quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

O Ribatejo é um segredo bem guardado

O Ribatejo um dia vai ser como a Provence francesa. Para já é um segredo bem guardado que um aeroporto internacional pode começar a desvendar.


Embora não seja um optimista inveterado, sou daqueles que olha para um copo de vinho e vê o copo sempre cheio ou meio cheio. Nos últimos tempos tenho sido desafiado para projectos que sempre sonhei realizar mas que agora já não me apetece. Mesmo assim estou metido numa camisa de sete varas porque há ideias que não se negam mesmo que nos digam ao ouvido que só os burros é que não mudam de opinião. Fica então aqui, preto no branco, que 2023 vai ser o ano de O MIRANTE na realização de iniciativas à margem do trabalho editorial, embora sempre pensando nos superiores interesses do jornal e no interesse público das iniciativas a que nos propomos. Esperem para ver e certamente que vão gostar de continuar a saber que O MIRANTE se apoia nas empresas e nas instituições sérias e bem dirigidas da região para ser também uma delas.


Numa altura em que a região está no centro do debate, a propósito da possibilidade de receber um aeroporto internacional, nada melhor que mostrar trabalho editorial para darmos a conhecer as potencialidades da região que, embora não tenha os favores políticos de outras regiões do país, tem gente laboriosa e dirigentes que ainda fazem a diferença e precisam da ajuda dos jornalistas.

Fica aqui escrito também, claramente, que O MIRANTE nunca será o arauto da desgraça mesmo que de Torres Novas cheguem tractores com asas, que do Entroncamento nos atirem à cara fenómenos com cornos, ou que em Santarém digam à boca cheia que temos que ser nós a perguntar ao Pedro Álvares Cabral se é verdade que ele está enterrado na Igreja da Graça.


Ironia à parte também não iremos ser nós a resolver as questões das margens do Tejo ou da falta de água para regar os campos durante o Verão ou os problemas da salinização ou do assoreamento; muito menos nos propomos oferecer casa de campo ou de bairro a António Costa ou a Marcelo Rebelo de Sousa só para que nos comecemos a encontrar no mesmo supermercado ou no mesmo café da cidade ou da aldeia. Está escrito nas estrelas que esta semana vou a Paris visitar, mesmo em cima do fecho da iniciativa, uma exposição de Francisco Tropa. Como está escrito no céu azul, que se vê da minha praia no Tejo, que um dia destes o Ribatejo vai ser um destino de eleição, não como a Comporta mas muito melhor que a Comporta, não como o Alentejo profundo mas como a Provence francesa onde todos os autarcas ribatejanos deviam passar férias para não dormirem na forma e se unirem à volta daquilo que cada cidade tem de melhor para oferecer a uma região única que ainda é um segredo bem guardado. JAE.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

A greve dos professores e o Portugal dos pequeninos

O Estado português deve ser o único do mundo desenvolvido que obriga os professores a deixarem casa e filhos para viver em quartos arrendados e trabalharem em escolas a 300 quilómetros de casa. Só não protesta e não leva esta luta até ao fim quem não se sente nem é filho de boa gente.

As greves dos professores são as mais justas das lutas laborais que se podem travar em Portugal. Espero que os professores levem esta luta até ao fim e não desistam sem conseguir assegurar as principais reivindicações. É desumano colocar um professor com filhos, em idade escolar, a dar aulas a 100, 200 e 300 quilómetros da casa de família. Portugal é um país pequeno, mas os professores têm que viver em quartos que custam metade dos vencimentos; e se quiserem ver os filhos ao fim-de-semana a outra metade do vencimento vai para os transportes. Os políticos portugueses, com a experiência governativa de António Costa, não podem dormir descansados quando têm pessoas a trabalhar para o Estado na condição de cidadãos de segunda; não há classes profissionais em Portugal que sejam tão injustiçadas como os professores. Por isso esta greve que certamente vai ficar na história da luta laboral em Portugal se os professores não aceitarem migalhas e a levarem até ao fim. 


Apesar da Europa estar em guerra, e o mundo depender dos azeites dos líderes da Coreia do Norte, da China, da Rússia e dos EUA, só tenho olhos para o que se passa em África e nos países árabes; é vergonhoso para os políticos das últimas gerações o legado que estamos a querer deixar aos nossos filhos e netos. Parece que o exemplo único de Nelson Mandela foi um fogo-de-artificio; o exemplo único de José Alberto Mujica Cordano, conhecido popularmente como Pepe Mujica, só chegou ao conhecimento dos homens que viajam no espaço quando são dois casos extremos daquilo que os homens são capazes para mudar o mundo. Mujica foi Presidente da República do Uruguai mas não se agarrou ao poder nem deixou a sua casa humilde e a sua vida de homem remediado; Nelson Mandela pagou com boa parte da vida na prisão numa luta sem igual pelo fim da guerra e da segregação racial, mas a sua história não serve de lição à grande maioria dos líderes africanos que, regra geral, são corruptos e ditadores.


Viajei este último fim-de-semana por Amesterdão onde não ia há alguns anos e o que encontrei surpreendeu-me: em meados de Janeiro, quando o turismo devia ser de época baixa, não era possível visitar os principais museus da cidade porque as entradas estavam esgotadas por vários dias. Os preços dos produtos essenciais são cada vez mais caros em relação aos países pobres como Portugal. Não preciso de frequentar os bares ou os bairros de Amesterdão para me sentir feliz, mas tomo boa nota do facto da Europa estar cada vez mais dividida entre países ricos e pobres, sociedades cada vez mais bem organizadas ao lado de outras que parecem reféns de um capitalismo selvagem praticado pelos grandes grupos económicos que controlam a distribuição. Tudo isto nas barbas dos socialistas e social-democratas portugueses que há meio século governam o país, mas não passam da cepa torta, na reforma do ensino da saúde, no apoio às autoridades reguladoras que, em muitos casos, parecem associações de caridade de apoio aos empresários Donos Disto Tudo. JAE.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

A ver quem tira mais carne do osso

O que se passa na CP e na TAP é uma vergonha para o país de Abril. O PS de António Costa perdeu o rumo. Notas de um diário que actualiza a notícia do reforço nos supermercados dos alarmes nas latas de conserva.


“Supermercados estão a colocar alarmes em produtos alimentares básicos como latas de atum ou garrafas de azeite. Os furtos estão a aumentar; são roubos de pessoas que já não conseguem sobreviver só com o seu salário e pensão”. A notícia está espalhada na maioria dos jornais e foi publicada em meados de Outubro de 2022. Ainda em Outubro, a autora de “Misericórdia”, Lídia Jorge, em entrevista ao Expresso admite que em Portugal se prende as pessoas que roubam uma lata de atum mas os banqueiros e os empresários corruptos não vão para a cadeia nem são tratados como ladrões. Quem fala assim não é gaga.


A saída de Pedro Nuno Santos do Governo de António Costa e a entrada de João Galamba para o seu lugar deixou um travo amargo naqueles que pensavam que António Costa ia, finalmente, dar um murro na mesa e virar do avesso a política lobista do PS e da maioria dos ministros deste Governo. A pergunta que todos fazem tem lógica: “João Galamba vai governar ouvindo a voz do agora deputado e ex-ministro Pedro Nuno Santos ou segundo critérios políticos do primeiro-ministro e líder socialista António Costa? Quem conhece o percurso político de João Galamba diz que não tem dúvidas. Veremos se António Costa tem a autoridade que todos julgamos que ainda tem no Governo e no meio dos camaradas desavindos a ver quem tira mais carne do osso.


Neste último fim-de-semana pus a leitura em dia e reparei que vários jornais deram largo espaço ao facto de José Sócrates ter sido convidado para a tomada de posse de Lula da Silva. Quem é que não sabe que alguns dos crimes de que Sócrates foi, ou ainda está, acusado tiveram o contributo de Lula da Silva que era presidente de um país onde o escrutínio da Justiça é o que se sabe? Tudo indica que José Sócrates vai passar mais um ano a correr na praia, a viajar e quem sabe a trabalhar em futuros livros, quem sabe de memórias, embora como autor de livros tenha uma história que o deveria envergonhar.


Das análises que li sobre a realidade das empresas públicas não há dúvida que a TAP e a CP estão ao nível daquilo que é a maior pouca vergonha dos lóbis económicos nos governos do Partido Socialista. António Costa desfez uma decisão de privatização da TAP que tem sido ruinosa para o país. A CP tem uma protecção do Governo que faz dela um ninho de víboras, que se dá ao luxo de marcar greves sucessivas em vésperas de feriados e fins-de-semana prolongados, prejudicando os utentes que pagam pela medida grossa o desvario dos nossos governantes. Quem continua a dizer que não há espaço para a concorrência neste sector em Portugal, só pode estar a chamar estúpidos aos portugueses, principalmente aqueles que utilizam diariamente os caminhos-de-ferro.


Tinha uma viagem programada à Rússia, para finalmente visitar Moscovo e São Petersburgo e o seu Hermitage, mas Putin, o espião feito Imperador, deitou por terra as minhas pretensões. Como eu, imagino que estão milhões de viajantes que só conhecem a terra de Tchekhov, Tolstói, Boris Pasternak, Nabokov e Dostoievsky, pela leitura dos seus livros. Quando penso no horror da guerra, naquilo porque passam os envolvidos neste confronto, principalmente os ucranianos que são as vítimas das armas de guerra dos russos, não tenho vontade de me lastimar por não poder assistir finalmente a um bailado no Teatro Bolshoi, mas sim o desejo de manifestar descontentamento por viver numa Europa que se deixou aprisionar pelos interesses económicos de um país que, politicamente, só podia ter seguido os exemplos da liderança política de um grande homem chamado Mikhail Gorbachev. JAE.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Toda a vida e mais seis meses

O título da crónica não tem a ver com o conteúdo. Mas devia; falta de jeito do cronista que trocou as voltas ao texto e não conseguiu dar a volta ao título.

Quem me conhece sabe que não sou de festas nem de festinhas. Gosto de festejar os meus anos quando me apetece, e o mesmo com o Natal, o Carnaval e todos os grandes festejos que reúnem multidões. Regra geral quando a maioria festeja eu estou a trabalhar ou recolhido no meu cantinho. Quando tudo volta ao normal marco viagens e vou viajar, aproveito os spas dos hotéis, vou às lojas comprar o essencial, enfim, não sou de luxos nem nunca fui e contento-me cada vez mais com o pouco que preciso para não ganhar barriga nem me tornar num velho jarreta como já vejo por aí muitos que ainda nem chegaram à minha idade.

No início da noite da passagem de ano saí à rua de mota, sem a chave de casa, e tive que me abrigar durante quase uma hora nas arcadas de um centro comercial, junto do pessoal que esperava as encomendas para entregar porta-a-porta. Entrei num multibanco de uma conhecida agência bancária, do tamanho de uma sala de festas, e fui dar com uma jovem a dormir no quentinho do espaço, a um canto, com a mala de mão em cima do colo. Estava a dormitar e deixou-se observar como se fosse um animal raro. Estava bem vestida mas percebia-se que não era fato para uma festa de passagem de ano. Não tive coragem para lhe perguntar se precisava de ajuda.

Quando a chuva abrandou meti-me ao caminho de capacete enfiado no braço e tentei adivinhar o drama humano dentro de três ambulâncias que passaram por perto, num espaço de meia hora, a caminho do Hospital de São José.

Perto da hora em que acabava a missa, numa igreja perto de casa, fui tocar a campainha do meu prédio e encontrei finalmente abrigo, conforto e companhia para passar mais uma noite, igual a tantas outras, com a diferença desta ser mais marcante no calendário das nossas alegrias e desilusões.

Para não variar aproveitei a folga no trabalho, embora de computador ligado, para durante uma parte da noite, e no dia de Ano Novo, ler pela terceira vez o mesmo livro de Rosa Montero com o título de A Louca da Casa. Ainda não sei explicar porque escolho alguns livros para reler, embora tenha tantos na estante que nunca li, e gostava tanto de ter tempo para ler. Agora que escrevo sobre o assunto tenho a sensação que para o ano vou voltar ao mesmo livro, provavelmente noutra edição, já que a deste ano está toda assinalada e certamente que a vou oferecer a um dos meus filhos para quando morrer ficar a prova de que existi e deixei rasto. É pouca coisa mas cada um deixa aquilo que tem de melhor.

Uma última nota, que me escapava deste final e início de ano, que foi bem mais tranquilo do que muitos outros. Realizei e trabalhei uma entrevista que um dia destes há-de ser paginada que me consumiu e fez perder a paciência. O trabalho de jornalista não é para fracos, nem para preguiçosos, e muito menos para quem julga que a profissão também é para velhos. Não é. Definitivamente. Daí esta vontade de mostrar serviço que de vez em quando me rouba o sono mas não me faz desistir. JAE.