tag:blogger.com,1999:blog-43702308976526490062024-03-16T01:09:51.145+00:00Crónicas de última página e outros textos de opiniãoCrónicas de última página e outros textosUnknownnoreply@blogger.comBlogger713125tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-86807797918499462192024-03-14T07:00:00.001+00:002024-03-14T07:00:00.139+00:00 1 em cada 5 eleitores votou no Chega no 50 anos do 25 de Abril<h3 style="text-align: left;">É muito provável que o dinheiro encontrado no gabinete de Vítor Escária tenha contribuído para o descrédito do Partido Socialista e dos seus dirigentes. Ninguém diria que no melhor pano ia cair esta nódoa. António Costa não merecia, mas a verdade é que ninguém tem um chefe de gabinete enviado num pacote sem endereço. </h3><p><br /></p><p>Um em cada cinco eleitores votou no Chega. Ninguém esperava. É muito provável que o dinheiro encontrado no gabinete de Vítor Escária tenha contribuído para o descrédito do Partido Socialista e dos seus dirigentes. Ninguém diria que no melhor pano ia cair esta nódoa. António Costa não merecia, mas a verdade é que ninguém tem um chefe de gabinete enviado num pacote sem endereço. António Costa tinha obrigação de vigiar quem escolheu para o apoiar nas decisões sobre os destinos do país.</p><p>Com as eleições recordam-se números estranhos para quem confia no sistema político que vivemos desde o 25 de Abril. O Chega com esta votação vai receber cerca de quatro milhões de euros por ano de subvenção do Estado, mais 1,4 milhões que lhe calharam dos 8,1 milhões que vão ser distribuídos pelos partidos que concorreram, no mínimo, a 51% dos lugares sujeitos a sufrágio para a Assembleia da República. O sucesso do Chega trouxe a lume ainda o facto de um em cada nove votos não ter servido para nada, ou seja, em alguns distritos somaram-se mais de seiscentos mil votos que não serviram para eleger deputados devido ao facto do país estar dividido em círculos eleitorais em que uns valem mais que outros. Dando como exemplo as eleições de 2015 no distrito de Portalegre, mais de 20% dos votos em vários partidos não elegeram qualquer deputado (apenas o PS e o PSD elegeram). Já em Lisboa, só cerca de 7% dos votos é que não resultaram na eleição de um deputado para um partido. Todos os votos são iguais e têm o mesmo valor, mas, tal como na ficção de George Orwell em "O Triunfo dos Porcos", todos os eleitores são iguais, mas uns são mais iguais que outros.</p><p>Assim como no Brasil os taxistas perguntam uns aos outros como é que é possível que a grande maioria vote Bolsonaro, em Lisboa acontece exactamente a mesma coisa: é muito raro entrar num táxi onde o condutor não seja apoiante do Chega. Nos livros O Mundo de Ontem e O Mundo que eu Vi, Stefan Zweig conta episódios da sua vida em que se lembra de ver Hitler a discursar para meia centena de pessoas e outras tantas a verem e a desvalorizarem o seu discurso e a sua importância política. Muitos anos depois Stefan Zweig estava a fugir da Áustria para França tentando escapar à primeira guerra mundial, depois de França para os EUA e depois para o Brasil escapando da segunda guerra mundial. A sua Obra é talvez o maior testemunho dos intelectuais do seu tempo, já que entre o seu círculo de amizades incluíam-se Rimbaud, Romain Rolland, Rainer Maria Rilke, Thomas Mann, Émile Verhaeren e Sigmund Freud, com o qual se correspondeu entre 1908 e 1939. A família de Stefan tinha uma biblioteca onde havia livros com os cabelos de Mozart. O célebre compositor tem um diário digitalizado na Internet escrito entre Fevereiro de 1784 e Dezembro de 1791, que foi retirado de um manuscrito que se chama Verzeichnüss aller meiner Werke (Catálogo de todos os meus trabalhos) doado à Biblioteca Britânica pela família do escritor austríaco em 1986. Nada desta importância impediu que Stefan Zweig se considerasse o único homem no mundo que teve que construir três casas de família em partes diferentes do mundo e que resolvesse suicidar-se por já não acreditar no futuro da Europa.</p><p>Misturei aqui resultados eleitorais com leituras e saberes enciclopédicos mas foi com intenção. Não me interessa desvalorizar o trabalho de André Ventura porque ele merece este resultado eleitoral tendo em conta o demérito dos seus adversários. Todos lhe fizeram a caminha como se diz na gíria. A começar em António Costa e Vítor Escária e a acabar em José Sócrates que vive um pesadelo na vida real como alguns actores vivem diariamente em palco do génio criativo de alguns escritores que escrevem ficção para ser encenada.</p><p>A minha esperança é que ainda viva o tempo suficiente para ver um primeiro-ministro português a governar a partir do Porto, uma dúzia de ministros em carro próprio a visitar as obras pelo país, a demitirem-se assim que um pássaro lhes cague em cima da cabeça e quem sabe, uma administração central onde já não habitem os velhos lobos que estão ao serviço dos DDT com o beneplácito dos socialistas, social-democratas e outras aves raras. Pode ser pedir muito, mas nestes tempos de pobreza de espírito aposto em não baixar as minhas expectativas. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-32591103931748258672024-03-07T07:00:00.001+00:002024-03-07T07:00:00.135+00:00 A região do Ribatejo e a sorte grande chamada José Saramago<h3 style="text-align: left;">Metade do mundo sabe que muito do vinho alentejano engarrafado é feito de uvas de vinhas ribatejanas. O Ribatejo acabou como marca e o Alentejo é cada vez mais uma marca internacionalizada e famosa. Oportunidade para voltarmos a José Saramago e à sorte grande de termos um escritor que é mais comemorado em Lanzarote, Mafra e Lisboa que na terra onde nasceu.</h3><p><br /></p><p>Quem ler as Pequenas Memórias de José Saramago fica a saber que a história de vida do autor de Memorial do Convento passa também pela Chamusca quando ele atravessava o rio e ia ao encontro de um familiar que guardava gado nos campos da Chamusca. O que me leva a falar do assunto é o facto de receber durante o ano vários convites para acompanhar visitas a vários caminhos de Saramago, de Lisboa a Lanzarote, de Mafra ao grande Alentejo. Foi neste último território, hoje cada vez mais desertificado, que Saramago se escondeu do mundo para escrever Levantado do Chão que o catapultou para o êxito e a conquista de milhões de leitores. O génio do escritor da Azinhaga levantou voo e poucos anos depois surgiram as obras que deixaram de ser só novidade no trato da escrita e da composição dos textos, para serem também literatura de génio, prosa de um grande espírito criador.</p><p>Falo do assunto porque a Chamusca e a Golegã podiam juntar-se para organizarem os caminhos de Saramago na terra onde o escritor nasceu e conheceu o mundo. Do lado da Chamusca governa um político, Paulo Queimado, que é uma ave rara que provavelmente nunca leu um livro depois de ter acabado a escola; do outro lado está um novo presidente, António Camilo, ainda a apalpar terreno e pelo que sei a estudar o assunto, mas sem coragem de dar o passo em frente.</p><p> A região do Ribatejo está quase a deixar de ter campinos, toiros e qualquer dia só tem a memória das tradições. Aliás, a região do Ribatejo já nem se chama Ribatejo para alguns produtos, como, por exemplo, os vinhos que passaram a denominar-se como marca "Vinhos do Tejo", considerado pelos seus autores “uma evolução”, porque “os vinhos ribatejanos tinham fama de baixa qualidade”. Enfim, quando se tem tudo, como uma marca famosa chamada Ribatejo, os vinhos escolhem a marca Tejo e mandam o Ribatejo às urtigas porque os vinhos de antigamente tinham má fama (embora metade do mundo saiba que metade dos vinhos engarrafados alentejanos são desde há séculos feitos com uvas compradas no Ribatejo, onde sempre houve mais fartura e variedade. E eles mantiveram a marca porque os alentejanos são tudo menos parvos). Para ser verdadeiro acho que o autor desta ideia tem os fusíveis queimados e quem foi na cantiga para lá caminha.</p><p>A Chamusca é cada vez mais uma terrinha que vive das festas da Ascensão e dos cantores pimbas e do romance, sem ficção, entre dois políticos que devem dormir mais do que governam. O resto é charneca, terra do campo e casas em ruínas. A Golegã sempre tem o museu do grande Martins Correia, mal divulgado, diga-se de passagem, a Casa Estúdio Carlos Relvas, um centro cívico ganho à custa de uma feira secular, e é sobretudo morada do grande José Saramago, que tem um Nobel na Obra que vai ficar para sempre.</p><p><br /></p><p>Como estamos em tempo de eleições lembrei-me de desafiar os leitores a procurarem nos tempos de antena dos partidos políticos o testemunho de figuras públicas ligadas à cultura, à economia e à sociedade civil. Já agora tentem ver se aparece algum militar de Abril a fazer campanha eleitoral em nome dos partidos do arco do poder. Népia. Agora o Álvaro Cunhal é um tipo que parece que saiu ontem do colégio; Mário Soares é um rapaz barbudo que diz como José Sócrates que as dívidas do Estado não são para pagar; o PSD tem um advogado como líder a quem António Costa pregou a partida de obrigar a disputar eleições em tempo recorde, sem lhe dar tempo de arrumar a casa laranja, o que lhe pode custar muito caro. JAE .</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-54160569195149514912024-02-29T07:00:00.001+00:002024-02-29T07:00:00.133+00:00 Conheço melhor Paris que Massamá<h3 style="text-align: left;">Uma crónica para partilhar que conheci Jorge O Mourão numa esquina de um bairro famoso, que aprendi a podar figueiras, que tenho a biblioteca mais desarrumada do que as ideias e que cada vez falho mais os meus compromissos de agenda incluindo a ida ao médico.</h3><p><br /></p><p>Na acção de formação de poda de figueiras que se realizou recentemente em Torres Novas (ver edição de O MIRANTE da passada semana) o almoço do engenheiro formador Rui Maia de Sousa foi passado a trabalhar. Como o dia era curto, e a prática no terreno não dava para conversas prolongadas, o almoço serviu às mil maravilhas para os formandos roubarem teoria ao mestre.</p><p>O que ninguém esperava era que a meio da tarde, numa demonstração junto de uma figueira, o mestre Rui Maia de Sousa respondesse a uma dúvida de uma formanda nos seguintes termos: “olhe, dez anos a aprender a podar podem ser poucos e ao fim desse tempo a sua conclusão pode ser a de que tem que voltar a aprender tudo de novo durante mais dez anos”. A frase pode não estar como foi dita mas está lá perto certamente.</p><p>Em tempo de campanha eleitoral dá para perceber que o engenheiro Rui Maia de Sousa não é candidato a nenhum cargo. Se fosse estava tramado. Quem reconhece que está sempre tudo por fazer, e só sabemos que nada sabemos, não pode ser político. Mas merece certamente a admiração que o pessoal de Torres Novas tem por ele, pelos seus conhecimentos e pela dedicação à causa do figueiral que dantes era uma indústria e hoje é uma das culturas que exige mais investimento e dedicação, assim como dimensão para poder ser rentável.</p><p><br /></p><p>Esta semana falhei mais uma vez a inauguração da Cartoon Xira, voltei a atrasar a leitura dos jornais, tanto em papel como digitais, ainda não curei as minhas árvores nem acabei a poda, não consegui encontrar nas estantes da minha biblioteca um livrinho autografado do Professor Joaquim Veríssimo Serrão, que preciso para um trabalho urgente, não marquei duas consultas que ando a adiar desde o início do ano quando deixei de ter médico de família e descobri que conheço melhor a cidade de Paris que Massamá, uma localidade da Área Metropolitana de Lisboa, concelho de Sintra, que fica entre Queluz e Cacém. Foi lá que encontrei um café cheio de gente, onde prolonguei a tarde, depois de uma massagem terapêutica, a beber café e a comer um doce regional, com a curiosidade aguçada pelo ambiente que me conquistou. Num outro café, que é ao mesmo tempo cervejaria e casa de petiscos, encontrei a decorar uma parede o cachecol do Real (de Massamá) que o dono do estabelecimento diz que é o único emblema da casa juntamente com o da selecção nacional.</p><p>É claro que deixei muito mais agenda por cumprir, já que quanto mais trabalho mais trabalho deixo por fazer. Mas essa é a sina de quem vai descobrindo ao longo dos anos que “o caminho faz-se andando”, que “a verdadeira viagem é a do regresso” e que “o único caminho na vida é aquele que já caminhamos”.</p><p>Escrevo directamente no computador que cheira a IA, mas tenho ao meu lado um livrinho antigo a cheirar a mofo, de Rainer Maria Rilke, que escreve sobre Rodin, que trouxe de oferta da biblioteca de um amigo que visitei recentemente. Estou de tal modo vidrado com a sua leitura que bloqueei e perdi a vontade de acabar o artigo que comecei a escrever, para desespero de um novo amigo que conheci na viagem, que se chama Jorge O Mourão, um cineasta que já faz parte da história do cinema brasileiro, que passou uma tarde comigo e com mais dois amigos numa esplanada de rua do Bairro da Glória, no Rio de Janeiro, enquanto centenas de corpos quase nus, outros nem tanto, desfilavam à nossa volta brincando ao Carnaval. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-54667842081215086832024-02-22T07:00:00.000+00:002024-02-22T07:00:00.129+00:00 Personalidades do Ano: o jornalismo de proximidade que é a marca de O MIRANTE<h3 style="text-align: left;">O MIRANTE é um jornal que edita livros quase desde a sua fundação; levamos o nome da região aos quatro cantos do mundo, somos a melhor redacção descentralizada dos jornais e das televisões de Lisboa e do Porto, que têm no nosso trabalho referências para valorizarem o seu, e disso também nos orgulhamos, por que ao trabalho de jornalista pode aplicar-se, sem vaidade, o provérbio que ensina que "a mão que dá está sempre acima da mão que recebe".</h3><p><br /></p><p>Na próxima semana realiza-se em Santarém a 19ª edição da cerimónia das Personalidades do Ano organizada por O MIRANTE. A minha memória é fraca para algumas coisas, mas para outras é forte e não desarma. Quando tenho o azar de esquecer, e de gastar as reservas da memória RAM, tenho a Joana, e agora também o Bernardo, que para minha sorte aceitaram o desafio de trabalharem comigo.</p><p>Diz a Joana que assim que se sentou à secretária, ainda no Beco dos Agulheiros, eu lhe disse: “agora que chegaste vamos começar a organizar as Personalidades do Ano para concorrermos com o Galardão Empresa do Ano cuja iniciativa tínhamos proposto três anos antes ao presidente da Nersant e que foi aceite de imediato.</p><p>Não sou capaz de diferenciar o meu interesse e entusiasmo tanto na organização do Galardão Empresa do Ano como na organização das Personalidades do Ano. É quase como perguntar a um pai que tem vários filhos de qual é que gosta mais. Hoje, nesta data, a poucos dias de editarmos um suplemento com treze entrevistas às treze personalidades do ano, é difícil não tomar partido sabendo que vamos mexer com a comunidade, que os nossos premiados não se ficaram pela satisfação de saberem que vão ser reconhecidos publicamente, como aceitaram falar e assumir em entrevista aquilo que os fez merecer a escolha dos jornalistas da redacção de O MIRANTE. Uns mais do que outros, por razões também díspares, já que os distinguidos têm diferentes papéis na sua intervenção na comunidade e na sociedade em geral.</p><p>Há uma situação que quero partilhar com os leitores desta página que acho pertinente e que merece ficar registado. Não há ano nenhum que não digamos, depois de cada cerimónia, tentando apanhar o que resta dos cacos que partimos ao longo do nosso trabalho de premiar, elogiar e criticar, que não digamos, repito, "este foi o melhor ano de todos, e a melhor cerimónia", e as razões são quase sempre as mesmas: a presença dos nossos ilustres convidados que enchem as salas onde nos juntamos e a excelência dos nossos premiados que nunca se fazem rogados a receberem a distinção nem deixam por mãos alheias o mérito que têm e que lhes reconhecemos.</p><p>No dia 29 de Fevereiro a cerimónia das Personalidades do Ano inaugura uma nova etapa anunciada em Novembro na cerimónia da entrega dos prémios Galardão Empresa do Ano.</p><p>A Joana vai assumir o seu papel de líder, como é justo e já vem acontecendo há muito tempo noutras situações, e o Bernardo, que neste momento é coordenador editorial, vai assumir a apresentação e direcção da cerimónia em cima do palco onde vamos reconhecer uma a uma todas as personalidades do ano de 2023.</p><p>O MIRANTE é um jornal que edita livros quase desde a sua fundação, premeia empresários e personalidades da vida pública ligadas às mais diferentes áreas da nossa sociedade, somos escolhidos por algumas entidades para entregarmos donativos às pessoas que são notícia no nosso jornal e disso nos orgulhamos; levamos o nome da região aos quatro cantos do mundo, somos a melhor redacção descentralizada dos jornais e das televisões de Lisboa e do Porto, que têm no nosso trabalho referências para valorizarem o seu, e disso também nos orgulhamos, por que ao trabalho de jornalista pode aplicar-se, sem vaidade, o provérbio que ensina que "a mão que dá está sempre acima da mão que recebe".</p><p>O jornalismo regional tem um lugar na democracia portuguesa que O MIRANTE representa há 36 anos sempre em crescendo, com muita luta e uma firmeza inabalável. O lema desta iniciativa é igual desde o primeiro dia: "Qualquer momento é bom para dizer isto é justo". JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-33622018829027828142024-02-14T12:06:00.002+00:002024-02-14T12:06:17.942+00:00 A campanha eleitoral e os novos actores do circo<h3 style="text-align: left;">É triste ver e perceber como os políticos são os novos actores do circo, os palhaços de serviço, os animais amestrados que em vez de actuarem num palco dão espectáculo sentados à volta de uma mesa usando a arte de falarem todos ao mesmo tempo de assuntos que só interessam aos empresários do circo.</h3><p><br /></p><p>Em plena campanha eleitoral devo confessar que tenho evitado ao máximo ligar a televisão para acompanhar os debates. Como é sabido vivemos uma democracia amputada. Quanto mais a democracia portuguesa, nascida no dia 25 de Abril de 1974, vai ficando velha, mais problemas vai criando aos novos democratas. Recordo palavras e sentimentos do presidente da Câmara de Mação, que andou dois anos a caminho do tribunal por causa de uma publicação na sua página pessoal; e de uma condenação recente do ex-presidente da Câmara do Cartaxo, Pedro Miguel Ribeiro, por ter permitido uma publicação em tempo de campanha eleitoral no site da câmara municipal de uma iniciativa que deveria ser entendida como trabalho de divulgação. Os partidos políticos podem endividar-se a divulgarem o que quiserem em cartazes espalhados por tudo o que é avenida, rotunda, praça, beco, árvores e postes de electricidade; não há limites para a distribuição de publicidade no espaço público, assim como não há limites para o tamanho dos cartazes. Chega a ser pornográfico ver cartazes em cima de cartazes, em lugares onde o diabo não chegaria, e o olhar humano só vê e consegue ler uma pequena parte. Apesar de toda esta prática política, que na maioria dos casos é abusiva e contrária a tudo aquilo que são as boas práticas ambientais, continua a ser proibido aos partidos políticos usarem a comunicação social para publicitarem as suas ideias e propostas eleitorais. Há uma excepção para o anúncio de comícios ou iniciativas partidárias, mas não podem exceder determinados tamanhos e menos ainda fazerem apelo ao voto.</p><p>Escrito e contado ninguém acredita. Os políticos criam condições para que a publicidade tenha regras na comunicação social, regras bem definidas que não permitem qualquer tentativa de esclarecimento sobre situações que interessam às populações, nomeadamente nas áreas sociais, culturais e económicas; mas permitem o livre arbítrio a toda e qualquer publicidade de rua, mesmo que seja numa situação de crime ambiental, ponha em perigo o trânsito e seja um atentado aos bons costumes. </p><p>Este ano comemoram-se os 50 anos do 25 de Abril. Meio século não foi suficiente para amadurecermos como povo e como país. Estamos a subir na classificação dos países da Europa onde não se investe no combate à corrupção. Na rua, em protesto, estão os funcionários dos tribunais, os médicos e enfermeiros, professores, polícias, inspectores de organismos do Estado como a ASAE, agricultores e etc; há um descontentamento generalizado sobre a actuação dos políticos e, em alguns casos, parece de propósito para gerar descontentamento. </p><p>Como é fácil de constatar os partidos que tradicionalmente ocupam os cargos de poder começam a ficar pelo caminho por falta de renovação dos seus quadros porque se deixam minar por gente menos apta e alguns homens de negócios que são os Donos Disto Tudo.</p><p>Os debates nas televisões são a cara da nossa democracia: todos contra todos e ninguém mete o dedo na ferida porque a campanha eleitoral é para exercitar argumentos falasiosos e vender sorrisos e frases feitas em tempo recorde. Os políticos que aceitam participar neste tipo de debates estão reféns de um sistema que eles próprios criaram e alimentam. É triste ver e perceber como os políticos são os novos actores do circo, os palhaços de serviço, os animais amestrados que em vez de actuarem num palco dão espectáculo sentados à volta de uma mesa usando a arte de falarem todos ao mesmo tempo de assuntos que só interessam aos empresários do circo. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-80646372073802335882024-02-08T07:00:00.013+00:002024-02-08T07:00:00.128+00:00André Seffrin: o escritor, crítico e editor que ainda organiza tertúlias na sua casa<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiLBine_e52fN3TWIj3_8GDo-EiN7f4kNSltHRxOg_pX6691JCsE9Pd8jFyx8JYp4LHPslVmjwlTL2aled0Z6AkA59DDTT21uYsnLsDLflUGIZXHlm3Pb4mldA9bul_mjf-JTbY90YMMif8oAcAIPqsqP_fUY-vFjeDpQilH7K4E50TtD4KPwaZ1RoParrc/s1400/Imagem-WhatsApp-2024-02-07-%C3%A0s-12.00.28_4980d62b.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="787" data-original-width="1400" height="362" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiLBine_e52fN3TWIj3_8GDo-EiN7f4kNSltHRxOg_pX6691JCsE9Pd8jFyx8JYp4LHPslVmjwlTL2aled0Z6AkA59DDTT21uYsnLsDLflUGIZXHlm3Pb4mldA9bul_mjf-JTbY90YMMif8oAcAIPqsqP_fUY-vFjeDpQilH7K4E50TtD4KPwaZ1RoParrc/w640-h362/Imagem-WhatsApp-2024-02-07-%C3%A0s-12.00.28_4980d62b.jpg" width="640" /></a></div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><h3 style="text-align: left;">André Seffrin é crítico literário e de artes plásticas, editor, ensaísta, faz de tudo e mais umas botas se lhe pedirem para organizar um livro ou valorizar um autor; e deve ser o único homem ligado às artes que ainda se dá ao trabalho de convidar os seus amigos para tertúlias na sua casa.</h3><p>Há cerca de três dezenas de anos levaram-me no início da noite, a medo, porque eu era novo nestas andanças e podia sair-me mal, para o bairro das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, para casa de um escritor, crítico literário e editor que habitualmente promovia tertúlias convidando gente do mesmo ofício.</p><p>Chama-se André Seffrin e ainda hoje é meu amigo e eu sou visita de sua casa como aconteceu recentemente.<br />Esta última estadia no Rio de Janeiro, o último dia de tertúlia com o André e a sua família, deram-se balanço para escrever este texto e provavelmente surpreender os meus leitores. Sou assumidamente um suicida tanto no convívio familiar como no trabalho e nos meus encargos com as coisas do corpo e do espírito. Nunca faço nada pela metade e se o faço é por razões da minha falta de inteligência ou força física. O eu que sou nunca me dá descanso nem a dormir. Sonho todas as noites e é raro que não goste dos meus sonhos. No meu dia a dia estou sempre a inventar mesmo depois de já ter passado os 68 anos e o meu coração ter reclamado dentro do peito. Sou incapaz de viajar para Cabo Verde, Brasil, França, Espanha, Chile ou Argentina, talvez os países que mais gosto, sem levar comigo o trabalho, os textos literários inacabados, uma pilha de livros, uma agenda de pequenos biscates que sei que posso resolver entre o café da manhã e o descanso num banco de jardim, a meio de um mergulho no mar, depois de uma sesta, enquanto dou uma mordidela numa nuvem ou engulo um bando de aves raras que me levam o que resta do cabelo que ainda tenho na cabeça.<br /><br /><strong>Conversar a ouvir fado e MPB</strong><br /><br />O André Seffrin é jornalista cultural tal como eu também gostava de ser. Mas somos tão diferentes um do outro que nos entendemos às mil maravilhas. Dantes durante uma noite de convívio, só à minha parte despejava dois litros de vinho entre as 7 da tarde e as 6 da madrugada; quando era cerveja nunca soube bem quantos litros bebia. Agora estou mais moderado e bebo mais água que vinho ou cerveja. Ele não. Continua em forma. A beber e a escrever. André Seffrin é daqueles escribas que gosta do que faz. Detesta assinar os seus textos e com 58 anos de vida discursou poucas vezes e já não aceita subir a uma tribuna para botar faladura. O que ele mais gosta é de trabalhar para editores que não querem textos assinados para as contracapas dos livros, as badanas ou para outra qualquer valorização do livro feito por quem vive e trabalha de ler e julgar o que os outros escrevem.<br />Nesta última vez que tertuliamos tivemos tempo de ver na televisão a gravação completa do Festival da Cancão Brasileira de 1966. Antes disso ouvimos a Marisa e a Amália a cantar o fado. Nunca na minha vida, na minha casa, liguei a televisão para ouvir fados ou fadistas, e muito menos espetáculos tão antigos, do tempo da Maria Cachucha. Quando saí da casa do André Seffrin e desci a rua Mário Portela, eram cerca de três da matina, disse para mim mesmo: preciso disto mais vezes para não morrer dentro de um carro de Fórmula1 sem saber se sou piloto ou copiloto suicida. Mesmo enquanto os artistas brasileiros famosos da época cantavam as canções que ainda hoje marcam a MPB brasileira, não deixamos de falar do Lêdo Ivo, do António Torres, da poesia do Alexei Bueno, dos diários inéditos do Walmir Ayala, da pintura do Gonçalo Ivo, da equipa do Fluminense, jogo que também vimos na íntegra, que nessa noite jogava em Saquarema, onde tínhamos passado uns dias antes, ele na sua casa de férias e eu numa Pousada onde fui reviver outros tempos. Falamos ainda da antologia de poesia erótica que haveremos de reunir a quatro mãos, das Obras de Octávio de Faria e do Baú de Ossos de Pedro Nava, que o André disse para não comprar que ia trazer um exemplar de Saquarema. <br /><br /><strong>Os livros como uma obrigação</strong><br /><br />André Seffrin não é maldizente como eu; não é tão cruel como eu a julgar pessoas, mas que ninguém o julgue só pelo que parece. Tem um humor fino e mortífero, ao contrário do meu, que só tem bala para atordoar.<br />Alguns dos melhores livros que ele leu, eu também já li depois de nos conhecermos. Nisso continuo igual ao que era aos 20 anos. Lia quase tudo o que eram sugestões de leitura do Manuel Alegre, do Baptista Bastos, do David Mourão Ferreira, Jorge de Sena, Piteira Santos, entre tantos outros que correspondiam aos pedidos dos jornais em tempos de feiras do livro ou de listagens de fim de ano. Embora esteja velho e cansado, não perco a mania de procurar os livros que, antes de morrer, tenho obrigação de ler. Diz-se que o escritor alemão Johann Wolfgang von Goethe, o autor de Fausto, chamou um padre minutos antes de morrer para se confessar. “Padre, confesso que vou morrer sem ter lido a Divina Comédia. É pecado”, perguntou. Só quem vive entre livros, viagens e fantasias percebe que há livros que até na hora da morte devem ser boa companhia. Nem que seja para os renegar. E tal como dizia Sócrates, horas antes de morrer questionado pelos seus discípulos sobre a razão porque não tirava os olhos de um livro, se a morte estava por breves horas, “devemos aprender até morrer”.<br /><br /><b>Escrever por favor e de borla<br /></b><br />Nesta última tertúlia o André confessou que quando chegou ao Rio de Janeiro vindo do sul, assistiu a muitas conversas do Walmir Ayala com músicos, escritores e artísticas plásticos da época, mas só guarda de memória o ambiente, nunca pensou em tirar apontamentos, sequer imaginava que a sua vida ir ser ler e escrever até morrer.<br />Quando conto as vezes que estivemos juntos, e os episódios que já vivemos, e as histórias que nunca irei contar desses encontros, porque me falta já o pormenor, fico danado e ainda mais suicida do que acho que merecia. A matéria de trabalho de um jornalista é a memória; quando a memória se vai são os apontamentos a que podemos recorrer que nos salvam a vida, ou seja, que nos dão material de trabalho para adiarmos a morte cerebral, doença que persegue qualquer pessoa que vive da arte da escrita, da música ou de qualquer outra actividade intelectual.<br /><br />Muitos dos amigos e amigas de há cerca de 30 anos que se juntavam a nós em tertúlia, já morreram e desses ainda reza a história, embora não sejam para aqui chamados. O André tem mais opinião literária dos amigos e conhecidos do que sobre eles próprios. Por isso quando fala dos grandes nomes da literatura brasileira que conheceu, e sobre quem escreveu, é como se falasse de família, de gente com quem bebeu um copo e trocou umas ideias sobre o assunto.<br />Embora tenha trabalhado para dezenas de editoras, poucas vezes o fez como funcionário. André Seffrin é dos poucos escritores do mundo que aceita viver no fio da navalha para fazer só o que gosta. Por isso admite que raramente escreve por favor e muito menos de borla. A escrita é o seu trabalho, e escrever exige tempo de estudo e, mais ainda, de habilidade intelectual que para pôr em prática é preciso fazer muitos abdominais e saltos mortais. <br />Quem quer prefácios do André Seffrin não fica a chuchar no dedo mas tem que merecê-lo. <br /><br /><br /><strong>O Demónio da Inquietude</strong></p><p>É minha convicção que os escritores vivem da abundância da sua memória, por isso leem muito, colecionam grandes bibliotecas, são regra geral ratos de sebos, interessam-se desalmadamente por jornais e revistas, notícias sobre tudo o que mexe no mundo das artes, da política e de sociedade, raramente sobre economia.<br />Recentemente perguntei ao autor de “O Demónio da Inquietude“, quem, depois de Carlos Drummond de Andrade, a quem chamou o Camões do nosso tempo, podíamos nomear seu herdeiro no Brasil. A pergunta complementava um desabado recente sobre a poesia que se publica actualmente. Não vejo ninguém, desabafou o mais arguto dos críticos brasileiros, mas também o menos cruel, eventualmente o mais afetivo dos escrutinadores da literatura brasileira dos últimos anos.<br />André Seffrin conviveu desde muito cedo com Walmir Ayala. Quando chegou ao Rio de Janeiro com 21 anos, e começou a conviver com Ayala e os seus amigos e conhecidos, tudo gente ligada às artes e às letras, André Seffrin fez-se crítico literário encantado pelas possibilidades de ser visitado pelas musas, ao contrário dos seus interlocutores que não faziam mais nada que andar no seu encalço, muitas vezes com a ajuda da bebida, do fumo e de algumas loucuras inomináveis.<br /><br />A minha memória está povoada de artistas que nunca precisaram de procurar trabalho: encadernadores, correeiros, alfaiates, marceneiros, jardineiros, torneiros, canalizadores, entre muitas outras profissões. O trabalho chegava porque eles eram únicos, já tinham sido aprendizes, herdaram a profissão dos seus mestres, mas também as oficinas e os clientes dedicados. André Seffrin lembra-me os mestres da arte e da vida que tenho como referências. Nunca o ouvi fazer queixinhas do trabalho ou de alguma desfeita, jamais o ouvi clamar por justiça como fazem as vedetas e como se houvesse justiça para quem trabalha por sua conta. Fizeram dele guardião de uma grande biblioteca e de um grande autor, e ele não enjeita esforços para continuar a valorizar quem nele confiou.<br /><br /><strong>O desejo de ser dono de editora</strong><br /><br />O que guardo dos seus segredos de escritor e editor profissional são episódios de falta de tesouraria, e o recurso à venda de revistas e jornais antigos que lhe serviram de material de trabalho por valores que deram para sobreviver durante dois anos. Mas também ouvi contar que gastou num só livro, que queria ter na biblioteca, o valor de um cordão de ouro.<br /><br />No ano em que se comemoram os 500 anos do nascimento de Luís Vaz de Camões, comemorações que estão longe de terem a dignidade que merecem, por culpa dos políticos analfabetos, Isabel Rio Novo vai publicar uma biografia do poeta que lhe consumiu seis anos de trabalho. Ao contrário dos políticos, os editores ainda arriscam. E os biógrafos fazem jus à sua profissão, trabalhando por pouco mas semeando em terra boa, esperando pela hora da colheita. André Seffrin trabalha como um poeta mas recebe como um biógrafo; esforça-se como um romancista mas é pago como revisor de texto. O seu sonho era fundar uma editora, e não trabalhar só para os editores, mas para isso precisava de duas vidas, pois é como escritor que sabe ganhar o pão para a boca. E um crítico também precisa de dormir e descansar e não tem que ser nem pode ser homem de negócios a tempo inteiro, que é o que são os editores que arriscam pedir uma biografia sobre um poeta, que morreu há 500 anos, e que terá sido enterrado em vala comum, embrulhado num lençol, numa data que nunca se irá saber ao certo.<br /><br /><strong>O escritor que a vaidade não perturba</strong><br /><br />André Seffrin guarda livros como um médico guarda amostras de medicamentos. O último livro que me ofereceu andava na minha lista de compras há mais de 10 anos e foi-me sugerido por uma amiga do Porto que tem um fraquinho por Rodin e Rainer Maria Rilke. O segundo foi secretário do primeiro e escreveu uma pequena biografia que é uma preciosidade. André Seffrin, tal como Rodin, amadureceu enclausurado na sua oficina, escondendo-se do público que o lia, dos artistas que precisavam dele, dos editores com quem tratava só de forma profissional, falando pouco e poucas vezes.<br />A segurança da sua escrita foi conquistada em silêncio, sem deslumbramentos, sem se deixar perturbar pelos elogios, sabendo de outras vidas que a grande segurança de um escritor é a sua independência.<br />André Seffrin é um daqueles escritores em que todos podem bater, o que não é o caso, mas que nenhum elogio o desconcerta ou perturba. <br />O crítico de mão implacável, sem ser carrasco, já escreveu sobre centenas de escritores, artistas plásticos e ensaístas. Só recentemente reuniu em livro alguns, poucos, desses textos que ajudaram alguns autores a deixarem de duvidar de si mesmos e dos seus recursos literários.<br /><strong>JAE</strong><br /><br /><strong>Nota de interesses; </strong>“O Demónio da Inquietude” é uma edição portuguesa da editora Rosmaninho, uma chancela de O MIRANTE, que está em todas as livrarias portuguesas. O livro tem uma folha de rosto com a seguinte epígrafe que abre a secção de Poetas Brasileiros: “…essa estranha terra natal chamada língua portuguesa. Augusto Meyer, A forma secreta / “Epístola a Porfírio”.<br />Embora tenha sido eu o editor, o livro vai-se lendo e relendo aos trancos e barrancos, e de vez em quando falha a memória sobre um autor que faz parte do livro, sobre um texto que volta a ser tema de conversa. Só a epígrafe fica, porque no Brasil há sangue português até nas raízes das árvores.<br />Graças ao André, ou por causa da amizade com o André, editei no Brasil, também com a Rosmaninho "Rio, da Glória à Piedade", um livro de crónicas e memórias de homenagem ao Rio de Janeiro, escrito por um colectivo de autores em que também estou incluído. Recentemente André Seffrin organizou para a Editora Nova Fronteira uma reedição de uma Antologia de Poemas de Amor, trabalho iniciado há muitos anos por Walmir Ayala, e fez o favor de me incluir, embora eu não o merecesse. <br /> </p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-32821893282304544602024-02-01T07:00:00.000+00:002024-02-01T07:00:00.137+00:00 Renova pode ser alvo de uma acção internacional de repúdio<h3 style="text-align: left;">A Renova é uma marca internacional de prestígio que tem um caso sério com o concelho de Torres Novas e com as instituições da região. Um movimento internacional de repúdio pela apropriação da nascente do Almonda pode ser um caso sério para a marca que faz publicidade no Museu do Louvre, em Paris, mas não oferece um rolo de papel higiénico para uma quermesse de uma festa local.</h3><p><br /></p><p><span style="font-size: x-large;">O</span> MIRANTE distingue-se na região por organizar o Galardão Empresa do Ano e publicar todas os dias e todas as semanas, em plataformas diferentes, notícias e matéria editorial diversificada com e sobre empresas e empresários. Quase sempre a favor uma vez que as empresas, regra geral, são fonte de boas notícias. Há excepções. A Renova é uma delas. O que a sua administração está a fazer na nascente do rio Almonda não vai acabar bem para a empresa. Ninguém com juízo, mesmo que tenha muito dinheiro e seja muito influente, pode proibir a população de uma região de ter acesso à nascente de um rio. Ainda por cima um rio que é o ex-líbris da cidade de Torres Novas.</p><p>Infelizmente a Renova tem um historial na região que não abona nada a favor dos seus administradores. Ouvi um dia a um deles que o melhor da nossa região é a auto-estrada para Lisboa. Sei que já nessa altura morava em Cascais, mas que tinha, e ainda terá, um quarto na fábrica, para não fazer o caminho de ida e volta nas alturas em que o trabalho aperta. Conto o episódio, não para lhe chamar forreta e pobretana, por não usar os hotéis da cidade, mas para acentuar o espírito de quem faz a gestão de uma marca que paga milhares em publicidade para ter uma montra no Museu do Louvre, mas depois poupa na dormida. Pode escrever-se que a Renova é património da região e um sucesso empresarial, mas não se nota ao nível da interacção com as instituições locais e regionais. Não conheço associação ou colectividade que seja apoiada pela Renova, sequer com uma taça para um concurso de pesca ou uma caixa de papel higiénico para uma quermesse. A Renova, pelo que sei, é uma empresa fechada à comunidade. Para os seus administradores só a nascente do Almonda é que é importante. E certamente a mão-de-obra de proximidade.</p><p>Não me custa admitir que a empresa que aluga montras no Museu do Louvre, e quer proibir a população de uma região de ter acesso à nascente de um rio, que sempre foi pública e deve continuar a ser custe o que custar a quem de direito, não me admira que um dia destes não se seja alvo de um movimento internacional de repúdio e de boicote à marca. Há casos recentes que deitaram abaixo marcas mais prestigiadas. Certamente que não é isso que todos nós queremos, nem tão pouco desejamos, mesmo que saibamos que o que nasce torto tarde ou nunca se endireita.</p><p><span style="font-size: x-large;">P</span>ortugal, o país do respeitinho, foi abalado até aos alicerces com os anúncios do Ikea que ainda vão dar muito que falar se os políticos não forem todos iguais.</p><p>A publicidade promete marcar a campanha eleitoral até ao dia das eleições, principalmente o outdoor que anuncia uma estante onde se podem guardar 75 mil euros, valor em dinheiro encontrado no gabinete de Vítor Escária, ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro António Costa.</p><p>Em termos públicos e de enxovalho da classe política portuguesa nunca se tinha ido tão longe. Só os episódios com José Sócrates, a viver dos envelopes de dinheiro entregues pelo condutor da sua viatura oficial, João Perna, podem comparar-se à situação vergonhosa vivida por Vítor Escária, seus chefes e subordinados. O facto de António Costa ter continuado como primeiro-ministro ainda justifica mais esta campanha de publicidade sensacionalista. Vítor Escária não terá justificado a existência do dinheiro no seu gabinete e, num país desenvolvido com uma democracia mais vigiada, um chefe de gabinete apanhado com quase 80 mil euros no seu gabinete tinha desaparecido de cena no dia a seguir ao escândalo e o primeiro-ministro tinha ido com ele. António Costa preferiu ignorar que Escária era o seu principal interlocutor no Governo do país e que o comportamento dele pode muito bem ser confundido com o do seu chefe. Nunca uma empresa, ou sequer um dirigente político da oposição política mais extremista, pôs em causa a idoneidade dos políticos portugueses como acaba de fazer o Ikea. Eu não comprava no Ikea mas vou começar a comprar. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-51534000861555668712024-01-25T07:00:00.001+00:002024-01-25T07:00:00.134+00:00A nota de cinco contos e a recordação que fica da Dª. Ricardina Vital<h3 style="text-align: left;">Morreu recentemente a Dª. Ricardina do Café Vital, esposa do António Vital, mãe do Jorge e do Rui, que teve um café, mais tarde também restaurante, onde eu quando era rapaz ia ver na televisão as corridas de touros e os jogos do Sporting.</h3><p><br /></p><p>Há histórias que não podem morrer connosco. Não é para nos imortalizarmos porque no resto tudo são borras; é só para correspondermos a quem espera de nós atitude, perseverança, boa memória, bairrismo, postura na vida, pelo menos enquanto cá andamos somos respeitados e respeitamos.</p><p>Morreu recentemente a D. Ricardina do Café Vital, esposa do António Vital, mãe do Jorge e do Rui, que teve um café, mais tarde também restaurante, onde eu quando era rapaz ia ver na televisão as corridas de touros e os jogos do Sporting. A Dª. Ricardina foi minha vizinha durante muitos anos e assim pôde testemunhar o crescimento dos meus filhos. Um dia o mais novo, talvez com sete anos, foi à carteira da mãe, tirou uma nota de cinco contos, fez o caminho de casa até ao restaurante que fica a duas dezenas de metros da minha casa, e entrou para encomendar e pagar um frango assado para o almoço. A Dª. Ricardina não estranhou a encomenda mas perguntou ao Bernardo onde é que ele tinha ido desencantar a nota de cinco contos. A resposta foi pronta e rápida; “não se preocupe; a minha mãe tem na carteira muitas notas iguais a esta”.</p><p>Conto esta história porque a Dª. Ricardina era uma mulher que podia ser minha mãe. E muitas vezes conversou comigo como se eu fosse seu filho, mas também um homem com quem ela podia desabafar as alegrias e as misérias da vida sabendo que eu era de confiança. Dificilmente uma pessoa que trabalha uma vida inteira atrás de um balcão, como foi o caso da Dª. Ricardina Vital, não deixa marcas naqueles com quem convive mais de perto ao longo de dezenas de anos. Foi o caso.</p><p>Eu próprio, entre os 11 e os 22 anos, fiz-me homem atrás de um balcão. E muito cedo comecei a ser confidente de homens que passavam o dia na taberna ou na cervejaria do meu pai, alguns viciados no álcool, amparo na conversa das suas mães e esposas que me pediam ajuda, dos segredos de alcova de uns e outros, dos dramas de todos os dias das pessoas mais pobres, mas também das remediadas, que isto de viver angústias, dificuldades financeiras e problemas sentimentais não é exclusivo dos menos sortudos e afortunados da vida. </p><p>Aos 14 anos pedi namoro a uma rapariga porque alguém me deu a dica que tinha caminho aberto, porque o meu pai era comerciante e vivia em casa própria, e ela vivia com a família numa casa de paredes de terra com boa parte do telhado em chapas de zinco. Acho que foi a primeira vez que percebi o drama da existência de classes e como funcionava a cabeça de quem achava que riqueza era beber água por um copo e pobreza era beber directamente da torneira. Cinco anos antes deste episódio a cozinha da minha casa era de chão de barro, tomávamos banho num alguidar e a sanita era um buraco ao fundo do quintal atravessado por uma tábua onde nos agachávamos. E as divisões da minha casa, construídas com tijolo de burro, eram tão modernas que eu tinha que tapar a cabeça com a roupa da cama para não ouvir os meus pais no truca truca.</p><p>A Dª. Ricardina Vital fica certamente na memória de centenas de pessoas, como ficam alguns dos nossos familiares mais chegados. Há pessoas das nossas comunidades que muitas vezes nos marcam mais que as pessoas da família. Não precisaram de ter andado connosco ao colo, ou de nos terem matado a fome, sequer de nos ampararem nos maus momentos; bastou que nos tivessem aberto os olhos de forma a crescermos como Homens e sabermos diferenciar-nos. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-48724297530423678202024-01-18T07:00:00.000+00:002024-01-18T07:00:00.130+00:00Portugal é o país das pessoas mais tristes do mundo<h3 style="text-align: left;">Portugal, o país da palavra saudade, é o lugar onde vivem as pessoas mais tristes do mundo, a confiar no que conhecemos, vemos e não podemos ignorar.</h3><p><span style="font-size: x-large;">S</span>empre que a política se mete à minha frente e me rouba a possibilidade de ler um livro com atenção, ver um bom filme, conversar em casa sobre o que me interessa desabafar, desligo a televisão ou tiro-lhe o som. Foi o que fiz este fim-de-semana em que as televisões voltaram a preencher horas e horas de programação a custo zero, já que os actores foram os políticos do Chega, reunidos em Congresso. Foi assim também quando reuniu o PS e elegeu o seu novo timoneiro. Para quem não sabe quanto custa produzir uma hora de televisão, imaginemos o que poupam as empresas quando têm o espectáculo da política para produzirem, sem terem que pagar a actores, realizadores, maquilhadores, aluguer de instalações, enfim, um nunca mais acabar de despesas que fazem da televisão a máquina mais cara do mundo, mas que elege presidentes da República.</p><p><span style="font-size: x-large;">A</span>s condenações que saíram do Tribunal de Santarém para os envolvidos no acidente da artista Sara Carreira fariam corar de vergonha os responsáveis pela Justiça, se houvesse quem respondesse pelo que se passa nos tribunais portugueses. Um condutor com excesso de álcool no sangue, a conduzir a uma velocidade abaixo do permitido na auto-estrada, provocou um acidente que resultou numa tragédia. Os envolvidos no acidente (provocado por uma pessoa irresponsável, sem estar no seu perfeito juízo), que podiam ter morrido como aconteceu a Sara Carreira, sobreviveram para irem a tribunal e serem condenados a uma pena quase comparada à do condutor irresponsável que provocou a tragédia. Uma vergonha. Os portugueses não merecem os políticos que temos e muito menos a Justiça que nos julga. É verdade que tudo funciona, e que podemos escrever “Aqui Del’Rei” sem sermos presos ou mortos na forca, mas pelo meio há muita gente que sofre, que é obrigada a viver medicamentada porque sem químicos não aguenta as injustiças do sistema político e judiciário.</p><p><span style="font-size: x-large;">A</span> grande notícia desta semana foi a manchete do jornal Expresso: “30% dos jovens nascidos em Portugal vivem fora do país”. Li o artigo e apesar de me considerar uma pessoa bem informada estava longe desta realidade. É por isso que não há juízes suficientes para que a Justiça não seja controlada pelo poder político como acontece em muitos tribunais, onde o Administrativo é um bom e pornográfico exemplo; é por isso que não há médicos suficientes; é também por isso que a crise de professores, onde se formam os homens de amanhã, vai ser um drama para o futuro; é por isso que os cretinos sobem na hierarquia dos partidos políticos e facilmente seguem o exemplo de Vítor Escária, que, apesar de ser chefe de gabinete do primeiro ministro de Portugal, tinha mais dinheiro vivo no seu gabinete de trabalho que todas as dependências dos bancos em Santarém.</p><p><span style="font-size: x-large;">P</span>ortugal, o país da palavra saudade, é o lugar onde vivem as pessoas mais tristes do mundo, a confiar no que conhecemos, vemos e não podemos ignorar. No ano em que comemoramos meio século da revolução dos cravos, a Justiça (os funcionários dos tribunais), a Autoridade (a PSP, GNR e a ACT), o Ensino (os professores e os funcionários das escolas), a Saúde (os médicos e os enfermeiros), estão na rua a gritar protestando melhores condições para poderem trabalhar, para além de pedirem também melhores remunerações. Entretanto os políticos do regime, PS e PSD, deixam falir as instituições e desmotivam os trabalhadores do Estado, abrindo caminho a um novo Messias que promete eliminar a corrupção e o desvario em Portugal enquanto o Diabo esfrega um olho.</p><p>Se tivesse 20 ou 30 anos não hesitava e juntava-me aos 30% dos jovens que fugiram do país e dos políticos mentirosos e trapaceiros. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-43750311300257616472024-01-11T07:00:00.001+00:002024-01-11T07:00:00.131+00:00Não escrevo sobre política nem que me matem<h3 style="text-align: left;">Vi e ouvi António Costa no congresso do PS e não quis acreditar; em Burgos há uma estátua ao leitor de jornais que revi num jornal onde o colunista cita Mário Quintana: “Os verdadeiros analfabetos são aqueles que aprenderam a ler e não lêem”.</h3><p><span style="font-size: x-large;">C</span>omecei o ano a reler livros e a passar os olhos pelos jornais que se acumulavam na minha secretária de trabalho. De tanto ler fico de espírito cheio, incapaz de escrever uma linha ou dedicar-me ao trabalho de escrutinar o que se passa à minha volta. A leitura aperfeiçoa a escrita mas é para quem vive de escrever. Não é já o meu caso. Escrevo cada vez menos e leio cada vez mais. Nada me cega mais que a leitura de livros e de artigos de revistas e jornais que me dão de volta aquilo que já esqueci ou de que me lembro só em parte.</p><p>Em Burgos, a cidade que tem uma das catedrais mais lindas do mundo, há uma estátua na Plaza Mayor dedicada ao leitor de jornais. Revi a imagem num jornal daqueles que chegam pela Internet e tomei nota da frase do colunista, roubada a Mário Quintana, que me avivou a memória: “Os verdadeiros analfabetos são aqueles que aprenderam a ler e não lêem”.</p><p><span style="font-size: x-large;">N</span>ão vou voltar a escrever sobre a crise na imprensa, da nacional à local e regional, mas não deixo passar o pretexto para lembrar que a maioria dos jornais locais, regionais, e até alguns nacionais, estão com tiragens e vendas de mil exemplares. Como é evidente há um clamor por aí mas não chega para iluminar o santo padroeiro da imprensa. Quem tiver que morrer já tem o seu destino traçado, como foi o caso recente do jornal Nova Verdade, um jornal da Igreja que chegou aos 91 anos mas não resistiu ao ano velho. Neste meio tempo o senhor Arons de Carvalho, que é uma das personagens mais sinistras dos governos democráticos, escreveu no jornal Público aquilo que nem o Diabo se atreveria, como se ele não fosse um dos maiores responsáveis pelo facto de Portugal ser um dos poucos países da Europa que não tem um plano para ajudar a imprensa.</p><p><span style="font-size: x-large;">N</span>ão escrevo sobre política nem que me matem. Escrevo só sobre Pedro Nuno Santos e António Costa porque vi, enquanto jantava, umas imagens na televisão que me doeram. António Costa foi enxovalhado enquanto primeiro-ministro ao ponto de ter que se demitir dois anos antes do seu Governo acabar o mandato de maioria absoluta. Foi ontem mesmo que saiu do Governo de Portugal envergonhado e enxovalhado pelo seu chefe de gabinete que num processo que também o envolve foi apanhado com 80 mil euros em dinheiro vivo escondidos no seu gabinete. Nada disto o motivou a ficar no seu cantinho e a deixar os seus sucessores abraçarem-se e beijarem-se e festejarem nova vida no PS sem o cheiro dele por perto. “Os homens jamais fazem o mal tão completamente e com tanta alegria como quando o fazem a partir de uma convicção religiosa”, disse Pascal, que em vez de “religiosa” podia ter escrito “política”. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-53088222700260710452024-01-04T07:18:00.001+00:002024-01-04T07:18:00.135+00:00 Terrorismo de Estado e a luta na Justiça<h3 style="text-align: left;">Vou começar o ano em tribunal a defender o jornal e o nosso trabalho contra gente que acha que o dinheiro lhes dá poder e lhes permite arbitrariedades sem escrutínio. Entretanto o país vai para eleições, mas até agora ninguém garante que o socialismo ou a social democracia nos livram do terrorismo de Estado.</h3><p><span style="font-size: x-large;">A</span> primeira crónica do ano novo é para pedir meças a mim mesmo. Estive envolvido num texto em que as fontes do jornalista eram figuras importantes da nossa vida associativa, mas a quem O MIRANTE não dá tréguas por serem manhosos nas suas decisões, um pouco facínoras nas suas vidas pessoais e profissionais. Devia começar o ano a partir a loiça, mas tenho a certeza que me ia acontecer o mesmo que aquele que respondeu à cuspidela de uma criança com outra cuspidela; se o adulto não desse parte de fraco perante a criança ainda hoje estavam os dois a cuspir um no outro. Vai daí que resolvi seguir a velha máxima de que “cá cantarás”.</p><p><span style="font-size: x-large;">V</span>ou começar o ano em tribunal, que é uma coisa a que já estou habituado, embora hoje muito menos do que antigamente. Mas lá estarei mais uma vez para defender o jornal e a empresa editora de O MIRANTE. A luta na justiça é contra gente que tem o rei na barriga, que acha que pode pisar sem levar troco, que julga que o dinheiro dá estatuto e sabedoria. Este trabalho de liderar um projecto de comunicação social pode tornar-se perigoso, mas é para quem trabalha nele; ficamos de tal modo apaixonados pelo que fazemos que nos esquecemos de viver a vida. Não me posso queixar porque falo de barriga cheia; estou em processo acelerado de descer à terra, mas para não chatear quem me lê dispenso-me de contar como aqui cheguei e o que ainda tenho para andar.</p><p><span style="font-size: x-large;">A</span>ntónio Costa caiu com o seu Governo de maioria absoluta por causa do dinheiro que o seu chefe de gabinete, Vítor Escária, tinha escondido nas estantes do seu espaço de trabalho. A comunicação social não devia deixar dourar a pílula. António Costa só tinha um caminho a seguir depois do seu chefe de gabinete ser apanhado com dinheiro vivo escondido. Se fossem oito mil euros já era um escândalo; como eram 80 mil euros tornou-se um facto histórico que vai manchar para sempre a história deste último Governo.</p><p>Só a comunicação social pode ajudar o país a não esquecer os factos graves que derrubaram o Governo. Infelizmente esse quarto poder, que é a comunicação social, está cada vez mais depauperado; parece que há um terrorismo de Estado contra os jornais e os jornalistas, a confiar no desprezo que o Poder tem dedicado ao sector da comunicação social. De verdade não é só com a comunicação social; é também com a justiça, onde faltam funcionários, com a saúde onde faltam médicos, com o ensino onde faltam professores e escolas em condições, e fico-me por aqui. De nada nos vale termos no poder políticos socialistas e social democratas, já que de socialismo e social democracia só sabemos o que é em teoria; na prática quem manda são os grandes oligarcas da nossa economia, como aliás tem sido bem visível desde a queda do Grupo BES, e dos esquemas que foram montados e ainda estão armadilhados para mal dos nossos pecados. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-10835774594593399102023-12-28T07:00:00.001+00:002023-12-28T07:00:00.131+00:00 Um elogio ao Pedro Ribeiro por causa do desperdício e dos telemóveis<h3 style="text-align: left;">Pedro Ribeiro publica regularmente informação que é o espelho do seu trabalho diário como autarca. Este ano fez figura a nível nacional implementando duas medidas que dizem bem da importância para um concelho quando o presidente da câmara sabe o que quer e o que faz.</h3><p><br /></p><p>Esta semana estive quase a dar este espaço ao presidente da Câmara de Sardoal por causa da clarividência e da frontalidade com que escreveu um texto numa página pessoal numa rede social. Não é normal, diria que é caso único na região, ler um autarca de peso a dizer mal do sistema e a apontar o dedo aos colegas sem se refugiar em palavras mansas.</p><p>Foi o texto de Miguel Borges que me levou a escrever o texto de última página que fecha o ano e que é um elogio ao Pedro Ribeiro, presidente da Câmara de Almeirim, que a 10 de Dezembro me convidou para fazer parte de um grupo também nas redes sociais. Só passaram duas semanas e tudo o que eu já sabia está espelhado nos textos e na importância da informação que o autarca de Almeirim partilha todos os dias para dar testemunho do seu trabalho.</p><p>Falo de dois casos que para mim são os mais importantes e que a nível nacional não têm paralelo. As escolas de Almeirim começaram a servir sopa feita de talos e cascas de legumes, numa clara demonstração de como se deve combater o desperdício e valorizar os alimentos no seu todo; noutro caso, não menos importante e desafiador, a implementação com sucesso da proibição do uso de telemóveis nas aulas. O maior elogio que posso fazer ao Pedro Ribeiro é publicar aqui um texto que guardo no meu computador, e que não fosse este caso acabaria no rol dos esquecidos, como muitos outros.</p><p>O jornalista e académico uruguaio Leonardo Haberkorn, desistiu de continuar a dar aulas no curso de "Comunicação" na Universidade ORT de Montevideu, através desta carta "Depois de muitos anos como professor universitário, hoje dei aula na faculdade pela última vez. Estou cansado de lutar contra telemóveis, WhatsApp e Facebook. Eles venceram-me. Desisto. Atiro a toalha ao chão. Cansei-me de falar de assuntos pelos quais sou apaixonado, para rapazes e raparigas que não conseguem tirar os olhos de um telemóvel que não pára de receber selfies.</p><p>É verdade que nem todos são assim, mas há cada vez mais a ficar assim. Até há três ou quatro anos, o apelo para deixar o telemóvel de lado por 90 minutos, nem que fosse só para não ser desrespeitoso, ainda teve algum efeito. Já não o está a ter. Pode ser que seja eu que me tenha desgastado demais neste combate, ou que esteja a fazer algo de errado. Mas uma coisa é certa: muitos desses miúdos não têm consciência do quão ofensivo é, e o quanto magoa o que eles fazem. Além disso, está cada vez mais difícil explicar como funciona o jornalismo, a pessoas que não o consomem, nem lhes faz diferença estar informado ou não.</p><p>Esta semana na aula saiu o tema Venezuela. Apenas uma estudante entre 20 conseguiu explicar o básico do conflito. O básico. O resto não fazia a mínima ideia. Perguntei se eles sabiam que Uruguai estava no meio dessa tempestade. Obviamente, ninguém sabia. Perguntei-lhes se eles sabiam quem é o "Luís Almagro". Silêncio. Entre as "cansadas" do fundo da sala, uma única miúda apenas balbuciou: "Não era o Chanceler?". O que está a acontecer na Síria? Novamente silêncio. Qual partido é mais liberal, ou está mais à esquerda nos Estados Unidos? Democratas ou Republicanos? Silêncio. Sabem quem é o Vargas Llosa? "Sim! Sim!" Alguém leu algum dos seus livros? "Não, nenhum". Lamento que os jovens não consigam libertar-se do telemóvel, nem mesmo na aula. Conectar pessoas tão desinformadas com o jornalismo, é complicado.</p><p>É como ensinar botânica a alguém que vem de um planeta onde não existem vegetais.</p><p>Num exercício em que os alunos tinham de sair para encontrar uma notícia na rua, uma estudante voltou com a notícia de que ainda se vendem jornais e revistas na rua.</p><p>Chega uma altura em que ser jornalista joga contra si mesmo. Porque nós somos ensinados a colocarmo-nos no lugar do outro, a cultivar empatia como ferramenta básica de trabalho.</p><p>E então vemos que esses miúdos - que continuam a ter a inteligência, a simpatia e o calor de sempre - foram enganados, a culpa não é só deles. A incultura, o desinteresse e o alheamento, não lhes nasceu do nada.</p><p>Foram-lhes matando a curiosidade, e cada professor que deixou de lhes corrigir os erros ortográficos, lhes estava a ensinar que tudo vai dar mais ou menos ao mesmo.</p><p>Então, quando tu entendes que eles também são vítimas, quase sem perceber vais baixando a guarda. E aí o mau acaba sendo classificado como medíocre; o medíocre passa por bom; e o bom, nas poucas vezes que chega, celebra-se como se fosse brilhante. Não quero fazer parte desse círculo perverso. Nunca fui assim e nem serei. O que eu faço, gosto de fazer direito, ou o melhor possível, e não suporto o desinteresse a cada pergunta que faço, respondida invariavelmente com o silêncio. Silêncio! Silêncio! Silêncio!</p><p>Eles queriam que a aula acabasse.</p><p>Eu também". JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-89731776606294947392023-12-21T07:00:00.000+00:002023-12-21T07:00:00.236+00:00 Viver a vida como uma prenda de Natal<h3 style="text-align: left;">Não gosto do Natal mas gosto do espírito de Natal. Por isso fica aqui a minha história de Natal, embora um pouco triste, embora um pouco envergonhada.</h3><p><br /></p><p><span style="font-size: x-large;">N</span>ão gosto da quadra festiva que estamos a atravessar e não é para contrariar nem para me fazer difícil. Não gosto mesmo, sinto que é nesta altura que somos mais hipócritas, que valemos menos por esquecermos os velhos nos lares, por não sermos solidários com um vizinho com problemas de saúde, por não aceitarmos uma buzinadela de um carro sem dizermos uma asneira, por não darmos o lugar na fila a uma pessoa mais velha, entre tantas coisas em que somos maus cidadãos e achamos sempre que a culpa disto tudo estar como está não é nossa, mas dos outros. Por isso não dou nem recebo prendas, com as devidas excepções que ninguém pode negar à família e alguns amigos. Aliás, aprendi muito com a família que ajudei a formar a ser menos radical nestas coisas das tradições, mas não cedi em tudo. </p><p><br /></p><p><span style="font-size: x-large;">T</span>enho uma história de Natal para contar aos leitores desta coluna que na última semana fizeram do meu texto um dos mais lidos na Internet, sem que o mérito seja meu, uma vez que escrevi sobre a aberração dos homens escolhidos para indicarem o melhor local para o novo aeroporto de Lisboa, e, depois de fazerem o seu trabalho, bem pago por sinal, vieram para a comunicação social dizer disparates como se estivessem a falar em nome de um partido político ou de interesses privados.</p><p>O antigo director do jornal do Fundão, António Paulouro, contou-me um dia, já lá vão quase 40 anos, que o jornal tinha uma assinante que não sabia ler. As fotos do jornal chegavam para ela se informar sobre o que mais lhe interessava, que eram as fotos dos artigos e as dos mortos da sua freguesia. Era noutro tempo, em que uma pessoa era notícia pelo menos uma vez na vida, que era quando morria. Com o advento da Internet, e a extinção dos jornais locais, as funerárias adoptaram as redes sociais para pouparem dinheiro e para fugirem ao trabalho e a uma responsabilidade social que também lhe cabe.</p><p>Um dia destes fui consultar as páginas de algumas funerárias e dei pela morte de pessoas que me eram queridas e de quem tenho saudades. Não chorei porque não tenho lágrima fácil, mas fiquei triste com a morte do João Maria Laranjinha, que nos meus tempos de adolescente ensinou-me que até para temperar uma salada é preciso ter boa mão no azeite, no sal e no vinagre; e soube da morte do Luís Godinho, que era a personagem que melhor sabia contar as histórias da sua terra que envolviam as personagens mais carismáticas.</p><p>Não posso escrever sobre todos os que reconheci nas fotos das funerárias, e por quem tinha estima e admiração, porque o espaço não chega, mas vou até ao fim da página a lembrar com saudade a Maria de Lourdes Ribeiro, com quem conversei muito no lar da Misericórdia; Manuel Barriga, que era um homem quase exemplar; Elisa Simões, conhecida como a Elisa dos bolos; Maria Piedade Cardador, mulher do Duarte Malaquias, que me ensinou alguns truques sobre como sobreviver num meio pequeno e de muita gente tacanha; Maria Alice Almeida, que durante mais de quatro décadas foi funcionária na escola da Chamusca; Eugénio Vaz, o homem das bombas de gasolina e das podas; Acácio Araújo, um filósofo que nunca exerceu a profissão; Maria Luísa Pestana, a mãe do Tó e da Ana Maria, que embora não sejam meus amigos são do meu tempo; Joaquim Vacas de Jesus, que foi meu companheiro nas manifestações de rua a seguir ao 25 de Abril; Francisco de Almeida Redol; Maria da Glória Cláudio, esposa do ainda meu respeitado amigo Joaquim Cláudio; Maria Emília Nalha e Manuel João Nalha, que ainda eram da minha família e que me recordavam sempre a sua mãe Leonor Nalha, de quem guardo recordações de muita ternura; Celestina Albino e Gonçalo Melrinho, um rapaz a quem dei muitos rebuçados e que teve uma vida difícil que só sabe avaliar quem sabe o que é o verdadeiro espírito de Natal, sem prendas e a trabalhar para ajudar quem não tem uma lareira para se aquecer. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-11620315770669973062023-12-14T07:00:00.000+00:002023-12-14T07:00:00.185+00:00 Novo aeroporto Internacional de Lisboa vai ser em Santarém<h3 style="text-align: left;">A entrevista que Rosário Partidário deu à Rádio Renascença e ao jornal Público dá a entender o contrário daquilo que foi a decisão da CTI ao escolher Alcochete. O que se pode deduzir das suas palavras e conclusões é que o aeroporto está destinado a ser em Santarém, longe das regras da concessão e sem o problema do caminho-de-ferro e de mais uma travessia rodoferroviária sobre o Tejo.</h3><p><br /></p><p>Rosário Partidário, a coordenadora da Comissão Técnica Independente (CTI), que avaliou a melhor localização para o futuro aeroporto internacional de Lisboa, deu uma entrevista à Rádio Renascença e ao jornal Público em que admite que Portugal em termos de projectos aeroportuários está nas mãos da ANA, que é a concessionária dos cerca de 10 aeroportos que existem no país, onde se inclui o de Lisboa, que sozinho vale pelos outros todos.</p><p>O que se pode concluir da entrevista de Rosário Partidário é que a única solução para haver aeroporto a curto prazo, sem os entraves que ela levantou nesta entrevista, é fazer as Obras do novo aeroporto fora da área de concessão da ANA, ou seja, a mais de 75 quilómetros do aeroporto Humberto Delgado.</p><p>Quem leu ou ouviu a entrevista ficou a saber que “Estamos nas mãos da ANA”. O Governo tem que renegociar “o contrato de concessão e a retirada urgente da gestão das taxas aeroportuárias à ANA”. Questionada sobre a hipótese de “não haver acordo entre o Estado e a ANA, e que solução existe para Portugal poder construir um novo aeroporto”, Rosário Partidário não foi de modas: “de facto, a pergunta feita dessa maneira mostra mesmo que estamos nas mãos da ANA”, por isso a presidente da CTI defende “a renegociação do contrato de concessão com a ANA - Aeroportos de Portugal e, de imediato, a passagem da gestão das taxas aeroportuárias do concessionário para o regulador, a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC)”.</p><p>As declarações políticas de Rosário Partidário chegaram ao ponto de afirmar que o aeroporto não devia depender da vontade dos políticos. Mas não se ficou por aí. Rosário Partidário afirmou que “a ANA tem uma actividade que é muito rentável” e que “há várias coisas que se deviam mudar no contrato de concessão. A questão da decisão sobre as taxas é uma delas”, assim como “o equilíbrio entre as partes, que está muito desequilibrado”. E se a ANA não abdicar dos seus direitos de concessionária? Rosário Partidário dá a resposta: “Se não chegarem a acordo, resolverem o contrato, tem que haver outro concurso para abrir uma nova concessão”. Assim, como se tira um coelho de uma cartola, Rosário Partidário diz que a ANA pode levar como indemnização o total do Orçamento do Estado para um ano de Governo, mas o problema fica resolvido e Portugal vai ser muito feliz deslizando numa jangada de pedra como na escrita de ficção de José Saramago.</p><p>Resumindo: uma grande entrevista que dá pano para mangas: Rosário Partidário acha que a decisão de construir um aeroporto não devia ser dos políticos mas ela própria dá uma entrevista que pode ser considerada a entrevista política do ano. Depois diz que não pode haver aeroporto sem linha de caminho-de-ferro mas Alcochete continua a ser a melhor opção. Por fim dá a entender que se a ANA não baixar a crista os políticos têm que renegociar o contrato de concessão. Esta última parte é para fazer parte do anedotário nacional se vivêssemos num país normal, onde esta gente fosse ridicularizada. Não vejo outra forma de julgar Rosário Partidário. Toda a gente sabe que a ANA tem a faca e o queijo na mão. Que a concessão já está paga pelos lucros do aeroporto de Lisboa, mas só acaba daqui a 20 anos; e acima de tudo que a empresa ANA é cotada em bolsa, que os seus accionistas só não comem o osso da carne porque também é preciso produzir farinha para as galinhas dos aviários.</p><p>Resumindo, outra vez, agora para acabar; Rosário Partidário está tão descontente e desiludida com a realidade em que vive e trabalha, assim como com as escolhas da CTI, que deixa caminho aberto para que o novo aeroporto só tenha um destino: os terrenos no concelho de Santarém, que ficam fora da área de concessão da ANA e que não precisam de mais uma ponte sobre o Tejo e uma linha ferroviária que não existe nem vai existir tão depressa de Lisboa para o Campo de Tiro de Alcochete. Só quem não leu a entrevista de Rosário Partidário é que pode acreditar que Santarém não vai ganhar a corrida ao novo aeroporto e que o facto de não ter sido a primeira escolha faz com que Rosário Partidário e os seus companheiros da CTI comecem a sofrer de pesadelos. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-79461052777408370122023-12-07T07:00:00.000+00:002023-12-07T07:00:00.144+00:00 Quantos caminhos percorreu Santo Agostinho até se tornar Santo Agostinho?<h3 style="text-align: left;">A arte da política é a mentira, mas o que resta para além da mentira é muito importante para que possamos sobreviver ao fanatismo, ao poder dos que acham que tudo tem um preço, aos jumentos que ganham eleições e por isso acham que passam de burros para cavalos só por aprenderem rapidamente a relinchar.</h3><p><br /></p><p>Há um lugar à beira do Tejo entre Alpiarça e Chamusca onde a água beija a margem e os ramos dos salgueiros caem como um chuveiro na enseada. O areal parece ter escapado à poluição dos esgotos e das indústrias a montante, e ali nota-se menos a cor do petróleo na água, que é a marca da fábrica do Caima que despeja no rio as águas das suas ETAR’s.</p><p>Este Verão não fui lá. Fiquei mais a sul onde descobri outro areal fabuloso e uma maracha onde dá para uma pessoa se esconder do mundo sabendo que basta deitar a cabeça de fora e ficamos a um passo da civilização. O Ribatejo deve ser o território mais privilegiado do país embora não tenha pena dos portugueses que vivem por perto de outros rios famosos como o Douro, que tem afluentes que proporcionam as melhores praias fluviais onde já mergulhei.</p><p>Não conheço o país como gostava, mas espero ainda ter tempo para me meter ao caminho. Tenho em lista de espera a releitura de Viagem a Portugal, de José Saramago, e dois livros de autores diferentes que percorreram o país de mota e contam quase tudo. Vou seguir só o que me interessa e certamente vou ficar muito mais tempo no interior que no litoral. Para mim é mais importante ficar uma hora a observar uma paisagem que umas ruínas mesmo que sejam romanas. Gosto de falar com as pedras, mas é sobre o presente. O que as pedras nos têm a dizer sobre o passado pouco me interessa, deixo isso para outros matarem a cabeça.</p><p><br /></p><p><span style="font-size: x-large;">T</span>enho visto pouca televisão, mas pedi para gravarem o documentário sobre a Estrada 40 na Patagónia; e pouco mais. Vi as lágrimas de António Costa no Facebook e só me comoveram porque acho que foram um sinal de fraqueza. Não há nada mais fingido que uma plateia a bater palmas. Sei isso do teatro: muitas vezes bato palmas só pelo esforço e arte dos actores, mais do que por ter gostado da peça. António Costa teve razões para chorar muitas vezes ao longo dos seus mandatos como primeiro-ministro, mas foi chorar naquele que só tinha o som das palmas. A política tem destas virtudes; um homem escorrega nas emoções quando menos espera.</p><p>A política é uma escola de vida das mais difíceis que muitas vezes cai no colo dos mais ineptos e destituídos. Uma vez soube que António Costa foi a correr a uma iniciativa onde não podia faltar, mas cumpriu os seus 10 minutos prometidos; outra vez estava a conversar com um secretário de Estado de Durão Barroso e fiquei a falar sozinho porque o telefone tocou e o meu interlocutor estava proibido de atender chamadas do chefe junto a testemunhas. O membro de um Governo que mais quis falar comigo no seu gabinete para me roubar calhandrices do meu trabalho como dirigente associativo foi aquele que mais me traiu e passou a perna. Aprendi ao longo destes 36 anos de trabalho como jornalista/editor que não há político do PS ou do PSD que, quando os governos alternam, desfaçam as asneiras que tanto criticaram enquanto oposição. Parece que são todos da mesma família e comem todos do mesmo tacho. E não me parece que algo tenha mudado nos últimos anos. O Governo de Passos Coelho criou uma lei que obrigava os beneficiários do PRR a publicarem nos jornais a aprovação das candidaturas. Ao fim de quatro anos, à falta de associação que represente condignamente as empresas editoras, paguei a um escritório de advogados para escrever à actual Provedora de Justiça a exigir que se cumprisse a lei. A resposta foi um chuto no cu apesar de nos ter dado razão. Meses depois o Governo de António Costa revogou o decreto lei e acabou com a obrigatoriedade… que nunca foi cumprida. Uma vez abordei um ministro da pasta da Comunicação Social num balneário de um ginásio e ele respondeu-me com todas as letras: porra, nem aqui deixas de me chatear. A verdade é que ele nesse ano beneficiou os jornais de um certo grupo empresarial e não queria admitir. Até que deu a mão à palmatória. </p><p>Ser discreto e ter mais que fazer que andar em tertúlias a ouvir conversas da treta faz-me saber mais de política do que muitos que andam na política. Saber guardar segredos também me favorece. A arte da política é a mentira, mas o que resta para além da mentira é muito importante para que possamos sobreviver ao fanatismo, ao poder dos que acham que tudo tem um preço, aos jumentos que ganham eleições e por isso acham que passam de burros para cavalos só por aprenderem rapidamente a relinchar. Sou cada vez mais feliz por perceber que escolhi o caminho certo e cada vez mais infeliz por ver tanta gente a cheirar mal, tão habituados ao cheiro da merda que nem se estranham quando cheiram a esgoto.</p><p><br /></p><p><span style="font-size: x-large;">N</span>a minha última viagem deixei pelo caminho um livrinho de Mary Oliver que me acompanhou em várias viagens. Deixei-o em boas mãos embora admita que nunca mais vou voltar a ver a pessoa assim como não voltarei a ver os chineses para quem cantei o fado à capela na Ilha de Páscoa quando ainda tinha cabelos na cabeça e barba sem cabelos brancos. O livro tem um poema curto que já está gravado na minha cabeça há muitos anos. "As coisas levam o seu tempo. Não te preocupes. Quantos caminhos percorreu Santo Agostinho até se tornar Santo Agostinho?". JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-35202054831379915462023-11-30T07:00:00.000+00:002023-11-30T07:00:00.132+00:00 Mudar os pneus faz toda a diferença<h3 style="text-align: left;">O tesouro perto de nós é inerte, como se não existisse só a viagem é que faz com que o tesouro exista.</h3><p><span style="font-size: x-large;">T</span>enho uma mota Yamaha XT 600 comprada ao Fernando das bicicletas na Feira da Ascensão de 1998. É a minha mota de eleição apesar de ter uma outra mais nova a que hoje dou pouco uso. Não há dia que não ande de mota desde há cinco anos quando mudei de morada. Antes, a moto era para dar umas voltas pela charneca ou pelos campos do Ribatejo ao fim-de-semana quando ficava na Terra Branca. Hoje é para percorrer a cidade entre a casa e o ginásio, a praia, o cinema e as livrarias, e muitos outros afazeres que preenchem a vida de um homem que não gosta de rotinas mas nem sempre consegue fugir ao ramerrame do dia-a-dia. A moto ainda não tem 25 mil quilómetros e acabo de lhe mudar os pneus, o que me fez sentir que tenho uma mota nova. Não fazia ideia que uns pneus novos podiam alterar o equilíbrio na mota, dar-lhe outra performance na estrada, maior segurança, um prazer ainda maior de fazer as curvas. Quero dizer: acho que sabia, mas esqueci-me, a borracha dos pneus ficou requeimada mas o rasto manteve-se bom o suficiente para eu julgar que estava seguro em cima da mota. Não estava. </p><p>Curiosamente liguei recentemente a um médico meu amigo a dizer-lhe que precisava de uma consulta e ele disse-me para aparecer que tínhamos que mudar os pneus e as câmaras de ar para eu não me estampar pelo caminho. Foi já depois de ter mandado mudar os pneus da moto. Contado ninguém acredita mas é verdade. A vida vai-se vivendo e escrevendo de pequenas e grandes aprendizagens.</p><p><span style="font-size: x-large;">E</span>screvo esta crónica no aeroporto de Lisboa, a caminho de um destino africano, já a sentir-me a viajar com pneus novos. Curiosamente esta sensação de partir também tem mudado ao longo dos anos desde que li que a verdadeira viagem é a do regresso. Levo comigo uma biblioteca porque acho que vou ter o tempo todo para ler. Inclui um livro com o título "O Cunho do Editor, que tem uma história maravilhosa entre um rabi que vivia em Cracóvia e um chefe dos guardas de uma ponte em Praga, capital da República Checa, que gira à volta da procura por um tesouro que afinal estava no lugar mais improvável do mundo, mas que o rabi só descobriu porque fez a viagem para o lugar errado. A conclusão do autor do livro é tão bela como a história: "o tesouro perto de nós é inerte, como se não existisse. O verdadeiro objectivo é a viagem, aliás, a viagem improvável. Uma viagem improvável porque leva para longe, para um lugar incongruente, e, sobretudo, porque requer confiança (...) em algo que, por definição, é fugidio e não dá garantias: um sonho. Mas só a viagem é que faz com que o tesouro exista". JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-44870143579752338212023-11-16T07:00:00.001+00:002023-11-16T07:00:00.144+00:00 O teatro de Mónica Calle, o destino de António Costa e as palavras chulas que sabe tão bem utilizar<h3 style="text-align: left;">Numa semana em que em Portugal tudo voltou a desaguar no mar da palha, sem honra nem glória, trago aqui uma história da ida ao teatro de onde trouxe uma palavra chula que serve de pretexto para deixar uma pergunta ao ainda primeiro-ministro António Costa.</h3><p><span style="font-size: x-large;">A</span> saída de um teatro, depois de ver um espectáculo, é para mim ainda teatro. Regra geral tento sempre ouvir os comentários colando-me às pessoas, ziguezagueando para perceber que conversa me interessa mais. São dois minutos apenas, no máximo, conforme a saída do teatro dá para a rua ou para um espaço ainda interior, onde pode existir uma livraria, ou uma outra forma de adiar a dispersão das pessoas ainda tocadas pela arte de Molière. E o que ouço, muitas vezes, ajuda-me a perceber melhor os meus gostos, a formar a minha opinião, a perceber porque vamos em rebanho ver e ouvir actores em palco a fingirem vidas que não existem, e a darem corpo e voz a histórias na maioria das vezes inventadas.</p><p>Na passada semana fui ver “Salomé” ao Teatro São João, no Porto, encenado pela Mónica Calle que é uma das minhas actrizes e encenadoras de eleição. A plateia e o primeiro balcão estavam quase cheios, embora fosse uma quinta-feira. À saída formou-se um cogumelo de pessoas, as primeiras a sair do teatro, onde me encontrava. Uma Senhora, talvez da minha idade, baixa estatura e parecida com a D. Micaela, dona de uma antiga mercearia que ficava colada à minha casa de família, vinha divertida e com um sorriso disse em voz alta para um dos seus pares: “hoje não dormiste, deves ter ficado todo o tempo com os olhos bem abertos... seu c@ralh*”. Na altura em que disse o palavrão os meus olhos cruzaram-se com os dela; deve ter reparado que eu era sulista e levou as mãos à boca sem deixar de sorrir e de fazer a festa e deitar os foguetes no meio do grupo que a acompanhou e que era todo mais ou menos da mesma idade. A actriz que encarna Salomé, Mónica Garnel, esteve quase sempre nua ou seminua em palco, assim como a maioria dos seis actores, e por isso o comentário brincalhão à saída entre pessoas que provavelmente são presença assídua no teatro São João.</p><p><span style="font-size: x-large;">A</span> actividade política em lugares de responsabilidade, seja no Governo da Nação ou nas autarquias, devia ser o serviço que todos os cidadãos prestam ao seu país devolvendo tudo ou quase tudo aquilo que o país já fez por eles. A frase é velha e faz parte do vocabulário de muitos políticos. Ouvi-a dezenas de vezes na minha vida de convívio com políticos encartados, uns mais que outros, enquanto vendiam o seu peixe. A verdade é que é muito raro encontrar um político que tenha cumprido, ou que esteja a cumprir, este desígnio. Por isso a política é cada vez mais um teatro, como se comprovou agora com a demissão de António Costa que terá sido o primeiro político português na chefia de um Governo a pedir desculpa aos eleitores já depois de ter caído do pedestal; e, sem rebuços, anunciou que provavelmente já não deve regressar à vida pública, ele que nos últimos anos era notícia quase todos os dias por poder vir a presidir a um grande organismo internacional. António Costa sabe como funciona a Justiça e os anos que estes processos demoram e se arrastam nos tribunais. Mas tudo isto, que é muito triste, não retira a António Costa a fama e o proveito de ser um dos mais brilhantes políticos das gerações do pós 25 de Abril de 1974, com uma carreira invejável tanto no Governo do país como nas autarquias. Então como é que se deixou enredar numa teia de interesses aparentemente montada por gente incompetente, lobystas encartadas, pergunto eu que só me apetece repetir como a Senhora do Porto que estava a meter-se com o seu amigo e companheiro de visitas ao teatro São João: o que é que lhe aconteceu, seu </p><p>c@ralh*, a si que sempre foi um político cuidadoso, honrado, brilhante e destemido? JAE</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-91704352168581263122023-11-09T08:00:00.000+00:002023-11-09T08:00:00.147+00:00 O associativismo é a alma da nossa terra<h3 style="text-align: left;">Os Donos Disto Tudo estão outra vez em causa e por isso António Costa pediu a demissão de primeiro-ministro. Entretanto temos uma CTI ferida de morte e um aeroporto adiado desde o tempo de Marcelo Caetano. Mas o associativismo em Portugal continua lindo e os seus dirigentes pagam do seu bolso para ajudarem a comunidade e ainda choram de alegria e orgulho por verem os frutos do seu trabalho.</h3><p><br /></p><p>Os Donos Disto Tudo (DDT) prepararam uma estrangeirinha à volta do negócio do hidrogénio e da exploração do lítio que acabaram com o reinado de oito anos de António Costa e do PS. Foi um holandês que esteve na origem das denúncias. Tinha que ser um cidadão estrangeiro. Em Portugal, a confiar naquilo que vai sendo exemplo, desde que José Sócrates e Ricardo Salgado, que fizeram uma dupla aparentemente inultrapassável, que ninguém tinha coragem para meter a boca no trombone. Ainda não sabemos para o que estamos guardados, mas certamente que vamos ter o pior São Martinho dos últimos anos porque todas as reformas, más ou boas, vão ficar em banho-maria.</p><p><br /></p><p><b>A língua em sangue</b></p><p>O Hospital Distrital de Santarém esteve fechado das nove da noite às nove da manhã na data em que escrevo esta crónica. É muito possível que a situação se volte a repetir ou já se tenha repetido entretanto. Temos os hospitais privados como alternativa mas todos sabemos que o seguro de saúde é uma conquista de uma minoria de portugueses. O SNS vive a sua maior crise de sempre e ninguém jamais saberá quantas mortes é que esta crise vai provocar. Um doente que fique sem assistência, que seja apanhado num dia em que o hospital esteja fechado, que seja esquecido numa cama ou numa maca por falta de profissionais, morre por falta de assistência médica sem que alguém possa ser responsabilizado. A greve é um direito constitucional e os governantes não podem nem sabem exercer medicina. Quem governa o país devia estar com a língua em sangue por não conseguir salvar a vida de pessoas inocentes, que trabalharam e pagaram impostos durante uma vida, e que por causa da incompetência dos governantes e das organizações profissionais, morre como um cão vadio sem direito a veterinário. </p><p>Uma boa parte da culpa da falta de médicos não é do Governo, mas das associações profissionais que manobram os “numerus clausus” que condicionam o acesso de mais alunos aos cursos de medicina. É uma pena que os políticos não denunciem esta vigarice e os interesses instalados de quase todas as classes.</p><p><br /></p><p><b>Viva o associativismo</b></p><p>Fui assistir à sessão de aniversário do CPCD na Póvoa de Santa Iria que, entre outras iniciativas, premiou jovens atletas, e vi o presidente da associação comovido, de lágrimas nos olhos, mas também exaltado quando a sala não estava a respeitar o silêncio necessário para a sessão decorrer normalmente. Tal como diz a dirigente Isabel Graça, da Confederação Portuguesa das Colectividades, as associações são a alma das comunidades mas são tratadas pelo Sistema como entidades com fins lucrativos, e os seus dirigentes como gestores de empresas, embora sem acesso ao subsídio de desemprego ou à reforma. O presidente da AIP diz que Portugal tem cerca de quatro mil impostos para as empresas; os dirigentes associativos ligados ao desporto, à cultura e ao recreio, dizem que se substituem ao Estado e ainda levam com os impostos como se fossem empresas. Isto só na terra dos DDT.</p><p><br /></p><p><b>Ferida de morte</b></p><p>Com a demissão de António Costa, que se deixou envolver em mais um esquema em que os DDT achavam que podiam pôr e dispor, fica ferida de morte a CTI para o novo aeroporto. Quem corre por fora diz que Deus escreve direito por linhas tortas; e quem faz política lembra que foi preciso um holandês a fazer queixa dos compadres portugueses para cair o Carmo e a Trindade e Marcelo Rebelo de Sousa ter que trabalhar e deixar de andar por aí a fazer figura de Tio Patinhas e de homem do circo, embora sem bola vermelha no nariz. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-17879119563915511112023-11-02T07:00:00.001+00:002023-11-02T07:00:00.136+00:00Uma crónica para lembrar Samuel Barradas<h3 style="text-align: left;">Escrevo em cima do fecho desta edição incentivado por uma carta de um leitor de Azambuja, Joaquim Moreira, que quer contar a sua aventura como escritor. É disto que eu gosto. Que uma boa parte da matéria editorial de O MIRANTE chegue pelo telefone, ou pelo correio, com sugestões dos leitores para artigos de sociedade e de política, mas também de cultura que regra geral é marca da nossa identidade.</h3><p>Embora seja comum dizer-se que um jornalista nunca se reforma, tal como um médico, não tenho tanta certeza que um dia destes não arrume as botas e não deite a toalha ao chão. Trabalho não me falta. Se é jornalismo ou literatura ou terapia da alma, que seja em meu proveito. Só espero que quem me vai substituindo não ache que lhes deixei uma herança envenenada pois este trabalho não é para meninos.</p><p>Escrevo em cima do fecho desta edição incentivado por uma carta de um leitor de Azambuja, Joaquim Moreira, que quer contar a sua aventura como escritor. É disto que eu gosto. Que uma boa parte da matéria editorial de O MIRANTE chegue pelo telefone, ou pelo correio, com sugestões dos leitores para artigos de sociedade e de política, mas também de cultura que regra geral é marca da nossa identidade.</p><p>Nos dois dias em que esta edição de O MIRANTE viaja da gráfica para os CTT, e depois para as caixas do correio dos assinantes e para a empresa distribuidora, vou marcar presença no lançamento de um livro de Fabião Coutinho, na Póvoa de Santa Iria, e de um outro de Jorge Miguel, na Desmor, em Rio Maior. Nos dois casos são livros que ajudei a paginar, a rever, a desenhar as capas, a escolher os textos para as badanas; fui eu que os enviei para a tipografia, que os fui levantar, que os transportei para a sessão de lançamento, e ainda não sei se não vou ser eu que os vou vender ou oferecer, conforme a situação.</p><p>Nos últimos dias não fiz ponta de corno mas não parei de fazer projectos para o futuro. O meu telemóvel está cheio de mensagens a puxarem por mim como se eu fosse um rebocador de uma estrada ribatejana em tempo de cheias do Tejo. O meu email consome-me mais tempo do que aquele que tenho para ir diariamente ao ginásio, à piscina e à sauna.</p><p>Já só fumo duas vezes por dia, mas entretanto tripliquei o número de vezes que vou fazer terapias, ou seja, mexer o corpo para não enferrujar e morrer jovem quando chegar a hora. Longe vá o agoiro que falar da morte é coisa que não está no meu dicionário de palavras. Mas há bem pouco tempo é que soube que morreu o Samuel Barradas, o ourives da Golegã que toda a gente da terra conhecia e que eu também conheci quando me iniciei na mesma vida de vender relógios. Tudo o que aprendi com ele já esqueci, mas na altura foi um dos meus mestres, embora nem ele tenha chegado a saber como lhe roubei o conhecimento, e como a sua vida de ourives e relojoeiro influenciou a minha que foi bem mais curta e disso me orgulho.</p><p>Se esta crónica ficasse no computador não se perdia nada. Ou perdiam-se apenas estas últimas linhas porque estou a recordar o Samuel Barradas, que morreu já faz quase um ano e eu só soube há meia dúzia de dias. Não é justo que as pessoas morram sem lhes agradecermos o que fizeram por nós. Sei isso desde que morreu a mulher que ajudou a minha mãe a parir-me, e que foi a última desses tempos que me chamava por Joaquim António com as palavras todas, como eu me lembro de ouvir o meu nome quando brincava com os amigos da escola na rua da Formiga. JAE</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-67506055409343591832023-10-26T07:00:00.001+01:002023-10-26T07:00:00.143+01:00 A greve dos médicos é uma vergonha num país onde a política já viveu melhores dias<h3 style="text-align: left;">O SNS, as leituras subversivas, o caminho de ferro em Alhandra e o que vai rio abaixo.</h3><p><br /></p><p>Confesso que tive a semana mais espectacular dos últimos tempos e não saí dos mesmos caminhos dos últimos anos. Bastou começar a olhar mais para o lado do que para a frente e vi novas paisagens, conheci outras gentes e fui desafiado a meter-me em novas aventuras. Finalmente vou construir uma casa na árvore, dormir a sesta mais vezes e ler todos os livros que tenho em atraso. A minha máxima continua a ser inspirada em Sócrates, o filósofo: ler e aprender até morrer. “O que está presente lembra-te de organizar, sereno; as restantes coisas ao modo de um rio são levadas”.</p><p>Talvez por andar mais atento e a olhar para o meu umbigo registei o facto de esta semana, no mesmo dia, ter sido enganado nas contas em dois supermercados diferentes. Num comprei duas pastas de dentes e facturaram três e noutra comprei quatro garrafas de água de marca branca que foram facturadas ao triplo do preço que estavam marcadas. Só dei pela última já que na primeira estava na conversa com um amigo que não encontrava há muitos anos.</p><p>Para quem gosta de literatura subversiva recomendo o livro de Virginie Despentes, “Teoria King Kong”, e para quem aprecia um bom romance a leitura de “A Valsa do Adeus”, de Milan Kundera. Foram duas das leituras desta semana cheia de boas surpresas, incluindo a chegada do Outono que é a estação em que me encontro na vida. Lembro-me de ter 30 anos e perguntar que eternidade me faltava viver para chegar aos 60, ou aos 70, e já cá estou e nem dei por isso.</p><p>Fui ao teatro e só gostei da interpretação. É difícil escrever para representar e são poucos os escritores que sabem do ofício. Se vivesse no Porto tinha mais sorte; o Teatro São João teve em palco “A promessa” e “O pecado de João Agonia”, duas peças de Bernardo Santareno, o dramaturgo português mais significativo do século XX, que devia estar sempre presente na vida cultural da cidade de Santarém.</p><p>Esta semana atravessei-me por uma pessoa que disse que gostava de apresentar aos vilafranquenses uma proposta que resolve muitos dos problemas da quadruplicação da linha de caminho de ferro que tem provocado algumas manifestações populares. O projecto foi desenhado há muitos anos e quem o fez não quer perder a face nem que para isso tenha que subir as escadas do inferno. A resposta de quem organiza as manifestações foi a mesma que os manifestantes estão a receber dos responsáveis pelo projecto. Quando não é o Governo que pode e manda são os partidos que se fecham nos seus interesses ideológicos e os seus militantes nas suas obsessões partidárias; a esquerda vai pagar caro em Portugal a incapacidade para perceber que a ideologia já não faz revoluções; todos juntos somos poucos para combater os interesses instalados, assim como os extremismos de direita e de esquerda.</p><p>As greves dos médicos e enfermeiros são uma vergonha num país onde as desigualdades crescem todos os dias e se morre na cama de um hospital por falta de cuidados médicos. Quem não pode recorrer aos hospitais privados não pode dormir descansado. O Governo herdou um Serviço Nacional de Saúde que já era. Nos últimos anos os políticos do PS e PSD têm feito o caminho e a cama aos dirigentes partidários aventureiros que querem facturar mais com o descontentamento do povo que com os seus méritos (que não têm). E vão conseguir. Todos os dias, entre os dirigentes do PS e PSD, cresce o número dos que vão para a política para se servirem e não para prestarem serviço público. Sempre foi assim, mas a coisa está a ficar preta. Valha-nos o S. Martinho que está aí à porta. <b>JAE.</b></p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-68386382246228614982023-10-19T07:00:00.000+01:002023-10-19T07:00:00.142+01:00 Uma visita a A-do-Freire para trabalhar e comer figos<h3 style="text-align: left;">Adofreire não é uma aldeia qualquer perdida no mapa. É lá que vive a mais entusiasta produtora de figos de Torres Novas e o senhor João Alves Baptista que tem 83 anos e nasceu em Viana do Castelo.</h3><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi519vIU4HUk1nuq9d6g0yZyXOsAG3e-KGS9G-NKzmNsLi5bIDyt_PavaVGCdu6OcbZM5eWCW-JVuRl9hXAUFpVFbDcLTZvCcHSQQVovd36b-HEKbtn84TIEN45dzz2KWystw65O7Ks8staNClJkz8vUC3VZEmhAdj_4tANb-uUnylEGCdnwgwc6yhOrsF9/s1180/ultima-cronica.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="663" data-original-width="1180" height="248" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi519vIU4HUk1nuq9d6g0yZyXOsAG3e-KGS9G-NKzmNsLi5bIDyt_PavaVGCdu6OcbZM5eWCW-JVuRl9hXAUFpVFbDcLTZvCcHSQQVovd36b-HEKbtn84TIEN45dzz2KWystw65O7Ks8staNClJkz8vUC3VZEmhAdj_4tANb-uUnylEGCdnwgwc6yhOrsF9/w442-h248/ultima-cronica.jpg" width="442" /></a></div><p>Adofreire é uma aldeia do concelho de Torres Novas onde vivem cerca de 150 almas. Fui lá pela primeira vez muito recentemente no regresso de uma viagem ao Porto, onde renovei energias a ouvir a água de uma cascata, entre idas ao cinema, à livraria e uns mergulhos nas praias fluviais. No dia que desci a sul parei em Adofreite.</p><p>Estacionei o carro junto à igreja e sentei-me no degrau de uma porta à espera da Michele Rosa, a produtora de figo preto com quem tinha marcado encontro. Nesse meio tempo, que durou cerca de 20 minutos, só passou por mim uma alma, que puxava uma traquitana a arrojar pelo chão. Entretanto chegou companhia para fazer dupla no trabalho que me levou a Adofreire, e a presença do carro identificado com o símbolo de O MIRANTE incentivou a conversa entre forasteiros e residente. A única alma que tinha passado por mim e dado os bons dias, puxando a traquitana, estava de volta já sem a geringonça pela mão. João Alves Baptista parou na esquina da rua e desta vez meteu conversa. “Este jornal já entrou na minha casa durante muito tempo. Depois deixei de o receber. Tive pena, mas o dinheiro nunca é muito para pagar o que não é pão para a boca”, disse, identificando-nos com o carro, também estacionado no largo da igreja, como se tivéssemos escritos na testa.</p><p>“Agora já nem tenho olhos para ler. Mas vim aqui parar de uma terra que tem a festa tradicional mais famosa de Portugal, sabem qual é”, perguntou em jeito de quem queria saber e perceber se a nossa vontade de interagir era genuína. Viana do Castelo, respondemos quase em cima da pergunta. Os seus olhos sorriram e demos-lhe razões para continuar a contar a sua história de vida como se fosse sua obrigação fazer o papel de anfitrião da aldeia enquanto esperamos a mais entusiasta produtora de figos da região.</p><p>“Tenho 86 anos e este menino que vos fala ainda faz a lide da casa e trata da mulher que, infelizmente, precisa da minha ajuda. Fui trabalhar para Lisboa onde morei 20 anos. Depois mudei-me para aqui porque vim trabalhar para a Renova. Reformei-me e trabalhei durante muitos anos como empregado de mesa a fazer festas e casamentos. Corri o país. Agora acabou-se. Estou preso em casa por causa da mulher, mas também porque, entretanto, fiquei doente dos pulmões. Uso bomba duas vezes por dia, uma de manhã e outra à noite. Foi há quatro meses que um médico que me deu mais atenção mandou fazer exames. Já andava assim há muito tempo, mas agora os médicos só tratam o que está à vista. Não há tempo para mais. Daí que tenha chegado a um estado ruim, de uma doença pulmonar que demorou a descobrir por falta de exames atempados”.</p><p>A conversa estava a aquecer e íamos começar a falar dos filhos e das saudades da terra natal quando apareceu o carro da Michele Rosa que parou e gritou, “bom dia senhor João”, já nós tínhamos levantado o rabo da pedra do degrau da porta para ir ao seu encontro, enquanto o senhor João respondia à saudação e dizia, no timbre de voz em que falávamos, que a Michele era uma rapariga de confiança e filha de gente boa.</p><p>Nesse meio tempo em que conversamos com João Alves Baptista, Adofreire parecia a aldeia dos peregrinos; se não fosse a meia dúzia de carros que circularam, e que desapareciam sem fazer barulho suficiente para interromperem a conversa, dir-se-ia que naquela tarde, em Adofreire, éramos os únicos habitantes que não dormiam a sesta ou não se escondiam do sol de Verão entre quatro paredes.</p><p>A história acaba aqui, mas, entretanto, ainda está actual a outra que fomos contar conversando com Michele Rosa, que nos mostrou pela primeira vez na vida como se produzem figos de forma ecológica, pendurando armadilhas nas figueiras para apanhar as moscas e assim evitar a pulverização das árvores com o veneno que garante o crescimento saudável do figo, mas prejudica a saúde. Falta contar que Adofreire não é uma aldeia qualquer perdida no mapa apesar de ter apenas cerca de 150 eleitores. No dia 14 de Janeiro de 2001 a população desta localidade boicotou as eleições presidenciais portuguesas não comparecendo às urnas para votar, em protesto, contra a falta de cumprimento da promessa da autarquia de Pedrógão, sede da freguesia, sobre a resolução do problema da poluição da ribeira local. E ainda tem a particularidade de se poder escrever com duas grafias diferentes. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-44025747832705727692023-10-12T07:00:00.001+01:002023-10-12T07:00:00.138+01:00 Cada vez há menos jornalistas a escreverem sobre o que se passa no país <p><b><i>“Jornalismo é imprimir o que outra pessoa não quer que seja impresso: todo o resto são relações públicas.” George Orwell</i></b></p><p><br /></p><h3 style="text-align: left;">“Há uma crise na formação da opinião pública”, diz José Luís Cebrian, porque “o populismo levou a melhor”, e os políticos esfregam as mãos de satisfeitos por verem que são cada vez menos escrutinados porque há cada vez menos jornalistas a escreverem sobre o que se passa no país. </h3><p>As notícias sobre o futuro da comunicação social não são boas para os jornais. Quem é bom observador sabe que nos últimos anos as tiragens em papel dos principais jornais nacionais desceram para números irrisórios; nos casos dos jornais líderes como o Expresso, o Correio da Manhã e o Jornal de Notícias, a tiragem desceu para menos de metade. É assim também em Espanha que é o país da Europa onde a imprensa escrita tem mais força e onde os diários se multiplicam em várias regiões.</p><p>A verdade é que os grandes títulos deixaram de fidelizar leitores como acontecia noutros tempos. E a culpa não é do mercado, mas da forma como os editores continuam a trabalhar, privilegiando as notícias de Lisboa, próximas dos poderes da capital do reino, assim como o acompanhamento das figuras mais mediáticas graças ao papel das televisões que são um caso à parte no meio editorial.</p><p>A crise veio pôr a nu outro problema no jornalismo que é a falta de profissionais com mérito, e também com liberdade editorial, para a formação da opinião pública. É evidente que cada vez mais os jornalistas se dividem nas suas opiniões entre esquerda e direita. Mas o que é mais grave é que falta cada vez mais quem nos conte o que se passa no país, quem leve a carta a Garcia; e no caso dos que só escrevem opinião nota-se, cada vez mais, que os jornalistas estão entrincheirados, ou porque são condicionados pela entidade patronal ou sem capacidade de saírem dos seus casulos. Não é discutindo a ética na profissão que se aprende a respeitá-la, mas é por demais evidente que falta essa discussão; os jornalistas parecem exercer uma profissão em extinção, nem a porra de um congresso conseguem organizar que não seja de dez em dez anos. E há outra coisa extraordinária na profissão: os poucos jornalistas que verdadeiramente se fazem ouvir e são lidos, regra geral também eles são estrelas de televisão.</p><p>Os meus 36 anos de actividade profissional, quase desde o início envolvido no movimento associativo a nível nacional, fazem com que já tenha saudades de muita gente que deu o corpo ao manifesto mas que, entretanto, desapareceu de cena vencido e, nalguns casos, verdadeiramente derrotado. Este texto não é exactamente para falar deles mas para lembrar que O MIRANTE continua a ser um projecto de jornalismo de proximidade graças aos ensinamentos que essa gente nos deu. É cada vez mais evidente que os jornais ditos nacionais jamais vão renovar-se; mas não podemos perder a esperança na força do mercado e na reinvenção de negócio. Nos últimos 15 anos fecharam centenas de jornais locais e regionais. O fecho desses jornais era tão previsível como o aumento da influência da Internet nas nossas leituras, incluindo as notícias. E não podia ser maior o aviso à navegação dos denominados almirantes da comunicação social.</p><p>“Há uma crise na formação da opinião pública”, diz José Luís Cebrian, porque “o populismo levou a melhor”, e os políticos esfregam as mãos de satisfeitos por verem que são cada vez menos escrutinados porque há cada vez menos jornalistas a escreverem sobre o que se passa no país. </p><p>Uma última nota para dar conta que é minha convicção que um dia todos os jornais em Portugal copiarão o modelo de O MIRANTE, talvez fazendo melhor e com mais meios; se não o fizerem morrem no seu posto mas sem leitores. <b>JAE.</b></p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-21779799627767446642023-10-05T07:00:00.001+01:002023-10-05T07:00:00.150+01:00 Não sou o Manuel da Pastora mas sou do tempo dele<h3 style="text-align: left;">Escolhi o Manuel da Pastora para esta crónica por causa do valor dos euros na nossa vida de pobres mortais, o valor das propriedades para quem um dia morre e se transforma em pó. Tenho a certeza que o Manuel da Pastora, se fosse vivo e precisassem dele para gerir a coisa pública, era mais competente que esta rapaziada de hoje.</h3><p>Na minha terra havia um homem chamado Manuel da Pastora que tinha a fama, e talvez o proveito, de ser um forreta. Era um pequeno proprietário de terras com algumas vacas num quintal de uma casa rural no centro da vila da Chamusca, que vendia leite; abastecia uma leiteira, a senhora Custódia, que ia de casa em casa com uma bilha de bico mas vendia também a quem entrava pelo portão da propriedade uma de bilha de mão (hoje uma pesquisa na Internet mostra como estas peças se tornaram objectos de colecção). Em rapaz trabalhava perto da casa do Manuel da Pastora; conheci-o bem, o suficiente para me lembrar da fisionomia dele como lembro a de alguns familiares. Para a época era um homem remediado, com um feitio de bonacheirão, mancava, o que o obrigava a usar bengala, e era de poucas conversas. Como tinha o privilégio de trabalhar atrás de um balcão, num espaço onde ele ia de vez em quando, tinha estatuto para lhe roubar confidências. A alcunha de Manuel da Pastora é fácil de decifrar, porque tinha vacas leiteiras, e a de associar o seu nome a um forreta também não é difícil de perceber. Quem vende e vive do que vende é lógico que tem que ser rigoroso nas contas; e o trabalho por conta própria, às vezes, é também tão castigador que faz com que a pessoa mais sensível ao sofrimento dos outros se torne uma pedra quando lhe pedem fiado ou uma pequena facilidade na compra. Dantes, como hoje, a maioria das pessoas que pediam fiado um dia fugiam e deixavam rasto. Não era por mal. Parecia evidente que fazia parte do contrato de ter conseguido crédito. Não estou a generalizar; muitas vezes as pessoas não conseguiam mesmo sobreviver sem essa facilidade de comprar fiado e conheci e conheço pessoas que não dormem enquanto não pagam as suas dívidas. Também era assim nesses tempos, só que hoje uma lata de sardinha custa um euro e um maço de cigarro custa o preço de cinco latas de sardinha. E hoje é mais fácil a uma pessoa pobre sustentar o vício do tabaco do que nos tempos de Salazar era matar a fome.</p><p>Lembro-me muita vez do Manuel da Pastora por o seu nome estar associado a uma pessoa avarenta, egoísta, gananciosa, o que não tenho a certeza que fosse o caso. Mesmo assim sempre tive receio que por tanto trabalhar, e a vida me correr bem, me tornasse num Manuel da Pastora, com medo que o dinheiro nunca fosse suficiente, guardando sempre para o dia seguinte aquilo que já deveria ter gasto, viajado, comprado, usufruído nos anos anteriores. Ainda hoje, e por isso escrevo sobre o assunto, apanho um cêntimo do chão e guardo na carteira, mais em memória desses tempos antigos e do respeito que tenho pelo dinheiro, do que pelo valor ou por qualquer superstição. No meu dia-a-dia, a cada dia que se aproxima a idade da velhice, gasto menos dinheiro do que gastava. Se viajo evito hotéis caros, troco os restaurantes de luxo pelas tascas ou cervejarias, não estrago o dinheiro anunciando, na noite, balcão aberto para os amigos e amigas; conheço as regras principais para poupar gasóleo, água e luz, sou eu que vou com os carros às oficinas, compro e pago para saber sempre com o que conto e estou cada vez mais atento para ajudar na altura certa, e não por capricho ou vaidade, aqueles que são da família.</p><p>Sempre gostei no meu tempo de formação de ter a atenção dos homens mais velhos, de jogar às cartas a dinheiro com eles, de lhe ouvir contar o que se passava de errado nas suas vidas, de estudar as palavras e as atitudes dos mais temidos e respeitados. Em vez do Manuel da Pastora podia ter escrito uma crónica contando os episódios de vida com o Manuel Salgado, Tomaz Vacas, Manuel Eduardo Tecedeiro, José Félix, António Padeiro, Manuel Estevão Laranjinha, entre tantos outros. Escolhi o Manuel da Pastora por causa do valor dos euros na nossa vida de pobres mortais, o valor das propriedades para quem um dia morre e se transforma em pó; e escrevi também, embora aqui a escolha não tenha sido importante, porque a Chamusca é uma terra cada vez mais decadente; tenho a certeza que o Manuel da Pastora, se fosse vivo e tivesse forças, e precisassem dele para gerir a coisa pública, era mais competente que esta rapaziada de hoje. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-69312174723973800672023-09-28T07:00:00.000+01:002023-09-28T07:00:00.144+01:00 Reforma compulsiva é tão violenta como um despedimento<h3 style="text-align: left;">No final da passada semana participei activamente na organização, e depois na concretização, de uma mesa redonda sobre “Transições de vida em pessoas com mais de 50 anos”. Embora fizesse parte do painel do debate remeti-me ao silêncio porque a companhia era de peso e tinha muito para contar. Escrevi este texto que resume a iniciativa e pode interessar a quem está atento às novas realidades no mercado de trabalho, mas também na vida social e cultural.</h3><p><br /></p><p>A Constituição Portuguesa no seu artigo 13 diz que ninguém pode ser discriminado em razão da orientação sexual, religião, raça, situação económica e convicções políticas ou ideológicas. Mas pode ser em razão da idade e isso é a maior discriminação que se pode fazer a uma pessoa em vida, diz Maria João Valente Rosa, socióloga e demógrafa, que no dia 21 foi uma das que participou numa mesa redonda promovida pela InTransitus, moderada por Maria Ana Botelho Neves, professional activator. Rita Cunha, André Moreira e Vera Norte, completaram o painel que debateu o papel das transições de vida em pessoas com mais de 50 anos. O objectivo era mapear tendências e desafios emergentes.</p><p>Foi a primeira iniciativa pública da InTransitus. Maria João Valente Rosa abriu a conversa e não foi meiga com os políticos que parecem desinteressados dos problemas das pessoas mais velhas, dando como exemplo a questão da reforma obrigatória aos 70 anos: “A discriminação pela idade e o facto de estar a ser ignorado que vivemos numa sociedade de vidas longas. André Moreira é director de operações e parcerias, Movimento 55+, Movimento e Plataforma 55+, que trabalha no mercado com mão-de-obra oferecida exactamente por pessoas que se reformaram e não querem ficar paradas. André contou vários episódios que demonstram as dificuldades que existem para as pessoas que querem ser úteis, mas também para aqueles que precisam de mão de obra e ainda gostam de recrutar pondo a idade como um motivo de escolha. André tem 34 anos, era de longe o mais novo de todos os participantes, e contou que tirou a carta de condução ao mesmo tempo que a sua avó, e frequentou a universidade ao mesmo tempo que o pai; Os exemplos serviram para contar que tem consciência que vive numa sociedade cada vez mais mudada e diferenciada e que não faz sentido discriminar as pessoas por serem mais velhas.</p><p>Vera Norte, assessora de comunicação e empresas da Associação dNovo, que também mobiliza pessoas em transição para o mercado de trabalho, contou a sua história pessoal e exemplificou: “quando me perguntam a idade digo que tenho um filho com 31 anos”. Depois contou que no seu tempo a maioria das mulheres não ia para as fábricas, mas ela foi tirar um curso e acabou em engenheira química; depois, contrariando tudo o que era norma, que era as mulheres não saírem de casa, emigrou para a Dinamarca e fez lá boa parte da sua carreira profissional. </p><p>Rita Cunha, professora catedrática de Gestão de Recursos Humanos já tinha dado o mote mas mais tarde constatou a situação que marcou o debate; “Todos se indignam quando são vítimas de despedimento, ou sabem de alguém que sofreu essa situação traumática, mas a reforma compulsiva não deixa de ser também uma violência, e nos nossos dias pode ser considerada uma forma de violência tão grande ou ainda maior que a de um despedimento, porque as pessoas que sofrem essa situação não têm quem as apoie, está instituído que são uma carta fora do baralho, e mesmo que não sejam é assim que são vistas”, disse.</p><p>“As gerações vivem separadamente e as próprias sociedades, ou os seus representantes, organizam assim a nossa vida colectiva; esse é o mal. A educação tem um efeito mais diferenciador do que a nossa idade. Apenas cerca de trinta por cento do nosso envelhecimento é genético, o resto depende do nosso comportamento social, e pouca gente quer saber disto, preferem ignorar porque dá trabalho ajustar políticas públicas e privadas, mas não desisto de falar destes assuntos para que na União Europeia a questão da idade deixe de vir à cabeça em todos os estudos sobre discriminação”, insistiu Maria João Valente Rosa.</p><p>Maria Ana Botelho Neves provocou ainda a discussão à volta de situações em que um profissional que vai para a reforma, ao cortar a relação com o trabalho corta também o interesse pela vida; O assunto foi pretexto para contar episódios de pessoas que ainda hoje, depois de serem despedidas, continuam meses e meses a esconder da família essa realidade, até que um dia, já em grande sofrimento, são obrigadas a deixar cair a máscara da vergonha. JAE.</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4370230897652649006.post-48553976322725082922023-09-21T07:00:00.001+01:002023-09-21T07:00:00.235+01:00 Viver no campo é um descanso e mais ainda se for perto da charneca<h3 style="text-align: left;">No campo já se fez a vindima, apanhou-se o trigo, o milho e o tomate, e a maioria das árvores de fruto já está a perder a folha</h3><p>A litoralização do país e a desertificação dos territórios do interior só se explica porque vivemos num país governado por políticos impreparados, vaidosos, que facilmente se deixam manobrar pelo sistema capitalista e que, em alguns casos, não resistem à tentação de se deixarem corromper pelo sistema; não só por que alguns são mesmo corruptos, mas por que a maioria é incapaz, e não se rodeia de pessoas que os protejam das artimanhas dos oportunistas.</p><p>O melhor de Portugal está no interior e sempre esteve; é injusto o que está a acontecer no Alentejo e no centro do país, e o que já aconteceu e é irremediável numa boa parte do norte de Portugal, embora ainda seja a melhor parte do nosso território.</p><p>Fugi da cidade para o campo porque não suporto a vida citadina a tempo inteiro. Para fugir da cidade vale tudo, nem que seja ir à praia mesmo a chover ou caminhar à beira Tejo só para energizar as pernas.</p><p>Desta vez fui apanhar os últimos figos que os pardais deixaram para mim; são eles que estreiam os primeiros figos maduros e os que bicam os últimos que, embora de casca mais grossa, ainda são tão doces como os primeiros. No campo já se fez a vindima, apanhou-se o trigo, o milho e o tomate, e a maioria das árvores de fruto já está a perder a folha. Resta a oliveira onde os bagos de azeitona engrossam a olhos vistos, as romãzeiras, os dióspiros que em menos de uma semana vão ficar maduros demais, e os marmelos, principalmente das árvores da beira da estrada e dos valados, que ninguém apanha e acabam por apodrecer. Os marmelos e os figos que ficam nas árvores na nossa região são o melhor exemplo dos tempos que vivemos. Já não falo da azeitona que, em alguns casos, também não dá para a apanha; e muito menos falo do tempo em que os portugueses do Alentejo e do Ribatejo iam ao rabisco das uvas e do milho para matarem a fome e os marmelos e os figos da beira da estrada serviam para as nossas avós fazerem doce que durava para lá do Natal.</p><p>Agora que as uvas, o milho e as azeitonas se apanham com máquinas, o rabisco até se mete pelos olhos dentro; mas sou do tempo do rabisco da cortiça, o que quer dizer que já sou tão velho e enrugado que até fico com vergonha de escrever sobre temas que para alguns hão-de parecer ficção científica. Viver no campo é um descanso e mais ainda se for perto da charneca ou da montanha; é aí que sabemos verdadeiramente que um dia "quando faltamos a nós próprios tudo nos falta". JAE .</p>Unknownnoreply@blogger.com0