quarta-feira, 1 de outubro de 2008
Um elogio a Ricardo Chibanga
Um telefonema de Ricardo Chibanga para a redacção de O MIRANTE, brincando com uma situação em que fizemos dele personagem involuntária, fez-me recordar velhos tempos em que eu e o Alberto Bastos entrevistámos algumas figuras da região. Conto entre as melhores entrevistas que realizámos essa conversa com Ricardo Chibanga. E o que me levou na altura a pedir-lhe a entrevista foi um episódio caricato que agora posso contar sem qualquer prejuízo. Um dia estava no Café Central, à espera de vez para almoçar, e vi um daqueles empregados da velha guarda tirar o telefone do descanso e chamar o Ricardo Chibanga simulando que havia um telefonema para ele. Chibanga caiu no engano, como qualquer um caíria, e o resultado foram algumas risadas em surdina de que Chibanga não deu conta.
Nesse dia percebi melhor o quanto o toureiro da Golegã era um homem bom e excepcional, embora ingénuo ao ponto de ser uma vítima mais fácil de um empregado de balcão, que sentia prazer em o ridicularizar, do que no meio de uma arena no confronto com um toiro da ganadaria de Pinto Barreiros ou Manuel Veiga.
Se tenho boas recordações das corridas de toiros foi quando vi Chibanga de joelhos na praça de toiros da Chamusca e no Campo Pequeno, fazendo com o capote e a capa aquilo que provavelmente mais nenhum toureiro português fez até aos dias de hoje.
Não sei se Chibanga foi o nosso melhor toureiro de sempre. Foi certamente um dos maiores, um dos verdadeiros meninos pobres que se tornou num grande e admirado artista.
Por ser um homem humilde, artista no verdadeiro sentido da palavra, provavelmente nunca reivindicará para si uma estátua na sua Golegã adoptiva. Quem olhar para trás, para os últimos quarenta anos do toureio a pé em Portugal, não encontra outra figura do toureio a pé que mereça tanto uma homenagem como Ricardo Chibanga.
A brincadeira com o telefone no Café Central, já lá vão muitos e muitos anos, mexeu comigo. O telefonema recente de Ricardo Chibanga para a nossa redacção, a brincar com um suposto pedido de indemnização por termos cometido um erro, ingénuo mas imperdoável, a seu respeito, fez-me perceber melhor a dimensão dos seus valores como Homem e como cidadão.
Quem conhece bem o seu percurso sabe que a sua vida nunca foi fácil. Daria a um biógrafo uma grande história de vida. Quem soubesse conversar com a sua alma de africano e menino pobre, que um dia conheceu a fama e a fortuna, escreveria de certo um livro para a posteridade.
Tal como Eusébio, que ficará para sempre na memória dos portugueses, independentemente da cor clubista de cada um, Ricardo Chibanga será recordado um dia como um dos maiores toureiros portugueses de sempre. A forma como vai ser recordado é que dependerá de outras fortunas que não pertencem nem nunca pertenceram ao mundo elitista dos toiros.
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