Há mais de 30 anos que comecei a escrever um livro sobre stress. Escrevo-o no meu corpo e as palavras que fazem dele uma obra-prima são as marcas que tenho na pele, nos ossos e nos neurónios. A ideia de o tornar público derivou da minha última visita ao médico que só não me bateu por eu ser um homem de barba branca. Já não são as dores musculares, a falta de sono, a falência de algumas capacidades tão necessárias para uma vida de boa qualidade. O livro, que é o meu corpo, começou a cheirar a mofo que é o último estágio do papel antes do bolor e do consequente apodrecimento.
Preciso de um cu novo como no tempo em que a minha avó ralhava comigo por ser tão descuidado e um lingrinhas a comer. Preciso de reaprender a dançar o tango e a valsa, de voltar a jogar às cartas, de me esquecer de comer a correr atrás dos pardais e na apanha dos espargos e dos cogumelos silvestres.
Há 30 anos sonhava viajar até São Francisco depois das paragens obrigatórias nas sete maiores cidades do mundo. Já viajei. O ano passado, ao sair de um hotel numa dessas cidades, dobrei a esquina e encontrei uma loja de luxo com o nome de um amigo de há 30 anos. Entrei e chamei por ele. Sorridente, o Pedro parecia ter menos 30 anos que eu, devido à boa vida. Nesse dia escrevi no meu corpo, território de muitas tempestades, que estava na altura de reaprender a viver.
Na hora em que escrevo este texto, pela noite dentro, sou uma saca de 50 kg cheia de stress atada pelas orelhas com um atilho de cordel.
Acabei de ler um livro de uma escritora norte-americana, quase da minha idade, que fixou residência no Hotel Chelsea em Nova York na mesma altura em que eu era ajudante de guarda-livros na Chamusca; morava numa casa de adobos e aprendia a ler e escrever poesia.
Agora mesmo dei um pontapé no stress. Sinto-me outra vez com 30 anos a virar a esquina da rua onde moro, a caminho do trabalho, com a cabeça cheia de projectos e de ideias para viajar. Hei-de morrer a lutar sem atilhos nas orelhas da saca de 50kg.
Do relatório da Mariana: Recebemos várias chamadas a confirmarem o número da conta da Patrícia Duarte uma vez que está em nome de outras pessoas. Temos vindo a explicar que é uma conta solidária que está em nome de várias entidades entre elas o presidente da junta de freguesia e o Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Pernes. JAE
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