quarta-feira, 6 de agosto de 2008
Uma pega com dedicatória
Da festa dos toiros o momento que mais gosto é o da pega de caras. Ou da pega de cernelha que é ainda mais uma arte maior. Lamento por isso que numa boa parte das corridas a que assisto os forcados façam figuras cada vez mais tristes antes da concretização da pega.
Guardo de memória a dedicatória de algumas pegas que foram um verdadeiro espectáculo dentro do próprio espectáculo. Foi noutros tempos quando os forcados enchiam a praça com o barrete na mão, dirigiam-se às bancadas e, da arena, com uma voz que se ouvia por toda a praça, dedicavam a pega à mulher mais bonita da assistência que, na maioria dos casos, era a mulher da sua vida, a namorada ou a jovem a quem procuravam conquistar o coração.
Ou sou eu que ando com azar ou não consigo assistir a uma corrida com um forcado a escolher, entre o público, uma mulher bonita para oferecer a pega. Ultimamente nem às suas namoradas. O que eu vejo hoje, cada vez com mais regularidade, é os forcados cumprirem pobres rituais estabelecidos, oferecendo pegas a amigos dos copos ou, num ou noutro caso, a figuras oficiais. Na maior parte das vezes oferecem as pegas a si próprios que o mesmo é dizer a elementos do seu próprio grupo ou dos grupos que actuam na mesma corrida.
Não percebo como a forcadagem encara com tanto desportivismo e falta de seriedade tudo o que antecede uma pega. Sinto-me envergonhado quando vejo os forcados entre tábuas a abraçarem-se uns aos outros fazendo dedicatórias sem qualquer sentido para o público presente. Dedicar uma pega deve ser um acto poético que deve marcar o momento mágico que antecede a pega. O forcado deve passar para as bancadas o simbolismo da dedicatória, a força da expressão de quem dedica um acto de coragem que pode custar-lhe a vida, a si e aos seus camaradas. A festa da pega do toiro deve começar logo que o forcado salta a trincheira como, aliás, dá bom exemplo, o melhor que vi até hoje, o forcado Gonçalo Veloso dos Amadores de Santarém.
Pegar um toiro não é um acto suicida. Quando os forcados entram na praça sem cumprirem os rituais estabelecidos, e o elemento da cara corre para o boi como a querer ganhar tempo para não se mijar de medo, a pega de um toiro passa a ser uma violência. Ter medo é uma coisa. Ir borrado de medo para a frente de um toiro é outra coisa bem diferente. E devia ser motivo de crítica.
Não digo que uma coisa tenha a ver com a outra. O forcado até pode dedicar a pega à mulher mais bonita que está sentada nas bancadas e, logo a seguir, correr para a cara do toiro contrariando tudo o que deve ser a sua postura em praça. Mas que isto anda tudo cada vez mais ligado. Ah!!, disso não tenho dúvidas.
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