quinta-feira, 30 de setembro de 2021

A tirania das eleições

O PCP não liga aos seus quadros, nem aos novos nem aos velhos, nem procura mobilizar pessoas que não gostem do Partido Comunista Chinês ou do chefe do Governo venezuelano Nicolás Maduro.

As eleições autárquicas de domingo foram tiranas para o PCP e o Bloco de Esquerda. Se quanto a este último partido não há culpas para apontar, porque o BE é literalmente um partido de Lisboa e do Porto, que vive de meia dúzia de estrelas do firmamento da esquerda caviar (com raras excepções), já quanto ao PCP a coisa pia mais fino. Os comunistas coligados com os Verdes, que só existem graças ao PCP, têm uma tradição de poder nas autarquias que vai ficar na História deste último meio século. Infelizmente para o partido, e para a democracia, o PCP está a deixar-se morrer por culpa daquilo que era a sua grande mais valia: a proximidade dos dirigentes com as populações e com os seus interesses mais importantes e mais imediatos. Quase meio século depois do 25 de Abril os dirigentes nacionais do PCP aburguesaram-se e entregaram o partido no interior do país aos profissionais dos sindicatos, que são incapazes de organizar uma lista de compras de supermercado quanto mais uma força política para concorrer às autarquias.

No Ribatejo o PCP já só tem a Câmara de Benavente e, provavelmente, só até 2025. A história que ficou para trás com a reforma de Sérgio Carrinho, António Mendes e agora Carlos Coutinho (tão comunistas como eu (não) sou), é fácil de explicar. O PCP não liga aos seus quadros, nem aos novos nem aos velhos, nem procura mobilizar pessoas que não gostem do Partido Comunista Chinês ou do chefe do Governo venezuelano Nicolás Maduro. Na Chamusca e em Constância, para dar dois exemplos que citei, o PCP não soube renovar-se, os comunistas ou os simpatizantes do partido não mexem uma palha para recuperarem o prestígio ganho e acumulado ao longo dos anos de trabalho em favor das populações. Os gajos em que o PCP confia a tarefa de organizar as tropas vivem literalmente na clandestinidade nas suas próprias terras e, regra geral, são pessoas que não mostram os dentes nem trabalham em favor das associações ou colectividades, como sempre foi tradição nos militantes comunistas. Os que resistem parecem personagens de cinema: uns cheios de raiva e desesperados por lutarem contra moinhos de vento e os outros, os que andam com a foice e o martelo na testa, escondidos em casa onde montaram oficinas de recuperar imagens de Che Guevara, Fidel Castro e Catarina Eufémia.

Jerónimo de Sousa e António Filipe, para falar de dois dirigentes nacionais que estão a contribuir para levar o PCP à condição de partido insignificante a nível autárquico, são dois personagens de televisão como eram os bonecos do Contra Informação da RTP. Eles estão em todos os noticiários e programas de entrevista e de entretenimento das televisões, mas nunca estão no terreno; nem eles nem os camaradas do Comité Central que, segundo dizem os números, têm uma fortuna para gerir; o PCP é o partido mais rico do mundo em património e em dinheiro a prazo nos bancos; no resto está quase apagado do mapa pelo Chega e companhia; no Ribatejo mas também no Alentejo. Só no concelho de Lisboa, tal como o BE, o PCP ainda tem uma força que faz dele um partido respeitável. Álvaro Cunhal deve estar a mexer-se no túmulo.



Escolho Jorge Faria, que ganhou o Entroncamento por 62 votos, para deixar aqui um exemplo de um autarca que governa com os punhos e dialoga com a população com os cotovelos. Um político que faz dois mandatos numa cidade, que tem tudo para dar certo, e ao fim de oito anos só fica no poder graças a 62 eleitores e a Nossa Senhora de Fátima, ou vai acabar os quatro anos de poder a caminhar para o psicólogo ou é certo que vamos ter eleições antecipadas na cidade dos comboios. JAE. 

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Jorge Sampaio e as eleições autárquicas do próximo domingo

Que país é este onde as classes mais favorecidas, com um maior nível cultural e educacional, entregam o poder político da sua terra aos mais aventureiros e, por isso, aos mais incapazes, como se vivêssemos nos tempos do Zé do Telhado?


As eleições do próximo domingo são um bom pretexto para escrevermos sobre democracia e o exercício do poder. Jorge Sampaio tem uma biografia escrita por José Pedro Castanheira que é um espelho da sua vida política que nos deixa espreitar as suas qualidade pessoais. Conheço boa parte dos dois grossos volumes de memórias. E sou testemunha de outras histórias que não são contadas nos dois volumes da biografia e foram ouvidas no meio de grupo restrito contadas pelo seu ex-chefe de gabinete, António Fonseca Ferreira, quando Jorge Sampaio foi presidente da Câmara de Lisboa. Uma delas prende-se com a entrada fulgurante, e a matar, de Belmiro de Azevedo no gabinete de Jorge Sampaio fazendo pressão para resolver o problema na construção das torres do Centro Comercial Colombo. A história tem todos os ingredientes que sabemos existir entre poder económico e poder político: a luta de uns para construírem e desenvolverem as suas empresas e os seus impérios empresariais e a batalha de quem detém as rédeas do poder e tem a obrigação de moderar os exageros urbanísticos e a especulação imobiliária e comercial. Os arquivos de imprensa estão cheios de histórias que retratam bem uma época (1990-1995) de grande crescimento económico, mas também de grandes transformações que os nossos líderes não souberam aproveitar para nos aproximarmos dos melhores indicadores sócio-económicos dos países mais ricos da Europa. José Sócrates e Armando Vara são o melhor exemplo da italianização da política portuguesa e a queda da Portugal Telecom, e de gestores como Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, a par da falência de alguns bancos, que culminou na queda estrondosa do BES, são o melhor exemplo da regressão da democracia e dos valores de um regime que pode estar em perigo com a ascensão da direita fascista em todo o mundo ocidental. 

Para quem tinha 18 anos no dia 25 de Abril de 1974, e participava em reuniões clandestinas de opositores ao regime (beneficiava do facto de trabalhar num estabelecimento comercial que era ponto de encontro dessa gente corajosa e destemida), o facto de nas últimas eleições mais de metade da população portuguesa se recusar a votar é um sinal que deveria deixar os políticos de cabelos em pé. 48 anos depois de nos libertarmos da ditadura, que nos cerceava a liberdade de reunião, o acesso ao conhecimento e à igualdade de direitos, vivemos um tempo em que metade das pessoas não vota no seu presidente de câmara ou junta de freguesia. O que é que os políticos locais esperam para merecerem a honra de desempenharem cargos públicos remunerados? Que país é este onde as classes mais favorecidas, com um maior nível cultural e educacional, entregam o poder político da sua terra aos mais aventureiros e, por isso, aos mais incapazes, como se vivêssemos nos tempos do Zé do Telhado?

Jorge Sampaio, o antigo Presidente da República, que faleceu a 10 de Setembro, é o exemplo de um político que muitos autarcas deviam tentar imitar para um dia poderem ser melhores do que os seus mestres como ensinava Picasso. É verdade que temos gente valorosa à frente das autarquias e do país, mas não temos razões para nos orgulharmos da nossa classe política actual quando vemos emergirem na vida pública políticos analfabetos, que não sabem lidar com a liberdade de imprensa, não respeitam nem sabem como lidar com os seus adversários políticos, não sabem reivindicar nem como funcionam as instituições e, pior do que isso, são autênticos caciques, com a vantagem, para eles, de pertencerem a partidos cujos dirigentes nacionais fomentam o clientelismo e a monarquia em vez de respeitarem os ideais da nossa República já mais que centenária. JAE.

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Agroglobal já não vai ser o grande exemplo para a Feira da Agricultura

Pedro Torres anunciou, de forma inesperada, no último dia da Agroglobal, o fim da feira no Cartaxo e a sua passagem para Santarém com organização da CAP, que também organiza a Feira Nacional de Agricultura.

De 2014 a 2021 Pedro Torres e Manuel Paim ergueram uma feira agrícola no campo do Cartaxo que se tornou um caso de estudo. Dois empresários agrícolas, sócios e amigos, deitaram mãos a uma feira que este ano teve uma adesão nunca vista. “Isto parecia uma guerra civil”, reconheceu Pedro Torres num dos discursos de encerramento onde anunciou a passagem de testemunho para a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) e o fim da Agroglobal como a conhecemos até hoje.

Embora já há quatro anos se falasse na possibilidade de a CAP tomar conta da organização, o certo é que as conversações nunca surtiram efeito. Na altura O MIRANTE falou com as duas partes envolvidas no negócio: Pedro Torres admitiu as conversas mas pediu que guardássemos a informação privilegiada uma vez que as notícias podiam pôr em causa as conversações e um desfecho que, na sua opinião, seria bom para a cidade e para a Agroglobal.

Apesar de sondado noutras alturas nunca mais conseguimos actualizar a informação. De forma surpreendente, no final da maior edição de sempre da Agrobal, Pedro Torres e o presidente da CAP, Eduardo Oliveira e Sousa, subiram à vez ao palco para anunciar que o CNEMA vai tomar conta da feira.

Dos discursos que O MIRANTE publicou em vídeo, na notícia que escreveu na edição online, é fácil concluir que a cedência da organização da feira não foi tão simples como os organizadores fizeram parecer.

É certo que a feira vai passar para Santarém; e é certo e sabido que o CNEMA não tem estrutura nem pessoas para organizar uma boa Feira da Agricultura quanto mais uma Agroglobal que metia a Feira da Agricultura no bolso em termos de programa, de organização e participação dos agentes do sector. Não por acaso nasceu, cresceu e tornou-se uma das maiores organizações de sempre a promover o sector. A unanimidade gerada à volta desta organização nunca será possível com o CNEMA, gerido de costas viradas para a cidade e para as instituições da terra e da região.

Não é hora de pedir contas a quem tem a responsabilidade de organizar anualmente a Feira Nacional de Agricultura mas era meter a cabeça na areia não recordar que a CAP fez da Feira Nacional de Agricultura uma feira de vaidades. Manuel Paim e Pedro Torres mostram desde 2014 o que é uma feira agrícola e como se organiza e se ganha dinheiro sem cedências e facilidades (na feira da agricultura falasse em negócios paralelos no aluguer de pavilhões a artesãos, para além de outras manhas que foram instituídas ao longo dos anos e que fazem da Feira do Ribatejo um outro caso de estudo).

Pedro Torres reconheceu, no discurso em que entregou a Agroglobal ao CNEMA, que negoceia com os dirigentes da CAP desde a segunda edição da feira. Embora falem entre iguais (são pessoas que dominam o sector, andaram nas mesmas escolas, vão às mesmas festas, são parte de uma elite que domina uma parte da economia portuguesa), só cinco anos depois é que chegaram a um entendimento. Fica claro que esta cedência era a única forma do CNEMA não perder a curto prazo a Feira Nacional de Agricultura. Falta saber se Pedro Torres negociou a curto prazo a presidência do CNEMA como contrapartida por ter deixado de afrontar, com o seu trabalho a solo, a organização da Feira do Ribatejo.

Com o CNEMA a organizar a Agroglobal, certamente que a feira nunca mais atingirá a dimensão e o interesse das últimas edições; também é fácil concluir que quem organiza a Feira da Agricultura com um amadorismo desarmante não vai organizar a Agroglobal convidando os parceiros regionais e cativando aqueles que ao longo dos tempos se foram divorciando dos dirigentes da CAP.

Uma nota final que não devemos calar para darmos nomes aos bois, como se diz na gíria ribatejana: os dirigentes do CNEMA são tão bons a gerirem as suas organizações, e as suas azias pessoais, que ameaçam e retaliam contra empresários que falam a O MIRANTE de forma crítica nos suplementos que habitualmente editamos por ocasião da Feira da Agricultura. JAE.

Vêm aí as eleições autárquicas e tudo pode acontecer

Ferro Rodrigues e Marcelo Rebelo de Sousa, dois dos mais velhos protagonistas da nossa santa vida política, vieram a público manifestar solidariedade com os autarcas (...)  Depois desta corajosa tomada de posição destes dois “jovens”, o que é que têm a dizer os velhinhos das juventudes partidárias que se sentam nas cadeiras do poder? 


Pela primeira vez depois do 25 de Abril, depois do fenómeno PRD, de Hermínio Martinho e Pedro Canavarro, para citar dois escalabitanos que tiveram grande importância no partido, podemos ter umas eleições autárquicas que virem do avesso todo o espectro partidário. Não tenho desejos pessoais nem acho que aquilo que nós pensamos ou escrevemos pode influenciar umas eleições. De uma coisa estou certo; estas eleições vão baralhar a cabeça de muita gente se o PSD cair do cavalo abaixo e o PS e a CDU não mantiverem o seu eleitorado. Deixo de fora o Bloco de Esquerda que sempre foi um partido envergonhado nas eleições de proximidade e que, durante muitos e muitos anos, só teve como bandeira nacional uma senhora de Salvaterra de Magos, que desertou da CDU, e cujo nome esqueci completamente; eu e milhares de eleitores, incluídos os dos BE.


O facto de vivermos em pandemia durante tanto tempo tem os seus custos. Ninguém aguenta o ambiente de loucura que se vive em certas áreas da vida nacional. Toda a gente fala das mortes por Covid mas ninguém fala das mortes das pessoas com cancro que ficam meses e meses sem médico de família. Conheço algumas, e sei que são tão ingénuas e tão singulares que não sabem queixar-se; para elas Deus é grande e é Ele que as há-de ajudar. António Costa e Rui Rio sabem que o problema não é com Deus mas com a falta de médicos e de enfermeiros no SNS. Mas tanto um como outro vivem há meio século do mesmo que viveu Salazar e Marcelo Caetano: da renúncia natural do povo aos seus direitos quando, à sua volta, impera a mentira e uma administração pública falida, corrupta e incapaz de se reformar.

É imoral o que se passa na saúde pública depois de nos termos safo do pior da pandemia; os doentes com cancro e outras doenças graves parecem filhos de um Deus menor. Os candidatos às eleições autárquicas na Chamusca, Ourém, Carregado, Azambuja, entre muitos outros concelhos, deviam exigir ao governo políticas que permitam a formação de mais médicos e enfermeiros, e não o boicote da classe à criação de mais escolas de medicina e a entrada de mais alunos nos cursos. Não sei se alguns autarcas sabem do que estou a falar mas era bom que soubessem.


Ferro Rodrigues e Marcelo Rebelo de Sousa, dois dos mais velhos protagonistas da nossa santa vida política, vieram a público manifestar solidariedade com os autarcas que estão a ser prejudicados pela existência de uma lei eleitoral que os proíbe de fazerem campanha eleitoral ao mesmo nível dos políticos da oposição. Os deputados da Assembleia da República, muitos deles também autarcas ou ex-autarcas, conhecem de ginjeira este problema das leis eleitorais. E o que é que fazem aos longo das legislaturas? Tratam da sua vidinha e abafam diariamente os peidinhos nas almofadas das cadeiras do Parlamento para libertarem os gases provocados pelo stress de não terem nada para fazer. Depois desta corajosa tomada de posição destes dois “jovens” da nossa política, o que é que têm a dizer os velhinhos das juventudes partidárias que se sentam nas cadeiras do poder? JAE.

quinta-feira, 9 de setembro de 2021

O Tejo é um rio moribundo e está entregue à Iberdrola… mas é segredo

Perdi a certeza de que vale a pena falar do Tejo como rio, já que antes e depois das barragens do Fratel e de Belver, o Tejo é apenas um curso de água moribundo que os espanhóis deixam entrar em Portugal.

“Ousemos pensar, ler, criticar e escrever. A velocidade a que a ciência está a alimentar a tecnologia não nos dá hipótese de prevermos o futuro tal são as surpresas que nos esperam. O que vai mudar as nossas vidas é a economia e não a ciência. O que temos pela frente é muito difícil de imaginar. Temos que preparar os jovens para o imprevisto. E não há treino possível que possamos preparar para os ajudarmos. A saúde para todos é uma falácia. Nas crises fica claro, como acontece hoje com a pandemia, que as políticas não resolvem nada, muito menos as políticas económicas. 70 por cento dos europeus querem um mundo diferente daquele que vivemos mais centralizado nas pessoas. O jornal The Economist e o Financial Times, jornais líderes de opinião, e desde sempre conservadores, andam a gritar pelo socialismo”.

Recupero parte de um discurso da cientista Maria do Carmo Fonseca, ouvido num lançamento de um livro do advogado Eduardo Paz Ferreira, e fico sem certezas sobre o que escrever quando viajo a um domingo pelo centro do país, e vou reconhecer uma parte do meu território, onde pontificam as barragens de Belver e do Fratel, as praias fluviais cheias de banhistas, e as figueiras à beira das estradas carregadas de figos maduros que me alimentam a guloseima a cada paragem para descobrir os mais maduros, já quase em passa, doces como mel, com pena de não levar um balde para apanhar os frutos do chão e recuperar um hábito de criança do tempo em que a lua era habitada por pastores e muitos rebanhos de ovelhas.

Para alimentar a nostalgia doutros tempos fui à Amieira do Tejo e percorri uma das aldeias mais tradicionais do território que melhor espelha a fronteira entre o Alentejo e o Ribatejo;  do lado de lá, junto ao rio, reconheço a casa do antigo funcionário da CP entretanto desactivada como apeadeiro, e onde há uma dúzia de anos morava o poeta e tradutor Miguel Serras Pereira, que entrevistei durante um fim de tarde para um trabalho editorial que foi publicado num suplemento que anunciava os prémios de Personalidade do Ano de O MIRANTE.

Abaixo das duas barragens o rio parece um ribeiro. Acima a água está cheia de lodo, embora proporcione passeios de mota de água, canoa, e uns mergulhos que fazem as delícias dos habitantes locais que aproveitam para gozarem o fim-de-semana o mais perto que podem do paraíso.

A autoestrada serve para fazer centenas de quilómetros num único dia. Serve também para regressar ainda a tempo a Lisboa, passando pela Chamusca, apanhando as ameixas e os abrunhos que ainda restavam nas árvores, e assistir a uma sessão de cinema no S. Jorge. Enquanto vejo o filme trabalho mentalmente num documentário em cima das imagens do dia onde pontificam as terras de restolho, os porcos e as cabras à solta em alguns quintais, e os semblantes dos moradores à passagem do carro por dentro da aldeia, a 10 à hora, tentando adivinhar quem é o sacana que se passeia pela hora do calor.

A viagem foi no passado domingo; as palavras fortes da cientista Maria do Carmo Fonseca são de há dois meses. Neste meio tempo perdi a certeza de que vale a pena falar do Tejo como rio, já que antes e depois das barragens do Fratel e de Belver, o Tejo é apenas um curso de água moribundo que os espanhóis deixam entrar em Portugal depois do transvase que alimenta as hortas das províncias de Alicante, Almeria e Múrcia, e das cinco barragens espanholas que são grandes instalações de armazenamento de água que, junto com a central nuclear de Almaraz, representam o grande negócio da Iberdrola, o operador hidroeléctrico mais conhecido do mercado.

Na noite em quem escrevo esta crónica o primeiro-ministro António Costa deu uma entrevista à TVI ao jornalista Miguel Sousa Tavares, e a conclusão é que ele está a governar o país mais importante da Europa, que se orgulha de ser o centro do mundo por estar na rota das áfricas, das ásias e dos “brasis”, e todos os cabos onde a tecnologia faz milagres estarem amarrados no Porto de Sines. Rendo-me e prometo que não volto a escrever poemas nos próximos tempos e, muito menos, saio de casa para ver a banda passar. JAE.

quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Lei eleitoral estalinista e políticos que governam à moda de Salazar

Portugal é um país do terceiro mundo ao nível da lei eleitoral e verdadeiramente estalinista ao nível da justiça. Há tribunais administrativos onde a justiça serve para esconder o rasto de gente que governou como José Sócrates que deixou o país e algumas instituições da forma que todos conhecemos.

Portugal é um dos países mais antigos do mundo e o mais antigo da Europa. Temos uma democracia com quase meio século, já superior ao tempo da ditadura de Salazar e Marcelo Caetano. Devíamos ser um país exemplar no exercício da liberdade e do direito à informação. Não é isso que acontece ainda em boa parte dos casos. Há situações do nosso regime que são próprias de um país em ditadura; desde logo o controlo de alguns tribunais pelo Estado, ou por quem serve o Estado, como acontece com os tribunais administrativos onde, é sabido, os processos congelam nas prateleiras e só são resolvidos décadas depois quando a justiça já "prescreveu" ou as pessoas a quem era devida justiça já morreram. É uma situação vergonhosa que os dirigentes dos partidos calam e os membros da classe judicial omitem nas suas lutas pela dignificação da justiça. Uma vergonha nacional que faz de nós um país de terceiro mundo.

Apesar de termos uma democracia madura e amadurecida por meio século, em tempo de eleições Portugal quase que se torna um estado estalinista ao proibir, por exemplo, que os políticos se manifestem nas redes sociais, onde só lê e vê quem quer, permitindo, no entanto, meios de campanha completamente obscenos e desregrados, como é o caso dos cartazes espalhados por todas as principais rotundas, pondo em causa a segurança dos automobilistas e dos peões. Os órgãos de comunicação social estão sujeitos a um escrutínio que é de bradar aos céus tendo em conta aquilo que se passa noutros países da Europa e do mundo, onde a democracia funciona e os cidadãos não são tratados como atrasados mentais. A lei eleitoral proíbe que um candidato use as suas páginas nas redes sociais para se promover falando de si e do seu trabalho; e, mais grave do que isso, proíbe que os jornais e os jornalistas não se precipitem a dar notícias sobre obras ou outras iniciativas de uma autarquia, não vá escapar em alguma delas a promoção do poder instituído. A lei é uma aberração e trata os cidadãos abaixo de palermas. Não por acaso as pessoas de bom senso fogem da actividade política para não se sujeitarem a humilhações e a comportamentos literalmente próprios de uma sociedade de oportunistas.

A lei eleitoral portuguesa é uma caricatura de um sistema político a precisar de reforma. A percentagem de pessoas que não votam já é muito acima dos cinquenta por cento em boa parte do território onde as injustiças sociais são mais evidentes. Apesar de uma boa parte dos políticos no activo ainda terem memória do tempo do fascismo, estamos a gerir as leis como se nos preparássemos para entregar o país a uma classe dirigente ao nível de José Sócrates, Armando Vara e comparsas que tomaram conta do país durante décadas e deixaram o rasto que todos conhecemos. JAE.