quarta-feira, 22 de agosto de 2012
Os turistas trocaram Santarém por Tomar
São três horas da tarde de um dia de Agosto. Não sei se não era melhor estar de barriga vazia à beira do rio Tejo debaixo de um salgueiro se bem almoçado e entre quatro paredes organizando a minha vida e a dos outros.
Conheço certos tipos da minha idade que trabalham na administração pública que passaram estes anos todos sem fazerem a ponta de um corno. Trabalharam a maior parte do tempo para eles com os recursos que tinham à mão e abusando da confiança de quem lhes deu rédea larga. As crises também têm o seu lado bom; ajudam a moralizar a vida em sociedade; obrigam os bem instalados a saírem da toca.
Dantes as pessoas iam para a prisão por ficarem a dever aos seus fornecedores. Hoje, abrem insolvência e continuam ricas e abastadas gozando com os pobres dos credores que, em muitos casos, são pequenos empresários que investiram tudo o que tinham num negócio.
A nossa casa é a melhor do mundo; fresca no Verão e quente no Inverno. É uma obra da arquitectura moderna. Lá dentro respiramos felicidade. Temos um pequeno problema; a casa do vizinho está a cair para cima da nossa e os bombeiros lá da terra dizem que podemos correr perigo de vida. Cada um que tire as suas conclusões na certeza de que este exemplo não é de nenhum livro de ficção.
Se somos pessoas normais o normal é darmos uma terceira oportunidade às pessoas que falham connosco. Embora, regra geral, quem precisa de uma segunda oportunidade precisa de uma terceira e de uma quarta e por aí adiante.
Há 20 anos propus a quem trabalhava comigo que fechássemos o jornal para férias durante quinze dias de Agosto. Riram-se na minha cara e mostraram-me que eu os subestimava. Em 20 anos muita coisa mudou. Mas neste capítulo só mudámos de sorriso: agora rimo-nos da ingenuidade da altura. Ainda hoje dizemos em uníssono: quando fecharmos para férias o mais certo é já não reabrirmos.
Em rapaz quase todos os dias passava fome. Era debiqueiro. A minha avó é que me safava dos talos das couves e do resto dos legumes. Açorda era o meu prato preferido. Acabo de comer um filé mignon e sinto-me um sortudo. E todo eu sou vontade de me tornar vegetariano.
“Quem agarrar na charrua e olhar para trás não é digno do reino de Deus”. “Não vos preocupeis com o dia de amanhã pois o amanhã tomará conta de si mesmo. A cada dia basta a sua pena”. Leio os meus escritores preferidos e vejo como gostam de citar a Bíblia.
Sou dos que agarra na charrua e olha para trás; sou dos que se preocupam com o dia de amanhã e, às vezes, durmo mal só de me lembrar o que tenho para fazer nos dias seguintes. Como eu gostava de ser mentiroso e acreditar nas minhas próprias mentiras; como alguns políticos; como alguns mentirosos que se confessam aos padres e se dizem discípulos de S. Francisco.
Adoro filé mignon mas não deixo de pensar na hipótese de um dia me render à vida vegetariana. Já passei por muito pior e sobrevivi.
Nota: o título da crónica é só para lembrar que a principal promessa de Moita Flores quando veio para Santarém não foi comprar aquecedores para as criancinhas das escolas. Nem ligar os esgotos e distribuir água ao domicílio. Essa conversa é a do Raul Solnado nos seus melhores tempos.
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