Tenho um sorriso triste debruçado sobre os jornais onde leio notícias e opiniões sobre lugares considerados sagrados da cultura lisboeta. Sou frequentador de alguns desses lugares desde há mais de três décadas e tenho opinião sobre eles que na grande maioria dos casos não coincide com a opinião da maioria que escreve e “chora” nos jornais e na rádio.
A última novela foi sobre o fecho do cinema King. Passei lá noites memoráveis ao longo destes últimos anos a ver, sozinho nas salas, dos melhores filmes da minha vida; que maravilha que era ficar a ver cinema de autor à meia-noite no centro de Lisboa, em salas que me faziam lembrar as salas de cinema da minha terra e da minha região antes de fecharem também por falta de espectadores!
Aceitei sem revolta o fecho do cinema King como aceitei, sem ter voz para levantar, o encerramento do cinema da Golegã, Torres Novas, Chamusca, Entroncamento, Santarém, entre outros. Se não dão lucro!!!
Agradeço ao Paulo Branco as noites gloriosas que me proporcionou no cinema King fazendo de mim espectador único de centenas de sessões de cinema de autor; agradeço-lhe do coração pelas noites desassossegadas em que me senti personagem dos filmes tal era o sentimento de espanto por estar sozinho a usufruir da projeção de um filme só para mim numa sala para duas centenas de pessoas; e como era bom digerir todas essas emoções, dos filmes e do lugar, a correr pela Avenida de Roma abaixo até chegar ao Saldanha ainda a tempo de comer um prego e beber uma cerveja no Galeto.
No passado fim-de-semana, morto e enterrado o King, voltei ao Nimas, lugar de visita muito menos regular. E lá estava toda a memória ainda viva do King, incluindo os livros e os colaboradores, e aquele cheiro tão especial e característico que assinala os lugares antigos mas onde ainda se respira profundamente e apetece ficar muito tempo à espera que chegue a hora do filme.
Pedi um bilhete com número de contribuinte e a senhora demorou meia hora a imprimir a factura/recibo. Para não variar fui ver um grande filme numa sala para 300 pessoas onde só estava eu e outra criatura tão fantasmagórica como eu. Alguém sabe o que é que vai acontecer ao Nimas num futuro muito próximo? Ai meus Deus, como eu já sinto saudades do Nimas e quero agradecer ao Paulo Branco o seu amor ao cinema e a sua imensa capacidade para continuar a ser empresário e produtor.
Há por aí alguma autarquia onde os políticos ainda se lembrem do que é a força do cinema e queiram criar uma marca de prestígio para vender ao país e ao mundo ? JAE
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