quinta-feira, 17 de abril de 2025

O bullying no jornalismo

Quem conhece um pouco da história deste meio século de liberdade tem na vida dos jornais, das revistas e das televisões, mas principalmente nos jornais, um retrato do país. E não é nada de que nos possamos orgulhar. Isto está mau para a liberdade de imprensa, qualquer bardamerda que acha que os jornalistas têm as costas largas vai apresentar uma queixa por difamação. De verdade, o que eles querem é condicionar, meter medo, chatear, roubar tempo, obrigar o jornalista a perder a paciência, a pensar se não é melhor mudar de ofício.


Guardo da minha infância um recado dos mais velhos, que começava na voz autoritária do meu pai e acabava nos conselhos que nem sempre procurava dos homens mais velhos com quem aprendi a viver: “Não te queixes rapaz, se não puderes arreia, mas não te queixes que se tiveres que arrear vai custar-te o dobro”.

Às vezes olho por mim abaixo e pergunto-me como cheguei até aqui, como é que fiz todo este caminho e nem dei pelos anos passarem. Lembro-me de ser um rapaz soberbo, convencido que quando se tem vinte anos de idade a eternidade está assegurada. Hoje estou quase no fim da linha e nem acredito. Só sei que continuo a ser o rapaz de antigamente porque continuo a ser incapaz de me queixar que não seja ao médico. E mesmo nas consultas esqueço-me sempre de algo importante. Falo com os médicos do Sporting, do trabalho, dos livros, das viagens, e só quando chego à rua é que me lembro que deixei a consulta a meio.

Já fui a tribunal uma centena de vezes e tenho aprendido a lidar com a Justiça sem me queixar. Fui constituído arguido centenas de vezes sempre sem medo de ser condenado. Confesso que perdi o conto às vezes em que fui à PSP e ao Procurador do Tribunal prestar declarações. Um dos advogados que actualmente me assiste disse-me recentemente, numa conversa de preparação de um julgamento, que eu tenho a mania que qualquer dia também aprendo a fazer a revisão do meu carro. Disse-lhe que tinha ido prestar declarações numa acusação com mais de trinta páginas e ele, com a mão na cara, foi perguntando, “e falou?”, e eu disse que sim, e ele ainda tapou mais o rosto e gozou comigo por eu ter a mania da facilitar e pensar que a verdade é como o azeite.

É claro que ainda não é hoje que me vou queixar, mas isto está mau para a liberdade de imprensa, qualquer bardamerda que acha que os jornalistas têm as costas largas vai apresentar uma queixa por difamação. De verdade, o que eles querem é condicionar, meter medo, chatear, roubar tempo, obrigar o jornalista a perder a paciência, a pensar se não é melhor mudar de ofício, ou a fazer como muitos falsos jornalistas que vêm para a profissão para um dia chegarem a assessores de imprensa e ficarem perto dos gajos que são donos disto tudo. Quem conhece um pouco da história deste meio século de liberdade tem na vida dos jornais, das revistas e das televisões, mas principalmente nos jornais, um retrato do país. E não é nada de que nos possamos orgulhar. E em muitos casos até nos devia envergonhar. Mas o saldo é positivo, continua a ser a favor da classe. O problema desta vida é que há pessoas que nunca estão satisfeitas com o seu trabalho, sobretudo os jornalistas, talvez a profissão mais bela do mundo mas igualmente a mais ingrata e trabalhosa.

Muita gente sabe o que é o bullying nas escolas, na vida dos adolescentes, mas poucos conhecem o termo na profissão de jornalista. Lido com o problema há muitos anos e por variadas razões , todas relacionadas com pessoas que se sentem poderosas, que engoliram o globo terrestre e que acham que o dinheiro e as influências os ajudam a falar e a pensar. Nunca me queixei, ou me senti vítima, sempre encarei o bullying como uma consequência do meu trabalho, hoje mais do meu dever do que do meu trabalho. Mas denunciar estas práticas, que são criminosas, é o dever de qualquer jornalista que sabe que tem leitores interessados no seu trabalho.

Esta semana passei pelas caixas automáticas dos supermercados Continente para me despachar mais rapidamente. E não consegui a factura dos dois artigos. Fiquei danado. Na loja logo ao lado (estava num centro comercial) ouvi esta conversa que parecia ser para mim: “não uses aquelas caixas; estás a contribuir para quem quer diminuir postos de trabalho”. Sem qualquer justificação lembrei-me que esta semana a Benedita, que só tem 9 meses, andava pelo chão da redacção do jornal, enquanto a mãe e o pai não iam para casa. Quando escrevo, no início do texto, sobre os tempos em que pensava que era eterno, não sabia que a eternidade se conquistava deixando o que temos aos nossos filhos e netos para eles continuarem o nosso legado. Mas nada disto se diz, escreve e pensa, sem um certo receio: esta vida de jornalista e editor é a melhor herança que se pode deixar aos filhos e aos netos? Acredito que sim. E acredito convencido que eles vão ser bem melhores do que eu fui, no trabalho e na gestão, e muito mais inteligentes para não trabalharem tanto e até tão tarde na vida. JAE.

quinta-feira, 10 de abril de 2025

Ordens profissionais estão sempre a ver as pilinhas uns dos outros e assim o SNS não passa da cepa torta

As ordens profissionais estão sempre a ver as pilinhas uns dos outros; de reunião em reunião parece que isto vai, mas depois nunca vai. Nestes últimos tempos os serviços de obstetrícia não funcionam regularmente porque não há médicos, mas os serviços estão cheios de enfermeiros e enfermeiras de braços cruzados sem trabalho. Como a classe não trabalha sem médicos, então não trabalha ninguém.

A idade de um colunista de imprensa tem muito a ver com o seu estilo. Regra geral os velhos jornalistas são mais amargos a escreverem, enquanto os mais novos trazem para o debate questões mais leves, divertidas e muitas vezes felizes. Faço sempre este exercício quando escrevo, e tento moderar-me para não contribuir para o azedume que estraga grande parte dos nossos dias, mesmo antes de chegarmos a casa e vermos os noticiários miseráveis que as televisões nos oferecem.

Num dos últimos fins-de-semana fui fazer um retiro de yoga onde pratiquei pela primeira vez na água. Mais uma vez era um homem entre mulheres. Nada que não me tenha já acontecido noutros retiros, e noutros cursos que frequento com regularidade. Desta vez encontrei uma enfermeira que trabalha com grávidas e faz parte de um grupo de profissionais que defendem com unhas e dentes o parto na água. Claro que a grande maioria dos hospitais não têm condições para a prática do parto na água, e mesmo quando têm os médicos torcem o nariz porque dá mais trabalho e exige mais tempo. Mas as histórias que ouvi ao longo de dois dias são de arrepiar numa área da saúde que deveria ser a primeira em qualquer hospital do mundo.

Como todos sabemos os serviços de obstetrícia da grande maioria dos hospitais do país estão em grandes dificuldades, sem urgências ao fim-de-semana, sem médicos durante muitos dias, num caos que certamente está a fazer aumentar a mortalidade infantil e o sofrimento às mulheres que, quase sem excepção, quando estão grávidas vivem momentos de grande angústia, não só com as dores mas, acima de tudo, com medo de perderem os filhos ou de nascerem com problemas de saúde.

O que mais ouvi, e me deixou perplexo, foi a frase chave que a enfermeira costuma transmitir às grávidas a quem reconhece capacidade de gerir o seu estado físico e espiritual: “do outro lado não está o inimigo, mas tu mulher tens que fazer o teu trabalho, não te podes entregar e calar a tudo o que te dizem e mandam fazer, se não fizeres a tua parte vai correr mal, tens que saber quais são os teus direitos”. Resumindo, para não estar aqui a escrever o óbvio e a bater no ceguinho, voltando a citar a enfermeira Inês: “as ordens profissionais estão sempre a ver as pilinhas uns dos outros; de reunião em reunião parece que isto vai, mas depois nunca vai”. Nestes últimos tempos os serviços de obstetrícia não funcionam regularmente porque não há médicos, mas os serviços estão cheios de enfermeiros e enfermeiras de braços cruzados sem trabalho. Como a classe não trabalha sem médicos, então não trabalha ninguém. E se chegar uma grávida à urgência que não conseguiu marcar a sua consulta, mesmo que vá a gritar com dores, vai ter que voltar pelo mesmo caminho de onde veio. Concluindo: a maternidade e o apoio à maternidade, que devia ser um trabalho único no Serviço Nacional de Saúde, é uma desgraça ao nível daquilo que se passa em qualquer pocilga ou estalagem no meio do nada, onde os políticos que nos governam facturam à fartazana, para depois receberem os dividendos em envelopes ou das contas bancárias dos seus testas de ferro.

Há quatro dezenas de anos, quando vivi estes problemas na pele, pagava a uma enfermeira para ter a certeza que nem os meus filhos nem a mãe deles ficavam à porta da maternidade ou atrasavam o parto porque os serviços estavam em greve ou não havia médicos suficientes. Hoje ouço, vejo e leio o que se passa nas maternidades e no SNS, e pergunto: quando é que as Ordens Profissionais vão deixar de andar a contar pilinhas, e os políticos que governam o país ganham vergonha quando começam a receber informações de que a mortalidade infantil está a aumentar devido a gravidezes mal vigiadas e acesso desigual a cuidados de saúde. JAE.

quinta-feira, 3 de abril de 2025

Santarém é atar e pôr ao fumeiro

Só o Centro Histórico da cidade de Santarém é que ainda não é “atar e pôr ao fumeiro”. Como todos sabemos, é um circo perceber como é que alguém consegue fazer obras na sua própria casa, quando os técnicos e os gabinetes técnicos são parte de um exército de sanguinários, ao serviço do Estado, que ainda usam a velha e carcomida espada de D. Afonso Henriques para impedir qualquer atentado ao património.

 

O futuro aeroporto internacional de Lisboa está destinado aos terrenos do campo de tiro situado no concelho de Benavente. Santarém tinha um projecto que parecia irrecusável por ser investimento privado, e ficar fora da concessão da Vinci, que tem o monopólio de todos os aeroportos em Portugal, mas o Sistema é impenetrável, e o país de José Sócrates e Ricardo Salgado só muda quando mudarem as mentalidades. 

Na altura da escolha do campo de tiro, Santarém ficou de fora como já tinha ficado Alverca, as duas hipóteses por razões infundadas e muito mal explicadas, nomeadamente a de Santarém que, diz o relatório, por interferir com o espaço aéreo de Monte Real, o que parece surreal mas não é, mostra a lógica dos amplos poderes de quem manda e é Dono Disto Tudo.

Resumindo: quem ganhou, aparentemente, foram os portugueses que não querem os vícios da nova civilização nos seus territórios. Que os lusitanos se esmifrem uns aos outros na área metropolitana de Lisboa, que façam mais três travessias sobre o Tejo na área de Lisboa, que transformem a capital num CCB gigante, ligado por túneis com o teatro S. Carlos, o teatro Dona Maria, a Torre de Belém, as lojas de pastéis de nata, a Rua Augusta, o restaurante da filha do Senhor Amorim na Avenida da Liberdade e, já agora, os bordeis de luxo que crescem como cogumelos na áreas residenciais, também de luxo, do Chiado e das Avenidas Novas, só para dar dois bons exemplos.  E, já agora, que deixem o resto do país para os pastores de cabras e de sonhos, os vencidos da vida, os trolhas e os poetas populares e artesãos, mais os outros todos que só habitam o território ao fim-de-semana e vivem o melhor dos dois mundos.

Recentemente ouvi números que garantem que o passe ferroviário verde que o governo de Luís Montenegro estendeu até aos utentes da CP que chegam a Santarém fez aumentar os utentes para (quase) o dobro. O problema agora é o estacionamento. Nesta altura a câmara está a receber protestos  porque há pessoas a estacionarem onde não deviam nem é seguro, como aliás já acontecia antes.

Uma cooperativa de promotores de habitação, formada recentemente, está a iniciar a  construção, perto da Quinta do Mocho, de duas dezenas de apartamentos T2 e T3 que dizem já ter cerca de duas centenas de pessoas interessadas, numa lista que promete aumentar, uma vez que as reservas começam em breve. Os preços variam entre os 150 e 200 mil euros. Comparado com o que custa um apartamento em Lisboa, ou na região de Lisboa, estamos  a falar do mesmo que entregar um aeroporto aos tipos da VINCI, ou a um promotor privado que pouparia ao Estado português biliões de euros, sim, biliões; no caso de dinheiro bem distribuído pela economia do país provavelmente seria o suficiente para ficarmos todos com o nível de vida dos países mais ricos do mundo.

Só o Centro Histórico da cidade de Santarém é que ainda não é “atar e pôr ao fumeiro”. Aliás, os comerciantes da cidade andam a pedir S. José, o padroeiro, que alguém se ofereça para a associação da classe não morrer e haver vozes de contestação que não deixem os políticos dormirem na fôrma, e também eles se empenhem em contribuir para o governo da urbe. Como todos sabemos, principalmente quem mora e nasceu aqui, a população do Centro Histórico da cidade é quase toda descendente dos antigos monarcas, e os que não o são gozam com os que são, e é um circo perceber como é que alguém consegue fazer obras na sua própria casa, quando os técnicos e os gabinetes técnicos são parte de um exército de sanguinários, ao serviço do Estado, que ainda usam a velha e carcomida espada de D. Afonso Henriques para impedir qualquer atentado ao património, ou seja, tudo o que no Centro Histórico não for uma ruína não tem valor para os mangas de alpaca.

A crónica não pretende ser humorística, embora neste último parágrafo tenha resvalado para a anedota. Mas não é o que apetece depois de uma pessoa viver numa cidade, neste último meio século, e tudo o que devia ser “atar e pôr ao fumeiro” é quase, como diz outro provérbio “preferirmos viver eternamente arruinados pelo elogio a ser salvos pela crítica”? A luta política que se adivinha com as eleições autárquicas talvez nos ajude a perceber melhor o que é que falta darmos aos mangas de alpaca dos ministérios de Lisboa para nos largarem da mão e deixarem o centro histórico da cidade respirar, de preferência em obras, apoiadas pelos serviços técnicos e, quem sabe, até financiadas por programas especiais que o PRR’s desta vida deviam apoiar. JAE.

quinta-feira, 27 de março de 2025

Os aviões da TAP, Pedro Nuno Santos e o PSD na região ribatejana

Não sou do PSD, nunca me filiei num partido, mas não acho que os social-democratas têm sarna, assim como não acho que os comunistas comem criancinhas, embora esteja provado que se comem uns aos outros pela forma como vão desaparecendo do mapa eleitoral a cada eleição.


Os aviões da TAP são o melhor e o pior da minha vida de viajante. Nunca fui tão bem tratado em viagens longas como nos aviões da TAP, mas também nunca me senti tão maltratado como viajante por uma tripulação da TAP que me queria deixar no destino por overbooking, quando o meu check-in tinha sido feito a tempo e horas.

Um dia destes viajei para África num avião meio vazio. Fui dos últimos a entrar e assim que percebi que o corredor era todo meu disse à assistente de bordo, que me vigiava no assento de emergência, muito para lá do meio do avião, que fosse à sua vida que eu ia à minha. “Mas esta é a minha vida”, respondeu-me com um sorriso sem nada que fizesse prever que eu não ia sentar-me numa cadeira da metade do avião que ia quase vazio. E assim foi. Sai do meu lugar de mansinho e fui para onde se viajava com o conforto e o sossego da primeira classe.

Escrevi e li todo o caminho e lembrei-me do tempo em que se fumava nos aviões. E como alguns críticos que ainda hoje respeito escreveram cobras e lagartos sobre tão escandalosa proibição. Hoje a proibição de fumar num avião parece até piada tendo em conta que se alguém acendesse um cigarro era imediatamente excomungado. Mas nem sempre foi assim. Houve quem resistisse à proibição. Estou velho como o caraças. Lembro-me de algumas viagens com editores e escritores, todos reunidos nos últimos bancos do avião a fazermos tertúlia e a fumarmos (eu só fumava o cigarro dos outros e era o mais distante possível porque enjoava). Como é que daqui a meio século os meus netos vão aceitar que o avô gostava de fumar à noite, antes de dormir, embora soubesse que o tabaco prejudicava o sono? Não sei nem quero saber. O vício de fumar, ainda que só à noite e altas horas, alimenta um prazer solitário que só quem pratica saberá explicar.


Os aviões da TAP são uma das razões para não gostar do actual líder do PS, Pedro Nuno Santos, que assinou um cheque de meio milhão de euros para indemnizar uma ex-administradora da TAP que foi posta na rua, e teve o descaramento de dizer que não se lembrava depois de ter sido confrontado com a mentira em que escondia a sua responsabilidade como ministro com a tutela da companhia. É ele que está a iniciar uma campanha eleitoral para mais umas eleições legislativas em que alimenta a fé do seu partido ganhar e nomeá-lo primeiro-ministro.  Esta mentirinha da indemnização de meio milhão de euros só tem 4 anos. Foi ontem. Mas parece obra de um liliputiano dos tempos modernos, que agora não saberei explicar de forma a ser compreendido.

Pedro Nuno Santos ganhou o PS depois de António Costa ter sido traído por um chefe de gabinete que tinha quase 80 mil euros em notas no seu gabinete, que diz ser o valor de trabalho que prestou a terceiros. Alguém acredita verdadeiramente nos políticos enquanto não ficar claro que não podem cuspir para o ar porque é certo que o cuspo lhes cai em cima? Não sou do PSD, nunca me filiei num partido, mas não acho que os social democratas têm sarna, assim como não acho que os comunistas comem criancinhas, embora esteja provado que se comem uns aos outros pela forma como vão desaparecendo do mapa eleitoral a cada eleição. Também não acho que os socialistas que governaram o país sejam tão esquecidos como Pedro Nuno Santos. Mas o tempo dirá o que vale este discípulo de António Costa com quem teve a briga do aeroporto que vai ficar na história de Portugal, não por causa da indemnização, mas pelas razões que o levaram a anunciar o aeroporto no Montijo e, no dia a seguir, a sofrer a desfeita do primeiro-ministro que lhe retirou a autoridade sobre o assunto.


Como estamos a escrever sobre gente da política e dos negócios não acabo sem deixar uma nota para o facto do PSD se preparar para apresentar nas próximas eleições legislativas, como cabeça-de-lista no distrito de Santarém, o impagável João Moura, o homem que melhor sabe explicar como é que se pratica o ofício de secar tudo à volta para ele ser o bombeiro de serviço. Muito mal vai a região de Santarém quando o partido do poder, que quer voltar ao poder, tem um político destes como grande referência. Só temos duas hipóteses para conseguirmos sobreviver no meio de tanta mediocridade: continuamos a acreditar que ninguém vive para sempre debaixo de uma moita, ou continuamos a acreditar que o quartão tanta vez vai à fonte que um dia parte-se pelo caminho. Há uma terceira hipótese, mas essa fica para os camaradas do PSD nos contarem quando falarem da importância política do partido na região ribatejana e na defesa do nosso território. JAE .

quinta-feira, 20 de março de 2025

Gastar cera com defuntos, o PS e o PSD, e o exemplo da Chamusca que é um concelho em extinção

O crescimento do CHEGA que recruta políticos para candidatos a deputados como se recrutam trabalhadores para a vindima, não serve de lição aos líderes dos partidos tradicionais que falham todas as promessas.


É gastar cera com defuntos escrever sobre o facto do PSD na região ribatejana ser um partido fantasma quando chega a hora de concorrer às autárquicas? Há bons exemplos, mas na generalidade sobressaem os maus.

Nem por isso as direcções dos partidos a nível nacional pedem contas aos líderes regionais e locais. Com a desmobilização dos cidadãos, que estão cada vez mais descontentes com a vida política, os políticos locais e regionais, salvo as excepções, comportam-se como caciques e estão-se marimbando para os resultados pois sabem que nas altas esferas dos partidos discutem-se prebendas, marcas de carros, nomes de gajas e de gajos, e contam-se algumas piadas brejeiras que cortam a direito e gozam com quem se põe a jeito, independentemente de ser do partido A ou B.

Está por nascer o jornal ou a televisão, de âmbito nacional, que faça o escrutínio dos políticos e da vida em sociedade que não seja à volta das elites da capital. A maior parte dos colunistas são amigos dos governantes ou dos ex-governantes, mas apesar das diferenças de opinião todos têm acesso à mesma garrafeira, à mesma panela, às mesmas irmandades. É por isso que a regionalização é o maior fantasma no seio dos partidos, nas reuniões das associações de empresários, nos meios intelectuais onde se discutem lugares e posições na administração pública, em todos os lugares onde toca o alarme só de se falar numa possível descentralização de poderes que esvazie os poderes dos mangas de alpaca de Lisboa.

O crescimento do CHEGA que recruta políticos para candidatos a deputados como se recrutam trabalhadores para a vindima, não serve de lição aos líderes dos partidos tradicionais que falham todas as promessas da reforma da Justiça, do Serviço Nacional de Saúde, da escola e creches para todos, da habitação social e o mais que todos sabemos.

Pedro Nuno Santos é o líder do PS que há três anos na qualidade de ministro de António Costa, o seu líder no PS e no Governo,  anunciou um novo aeroporto no Montijo que António Costa desfez no dia a seguir. Foi o governante que mais mentiu sobre a realidade da TAP e da CP, duas empresas que consumiram e consomem mais do orçamento público que quase todos os portugueses reformados.

Dizem as primeiras sondagens que na Carregueira, concelho da Chamusca, onde a CDU perdeu a câmara da Chamusca para o PS ao fim de mais de quase 40 anos de poder, dizem os números que os partidos tradicionais têm os dias contados. Não admira. O estranho é que seja só na Carregueira porque a abertura dos políticos do concelho para fazerem ali aquilo que mais ninguém quis noutra parte do território teve como paga o esquecimento eterno. Os investimentos prometidos estão por cumprir e mesmo que os políticos locais não saibam valer as suas reivindicações, o povo sabe fazer justiça pelas suas próprias mãos, neste caso usando o voto. Não resultou o castigo à CDU dando a vitória ao PS e a Paulo Queimado e Cláudia Moreira. Foi pior a emenda que o soneto. Falta saber se ainda vamos a tempo de ver o governo a cumprir as promessas que estão por cumprir, incluindo o raio de uma ponte que depois de fechada nos dois sentidos tem um tabuleiro onde qualquer dia se podem semear batatas. JAE.

quinta-feira, 6 de março de 2025

A luta de galos entre os mesmos de sempre na casa da democracia

Uma crónica a propósito da reedição de O PROCESSO e a recordação de três frases, roubadas à memória, que espelham os tempos que vivemos.


O empresário José Manuel Roque, que faleceu recentemente, era um homem de poucas confianças, mas tinha uma atitude perante a vida que não era de vacilar. Éramos amigos, mas não tanto. A nossa diferença de idades, o nosso trabalho e o percurso de vida não permitiam grandes tertúlias. Curiosamente, a última vez que veio em meu socorro para me defender num julgamento em que estava a ser apertado por gente que queria fugir com o rabo à seringa, o seu depoimento sobre mim não foi validado pelo juiz que acabou a condenar-me. Mas o mesmo se passou com o presidente da câmara de Santarém da altura, Ricardo Gonçalves, que embora fosse testemunha importante dos motivos que levaram ao julgamento, foi igualmente desconsiderado pelo juiz e também as suas declarações foram dispensadas na hora do juiz decidir.

Cito José Manuel Roque porque desde que o conheci, até morrer recentemente, sempre lhe ouvi esta frase forte, mas que ele não perdoava cada vez que analisava a situação política do país: “Portugal é um bordel em autogestão”.

Outro episódio que ficou na memória foi o que resultou de uma entrevista que realizei em parceria com o Alberto Bastos, em Março de 1992, com Rui Sommer de Andrade,  que confessou que Portugal lhe ficava apertadinho nas cavas. A mais recente, que também não vou esquecer, é a frase de Mira Amaral que, numa entrevista ao jornal SOL, disse que qualquer dia um tipo só pode ir para o governo se tiver acabado de nascer.

Todas estas frases se ajustam ao momento político que vivemos, que não é mais que uma luta de galos entre os mesmos de sempre, que enchem a casa da democracia como dantes se enchiam os circos em Roma. E é de lá que alimentam toda a informação que chega a todas as televisões e jornais do regime que monopolizam a informação que chega à generalidade do povo português.

 

O caso MIRANTEGATE

Acaba de sair para as bancas a segunda edição de O PROCESSO, um livro que conta a tentativa de silenciamento da actividade de O MIRANTE.  Orlando Raimundo, o autor, junta-lhe um prefácio a que dá o título de “O caso Mirantegate paradigma da liberdade” onde reconhece que este caso “foi, por ventura, o mais grave atentado à Liberdade de Imprensa do pós 25 de Abril, adiantando ainda que “nunca antes na atribulada História da sonolenta e amadorística Imprensa Regional Portuguesa nada de semelhante tinha acontecido”. António Valdemar, o decano dos jornalistas portugueses, assina na quarta capa do livro um elogio a Orlando Raimundo, que considera um jornalista “consagrado ainda antes do 25 de Abril” e “um dos grandes repórteres da sua geração que derivou para a investigação histórica de figuras e acontecimento polémicos do nosso tempo”.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

As universidades seniores, os meios de comunicação regionais e o desenvolvimento local

Os meios de comunicação deviam viver mais da participação dos cidadãos. E os alunos das universidades seniores podem ter um papel diferenciador nessa participação.


“Os meios de comunicação regionais e o desenvolvimento local” foi o título que a RUTIS deu a uma das intervenções de abertura do seu Congresso que reuniu em Óbidos no passado dia 20 de Fevereiro. Fica aqui o essencial da palestra que proferi para cerca de centena e meia de pessoas que estavam na sessão de abertura.

Os meios de comunicação regionais e locais são a única voz de uma região que leva para fora de portas aquilo que só a nós nos interessa. Por isso é tão importante a sua existência. Se dependermos em termos de desenvolvimento regional do escrutínio que o poder de Lisboa tem sobre o nosso território, nunca mais passamos da cepa torta, e a RTP e os organismos do Estado, que têm tutelas mais fortes que ministérios, arrasam orçamentos e todos juntos são um perigoso poder paralelo que nos governa quase há 50 anos. 

Se há coisas de Abril que faltam cumprir é a distribuição dos incentivos do Estado em igualdade de circunstâncias para os que gravitam na grande nave do Terreiro do Paço e os outros que vivem no bairro, na charneca, na lezíria ou na grande paisagem que é todo o interior do país.

É evidente que sem imprensa de proximidade não há escrutínio. Se não houver imprensa de proximidade não há descentralização, se há coisas que matam todos os dias um pouquinho a nossa democracia é a falta de escrutínio, ou então a tentação de escrutinar para além do razoável, que é o que está a acontecer nesta altura com a mudança de cadeiras que se deu na Assembleia da República. Caiu o Carmo e a Trindade em S. Bento porque um determinado partido elegeu como deputados pessoas que não estão a respeitar o que era regra no parlamento.   

Os meios de comunicação deviam viver mais da participação dos cidadãos. E os alunos das universidades seniores podem ter um papel diferenciador nessa participação. Os meios só têm a ganhar se aceitarem textos de opinião dos cidadãos que vivem e pensam o território e no território. Se os professores e os alunos se empenharem nessa missão de escreverem textos e gravarem depoimentos para enviarem aos meios, tenho a certeza que serão bem recebidos.

Os textos mais lidos de O MIRANTE são as entrevistas e as reportagens que retratam os dirigentes associativos e as suas colectividades, os textos que põem a nu as injustiças sociais, os textos das rubricas onde damos voz aos cidadãos que têm uma história para contar.

Os alunos das universidades seniores podem mudar em parte a linha editorial de um meio de comunicação social se organizarem e souberem como intervir no meio onde vivem e trabalham. O que cada um de nós tem para ensinar ou influenciar uma redacção de jornalistas é tão ou mais importante que colaborar apenas como leitor ou ouvinte. Não vou deixar aqui o anúncio de uma ferramenta ou apontamentos sobre como a universidade sénior e os seus alunos podem ser diferenciadores no debate sobre o desenvolvimento regional. Deixo a minha disponibilidade para ser parceiro de quem quiser arriscar aceitar esse desafio e desconstruir essa ideia de que estamos condenados a ver e ouvir televisão, sempre com o coração apertado, porque está tudo em guerra, e as desgraças e os mortos entram pela nossa casa como se o nosso reduto fosse um mesmo cenário de guerra, que dá continuidade às reportagens que chegam do fim do mundo, e que, na maioria dos casos, nem precisam da intervenção de jornalistas para serem contadas. JAE.