quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

O jornalismo como arma de arremesso

Maria Flor Pedroso, a última vítima dos snipers do jornalismo de opinião, pôs-se a jeito e acabou de provar do milho envenenado que é prática corrente distribuírem nos galinheiros onde ela também habita.


“A arrogância fica bem aos perus”. Cito do livro de Mário de Carvalho, com o título “Quem disse o contrário é porque tem razão”, talvez um dos livros deste autor que vai ficar como referência para os vindouros que, quando ele morrer, vão descobrir uma grande Obra literária. Mário de Carvalho tem um escritório de advocacia, num prédio numa rua de Lisboa, profissão que exerceu até há bem pouco tempo, mas também tem a sua casa de fim-de-semana em Salvaterra de Magos onde lê os jornais e escreveu alguns dos seus melhores livros.
Lembrei-me dele várias vezes nos últimos tempos por causa da guerra que vai por aí entre jornalistas encartados que têm empregos na Agência LUSA, na RTP/RDP e na generalidade dos Media que vivem cada vez mais da opinião e cada vez menos das notícias. O Estado gasta com a Agência LUSA, e com a RTP/RDP, o que nem o Diabo quer saber; tudo para que alguém faça a agenda completa de uma centena de governantes, que reduzem os problemas do país a declarações pueris, feitas em viagens pelo país desertificado, sem políticas para a floresta, a agricultura e o mais que se sabe.
Quanto mais a crise da Imprensa se vai acentuando mais os jornalistas e os comentadores das televisões se descompõem e escrutinam o trabalho uns dos outros sobre questões que só servem para destilar veneno e raivinhas caseiras. O jornalismo está em crise mas os jornalistas que têm o poder de falar para grandes audiências fazem lembrar os Sousa Laras desta vida. Maria Flor Pedroso, a última vítima dos snipers do jornalismo de opinião, pôs-se a jeito e acabou de provar do milho envenenado que é prática corrente distribuírem nos galinheiros onde ela também habita.
Mário de Carvalho diz no livro citado que o episódio da investidura de D. Quixote contra os moinhos de vento só dura uma página do livro que é composto por cerca de setecentas. Todos os jornalistas das LUSAs e RTP/RDP’s desta vida se acham como Miguel de Cervantes, que numa só página conseguiu criar um episódio que marca todo o livro.  Eles também, quando chegam às redacções destas máquinas de Poder, acham-se à prova de bala, até que um dia percebem que podem cair redondinhos só com o silvo de uma baioneta, que os comentadores encartados usam até partirem o cabo, principalmente nestes tempos de crise. JAE

Nota: Leiam, por favor, a história que contamos nesta edição da escritora Ana Cristina Silva que foi vítima de atropelamento. Este é o país onde as seguradoras, os bancos e os burocratas, que são protegidos pelos governantes, mandam mais que qualquer primeiro-ministro. 

sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

De quantos amigos se faz um Museu, em Vila Franca de Xira, e na casa do André, no Rio de Janeiro?

Uma braçada de livros e um pretexto para falar de António Redol e André Seffrin.

Esta semana recebi uma braçada de livros que não encontraria nas livrarias por circularem um pouco à margem do circuito editorial; Livros patrocinados pela Associação Promotora do Museu do Neo-Realismo; António Redol tem sempre o cuidado de não se esquecer de nós e partilhar os livros que a associação vai apoiando.

O filho do autor de Gaibéus é um cidadão exemplar no trabalho de divulgação da Obra do seu pai mas também dos escritores neorealistas. E não se fica pelo trabalho de divulgação; tudo o que herdou e vale muito dinheiro está entregue para o serviço público de um museu em Vila Franca de Xira.

O herdeiro do autor de “Uma Fenda na Muralha” tem uma conta só para os direitos de autor que vai recebendo; diz ele que nunca se serviu de um cêntimo da venda dos livros; tudo o que recebe dá de volta para a comunidade apoiando autores, iniciativas e associações.

As pinturas e os desenhos de gente famosa que estão em exposição no Museu, e que foram entregues recentemente à sua guarda, para um dia serem doados definitivamente, são o melhor exemplo da militância cultural da família do autor de “Avieiros”.

É gratificante ouvir falar de Alves Redol pela voz do seu filho; A criança em quem Alves Redol se inspirou para escrever “Constantino, Guardador de Vacas e de Sonhos” ainda é vivo e convidado para aparecer em escolas; Mas a sua história é pouco divulgada e na empresa onde trabalha só há pouco tempo é que souberam do seu passado em livro (O MIRANTE publicou uma entrevista com ele que se encontra facilmente com uma pesquisa na internet).

António Redol fala dos autores que a Associação Promotora edita com a paixão de alguém que dedica a sua vida a uma causa; Deve-se a ele uma boa parte desta teimosia em manter viva a associação; na cidade poucos sabem desta militância mas ela é fundamental para o Museu e a sua importância. Quem é que não sabe que nem tudo vem nos livros? Que é importante haver pessoas vivas que não se escondam nos seus castelos de cimento e nos seus corações empedernidos?

Tenho um amigo, André Seffrin, homem dos sete saberes, que é outro exemplo de dedicação à Obra de Walmir Ayala, de quem herdou a casa e os livros. Há muitos anos que sou testemunha da briga que é editar e apoiar edições para manter viva a lenda.

Enquanto trocava mais uma vez afectos e conhecimentos com António Redol, tudo por causa da admiração pela Obra do seu pai, recordava as últimas conversas com o André e o último projecto que combinamos para 2020. A vida literária, e o mundo dos livros, não é coisa para meninos; mas de vez em quando dá para continuar a perguntar como Pessoa: “Que voz vem no som das ondas que não é a voz do mar?” JAE.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Contra a regionalização marchar, marchar

A Associação de Municípios do Vale do Tejo continua sem reunir. Não há melhor exemplo da falta de responsabilidade política dos autarcas da região que tanto barafustam contra a centralidade do Governo.

Os autarcas ribatejanos criaram uma Associação de Municípios do Vale do Tejo (AMVT) para tratar, entre outros assuntos, da Colónia Balnear da Nazaré, um património avaliado em mais de cinco milhões de euros que foi encerrado em Julho de 2009 por pôr em causa a segurança dos utentes na sua grande maioria crianças. Já escrevemos neste jornal, no passado e no presente, sobre o assunto que deveria ser suficiente para envergonhar os autarcas. As últimas notícias datam do início de 2019 quando o presidente da Câmara da Nazaré resolveu dar o grito do Ipiranga. Daí para cá a AMVT nunca mais reuniu; o tanso do presidente da dita associação, Paulo Queimado, que é também presidente da Câmara da Chamusca, nunca mais convocou os seus parceiros autarcas ou mostrou preocupação por ser o líder eleito entre os seus pares. Na altura em que publicámos as notícias ouvimos cobras e lagartos de Paulo Queimado que fariam um santo corar de vergonha. E o que é que aconteceu depois das críticas demolidoras dos seus pares? Zero, bola, como diria Jorge Jesus.
Imaginem a região ribatejana entregue a Paulo Queimado e a António Rodrigues, o eterno recandidato à Câmara de Torres Novas, embora o PS em Lisboa não o leve a sério; ou os autarcas influentes e ambiciosos dentro do aparelho do PS, como é o caso de Rui Barreiro. Há aí desse lado algum leitor que reconheça num dos nossos autarcas um líder regional? Alguém que ensine Paulo Queimado a respeitar as regras da democracia e a portar-se como um Homem que faz a gestão da coisa pública? É ele o culpado por lhe terem entregue tamanha responsabilidade e não lha tirarem da mesma forma como a entregaram? Como é que se põe na ordem um analfabeto político que anda a fazer uma gestão desastrosa da Câmara da Chamusca e da Associação de Municípios do Vale do Tejo? Pergunto, mas eu próprio tenho a resposta. O rapaz é assim por culpa da família dos Silvas. E se não for culpa dessa família antiga há-de ser culpa do Mário Soares e do Francisco Salgado Zenha que já morreram e não podem acudir à pobreza de espírito dos políticos socialistas das novas gerações.
Sou contra a regionalização mas sou regionalista. Não me identifico com os autarcas que andam por aí no seu trabalho de caciques mas não os ignoro. Vou espernear aqui, ou noutra qualquer tribuna, até conseguir envergonhá-los ou fazê-los dormir menos e trabalhar mais.
Quero um Governo do país que descentralize, que promova políticas de proximidade, que acuda com urgência ao país das casas abandonadas, da desertificação, da má gestão florestal do território, da preservação dos rios e ribeiras, da reforma da Justiça e do Serviço Nacional de Saúde. Mas também quero um Governo de autarcas que se destaquem da mediocridade dos Paulos Queimados da vida.
Sirvo-me da gestão desastrosa de uma associação de municípios para vincar a minha opinião contra a regionalização mas, repito, sou regionalista; defendo a descentralização a exemplo do que o actual Governo fez com três secretarias de Estado; é preciso exigir mais a António Costa; mas não é com palavrinhas mansas nem com autarcas medíocres que não sabem os caminhos para os ministérios e na gestão da coisa pública não passam de dirigentes analfabetos. JAE.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Com os olhos em José Saramago e na Azinhaga

Os Caminhos de Saramago, na Azinhaga, continuam na gaveta e já lá vão 20 anos da entrega do Nobel e quase um século do seu nascimento.


O prémio Nobel da Literatura para a polaca Olga Tokarczuk é o décimo quinto atribuído a polacos e o sexto a escritores daquele país. Portugal só teve dois laureados: Egas Moniz, em 1949, e José Saramago, em 1998. Não temos que fazer comparações com a Polónia, o país da Olga ou da genial Wisława Szymborska, para deixar aqui preto no branco que Portugal é um país cheio de gente igualmente genial em todas as áreas da Ciência e da Cultura mas muito pouco reconhecida. E acho que a culpa é nossa; fomos poupados nas guerras mundiais e nas ocupações militares (a Polónia foi um dos países da Europa mais sacrificado) mas nada disso nos serviu para crescermos como pessoas, como povo e como país.
José Saramago teve um percurso de vida que não contribuiu em nada para esta pasmaceira de país; nunca se acomodou, nunca se vendeu ao Diabo, não perdeu a cabeça com provocações e escreveu uma obra que corre mundo e confirma-se, com o tempo, como de grande actualidade e qualidade literária.
Há iniciativas quase diárias nas suas duas casas; em Lisboa e em Lanzarote; congressos e encontros por todo o mundo; só na Azinhaga é que a porca torce o rabo; Não há em Santarém ou na Azinhaga ou na Golegã apaixonados pela Obra de Saramago que ponham mãos aos “Caminhos de Saramago” que seria, na nossa opinião, a melhor forma de trazer pessoas à terra natal do escritor e valorizar o território ribatejano que tanto precisa.
O escritor não ignorou a sua terra e a sua região. Há na sua obra razões mais do que suficientes, mais do que nos lembramos ou valorizamos, para se criar um roteiro de caminhos mas também de sentimentos e afectos, que fazem as delícias dos grandes amantes da literatura e, neste caso, certamente dos grandes admiradores de Saramago.
O Ribatejo é território e casa de um dos maiores escritores de sempre, que vai ficar na História da literatura mundial, mesmo que ainda seja odiado ou menosprezado por certa gente de outros tempos que confundem patriotismo com fascismo ou comunismo. Talvez pela genialidade da sua escrita, e da sua obra literária, José Saramago despertou esses demónios que atacam as pessoas que não sabem nem sonham, como diria outro poeta, que “a literatura, como toda a arte, é uma confissão de que a vida não basta”.
A obra literária e o percurso de vida de José Saramago são inspiração para realizadores de cinema, músicos, poetas e outros criadores de todo o mundo.
Há lá melhor razão para mobilizar grupos de acção cultural, e pessoas ligadas à cultura, para se unirem e valorizarem o escritor na terra e na região onde nasceu e que soube valorizar e pôr no mapa?
Somos quase todos contemporâneos do homem que levou a memória do seu avô analfabeto à distinta realeza da Suécia, com repercussão em todo o mundo, e valorizamos menos esse acontecimento que a chegada do vinho novo pelo São Martinho.
É verdade que devemos sempre colocar cada coisa no seu lugar. Por isso deixo aqui mais uma vez a minha admiração pela fraca visão dos dirigentes políticos e associativos da região que aparentemente desconhecem a força mobilizadora da Obra do autor de Memorial do Convento. JAE

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

As touradas e a imbecilidade humana

Um texto onde se fala do guardião do Tejo, dos ambientalistas, dos deputados ociosos, dos bancos que comem tudo e não deixam nada e de Alves Redol que está em cena em Alverca.


Não há no concelho de Vila Franca de Xira outra figura tão importante culturalmente como Alves Redol. Um século depois do seu nascimento, o autor de A Fanga só não continua actual para quem acha que caminhamos no melhor dos mundos, onde não há “Fronteiras Fechadas”, e o dinheiro e a tecnologia resolvem todas as infelicidades e desgraças de uma civilização cada vez mais dividida e, curiosamente, cada vez mais analfabeta. Num tempo em que está em causa a morte do planeta, os ambientalistas fazem do fim das touradas a sua grande luta contra a imbecilidade humana. Num tempo em que a agricultura usa os pesticidas sem controle, provocando doenças que ninguém é capaz de inventariar; a água de regar as culturas é usada de forma arbitrária, sem qualquer vigilância, os rios são guardados e defendidos por cidadãos, como é o caso de Arlindo Consolado Marques, um herói que os ambientalistas ignoram. Num tempo em que os banqueiros vão à falência, depois de roubarem o dinheiro do povo, e voltam à actividade bancária para continuarem a roubar, mas agora com o apoio do Estado. Num tempo em que a criação de animais de aviário é feita em espaços super lotados, com as aves quase sempre sentadas para engordarem o suficiente no tempo mais rápido possível, sem que o Governo tenha capacidade para fiscalizar as condições sanitárias ou o uso de hormonas, o grande desígnio desta gente é combater as touradas.
Os livros de Alves Redol fazem falta nas escolas como fazem faltam os professores que gostam de literatura, teatro e cinema. Andamos todos a alimentar uma escola onde boa parte dos professores não são avaliados nem estão a trabalhar naquilo que mais gostam; e quando trabalham têm que viver em quartos alugados porque estão a muitos quilómetros de casa. É uma pequena vergonha o ensino em Portugal, com muitas e honrosas excepções, apesar da desgraça. Bastava pôr as Fundações portuguesas a pagar impostos e haveria dinheiro para tirar os alunos e os doentes dos hospitais de dentro dos contentores. Ninguém sabe, nem questiona, os milhões de euros que as Fundações poupam em impostos, que serviriam para Portugal ser um país mais desenvolvido e moderno, mais justo e solidário, com mais justiça e menos desigualdades.
Quem acompanha de perto a política que se faz entre o Terreiro do Paço e a Assembleia da República sabe mais da miséria humana que um toureiro sabe das manhas dos toiros. No entanto, é muito raro ouvir um deputado, ou um ex-deputado, a desmascarar a ociosidade dos eleitos, a falta de trabalho, a pouca importância que têm no Governo do país e da coisa pública. O mais triste é vê-los a deixarem-se usar como os pastores se servem da lã das ovelhas, a maior parte das vezes aceitando trabalhos de assessoria em empresas que são quem, verdadeiramente, manda na Assembleia da República.
Nota: este texto foi inspirado na peça de Alves Redol, Fronteira Fechada, que está em cena no Teatro do Grupo Cegada, em Alverca (Ver texto nesta edição) JAE.

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

O MIRANTE 32 anos depois de um outro aniversário

O autor destas linhas tinha 32 anos quando fundou este jornal. Passaram entretanto 32 anos desde a data da primeira edição. Contas feitas e refeitas, o jornal renova-se todos os anos enquanto o pobre escriba faz contas de cabeça à magnitude do tempo.


Esta edição de O MIRANTE assinala mais um aniversário. O MIRANTE nasceu em Novembro de 1987, há 32 anos, exactamente no ano em que o autor deste texto também festejava o seu 32º aniversário. É uma curiosidade que faço questão de partilhar porque estou em cada página da edição deste jornal com o mesmo espírito que estava na primeira edição de há 32 anos.
O jornal nasceu da necessidade de o autor intervir na comunidade. E assim se cumpriu o desígnio. Idealizámos, construímos e depois lançámos no mercado um título que conheceu, até hoje, todas as vicissitudes de um órgão de comunicação social que nunca serviu outros propósitos que a defesa da região e das pessoas da região. Por isso nasceu e cresceu cumprindo ciclos e etapas; ainda temos muito caminho para andar mas já não podemos ignorar o caminho que fizemos.
Há quem garanta que O MIRANTE nasceu em Alverca. Outros que nasceu em Torres Novas. Já me garantiram, olhos nos olhos, que eu era natural de Alhandra e que O MIRANTE era um projecto editorial pago por um capitalista americano. Tenho histórias deliciosas para contar sobre sermos apelidados de comunistas pelos liberais e de liberais pelos comunistas. Já fomos excomungados em muitas reuniões partidárias, lembrados em muitas missas, amaldiçoados por muitos políticos e dirigentes associativos, difamados pelas bocas das pessoas mais insuspeitas da nossa comunidade. É verdade que ao longo dos anos também recebemos alguns elogios mas deixo isso por conta de alguns pecados que cometemos nomeadamente quando trocámos os nomes dos protagonistas das notícias ou fomos injustos a escrever sobre quem não devíamos.
Os 32 nomes referenciados no cimo da capa da edição de aniversário, que sai em conjunto com a edição em que publico esta crónica, são a parte maior do conjunto dos profissionais que aqui trabalham e das empresas que nos prestam serviço. Como é fácil de verificar, na equipa actual há três advogados. Que ninguém julgue que é para fazerem número. Os advogados não escrevem notícias mas defendem quem as escreve. Falo do assunto, não porque seja novidade, mas para chamar a atenção dos leitores mais distraídos para a diferença entre fazer jornalismo e escrever umas coisas nas redes sociais; entre sustentar um jornal que se limita a trabalhar texto de agência ou comunicados oficiais, páginas no Facebook ou no Instagram, e o trabalho de investigar, escrever e publicar, procurando remar contra a maré. Esse é o nosso grande orgulho: vivemos da publicidade e só da publicidade. Esse é também o grande desafio do futuro: até quando uma região tem actividade económica para sustentar um jornal ou, dando a mão à palmatória, temos nervo e somos suficientemente bons a trabalhar para sustentarmos a nossa empresa e os nossos empregos.
Há 32 anos, quando tinha 32 anos, iniciei este projecto certo de que dificilmente o deixaria pelo caminho. Pura ilusão: em 32 anos ajudei a construir um projecto novo, que só agora dá verdadeiramente os seus frutos, mas entretanto fiquei sexagenário. Mais ano menos ano vou ter que mudar de vida como acontece com toda a gente por mais que fujamos do caruncho. Acho no entanto que ainda rendo mais uns anos. Nem que seja a arrastar as asas. Em tempo de aniversário todos os minutos contam para criarmos a ilusão de que vale a pena festejarmos o trabalho e o fruto maduro que nos escorrega das mãos mas que, em contrapartida, já não nos debota o dente. JAE.

quinta-feira, 31 de outubro de 2019

CTT voltam a falhar na distribuição de O MIRANTE

O MIRANTE e a generalidade das publicações da imprensa regional, que se vendem por assinatura, constituem uma importante fonte de receita para os Correios que é pouco valorizada pela empresa. A privatização dos CTT, no Governo de Passos Coelho, foi um duro golpe no serviço público que os Correios prestavam ao país.
A edição de O MIRANTE da passada semana não foi distribuída na quinta-feira, como é habitual, por razões que até hoje não foram explicadas pelos CTT. Os assinantes de O MIRANTE começaram a ligar bem cedo na manhã desse dia a perguntarem pelo jornal mas os CTT até à data do fecho desta edição não deram explicações sobre a falha no serviço que compromete a relação de confiança com os assinantes e os anunciantes.
Os CTT não perdoam o pagamento a tempo e horas de todo o serviço que prestam a O MIRANTE e a todas as outras publicações da imprensa regional. Há casos de débito de juros de dois dias de atraso no pagamento de facturas. Quando o serviço é deficiente, pondo em causa a credibilidade das empresas na relação com os seus parceiros, como foi o caso da passada semana, a cobrança do serviço é igualmente implacável e não tem em conta os prejuízos que os editores sofrem com os créditos da publicidade, que sempre acabam por acontecer, tendo em conta que muita dessa publicidade perde impacto com o atraso na distribuição do jornal e obriga, em alguns casos, à sua republicação sem custos para os anunciantes.
O MIRANTE sempre teve com os CTT uma relação de confiança, em alguns momentos conturbada pela reivindicação de uma melhor distribuição, mas nunca ficamos, como hoje, a falar sozinhos, sem uma explicação que nos conforte e nos garanta que os CTT não se demitiram da sua função de serviço público embora pago a peso de ouro.
Mesmo sem sabermos o que nos espera por parte da administração dos CTT, que nos ignorou e desrespeitou como clientes, acreditamos em dias melhores. Para isso contamos também com a vigilância das autoridades que têm a obrigação de regular os prestadores de serviço postal.
Na próxima semana voltaremos a dar conta do ponto de situação nesta relação com os CTT de forma a darmos também uma satisfação aos assinantes e anunciantes que, apesar de tudo, confiam em nós e na qualidade do nosso trabalho. JAE

Tempo de férias prolongadas e muitas leituras

Escrevo entusiasmado com as leituras de férias exactamente quando só me apetece ser leitor de crónicas, romances e poesia.


Ando a viajar mas todos os dias escrevo para o jornal como quem tem um compromisso com uma grande paixão. E de verdade não me apaixono assim tão facilmente e já lá vai o tempo, há muito tempo, em que morria de amores dia sim dia sim. E nunca deixei de ir à praia ou ao cinema para ficar a escrever.
Escrever é um compromisso com a sociedade maior do que com os deuses. Os poetas, os romancistas e os ensaístas, que passam a vida depressivos, porque ninguém os lê ou lhes publica os livros, deviam fazer o percurso dos jornalistas antes de qualquer actividade literária. Assim aprenderiam os valores do trabalho colectivo, o gosto de escrever sem assinar, o prazer de reescrever o trabalho dos outros quando a matéria chega mais pobre do que era suposto. Aprenderiam sobretudo a fazer da escrita um prazer igual ao da leitura e nunca publicariam para serem conhecidos mas sim como quem aprende a arte de semear e colher para não morrer de fome no meio de uma qualquer Amazónia da terra e da vida.
Escrevo entusiasmado com as leituras de férias que incluem Manoel Carlos, Walmir Ayala, Ledo Ivo, Manuel Bandeira, Elisa Rodrigues, Rosa Montero, Baptista-Bastos e José Saramago, entre outros. Numa passagem pelo bairro do Leblon, no Rio de Janeiro, comprei na livraria Argumento, uma das minhas preferidas, o último livro Vagantes da recém prémio Nobel, Olga Tokarczuk, que leio devagarinho, muito devagarinho, para saborear entre outras opções que me entusiasmam mais.
Já vi no cinema “Joker” e “Quem você julga que eu sou”, com dois actores dos poucos que sei o nome de cor:  Juliette Binoche e Joaquin Phoenix; E vi “Bacurau”, um filme brasileiro ao jeito de Tarantino, que  acho que não vai chegar aos cinemas portugueses e é pena.
Pelo caminho tenho deixado apontamentos escritos no vento e no sol; histórias de praia, de shopping, de taxista português anónimo a trabalhar nos cantos mais imprevisíveis do mundo, de gerente de hotel, mas também de livreiros e pequenos patifes.
Tenho contas para acertar com os leitores desta coluna mas, a exemplo do que sempre fiz neste ofício de operário da escrita, só escrevo quando me apetece e acho que ou estou muito azedo ou muito doce.
E vou confessar uma das minhas muitas fraquezas: quando ando a ler cronistas muito bons como Ruben Braga, ou escritores de viagens como Paul Theroux, só para dar dois exemplos, fico vidrado na qualidade da escrita deles e só me apetece ser leitor. JAE

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Rui Barreiro é um idiota mas não é por mal

Crónica sobre uma decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que condenou o Estado português numa decisão infeliz dos tribunais portugueses que condenaram o autor desta coluna a propósito de um texto de 2011 sobre a classe política em geral e Rui Barreiro em particular


O PS de Santarém era um saco de gatos em 2011 (e ainda hoje é, em boa parte) e o maior deles era, e é, Rui Barreiro.

Numa página interior desta edição (página 6) a notícia da semana é a condenação do Estado português pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em defesa da minha pessoa por ter escrito um artigo de opinião em 31 de Março de 2011 onde, preto no branco, criticava a classe política portuguesa e chamava idiota ao ex-secretário de Estado da Agricultura e Florestas, Rui Barreiro.
O Juiz do Tribunal de Santarém, António Gaspar, não teve dúvidas em me condenar com uma multa e uma indemnização a Rui Barreiro por ofensa da honra. No julgamento, o Juiz Gaspar bem tentou que eu explicasse que motivações tinha para chamar nomes considerados impróprios aos políticos, nomeadamente a Rui Barreiro, mas a resposta nunca variou: um jornalista de opinião escreve em função das suas convicções e da sua coragem para enfrentar os poderosos que detêm o poder e muitas vezes fazem uso dele de forma arbitrária. Como não conseguiu perceber que o meu artigo de opinião era uma crítica a toda a classe política, com destaque para o ex-governante, o mais idiota de todos os políticos que conheci, condenou-me sem apelo nem agravo já que o recurso para o Tribunal da Relação de Évora não surtiu qualquer efeito.

Esta decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem fez de mim um dos cerca de 20 jornalistas portugueses que nos últimos 12 anos foram injustamente condenados por abuso da liberdade de expressão. Neste período, segundo dados do TEDH, Portugal é o país da União Europeia que mais abusa da condenação injusta de jornalistas no exercício da sua profissão.

Rui Barreiro é um político fraco e medroso, vingativo, analfabeto cultural, de mal com a vida, que vê em cada jornalista um inimigo. Durante muitos anos obrigou-nos a correr para o Ministério Público porque cada artigo que escrevíamos sobre ele, que não lhe agradava, era queixa pela certa, que acabava sempre arquivada. Quando ainda não se falava em bullying sobre os jornalistas em Portugal já nós tínhamos este idiota político à perna. E nunca nos queixámos porque ouvimo-lo em tribunal confessar que dormia mal e tinha pesadelos quando era criticado no jornal.

Fica aqui a nota, quanto mais não seja para ele saber, caso ainda leia jornais, que pressentimos que o PS ainda tem para lhe dar muitos cargos políticos onde ele pode continuar a pôr à prova a sua idiotice. JAE

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Somos quase todos frangos de aviário

14 bancos portugueses foram multados pela Autoridade da Concorrência em cerca de 225 milhões de euros. Os crimes foram praticados entre 2002 e 2013. Somos todos vítimas das “acções concertadas” da maioria dos bancos para pagarmos o que eles muito bem entendem.


A Autoridade da Concorrência condenou 14 bancos ao pagamento de coimas no valor global de 225 milhões de euros por prática concertada de informação sensível no crédito entre 2002 e 2013. O caso ficou conhecido como “cartel da banca”. A AdC indica que “os bancos participantes na prática concertada trocaram informação sensível referente à oferta de produtos de crédito na banca de retalho, designadamente crédito habitação, crédito ao consumo e crédito a empresas”.
“Neste esquema, cada banco facultava aos demais, informação sensível sobre as suas ofertas comerciais, indicando, por exemplo, as margens de lucro a aplicar num futuro próximo no crédito à habitação ou os valores do crédito concedido no mês anterior, dados que, de outro modo, não seriam acessíveis aos concorrentes”.
Através desta troca de informações, que durou mais de dez anos, cada banco ficava a par da oferta dos outros, o que “desencorajava os bancos visados” de ofereceram melhores condições aos clientes e impedia os consumidores de beneficiarem do “grau de concorrência que existiria na ausência de tal intercâmbio”.
Esta notícia, e esta condenação, pelo que representa e representou para todos os portugueses que contraíram empréstimos, vai ficar na História da nossa democracia e devia ter consequências a nível político. Não me perguntem quais. Também ainda não sei a quem devo agradecer este castigo aos especuladores e aos homens do dinheiro que fazem do povo, e da grande maioria dos empresários, frangos de aviário.



Esta semana num dos relatórios de trabalho que recebo diariamente tomei boa nota de um apelo de um morador de um conhecido bairro de Santarém para que escrevêssemos sobre a fraca qualidade de vida proporcionada por má vizinhança. As redes sociais vieram revolucionar a comunicação mas infelizmente de pouco servem para denunciarem casos de injustiça ou de uma simples denúncia de má vizinhança. Na maioria das vezes os utilizadores das redes sociais limitam-se a escrever comentários verrinosos sobre a actualidade política, social ou económica, praticando a critica com insultos valendo-se do anonimato ou da condescendência das pessoas ou das instituições visadas. O facebook fez de todos nós jornalistas, mas quando toca a denunciar casos de abuso de poder ou de denúncias que podem meter tribunal o exercício da escrita deixa de ser um acto de cidadania junto de quem de direito para ser um apelo a quem tem o dever de dar a cara pelo serviço público de informação. Não estou a queixar-me do meu/nosso trabalho. Estou só a dar conta que todos os jornais são poucos para que vivamos numa sociedade mais justa e informada que lute pela qualidade de vida das populações e, acima de tudo, pela democracia. JAE

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

A sopa da pedra não engana

Uma viagem com turistas brasileiros pela região ribatejana para confirmarmos que somos muito maus a receber turistas e a promover a nossa terra.

Esta semana desviei para Santarém, Almeirim, Chamusca, Tomar e Constância turistas brasileiros que me pediram para lhes mostrar a região. Não tenho boas notícias. Nem tenho a certeza que a esta altura não esteja a ser amaldiçoado por os ter apressado na visita a Óbidos e desviado de Mafra e Batalha. Só não consegui convencê-los a trocarem a visita às praias fluviais da região pelo banho de mar e de gente na Nazaré.
Senti que só os convenci em Almeirim na hora de comerem a sopa da pedra. No resto vi um brilho nos olhos que me pareceu de espanto por termos encontrado os museus fechados à hora do almoço, por algumas igrejas estarem fechadas e sem visitas, e por as lojinhas abertas em Óbidos serem mais atractivas que o número de todas as outras que fomos encontrando na viagem pelo Ribatejo.
Considero a Igreja da Graça em Santarém, e o túmulo do Pedro Álvares Cabral, o melhor cartão de visita do distrito logo a seguir ao Convento de Cristo em Tomar.  Mas os horários de abertura são insuficientes para motivar esperas. Coração que não vê não sente. Apesar do entusiasmo, e da admiração dos brasileiros pelos portugueses aventureiros que se fizeram ao mar para descobrirem o mundo, quem está de férias quer é fazer caminho e diversificar as actividades.
Tenho números que provam que a região ribatejana perdeu turistas nestes últimos anos. A iniciativa da Região de Turismo do Ribatejo e Alentejo em nomear embaixadores é meritória mas não chega nem parece uma solução que produza grandes efeitos. Está na cara que a solução é uma campanha de promoção da região nos aeroportos e junto dos agentes de turismo. Ninguém apanha moscas com vinagre para citar um ditado popular.
A Chamusca tem uma capela no Outeiro da Senhora do Pranto que é única na região devido aos azulejos muito antigos. A chave está na Santa Casa da Misericórdia mas podia estar na casa de um vizinho da igreja que aceitasse o trabalho voluntário e bairrista de mostrar a capela aos turistas mais bem informados que a procuram. A Chamusca é uma terra de gente boa sempre disponível para se voluntariar em nome do seu bairrismo.
A capela do Senhor do Bonfim, que também é única na região, está fechada e imagino que sem condições de ser visitada. Estivemos por lá a comer figos diretamente da árvore e foi o maior consolo que pudemos levar para a viagem até ao Almourol, que agora tem entrada paga mas que continua a ser um monumento mal aproveitado tendo em conta as exigências do turismo actual.
Estou a tentar enfrentar a página em branco onde escrevo esta crónica sem ter a certeza que vale a pena bater no ceguinho. Metade da crónica da viagem fica no computador porque também sinto pena de mim próprio. Tudo indica que, apesar de andar sempre a mudar de lentes, o maior cego da região sou eu. JAE

quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Para onde vão os jornais em tempo de crise?

O Governo publicou um decreto-lei em 2004 que obriga o Estado a distribuir pela imprensa local e regional uma percentagem da publicidade que publica nos media nacionais. Está por cumprir em grande parte até hoje.

Os governos fazem gato sapato das leis e não as cumprem quando não lhes apetece. Dou um exemplo: em tempos que já lá vão (decreto-lei 231/2004) ficou escrito em Diário da República que o Governo português obriga-se a dar à imprensa local e regional uma percentagem significativa do valor da publicidade institucional que publica nos órgãos de comunicação nacionais. O resultado é desanimador. O Governo não cumpre a lei e assim prejudica uma parte importante do sector da comunicação social em Portugal. 
Quantos de nós é que aproveitam as páginas dos seus jornais para chamarem trafulhas aos governantes, desde Durão Barroso a Passos Coelho, passando por António Costa? Zero: não temos força editorial para abanar as estruturas partidárias, quanto mais um Governo. Não há um sacana de um deputado que se ponha do lado da imprensa regional e leve o assunto à Assembleia da República; não há com certeza advogados entre os patrões da comunicação social regional pois se houvesse certamente que algum mais empenhado já tinha resolvido o problema com uma queixa em tribunal que só podia acabar na condenação do Governo.
E por que é que os grandes grupos de comunicação social, que estão a morrer todos os dias um bocadinho, não se aliam aos mais pequenos e não dão o grito do Ipiranga de forma a fazerem mossa? Porque há muita gente pelo meio presa pelo pescoço? Como trabalho longe dos gabinetes do Poder não consigo perceber como se pode ser tão hipócrita a governar, um país ou uma associação de classe; como trabalho sempre no fio da navalha não entendo os que dormem em cima de brasas e acordam todos os dias no melhor dos mundos.
Estou longe de defender a intervenção do Governo para salvar jornais ou televisões; mas acho que vale a pena continuar a denunciar os que governam e alguns que são governados chamando-lhes hipócritas e mentirosos.
Um estudo sobre a imprensa regional e local, com data de 2009, mandado fazer e publicar pela ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social), diz o seguinte no texto de apresentação de Azeredo Lopes, na altura presidente do Conselho Regulador da ERC (sim, esse que entretanto foi ministro da Defesa e vai ser arguido no roubo das armas em Tancos):  “A imprensa regional, pude comprová-lo se dúvidas tivesse, desempenha um papel notável de reforço de um conceito rico de cidadania. Cultiva a proximidade, é útil para quem a lê, estimula ou, pelo menos, conserva laços identitários, culturais e históricos da maior importância – e muitos exemplos concretos conheci. Acarinha o particular, numa altura em que só se prega o global. Cultiva a língua portuguesa, num plano cada vez mais raro na imprensa em geral. É, por isso, e não só por isso, fascinante e justifica, plenamente, que, sempre que possível, os poderes públicos – na ponderação de decisões – tenham estes aspectos presentes a pesar favoravelmente num dos pratos da balança”. O estudo tem quase 600 páginas e até agora só serviu para inglês ver. JAE

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Uma crónica sobre um livro de Henrique de Carvalho Dias

Escrever sobre os problemas da região, que não sejam a ligação ao rio Tejo, e a falta de tempo para ir dar um mergulho, parece desajustado de tudo.


Esta semana escrevi um texto para um álbum de imagens do fotógrafo Henrique de Carvalho Dias. Aproveitei para lembrar Fernando Lemos, de quem também sou amigo há muitos anos, que nesta altura tem três exposições em Lisboa e é mimado, justamente, por toda a imprensa e todas as instituições portuguesas e brasileiras. Nunca o visitei na sua casa de São Paulo mas a culpa é minha que não gosto da cidade e as vezes que lá fui desencontrámo-nos. O mesmo com Henrique de Carvalho Dias. Conhecemo-nos do nosso trabalho e das relações amistosas; da arte e do prazer que muitas vezes conseguimos retirar do trabalho árduo, desmedido mas quase sempre extraordinário.

Henrique de Carvalho Dias é um Homem e um artista diferente da grande maioria dos fotógrafos que hoje capta imagens nas trincheiras das praças de touros. Quando olho para ele vejo um poeta da imagem; um fotógrafo que quer mostrar numa só imagem o que um jornalista ou um escritor tentam mostrar num conjunto de palavras. Há 30 anos que o conheço muito bem e há mais de quatro décadas que trabalha apaixonadamente por amor à arte de fotografar e ao serviço dos artistas da festa brava.
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Trabalhar 12 horas por dia em Agosto é obra. E escrever sobre os problemas da região, que não sejam a ligação ao rio Tejo, e a falta de tempo para ir dar um mergulho, parece desajustado de tudo. Em Agosto toda a gente vai de férias menos os jornalistas e os homens do campo (passe o exagero).

Por causa da greve dos motoristas e do susto que apanharam alguns empresários com a corda na garganta, nomeadamente os agricultores, lembrei-me de um empresário que, um dia, ao telemóvel, guiando um BMW último modelo, numa viagem Lisboa-Porto, contou-me que podia falar tranquilamente porque ia a 110 à hora para não desperdiçar gasóleo. Dois anos antes desta conversa fez um investimento de 30 milhões de euros. Nesse dia reconheceu que o negócio estava a ir por água abaixo devido a problemas com as máquinas importadas que eram o coração da fábrica. E foi, passado alguns meses. Hoje é mais um desses barracões gigantes fechados e abandonados numa zona industrial; Entretanto começou a trabalhar como consultor; e nos intervalos vai sonhando que ainda tem idade e capacidade para voltar a juntar dinheiro e regenerar o antigo negócio. JAE

Uma greve de camionistas com dois advogados a guiarem as operações

Aveiras de Cima é um dos cenários principais de uma greve que pretende paralisar o país e que nasce de um clima de raiva e ódio entre patrões e empregados.


Pedro Pardal Henriques é o herói/vilão do momento; ele e os seus clientes, dois sindicatos independentes de camionistas de matérias perigosas, tomaram conta do país como se fossemos um principado ou um território em auto-gestão. Os debates nas televisões entre sindicalistas e representantes dos patrões têm sido lições de serviço público que vão ficar na História, pela negativa, e servem para adaptar às matérias do ensino sobre cidadania nas escolas. Ficamos a saber que a greve foi decretada sem que tenha havido negociações; a guerra entre camionistas e empresas é motivada apenas pela raiva, pelo ódio e pelo desprezo que existe entre uns e outros. Os ordenados baixos e a exploração da mão-de-obra barata nas horas extraordinárias, só para dar dois exemplos, ficaram para segundo plano. Ninguém contabilizou, até hoje, o número de sindicatos que ficaram de fora desta greve, nem tão pouco o número de camionistas que não aderiram nem estiveram solidários com os colegas destes dois sindicatos que comandam a luta.

O Governo de António Costa desta vez não dormiu em serviço; e todas as televisões mostraram reuniões de emergência de ministros, e conferências de imprensa, como se estivesse em causa a independência do território; e o caso não é para menos; com esta facilidade em parar um país de 10 milhões de pessoas, o mínimo que podemos esperar é que tenhamos um primeiro-ministro com os tomates no sítio.

Neste meio tempo os jornalistas da TVI tiveram vagar para descobrir os podres da vida de Pedro Pardal Henriques que, pelo vistos, nunca guiou um camião; foi um empresário falhado que ficou a dever dinheiro a muitos colaboradores; e apareceu como vice-presidente da direcção de um sindicato numa altura em que estava proibido pelo tribunal de exercer qualquer cargo público ou sequer de gerir empresas. Mas ninguém falou com os sindicatos que não aderiram à greve; e não houve tempo para ouvirmos as associações das gasolineiras, que são a parte importante deste negócio. Como todos sabemos, a Galp, a BP e a Repsol, só para citar três grandes marcas, são verdadeiros colossos da economia portuguesa e, aparentemente, tentaram passar à margem desta guerra como se não tivessem nada a ver com o conflito, que pretendia, e ainda pretende, levar a economia portuguesa a um coma profundo.

Pedro Pardal Henriques fugiu às câmaras de televisão durante alguns debates mas nunca saiu dos noticiários; a sua putativa candidatura a deputado no partido de Marinho e Pinto ainda é notícia. E o seu adversário, o igualmente advogado André Matias de Almeida, representante dos patrões, não fica melhor na fotografia de uma luta entre patrões e empregados que encontrou um chefe de Governo em forma, sereno mas determinado, no meio de um silêncio partidário que é único na vida política portuguesa. JAE

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Crónica ao jeito de um antigo director de jornal mas sem sexo pelo meio

Apontamentos de um jornalista que vive e trabalha no Ribatejo e que nunca se rendeu ao poder de Lisboa.

Fui amigo de uma pessoa com alguma importância na Caixa Geral de Depósitos que me contou que na instituição era normal encomendarem estudos de mercado, que custavam milhões de euros, que depois desapareciam nas gavetas porque a encomenda era só para dar dinheiro a ganhar às empresas amigas do Governo e dos administradores. Por essa altura falava regularmente com um elemento do gabinete do ministro do Ambiente, José Sócrates, que me confessava que o seu chefe detestava o presidente da Câmara de Santarém da altura, José Miguel Noras, e que não queria nada com ele nem com quem o acompanhava. E aproveitava para me pedir regularmente informações sobre a vida política local.


Um dos mais influentes jornalistas dessa altura, de quem ainda hoje sou amigo, dizia-me que Santarém ainda ia ser a quarta cidade do país a seguir a Lisboa, Porto e Coimbra, por estar tão perto da capital e ter um excelente património. E que Tomar disputaria essa capitalidade valorizando ainda mais a região ribatejana. As potencialidades estão à vista mas a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), e outras associações de negócios, com conivência dos políticos locais, vivem no melhor dos mundos e, como não é demais repetir, o melhor de Santarém para eles são os caminhos para Lisboa. A última tentativa da dona do CNEMA de vender um terreno à Câmara de Santarém por 20 milhões de euros é de bradar aos céus e diz bem o que são as forças de bloqueio e para que servem.


Um dia senti-me de tal forma indignado com as políticas de um ministro com a pasta da Comunicação Social (Santos Silva), que fui atrás de um pedido de reunião até conseguir os meus objectivos. A primeira meia hora de conversa foi a ouvi-lo dizer os maiores disparates sobre o sector, sem direito a abrir a boca. Quando se cansou, e me deu a palavra, comecei o meu rol de perguntas em forma de críticas; passou o resto do tempo a pedir à Teresa (directora do Gabinete de Meios) que lhe traduzisse a conversa porque não estava por dentro da maioria dos assuntos.


O membro de um Governo que mais se serviu de nós para conhecer os meandros da luta associativa dos antigos patrões dos media foi aquele que mais prejudicou a imprensa regional (Alberto Arons de Carvalho). Recebia-me várias vezes por ano no seu gabinete, na Gomes Teixeira, para ficar por dentro daquilo que se falava nas reuniões. Nessa altura os patrões da comunicação social em Portugal faziam mossa no Governo quando decidiam juntar-se e falar a uma só voz. Foi com esse membro do Governo que tivemos a maior briga política; e deve-se a ele muito do que ainda hoje é o calcanhar de Aquiles da imprensa regional: por exemplo: os valores inflaccionados dos portes do correio uma vez que era o Governo que pagava e ninguém discutia preços. 


Assisti de perto ao assalto aos grupos de comunicação social importantes, como o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias, tomando nota de declarações, como as de António Oliveira, que a certa altura, referindo-se à compra do grupo destes dois jornais, disse que tinha comprado um porco e ia receber um bacorinho. A frase ficou, mas também ficou a saber-se que quase tudo o que comprou não foi com o dinheiro dele; O caso de José Berardo não é muito diferente. Os políticos destas últimas décadas vão ficar muito mal na fotografia da História de Portugal.


Nos tempos em que a imprensa vivia dias felizes fui convidado para fazer parte da estrutura accionista da agência Lusa. Faltei à chamada porque nesse dia, ao fim da tarde, caiu uma tempestade sobre Lisboa que me impediu de chegar a tempo e horas ao bairro da Lapa, em Lisboa, onde decorria a assembleia-geral. Ainda hoje as tempestades inesperadas fazem-me lembrar o dinheiro que poupei nesse ano; e nos dias em que gasto mal o meu dinheiro levo à conta desse investimento que não fiz, numa agência com maioria de capital do Estado, cujos jornalistas muitas vezes trabalham em cima das notícias que O MIRANTE publica em primeira mão. JAE

domingo, 4 de agosto de 2019

A tourada a Património Mundial da Humanidade

As corridas de toiros em Portugal têm um director de corrida que não manda nada. E os artistas fazem o que querem, para um público cada vez menor e menos entusiasmado com o espectáculo.

As corridas de toiros em Portugal, na grande maioria das praças, são uma brincadeira comparadas com os espectáculos na vizinha Espanha. Todos os aficionados sabem bem disso e os empresários sabem melhor do que ninguém; e os toureiros estão carecas de saber. Por isso é que em Espanha já há muitas cidades onde as touradas estão proibidas embora a aficion seja a sério e haja dez vezes mais aficionados que em Portugal.
As touradas são um espectáculo perigoso, que se gosta ou se detesta, como o boxe, por exemplo, e nos tempos que correm tornou-se bárbaro aos olhos da grande maioria da população por causa dos fracos empresários, e da falência do espectáculo como um todo, que não deixou de ser popular mas deixou de interessar ao povo.
Está na cara de qualquer republicano que matar o toiro na arena ou castigá-lo com os arpões das bandarilhas é coisa doutros séculos. Qualquer pobre de espírito que vá ver uma tourada percebe que não há leis a sério para cumprir dentro e fora de tábuas; que cada artista faz o que quer; que o director de corrida, vulgo “inteligente”, é uma figura de faz de conta, não manda nada nem vai querer mandar porque no outro dia é substituído por outro tão inteligente como ele mas mais permissivo aos abusos.
Os toureiros portugueses, na grande maioria, são gente boa mas militam nos partidos monárquicos e na cabeça deles, por exemplo, as mulheres jamais podem ter, em sociedade, os mesmos direitos dos homens, nem sequer como artistas da Festa: são os marialvas dos novos tempos; grandes artistas, sem dúvida, mas convencidos que são os herdeiros de um mundo que se mantém igual àquele que os avós viveram.
Não quero ser injusto com os artistas, principalmente com alguns que conheço, mas há muitos cuja mentalidade não é mais tolerante que a dos anti-taurinos, essa gente igualmente boa que de forma pornográfica se deixa enjaular a 70 metros da entrada da praça de toiros do Campo Pequeno, em dia ou noite de corrida. Se tivesse que protestar contra alguma coisa, enjaulado daquela forma, matava-me de vergonha.
Tourear é uma arte grande, corajosa, para poucos privilegiados. A arte de tourear, e de pegar o touro de caras, ou de cernelha, podia ser Património Mundial da Humanidade se o toiro fosse toureado sem sangue, os toureiros fossem admoestados em público quando são inábeis e violentos com o animal e o director de corrida tivesse autoridade para mandar prender ou expulsar da praça os artistas que infringissem as regras do espectáculo. JAE

quarta-feira, 24 de julho de 2019

De quantas mulheres é que um homem precisa para viver?

Uma semana cheia de encontros com algumas das mulheres importantes da minha vida, como é o caso de Maria de Medeiros, Isabel Huppert, Helena Ortiz e Natércia Freire, que habitam o peito das minhas emoções.

Não sei se tenho o direito de escrever aqui sobre teatro e livros e artistas que me interessam, fascinam ou admiro simplesmente. Não me apetece escrever sobre os problemas da minha comunidade; melhor dito: não me apetece publicar porque material não me falta. 
Esta semana que passou usei todos os meus conhecimentos pessoais e profissionais para ir ver Isabel Huppert, no CCB, numa peça de teatro a solo no papel de Maria Stuart. Meti ao barulho, para conseguir um dos mil bilhetes para as duas representações, pessoas supostamente influentes. Não consegui. Os bilhetes no CCB para determinados espectáculos são à conta para determinadas pessoas. Já a tentativa para ir ver Maria de Medeiros em Almada resolveu-se com um telefonema para o Carlos Galvão e uma viagem de mota às seis da tarde para não ficar preso no trânsito da ponte 25 de Abril (o tempo ganho na viagem permitiu-me ficar meia hora à conversa com o maestro Vitorino de Almeida que me surpreendeu com algumas partilhas da sua longa vida).
Esta semana fui à estante recuperar dois livros de Elfried Jelinek depois de acabar de ler Leila Slimani e o seu “No Jardim do Ogre”. Ando a reler a poesia de Helena Ortiz, que morreu há meses e era minha amiga, e a reler outra vez Camille Paglia e o seu último livro “Mulheres Livres Homens Livres”.
Gosto de mulheres que me espicaçam a inteligência e me desafiam a dormir menos, e a trabalhar pouco, para ter tempo de ler, ver cinema, ir ao teatro e viajar. Não preciso de conhecer pessoalmente ou apalpar os meus artistas preferidos para sentir; já assisti a muitas estreias sem me meter com os autores/artistas embora tivesse boas razões para isso. O que eu gosto é de experimentar sentimentos e emoções. E foi isso que consegui outra vez com a Maria de Medeiros, em Almada. Ela em cima do palco e eu numa coxia do teatro a vê-la representar uma peça em francês, atrapalhado para seguir a sua interpretação e ao mesmo tempo não perder nada da tradução. Guardo duas recordações da actriz quando era uma menina, e eu um rapaz, e ainda hoje quando vou ao teatro ando à procura da inocência desse tempo. Desta vez deu para perceber melhor que vão chegando os dias em que tudo se desvanece, a memória cansa-se, ou desilude-se, ou muda de planeta.
Queria ver a Isabel Huppert  (IH) para me certificar ainda melhor de que há certas alturas da vida em que a beleza também é inútil, e a alegria não serve para nada, e que há amores ociosos, e que, às vezes, um homem precisa tanto da arte para viver como um peixe precisa de uma bicicleta. Mesmo assim assinalei o dia em casa, na noite do primeiro espectáculo da IH, abrindo uma monografia da Françoise Gilot, que trouxe recentemente de Paris, onde fui ver uma exposição da Dora Maar (ironia do destino: Françoise Gilot roubou Picasso a Dora Maar quando tinha 24 anos e o pintor 60 e tem um livro sobre a relação com ele e com Matisse, entre outros, que é uma obra-prima para os amantes da literatura autobiográfica que admiram Picasso, como é o meu caso).
Falta contar que a presença da IH em Portugal fez-me voltar a procurar a biografia de Maria Stuart, a rainha da Escócia, que foi decapitada em 1587, aos 44 anos, e que esteve presa durante 18 anos em vários castelos e mansões de Inglaterra por ordem de Isabel I; e que assisti na passada quinta-feira, na Biblioteca Nacional, ao primeiro acto da festa do centenário de nascimento da escritora Natércia Freire, que escreveu um dia que “Amor e Livre” são palavras desavindas, embora toda a sua obra seja um hino ao amor e à liberdade. JAE

sexta-feira, 12 de julho de 2019

Mação é um exemplo para o país. A Chamusca é um caso de estudo.

Os autarcas de Mação conseguiram, sozinhos, entalar o Governo do país que acha que, no interior, somos todos raposas em extinção. A Chamusca tem um presidente de câmara que só pode ter saído do fundo de um poço…sem água.

Mesmo quando a Justiça funciona, como foi o caso recente em Mação, que viu reconhecido pelo Tribunal de Leiria o seu direito aos apoios para a calamidade dos fogos, ficam sempre em evidência os espaços vazios entre os factos e os sentimentos, as dilacerações que cada indivíduo e cada grupo de uma comunidade guarda no seu íntimo. Com esta decisão do tribunal, que faz lembrar mais uma vez a história do homem que mordeu o cão, o interior, as suas gentes e os seus dirigentes, voltaram a ter honras de horário nobre nas notícias. E acima de tudo percebem que o mundo é injusto e todos os governos são injustos mas há sempre forma de os combater quando somos bons lutadores. Nem o facto de ser uma luta contra uma decisão brutal e atentatória dos direitos dos mais fracos fez com que os autarcas da região ribatejana se unissem e pedissem em uníssono, junto do Governo, justiça, lisura, competência e respeito pelos infortunados.
Sou contra a regionalização no papel, feita e desenhada em Lisboa pelos mesmos de sempre, exactamente por situações como esta de Mação. Se a pobreza a que o concelho e as suas gentes estão sujeitos, por causa da calamidade dos fogos, dependesse da solidariedade pública e da reivindicação dos autarcas da comunidade urbana do Médio Tejo, era desgraça pela certa. Estas são as melhores alturas para medir a capacidade dos dirigentes, o poder de iniciativa dos burocratas que os acompanham na gestão do Poder (leia-se aqui os nomes de alguns dirigentes da Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, que são lugares de grande responsabilidade na gestão dos territórios, que muitas vezes acabam entregues a políticos que só querem um emprego e trabalho fácil, como acho que é o caso).
Se numa situação como a que Mação vive, e vai continuar a viver, os autarcas não se mobilizaram junto do Governo a pedirem justiça, e fizeram a autarquia de Mação percorrer o caminho das pedras, em que século é que se vão entender para gerirem um território tão diferenciado e com tantos problemas como o nosso, do Minho ao Algarve?

Não largo o assunto dos autarcas, e das suas competências e responsabilidades, para deixar registo do trabalho infantil que o presidente da Câmara da Chamusca está a fazer na gestão da sua autarquia. Admito, pelas evidências da sua gestão, que o autarca possa estar doente e não tenha capacidade sequer para gerir a sua secretária.
A forma como ele compra património, e faz o negócio em público, é de bradar aos céus. A entrevista que publicamos nesta edição com o vereador Manuel Romão, a quem Paulo Queimado comprou uma casa, vai ficar na história porque mostra o nível da capacidade intelectual, política e pessoal de Paulo Queimado.
O autarca leva seis anos de trabalho a gerir um orçamento anual de 12 milhões de euros como se gere uma mercearia de aldeia; e a ser o principal guardião de um património também de muitos milhões que não é só cimento, floresta e alcatrão, mas também cultura, tradição, memória, legado, honestidade, desenvolvimento e progresso. Um território entregue a políticos como Paulo Queimado é um território condenado à morte lenta. Como se tem visto nos últimos tempos; como se vê e se sabe todos os dias, principalmente aqueles que têm que gramar diariamente as suas fuças, e sofrem na pele a desvalorização do seu melhor património pessoal e colectivo. JAE

quinta-feira, 4 de julho de 2019

Que título davas a esta crónica ó tu que fumas? *

Estamos em Santarém, perto de Lisboa o suficiente para irmos em coluna militar destronar um regime fascista, e não estamos perto o suficiente para fazermos parte de um território onde deixem de mandar os ódios políticos e as invejas.

Vivo e trabalho numa região cheia de gente boa e de respeito. O meu território dá pão, fruta e vinho, como muitos poucos territórios no mundo; posso trabalhar em Lisboa e ir dormir todos os dias a Santarém, ou vice-versa, que não perco qualidade de vida. Foi por aqui que nasceram ou morreram homens como José Saramago e Pedro Álvares Cabral, só para dar dois exemplos. O Tejo é uma realidade que diferencia os campos da Lezíria e um rio que nasce em Espanha mas é em território português que a qualidade dos aquíferos lhe dá uma riqueza e excelência que não tem paralelo em muitos rios de outros países da Europa.
Não me faltam adjectivos para valorizar a terra onde nasci. Não me faltam palavras para dizer ao mundo que o meu território é mágico; e sou um privilegiado por ter nascido, viver e trabalhar aqui.
O facto de ser jornalista de profissão faz com que não aproveite bem esta bênção. Não me conformo com a postura arrogante e a sobranceria dos líderes políticos e empresariais da minha terra e da minha região; nesta altura não vejo ninguém a nível regional que mereça verdadeira admiração pelo trabalho que lhe compete fazer em nome do território.
Com todo o respeito pelas galinhas, que nos dão os ovos e são o melhor petisco no espeto, só vejo galináceos à minha frente a disputarem pequenos poderes que, hoje, como há 40 anos, só dividem em vez de unirem. Algumas associações lideres, que deviam ser o exemplo, em vez de premiarem os melhores dão as mãos aos falhados frustrando as expectativas de quem confia neles por gerirem pessoas e territórios. Os políticos dos concelhos mais ricos não conseguem uma agenda colectiva que não seja para as reuniões obrigatórias nas comunidades intermunicipais. Não há mérito colectivo no Ribatejo que seja notícia nacional salvo uma ou outra excepção.
Em Santarém dizemos alto e bom som que somos mil vezes melhor que os alentejanos, mas vamos a Évora, que tem um território e uma população mais pequena que a nossa, e encontramos uma diferença que nos envergonha. E Évora não tem rio, nem Lisboa a 60 quilómetros por auto-estrada, nem a Linha de Sintra quase à mesma distância de Lisboa, nem Leiria ou a Nazaré ou o Santuário de Fátima a pouco mais de meia hora de carro.
O Turismo do Ribatejo e do Alentejo entrega todos os anos prémios aos melhores espaços turísticos. Candidatam-se duzentas empresas do Alentejo e 20 do Ribatejo. Alguém percebe esta apatia? Santarém foi a terra de onde saiu a coluna militar de Salgueiro Maia para reconquistar a liberdade em Portugal em 25 de Abril de 1974. Alguém consegue perceber esta anomalia portuguesa e ribatejana? Estamos em Santarém, perto de Lisboa o suficiente para irmos em coluna militar destronar um regime fascista, e não estamos perto o suficiente para fazermos parte de um território onde deixem de mandar os ódios políticos, as invejas, os punhetas que têm lugares de responsabilidade e passam a vida a fingir que a evolução do território não é com eles nem com as suas associações e as suas empresas?
Juro que ainda não perdi a paciência nem a esperança. Estou por aqui todos os dias a dar conta também de alguns exemplos que me fazem ter esperança no futuro e em algumas pessoas da minha terra e da minha região com quem vou também partilhando o meu descontentamento: a desilusão por ter que baixar diariamente a minha fasquia quando o meu gozo maior é acordar todos os dias com a ilusão que trabalho e vivo no melhor território do mundo com as melhores pessoas do mundo. JAE

* Título roubado à memória de uma pergunta
que me fizeram há 30 anos e para a qual não tive resposta

quarta-feira, 26 de junho de 2019

Ourém e o seu mundo que não é só Fátima

Crónica para falar de empresários e do mundo sacana e injusto em que vivemos que premeia mais os audazes e os bonitos que os fortes e mal encarados.

O mundo em que vivemos é cada vez mais interessante e inovador mas repete até quase ao ridículo os defeitos dos tempos mais antigos. Dou um exemplo; em Ourém foi inaugurado um novo espaço de excelência para incubação de novas empresas. Muitas delas serão virtuais como já acontece em Santarém, mas não vou discutir aqui e agora a importância da presença de empresas virtuais em espaços considerados de grande importância para renovação do tecido empresarial da região.
Quem organizou a cerimónia de inauguração escolheu para sentar na primeira fila, e para subir ao palco, um jovem de 23 anos que criou um negócio de venda de smartphones em segunda mão e que nesta altura já tem loja em Lisboa e Madrid. Tudo começou aos 16 anos na casa de jantar dos pais mas depois foi para Lisboa e foi lá que começou o seu negócio. Não me interessa se vai ser o novo Belmiro de Azevedo dos empresários portugueses. O jovem parece uma excelente pessoa e deve ser um ouriense do coração. O que acho é que um empresário de Ourém, a viver e a trabalhar em Ourém, com dois ou mais colaboradores, com uma oficina de electricista ou de mecânica, ou serralharia, etc, etc, tinha muito mais direito a palco que este jovem candidato a milionário.
Quem é que liga ao empresário da nossa terra que ainda mantém uma actividade quase em extinção que tanta falta nos faz e nos obriga a mandar os electrodomésticos avariados para as lixeiras? E quem é que promove os donos das oficinas, das muitas oficinas que nos fazem falta para termos uma vida de qualidade longe dos grandes centros? O que é que interessa para as pessoas de Ourém, que não querem sair de lá por amor à terra e que desenvolvem lá a sua actividade empresarial, o exemplo do jovem empresário de 23 anos que abriu lojas de venda de telemóveis em Lisboa e Madrid? Não sabemos todos que o dinheiro para estes investimentos não tem fronteiras e que não aparece debaixo das pedras da calçada?
O poder político e empresarial, regra geral, vive e promove-se de vaidades e exemplos de pedantismo que não são deste tempo e do mundo em que vivemos. Um grupo internacional empresarial de sucesso pede para abrir o centro das nossas cidades um estabelecimento de fastfood e os autarcas abrem as pernas e só não lhes dão o dinheiro de mão beijada, mais o terreno e a isenção de impostos. Um empresário local tem a mesma ou outra actividade, sustenta os mesmos postos de trabalho, exactamente no centro da mesma cidade, e é literalmente ignorado porque só está a fazer aquilo que lhe compete. E no caso de querer fazer obras, ou de vedar um simples terreno, ou partir uma parede, não há arquitecto ou engenheiro na autarquia que não prometa fazer-lhe a folha.
Ourém é o concelho mais importante do distrito de Santarém e um dos mais importantes do país. Tem seis milhões de turistas por ano. É um território único atravessado por três auto-estradas embora ainda tenha muitos caminhos de cabras e o saneamento básico chegue apenas a metade do território. A cerimónia do dia da cidade de Ourém, que se comemorou no feriado de 20 de Junho, foi uma festa bonita com a presença da grande maioria das forças vivas do concelho. Mas há muita coisa para fazer pelo concelho, e pela região, que Ourém tem a obrigação de liderar. Com autarcas destemidos e empreendedores mas também com os empresários locais que são o espelho em que nos olhamos todos os dias e, regra geral, gostamos do que vemos. JAE

quinta-feira, 13 de junho de 2019

A Feira da Agricultura podia ser um exemplo mas não é

Está aí outra Feira do Ribatejo e a única diferença dos anos anteriores é o aumento dos parques de estacionamento à volta do CNEMA.

Todos os bocadinhos do dia que consigo guardar para mim depois de largar o trabalho são para ir apanhar ameixas, nêsperas e laranjas, e regar as árvores de fruto e olhar o Tejo depois de atravessar uma pequena seara de milho.
Neste último fim-de-semana não fiz quase nada e os dias passaram a correr. Quase que não li jornais e mais uma vez não fui à Feira da Agricultura; nem à festa do Bodo à Azinhaga; nem à FICOR, em Coruche, uma feira a que não deveria faltar por ser das mais importantes para o mundo rural em que ainda vivo e gostava de continuar a viver mais uns tempos.
Em Coruche ninguém paga para entrar na festa; nem na Azinhaga; a Feira da Agricultura em Santarém é nacional mas eu preferia que fosse local, a exemplo da feira de S. Martinho que faz da Golegã a capital do país durante meia dúzia de dias e deixa a vila num sobressalto desgraçado para bem de quase todos.
É por causa dos cavalos que a Golegã não tem casas a cair e as que existem para venda são poucas e caras. A meia dúzia de quilómetros, para norte, sul, este e oeste, as casas à venda são às centenas, e o número de habitações degradadas e abandonadas é um espelho dos maus tempos que se vivem no interior do Ribatejo a exemplo do que já acontece há muitos anos no norte do país e no Alentejo profundo.
Até há poucos anos Abrantes era a referência a norte de um território em perigo de desertificação e massa crítica. Agora fala-se abertamente em Santarém do que dantes se murmurava de Abrantes. As casas senhoriais na Chamusca, que fica a meio caminho, estão à venda e ninguém as quer comprar. Por isso é que a Feira de S. Martinho é um exemplo para a dinamização de uma terra e de um território. A Feira da Agricultura, da forma que é organizada, não passa de uma feira de espectáculos e de artesanato, única no país, mas que passa ao lado da economia da cidade e da região e dos seus interesses mais prementes.
Há um novo presidente no CNEMA mas os que mandam são os mesmos dos últimos 20 anos. Estão ali para ganharem dinheiro em nome da CAP, uma associação que já foi de agricultores mas hoje é uma rede de negócios. A Feira da Agricultura é uma das suas fontes de receita com o que pagam os expositores, os patrocinadores e os visitantes. Tudo em nome de uma associação de agricultores que se está marimbando para o tecido económico do concelho e da região.
É verdade que a CAP não é uma Santa Casa nem uma associação de benfeitores. Mas há limites para a exploração de uma Feira que já foi a cara da cidade e o orgulho dos escalabitanos. Nesta altura, pelo que é do conhecimento público, os escalabitanos são os primeiros a ignorarem a Feira e a criticarem a organização por não trazer nada de novo e significativo à cidade e à sua vida cultural e económica (com excepção do aumento significativo de parques de estacionamento para serem usados uma vez por ano). JAE

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Tancos e os roubos das nossas armas

O roubo das armas da Base Militar de Tancos é o espelho do país em que vivemos e dos dirigentes políticos que se esquecem do interior.

O roubo das armas da Base Militar de Tancos fez da Chamusca uma terra de referência no mapa de Portugal. Pelas piores razões. Ainda dura uma das histórias mais tristes das nossas instituições militares e políticas a braços com velhos hábitos e costumes herdados de um regime caduco como era o de Salazar, e depois de um outro, democrata mas nem sempre, que nasceu com o 25 de Abril de 1974.
Tenho a certeza que António Costa ou Marcelo Rebelo de Sousa, só para falar das duas maiores figuras da política nacional, se envergonham desta situação caricata do roubo das armas e do circo que se montou para que, daqui a uns anos, ninguém seja responsabilizado e toda a gente lave as mãos como Pilatos. Mas não nos devemos conformar com a vergonha nacional de termos umas Forças Armadas que custam milhões de euros ao Estado e servem apenas para compor o ramalhete de um regime democrático que tem dificuldade em reformar-se.
Na passada semana publicámos neste jornal uma reportagem que prova à saciedade que estamos entregues à bicharada em termos de polícias e guardas. Não há efectivos da GNR nem da PSP para acudirem a acidentes, para fazerem patrulha à noite, para imporem respeito numa região onde se assaltam bancos e lojas com a facilidade com que se roubam melões nos campos da Lezíria.
O assalto à Caixa Agrícola da Chamusca é um exemplo que não pode ser esquecido. Outros assaltos praticados na mesma data já foram arquivados pelas autoridades por falta de novos elementos e porque o trabalho aperta e há coisas mais importantes para resolver e investigar.
Os bandos que organizam estes assaltos continuam por aí. Um dia destes voltam à carga e fazem nova razia aos estabelecimentos comerciais, liquidando a actividade e empobrecendo o meio já que nada se recupera como antigamente. No interior morre um velho e com ele a memória de um tempo. O mesmo se passa com determinadas actividades comerciais; se os gatunos a levam à falência dificilmente voltam a ser úteis na comunidade onde tinham a sua actividade.
Volto à segurança e à falta de meios das forças policiais que vivem em quartéis miseráveis, têm como principal função a caça à multa, são escassos para um território tão grande, e não servem para aquilo que deveriam servir, acima de tudo, garantir segurança, prevenir e proteger.
Enquanto isso nos quartéis militares vivem muitos milhares de homens à custa do orçamento sem qualquer utilidade para a sociedade. Gente que se prepara todos os dias, em tempo de paz, para defenderem com armas a Pátria portuguesa, que não inclui a defesa das populações e do território no que mais interessa, nomeadamente os fogos, os roubos, os crimes relacionados com a poluição, o vandalismo e o terrorismo nas suas mais diversas facetas.
Na Chamusca, em Abrantes e no Sardoal, em Coruche e em Alcanena não há autoridades policiais que possam defender o território daquilo que também o leva à falência. Entretanto os soldados do exército, e uma boa parte dos efectivos da GNR e da PSP, servem os clubes de futebol e os governantes em geral como se Portugal fosse um Principado e os homens que o governam se sentissem todos da mesma família de sangue. JAE

quarta-feira, 29 de maio de 2019

Deus, a Igreja e as mãos do diabo

Um padre ralha do cima do altar contra a pobreza e o Estado corrupto, mas depois reza umas missas pelos que morreram nos últimos dias e recebe os euros com as mãos do Diabo que foge aos impostos.

Na passada semana fui ver numa igreja património nacional um espectáculo de teatro. Como não consegui comprar bilhetes na internet fui mais cedo e comprei bilhete na entrada da igreja. O salvo conduto em troca de 15 euros foi um programa do espectáculo. Nem bilhetes nem factura e muito menos conversa já que a fila era grande e a bilheteira era improvisada.
A representação foi gira mas o espectáculo foi fraco. A igreja estava a abarrotar, o que quer dizer que a ideia da companhia de teatro foi boa e lucrativa.
O que não percebo é como nas igrejas tudo é permitido. Não há grupo de teatro neste país que não seja obrigado a ter uma bilheteira organizada. Vamos ver um espectáculo a uma igreja e a caixa registadora é uma caixa de papelão sem fundo.
Mas há mais: a Igreja em Portugal é um Estado à parte. Em quase tudo. Os padres das nossas freguesias são verdadeiros chefes de finanças. A troco de euros confessam, baptizam, casam, encomendam as nossas almas moribundas, rezam missas, enfim, a Igreja só não tem uma verdadeira Casa da Moeda para explorar os serviços que presta à comunidade. De resto é um negócio como não há outro no mundo; pelo que recebem dos baptizados, os padres passam uma factura numa folha de couve; pelo que recebem dos casamentos passam uma factura num papel pardo de jornal; pelo que recebem de todos os trabalhos religiosos os padres funcionam, pelo que sei como qualquer organização secreta que não é obrigada a cumprir a regras de um Estado de direito onde a grande maioria dos serviços paga IVA, e a grande maioria das empresas e dos portugueses que trabalham pagam impostos, sem poderem chiar quanto mais miar. Não sei nada do regime das caixas de esmolas mas gostava de saber porque imagino, só para dar um exemplo, quantos fios de ouro é que o Santuário de Fátima manda derreter para transformar o metal em “cacau”; tudo isto em nome do Senhor e da Senhora.
Não é novidade para ninguém que vivemos num mundo desigual; os grandes tubarões do nosso regime democrático almoçam todo os dias com os nossos ministros e os seus assessores. Alguns deles já foram governantes. Outros desempenham profissões como advogado ou consultor de empresas e são deputados na casa da Democracia como se vivêssemos ainda no tempo do Marquês de Pombal. O nosso Joe Berardo vai inaugurar mais dois museus pagos com dinheiro da Comunidade Europeia, para valorizar as suas colecções de arte. E no entanto tem empresas insolventes e nada é dele. José Sócrates passa pela vergonha de ter dado milhares de computadores às crianças portuguesas e o grande computador da sua vida de governante era o motorista João Perna.
Voltando à Igreja: não tenho nada contra os padres nem a organização religiosa. E admito que posso estar a tomar a nuvem por Juno em alguns casos. Mas tenho contra a sociedade injusta em que vivemos. Não aceito que um padre esteja do cimo do altar a mandar umas bocas contra a pobreza, e os políticos corruptos, e a seguir reze umas missas pelos que morreram nos últimos dias e depois receba os euros com as mãos do diabo que foge aos impostos. JAE

quinta-feira, 23 de maio de 2019

Sobre uma fotografia de Sophia de Mello Breyner Andresen


No próximo domingo somos todos Europa. Oportunidade para recordar uma foto de Sophia numa conferência única em Santarém de que resta pouca memória.

Anda por aí um burburinho por causa de uma biografia de Sophia assinada pela jornalista Isabel Nery. É a biografia ideal para quem conhece e gosta da poesia de Sophia mas que nunca se interessou pela sua vidinha. Dizem as criticas que estão lá todos os episódios que meio mundo do meio literário sabe de ginjeira e já enjoa.
Por mim vou ler como quem lê um romance porque o que me interessa em Sophia é a sua Obra escrita mas também tudo o que dela posso descortinar sobre a longa vida de viajante e admiradora dos prazeres da vida e dos seus mistérios. Por exemplo; os textos sobre o Nu na antiguidade clássica e a sua paixão pela Grécia, que nunca visitei e é o país sobre o qual mais li ao longo da minha vida com destaque para o livro “O Colosso de Maroussi” de Henry Miller.
Escrevo sobre Sophia porque esta semana voltei a encontrar uma foto de um encontro em Santarém em que compareceram meia dúzia de gatos pingados onde eu me incluía. Não encontrei o texto no jornal nem me lembro em que data foi mas sei que já escrevi algures sobre o assunto. 
Lembro-me da sua voz serena a falar e depois a declamar poesia. O que guardo mais dela foi a distância respeitosa que guardei depois de a ouvir; fui incapaz de lhe roubar duas palavras depois da conferência. A verdade é que deixei passar a grande oportunidade de lhe perguntar se era verdade que ela detestava que um dia a biografassem e contassem a sua vida como quem conta um conto e acrescenta-lhe um ponto.

Sophia é uma das mais ilustres mulheres do nosso país de Abril. Recordo-a com foto na semana em que vamos votar para as eleições europeias. Ela era uma europeísta de coração e sabia, tal como quase todos nós, que a Europa é a União de todas as vontades e virtudes democráticas. A Europa não é só poder e dinheiro. Não é só uma União em construção, com ou sem o Reino Unido; não é só uma questão de territórios e estatísticas; é uma forma de consolidarmos um território mais vasto com pessoas que respeitam os mesmos valores  da tolerância, do pluralismo, justiça, solidariedade e dos direitos humanos.
É pela Europa que viajam livremente e diariamente milhares de jovens de comboio em programas à medida dos seus ideais de vida. É na Europa que muitos milhares de estudantes de todos os países frequentam o programa Erasmus. As eleições do próximo domingo dão-nos a oportunidade de fazer ouvir a nossa voz na defesa daquilo em que acreditamos. Votar é influenciar o nosso destino comum. Domingo somos todos Europa. Para podermos viajar sem fronteiras mas também para termos a liberdade de escolher o melhor lugar do mundo para vivermos e trabalharmos e nunca mais nos sentirmos orgulhosamente sós. JAE

quinta-feira, 16 de maio de 2019

As lideranças políticas e o exemplo que vem de baixo

Por mim estou satisfeito com a evolução da democracia; tal como já escreveu, e continua a escrever, a Procuradora Maria José Morgado, há duas décadas o que aconteceu a Armando Vara era impensável.


Escrever num jornal é muito mais que escrever opiniões. Os tipos que têm um espaço para escrever, como eu tenho, podem prestar um mau serviço à comunidade se não fizerem mais nada que dar ao dedo na onda do que está na moda criticar.
Dou um exemplo; a corrupção na política que tem minado a democracia em todo o mundo. Este último exemplo com José Berardo é de bradar aos céus; mas o caminho está a fazer-se. Por mim estou satisfeito com a evolução da democracia; tal como já escreveu, e continua a escrever, a Procuradora Maria José Morgado, há duas décadas o que aconteceu a Armando Vara era impensável. E o mesmo a José Sócrates, só para citar dois exemplos; mas há mais casos e muito significativos: há duas décadas nem que a burra tossisse Ricardo Salgado caía do pedestal. E caiu com grande estrondo. E estamos todos a pagar a ousadia do ataque aos crimes económicos mas fica o exemplo que há-de dar frutos.
Portugal tem vindo, pouco a pouco, a cimentar as suas instituições e o seu regime democrático. Há muito por fazer, todos sabemos, mas a missão é de todos, e os principais deputados do regime são as pessoas que todos os dias exercem os seus direitos de cidadania. Pedro Passos Coelho e António Costa, os dois últimos chefes de Governo, são figuras que inspiram pela sua força política, carácter e capacidade de liderança. Mas a nível político e partidário eles não são o exemplo para uma ralé que domina nas lideranças locais e regionais. Basta tomar como exemplo o distrito de Santarém onde as figuras de proa dos partidos políticos são pessoas pouco comprometidas com o serviço público e os interesses da comunidade. Culpa nossa, como é evidente, que não reivindicamos e nos demitimos do dever de criticar ou colaborar e entregamos o poder a quem faz da política profissão e negócio.
Quem se der ao trabalho de ler as mensagens trocadas entre governantes e responsáveis da GALP, que andaram a oferecer bilhetes para os jogos de futebol do mundial de França, percebe como a democracia portuguesa ainda é uma criança, precisa da vigilância cívica de todos os portugas que sabem festejar a vitória da selecção portuguesa mas, também, sabem rir-se do selecionador, que diz que recebeu a certa altura do campeonato uma mensagem de Nossa Senhora de Fátima. Como se os deuses tivessem alguma coisa a ver com os resultados dos jogos dentro do campo e a justeza dos resultados finais.
Dizer que o país é uma merda por causa do que aconteceu e está a acontecer com José Berardo é justo. Mas não pode ser essa a nossa postura. Berardo acabou de chamar azêmolas aos políticos da geração de José Sócrates que entregaram o país aos especuladores, e acharam que o efeito Berlusconi em Itália era possível em Portugal, para serem, também eles, donos disto tudo. Enganaram-se e vão pagar caro, se não acontecerem reviravoltas nesta evolução conturbada da democracia e do sistema judicial. JAE

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Políticos com força na verga

Em tempo de eleições não se percebe como é que em Santarém não se berra contra o Governo por manter fechada uma estrada nacional que nos faz falta.



Nos últimos tempos tenho andado todos os dias a ver a morte nos olhos de um familiar que visito na cama de um hospital. A sensação é terrível por causa do sofrimento; o piso da unidade hospitalar onde estão muitos outros doentes nas mesmas condições é o espelho da nossa futura desgraça. É preciso sermos muito fortes, ou muito ignorantes, para aceitarmos sem condições o caminho para a falência física e mental. Não há como reclamar quando se está muito doente num hospital, seja ele público ou privado, mas é claro que morremos muito mais lentamente e com muito mais sofrimento onde o serviço é pago só pelo Estado.

Falo do assunto porque sou a favor de um Serviço Nacional de Saúde (SNS), como a maioria dos portugueses, mas também defendo com unhas e dentes a iniciativa privada e, neste caso, as parcerias com o Estado que se forem bem negociadas trazem muitas vantagens para os cidadãos e para os cofres do Estado. O Bloco de Esquerda e o PCP continuam a ver na iniciativa privada a raiz de todos os nossos problemas, quando são os empresários e as empresas que sustentam a nossa Economia, neste e noutros sectores, gerando trabalho e riqueza.

Sempre me considerei um homem de esquerda mas tenho que reconhecer que, nos dias de hoje, os partidos de direita defendem mais e com melhores argumentos a sociedade livre e democrática pela qual luto e lutarei até morrer. O Bloco, o PCP e uma certa ala do PS, querem legislar a todas as horas para que as leis coincidam com os comportamentos humanos. Para eles nós temos que ser máquinas, não podemos viver das emoções, temos que viver conformados, fiéis aos mandamentos de um Estado tutelar que nos pode esmagar a qualquer momento. A política anti Europa é o maior exemplo da mesquinhez de que vivem os partidos de esquerda em quem já votei e com quem me identifico, apesar de tudo, em algumas políticas; mas nas próximas eleições vou votar em quem luta pelo SNS mas também em quem acredita e acha que vale a pena viver integrado numa União Europeia.

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Não consigo perceber a passividade dos autarcas de Santarém depois de gastarem milhões na recuperação das barreiras da cidade. A EN 114 continua fechada prejudicando a cidade e milhares de pessoas que vivem e trabalham na região. Já lá vão cinco anos. Todos sabemos que o problema que impede a reabertura da estrada é de acção; murro na mesa, manifestação popular ou convocação das televisões e dos jornais para ridicularizar os serviços comandados por gente afecta ao Governo que vive das dificuldades que criam ao país e aos cidadãos.
Em tempo de eleições, como é o caso, chamar os bois pelos nomes tem o dobro do efeito na opinião pública, e faz a rapaziada do partido do Poder meter pernas ao caminho. Chamar incompetente ao Governo de António Costa numa altura destas, certamente que rolarão cabeças na Infraestruturas de Portugal e a estrada será reaberta. Mas onde é que andam os políticos de Santarém com força na verga? JAE

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Manual de pintura e caligrafia ribatejana

Uma viagem escrita por Florença para lembrar as tontices dos nossos autarcas e a dimensão da cabeça de alguns deles a começar na Azambuja e a acabar em Santarém.

Há um mês voltei a Florença quase 25 anos depois da minha primeira vez. Marquei a viagem no dia a seguir à noite em que acabei de reler, também muitos anos depois, o livro “Manual de Pintura e Caligrafia”, de José Saramago, uma ficção que se lê como autobiografia, o meu género literário preferido (o livro fala de Florença, como é evidente, ou de outra forma não estava aqui referenciado. E tem uma frase “assassina” sobre Santarém que um dia destes trago aqui noutra crónica). Florença é a cidade mais bem cuidada do mundo; talvez a mais bem governada; talvez a mais bem frequentada; porventura a mais extraordinária de todas as cidades do mundo por razões que me dispenso de comentar e que desafio cada leitor a descobrir.
Não há alcatrão nas ruas de Florença, cuja dimensão é maior cem vezes que a vila de Azambuja; as ruas são todas empedradas, da mesma pedra que parece ter mais de quinhentos anos como têm as pedras dos palácios.
Fico com insónias quando leio as palavras dos nossos autarcas a dizerem que vão acabar com os empedrados nos centros das suas terras para facilitarem o escoamento das águas e mais o raio que os parta, já que a ignorância e o desrespeito pelos valores da cultura e da civilização, em muito do território português, é literalmente militar.
Todos os dias da minha vida nos últimos 20 anos, mando o antigo presidente da Câmara de Santarém, Rui Barreiro, para um sítio que só eu sei, porque a renovação do denominado Largo do Seminário, onde circulo com frequência, é um aborto, tal como Rui Barreiro sempre foi politicamente a gerir a cidade enquanto mandou alguma coisa.
Já escrevi noutras alturas, em que me apetecia escrever com mais pimenta, que uma grande maioria dos nossos autarcas não viaja e quando viajam não vão em trabalho. Vão e regressam com a mesma mala de cartão; voam e aterram com a mesma cara de parvos, que também é a minha, com que saem do aeroporto de Lisboa ou do Porto. Poucos, muitos poucos, neste país de Ruis Barreiros, que trabalham uma vida inteira para o Estado e mais para quem só Deus sabe, têm noção do serviço público que lhes é confiado quando os partidos políticos os escolhem para receberem os votos dos eleitores. As cabeças de muitos deles estão ao serviço dos interesses próprios e não da comunidade. São presidentes de câmara e não estão presidentes de câmara. São assim uns analfabetos políticos, como é aquele jovem da Chamusca, que se chama Paulo Queimado, que se acha muito importante, principalmente nos dias em que consegue apertar o cinto das calças sem grande esforço.
Volto à Câmara da Azambuja e ao projecto de alcatroar o coração da vila da Azambuja. Se bem conheço Luís Sousa, o actual presidente da câmara, ele não vai levar até ao fim esta ideia maluca. Não é velho o suficiente para mandar às urtigas o amor à sua terra e não acredito que esteja a querer arranjar trabalho a uma empresa que vende alcatrão só porque ela precisa de pagar as prestações do Processo Especial de Revitalização. JAE

quinta-feira, 11 de abril de 2019

Uma classe de impostores


Temos os maiores impostores à frente de organismos públicos e privados que mandam na nossa vida e dispõem de nós como se fossemos peças de um jogo que eles jogam e arbitram ao mesmo tempo.

Portugal tem uma classe política que se descompõe nas televisões, o palco de todas as mentiras, mas que no essencial está unida em volta dos mesmos interesses. Devemos ser o único país da Europa que está sempre em campanha eleitoral. Os partidos enchem o espaço urbano de publicidade e provocam uma poluição que contraria todas as regras do bom senso. Os partidos chamados de esquerda, como é o caso do Partido Comunista e do Bloco, chegam a abusar de forma pornográfica.

Este fim-de-semana assisti em Lisboa a um seminário intitulado Sete Vidas Sete Debates sobre o futuro do jornalismo, e ouvi o mesmo de sempre: “A internet chegou para cumprir um sonho da humanidade mas também para acabar com o jornalismo tal como o conhecemos desde sempre”.
Os jornalistas que aceitam falar do assunto não sabem mais do que sabiam há uma década quando tudo começou a desmoronar-se. Por isso, quando se juntam é para adivinharmos qual deles tem o pior prognóstico; qual deles está mais perto de adivinhar em que braços desgraçados vamos cair.
Uma coisa dou como certa: os jornalistas do reino que nos orientam nestas opiniões continuam a funcionar como os políticos da Assembleia da República; eles só concebem o jornalismo a partir das secretárias das redacções em Lisboa, dos directos e dos dias de trabalho sem tréguas atrás dos políticos que governam a República, ainda que as novidades sejam sempre as mesmas, embora com outras roupagens.
Os jornais dão cada vez menos notícias e publicam cada vez mais opinião. Esta constatação generalizada não merece autocrítica nem discussão que ponha uma plateia em sentido. O Correio da Manhã, o mais temido de todos os jornais em Portugal, começa a ser elogiado, não porque escorre sangue das suas páginas mas porque é o único que cumpre a função de informar. Os outros reconhecem as suas limitações mas não dizem porque não publicam notícias e contentam-se com a opinião folclórica dos colunistas de serviço que, regra geral, são políticos, ex-políticos ou administradores/professores/gestores de empresas públicas.


“O sucesso é fruto de 10% de inspiração e 90% de transpiração”. A frase é de Thomas Edison e tem várias versões. Esta é aquela que eu gosto mais. Relembro-a para fecho desta crónica porque acho uma frase importante para modelo de vida e de trabalho; a verdade é que somos muitos a ignorar ou a inverter a máxima e o seu espírito. A maioria de nós espera tudo da inspiração e da sorte e qualquer coisinha do resultado da transpiração.
É por sermos um povo capado, incapaz de nos unirmos em órgãos de cidadania, medrosos até às canelas, que temos os maiores impostores à frente de organismos públicos e privados, que mandam na nossa vida e dispõem de nós como se fossemos peças de um jogo que eles jogam e arbitram ao mesmo tempo. JAE

quinta-feira, 28 de março de 2019

Terras sem Sombra e a Ordem dos Jornalistas

Esta semana acompanhei uma edição do Terras Sem Sombra que foi até Olivença; Registo aqui a morte de pessoas notáveis da minha terra e dou conta que defendo uma Ordem para a classe dos jornalistas


Sou a favor de uma Ordem para a classe dos jornalistas porque entendo que a auto-regulação que hoje se pratica jamais será um caminho para uma grande maioria daqueles que trabalham na profissão. Escrevo sobre o assunto porque entendo que os jornalistas portugueses deveriam ser mais cuidadosos na publicação de fotos sobre incêndios e terrorismo, entre outros actos criminosos que sacrificam vidas humanas por questões de luta política e religiosa. Todos sabemos que os crimes desta natureza são praticados por gente convencida que com os seus actos ficam para a posteridade e são exemplo a seguir. Condená-los ao anonimato era um serviço público que todos os órgãos de comunicação social tinham obrigação de prestar seguindo os velhos valores do jornalismo. 


Esta semana morreram duas figuras conhecidas da minha terra com quem conversei muitas vezes e aprendi muitas coisas. Falo da morte de Manuel José Moedas, um homem que ainda tirava o chapéu da cabeça para cumprimentar as pessoas na rua, e de Jaime Grilo, um pescador a quem ouvi contar histórias bonitas sobre a arte da pesca mas também episódios que confirmam que o leito do rio é perigoso para quem o conhece quanto mais para patos bravos que se afoitam nas suas águas.
Aproveito o espaço para lembrar a morte recente de outras pessoas importantes da minha terra que não foram notícia neste jornal mas que poderiam ter sido: Augusto Lourenço, vulgo Augusto da Bicicleta, Álvaro Agnelo, vulgo Álvaro Chané, Joaquim Arraiolos, vulgo Joaquim Burrico, Ercília Santos, vulgo Ercília dos bolos, Madalena Cardoso, vulgo Madalena do Chico Polícia, Luís Faustino, vulgo Luís Lameira, Manuel Matias, vulgo Manuel Calcanhar, Eduarda Ferreira, vulgo Eduarda Melrinho, Inácio Pestana, Domicília Barreiras e Joaquim Rafael Guita, entre muitos outros que agora não me lembro e que certamente também mereciam ser notícia no jornal da terra.


O Terras sem Sombra é um festival de cultura no Alentejo que já vai na sua 15ª edição. Tem como principal objectivo partilhar o legado cultural e natural do Alentejo, assim como dar a conhecer o que há de mais fascinante, dos centros históricos às áreas rurais, da vida selvagem às etnografias locais. A ambição da organização é projectar a região, nacional e internacionalmente, como um território de identidade ímpar que se afirma como destino de arte e natureza.
No passado fim de semana acompanhei em Olivença uma das actividades do Festival deste ano que só termina em Junho. Oportunidade para conhecer um território cheio de memórias e reencontrar o José António Falcão e a Sara grandes responsáveis pelo Festival e pelo êxito de cada iniciativa que mobiliza artistas, políticos, agentes culturais e população. JAE