quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Contra o Porte Pago marchar marchar *

O MIRANTE está a dar passos muito significativos para sair do sistema do Porte Pago. Nos últimos 2 meses mais de 90% da nossa tiragem foi feita sem os recursos aos apoios do Estado.
Com as alterações que ao longo dos últimos anos foram introduzidas nos apoios aos jornais, criou-se um clima que não dá descanso a quem gosta de investir numa empresa de comunicação social. As regras apertadas no conjunto de certas obrigações retiram margem de manobra à gestão de um jornal que vive das assinaturas e de uma prática empresarial que não tem paralelo em mais nenhuma actividade de negócio.
Com a descida da comparticipação do Estado no apoio ao Porte Pago justificam-se por parte dos empresários que fazem uma gestão dinâmica dos seus títulos a procura de meios de distribuição que não dependam só dos Correios e, acima de tudo, que não estejam presos às obrigações impostas por um incentivo que em vez de ser uma ajuda se tornou numa ameaça.
Vender com êxito jornais regionais por assinatura é um negócio para empresários com experiência; vender jornais por assinatura exige práticas comerciais agressivas ao nível dos descontos e das ofertas; exige práticas comerciais muito mais exigentes que a venda de outro qualquer produto dos milhares que circulam no mercado.
Um jornal é um produto cultural único no mundo. Renovar anualmente a assinatura de um produto cultural junto dos seus consumidores exige um grande investimento em meios humanos e tecnológicos.
Num país onde a divisão administrativa é o que todos sabemos, é uma grande aventura editar um jornal para uma região.
É fácil, ou pode ser fácil, editar mil, dois ou três mil jornais para um concelho e manter as assinaturas ao longo de várias gerações aproveitando a boleia das ajudas, ainda que mitigadas, do Estado. Para um jornal que procura furar o cerco, que se quer afirmar todos os dias ou todas as semanas como um jornal regional, procurando o nível dos jornais de referência da Europa, o empreendimento ultrapassa tudo aquilo que ainda é norma na mentalidade dos nossos governantes e também, infelizmente, na mentalidade de uma boa parte dos empresários do meio.
Trabalhar a renovação de uma assinatura de um jornal regional é cem vezes mais difícil do que trabalhar a renovação de assinatura de um jornal local.
Sobreviver no actual regime de obrigações do Porte Pago é vida apenas para os jornais parados no tempo que não investem na procura de novos públicos, que se contentam com os velhos hábitos que ainda minam a imprensa local e regional, nomeadamente a satisfação de clientelas políticas ou lobbies empresariais assim como muitas vezes o puro exercício do caciquismo travestido de jornalismo.
Ignorar as voltas que o mundo da informação deu nos últimos 20 anos, apoiar da mesma forma os empresários da imprensa regional que editam três mil jornais ou 30 mil, que empregam três pessoas ou 30, é esconder a cabeça na areia e, politicamente, fingir que estamos condenados à miséria franciscana.
Por último: renovar uma assinatura de um jornal regional ou de uma revista como a Exame, a Sábado ou a Visão, implica em muitos casos um gasto muito superior ao valor cobrado da assinatura.
Para se perceber porque é que é lucrativo fazer novas assinaturas, ou renovar velhas assinaturas com prejuízo, é preciso conhecer e perceber o mundo em que vivemos; em que o papel da comunicação social é cada vez mais importante mas também mais frágil e controlado pelo poder económico. JAE


*A propósito da proposta de modelo de avaliação da política de Incentivo à Leitura (ex-Porte Pago) apresentado pelo Governo no passado dia 19 de Fevereiro

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Em defesa de José Sócrates

O MIRANTE foi recentemente proibido por um tribunal de publicar notícias sobre um determinado assunto. Uma providência cautelar interposta por uma entidade que se diz prejudicada pelas nossas notícias teve o bom acolhimento de um tribunal e fomos proibidos de publicar assim como fomos obrigados a retirar as notícias que já tínhamos publicado na internet. É claro que recorremos da decisão e aguardamos uma última decisão do tribunal da relação.
O que me importa salientar é o barulho que por aí vai sobre asfixia democrática e o apertanço de que os jornalistas se dizem vítimas. José Sócrates não é flor que se cheire na relação com a comunicação social. É sabido que tem várias queixas em tribunal contra jornalistas por não aceitar críticas que na sua opinião lhe feriram a imagem. Está no seu direito. Saber que os jornalistas choram lágrimas de crocodilo por terem um primeiro-ministro que não diz por trás o que os jornalistas lhe dizem pela frente deveria ser uma honra para a nossa democracia. Quem não se sente não é filho de boa gente. Se Sócrates gosta de ir à luta com os jornalistas que mal é que isso tem. Paga caro o preço desse desafio mas o problema é dele.
Claro que Sócrates tem maus amigos que em vez de o ajudarem ainda lhe fazem a folha. Mas isso continua a ser problema dele.
Quem anda a cuspir para o ar e leva com o cuspo em cima é a classe jornalística. Dou-vos um exemplo; um único exemplo só para justificar esta crónica. Com a decisão do tribunal em nos proibir a publicação de notícias sobre um determinado assunto ouvi a alguns ilustres jornalistas da nossa praça o comentário de que O MIRANTE estava  a ser vítima de uma medida anticonstitucional. “Não há desde o 25 de Abril medida tão discriminatória praticada contra um órgão de comunicação social como esta relacionada com o assunto que esteve na origem da tal providência cautelar”, disseram-me alguns jornalistas com grandes responsabilidades em redacções de jornais ditos de referência. Sabem quantos jornais já falaram no assunto? Quantos jornalistas de vários jornais já meteram este assunto na gaveta? Quantos colunistas da nossa praça já se indignaram com a mordaça que calou a redacção de O MIRANTE? Não digo porque tenho vergonha de pertencer a esta classe de jornalistas portugueses que andam por aí a fazer figuras de primas donas como se vivessem numa redoma. Na generalidade, e falo só dos que têm nome na nossa praça, são piores que José Sócrates no trato e muito piores no que respeita ao que é essencial; o carácter e a solidariedade. Para eles o mundo começa à entrada da porta da redacção dos jornais onde trabalham e acaba na defesa dos seus interesses e dos patrões que lhes pagam o vencimento. O resto é matilha. O resto é esterco. Pouco importa que no país real os jornalistas ardam em lume brando se na patusca Lisboa comem todos do mesmo tacho ainda que a comida azede de vez em quando. JAE

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

De Vila Franca de Xira a Nurenberga na Alemanha


Há um pequeno restaurante no centro comercial de Vila Franca de Xira onde vou, quando posso, comer uma sopa e um bitoque. As batatas fritas são as melhores do mundo. Não há restaurante de luxo ali por perto que consiga pôr-me no prato umas batatas fritas tão saborosas.
O senhor que atende na mesa é simpático e a comida não é cara. Há uns tempos disse-lhe que precisava de comprar espaço publicitário num jornal da terra e perguntei-lhe em que jornal é que ele me aconselhava a investir.
Resposta quase pronta: no Vida Ribatejana. Dei uma volta à conversa, falamos sobre outros jornais, e como ele não se descosia a falar de O MIRANTE fui directo ao assunto. Também já me aconselharam O MIRANTE.
O que é que acha?
Bom, é um grande jornal mas é mais dedicado aos concelhos vizinhos de Azambuja e Benavente, rematou.
Depois desta conversa já voltei à mesa do pequeno restaurante mais duas vezes.
As batatas fritas continuam saborosas e o atendimento excepcional. A toalha de mesa é de papel pardo, as mesas e as cadeiras são de plástico e o lugar do restaurante onde gosto de me sentar é de passagem. Por causa das batatas fritas continuo a achar que aquele é o melhor lugar do mundo para comer uma refeição rápida. Na última vez que lá me sentei vi passar duas pessoas com O MIRANTE debaixo do braço. E disse para comigo: o pessoal de Azambuja e de Benavente anda muito por Vila Franca de Xira.


Tenho um primo chamado João Emídio que é um dos melhores, senão o melhor, da família paterna. Um dia destes estive a ouvir contar sobre as suas razões que já têm sessenta anos e quatro bypass. Aventuras de vida que o levaram a correr mundo depois de se despedir da fábrica de tomate da Chamusca que, dantes, dava emprego a meia vila.
O João tem um neto quase com a idade do meu filho. Conta ele que o miúdo vive perto de Nuremberga, na Alemanha, com os pais, e anda numa escola pública das melhores. O currículo escolar este ano já incluiu uma semana como “professor” de alunos do ensino básico, uma semana como “cozinheiro” num restaurante da cidade e outra como “guarda-florestal” do parque ambiental da região.
O meu filho Bernardo está “parado” este ano a repetir uma disciplina do 12º ano embora o ano passado tenha sido um aluno com média de quinze. Se Portugal tem um ensino público e os professores são uns santinhos e não sabem nada disto então eu sou um marciano. E se estes tipos que nos governam, e os outros que nos governaram, viajam tanto e não vêem mais do que auto-estradas, e não visitam mais que bordéis e casinos das cidades dos países da Europa por onde viajam, então eu quero sair deste filme o mais rápido possível. Quem sabe ainda a tempo de emigrar.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Orlando Raimundo


O livro que fotocopiei mais vezes ao longo da minha vida é da autoria de Alberto Dines e tem o título de “O Papel de Jornal”. Não está publicado em Portugal. Tem uma dúzia de páginas sobre as regras básicas da profissão de jornalista, em jeito de conselhos, que fazem do livro um verdadeiro tratado sobre a profissão.
O livro que li mais vezes tem como título “Cidade do Homem: New York” e é de um poeta espanhol chamado José Maria Fonollosa. Interessa-me aquela poesia sempre a renovar-se a cada leitura. E a ideia de que o escritor viveu um pouco daquela vida maldita que transpira nas suas palavras ajuda a fazer deste livro um dos meus preferidos e o que levaria para uma ilha deserta.
O livro mais barato que comprei até hoje foi um título de Baptista-Bastos numa edição da Asa. Baptista-Bastos é um dos meus escritores preferidos. Leio-o sempre como um clássico. Um escritor que eu já encontrei na minha adolescência e sempre imaginei como um dos descobridores da língua portuguesa. Os seus livros, que são muitos, usam as palavras que toda a gente usa para amar, para comunicar o que se vive e o que se sente, mas de uma forma admirável, que exige um leitor culto, inteligente, capaz de apreciar a sobriedade que parece excesso, a rendição serena e inteligente perante o universo e a condição humana. “As Bicicletas em Setembro” é o seu último romance. “Para onde vão os pássaros quando morrem”, “tínhamos-lhe perguntado” (: ) “Vão para onde morre o mar”, respondeu”. Este é um daqueles livros que se devia oferecer a todas as pessoas que ainda fazem anos e merecem uma boa lembrança.
O livro que ofereci mais vezes é da autoria do jornalista Orlando Raimundo e é um dos livros obrigatórios para todos aqueles que escolhem a profissão de jornalista. Há mais de 20 anos convidei Orlando Raimundo para um jantar de aniversário de O MIRANTE na altura em que ele era uma das maiores referências da ficha técnica do semanário “Expresso”. A uma carta simples e simpática que lhe escrevemos a pedir a sua comparência respondeu com um telefonema a dizer que podíamos contar com ele.
Ao longo destas últimas duas décadas encontramo-nos por aí uma dúzia de vezes. Sempre em trabalho e com o tempo contado.
Orlando Raimundo reformou-se do jornalismo profissional e agora dedica-se ao ensino e a uma pequena empresa que criou com alguns jovens jornalistas.
No passado dia 15 de Janeiro fui apresentar na Bolsa de Turismo de Lisboa um livro da sua autoria editado pela Câmara Municipal de Vila Franca de Xira. Foi a minha oportunidade de retribuir com tempo, admiração e estima aquilo que Orlando Raimundo nos deu há vinte anos e que lhe pagamos na altura com um simples obrigado.


Não há justiça no mundo para os meninos de Foros de Salvaterra que continuam a pagar a factura de viverem num país que não sabe estimar as suas crianças. O verniz das unhas da senhora secretária de Estado Idália Moniz é vermelho da cor das lágrimas das crianças desprotegidas.