quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Um recado para Sócrates


A verdade é que eu não vivo numa redoma de vidro. Estou aqui pela cidade todo o dia e, muitas vezes, boa parte da noite, a ver com os meus próprios olhos e a sentir com o coração apertado a pobreza e a miséria instalada.Este artigo podia ter sido encomendado1. Porque já passou uma eternidade depois das mudanças políticas em Santarém e, aparentemente, continua tudo na mesma. E é preciso falar do que cheira mal e não é o Alviela. Do que, em Santarém, é velho e salazarento e não são alguns dos antigos frequentadores do Café Central.
Ando a lutar comigo mesmo há meses para não gastar tinta a falar dos políticos. E, em vez de me indignar com esta gente pobre que nos desgoverna, agarrar na caneta e escrever versos de amor à minha mulher e aos meus filhos.
Depois da vitória política de Francisco Moita Flores confesso que comecei a dormir melhor. Sabia, juntamente com muitos outros munícipes e contribuintes, que não tínhamos que esperar pelas decisões dos tribunais para que a autarquia pagasse o que nos devia. E isso já aconteceu em grande parte. Depois da vitória de Moita Flores sabia que iam aparecer projectos revolucionários para esta cidade que prometem mudar o seu rosto de forma radical. Depois da chegada de Moita Flores ao poder autárquico escalabitano sabia que Santarém ia começar a ter uma visibilidade mediática, pela positiva, como nunca teve antes e depois do 25 de Abril.
A mudança do rosto da cidade, de forma que se pareça com uma cidade do século XXI, ás portas de Lisboa, é um imperativo não é a tradução à letra de um hino partidário seja ele do PS ou do PSD.
Nos últimos anos a autarquia escalabitana foi governada por gente politicamente incompetente, que geria com os suspensórios das calças numa mão para ficar com a outra livre para cometer os maiores disparates na relação com os munícipes, fossem eles agentes económicos, culturais ou simples e humildes cidadãos anónimos. Quem um dia escrever a história de Santarém perceberá melhor a pobreza de espírito das pessoas que nos governaram nos últimos anos. Saberá dar o devido valor àqueles que, como eu, insistem em destapar a panela que continua a esconder a caldeirada azeda que ainda alimenta os políticos do PS que perderam as eleições em Santarém.
Por que a politica é uma disciplina da cultura, e eu considero-me um homem de cultura, não ficaria bem comigo mesmo se não fizesse justiça a alguns socialistas do concelho que me parecem pessoas de bons princípios e bons costumes. E porque a verdade tem que ser clara como a água não considero que, em matéria politica, os homens do PSD sejam melhores que os do PS. Há de tudo como na loja de ferragens. Mas a questão, aqui e agora, é outra.
Santarém conseguiu eleger um presidente de câmara que deixou a sua vida universitária, a sua vida de escritor, de homem de cultura, de figura reconhecida a nível nacional, para dedicar o seu tempo e saber a esta cidade moribunda e endividada até ao último cêntimo.
Com o PS igual ao que era dantes, deixando que os anteriores responsáveis pela queda do partido em Santarém façam uma oposição de política de terra queimada, boicotando tudo o que mexe à sua volta, com o PS igual ao que era dantes fazendo-se representar nessas votações e decisões pelos mesmos trastes e incompetentes políticos de há dois anos atrás, então não há outra conclusão a tirar: o Partido Socialista de José Sócrates não é o mesmo em todo o território nacional. E alguém com coragem dentro do partido tem que lhe deixar este recado por baixo da porta. Para que o Partido Socialista não perca a identidade na cidade das Portas do Sol. Na terra de José Niza, de Joaquim Veríssimo Serrão, de Mário Viegas, de Bernardo Santareno, de Salgueiro Maia e de tantos outros nomes ilustres da nossa história recente que continuam a ser referências fora de portas independentemente de quem governa os destinos do concelho.



1 Este artigo podia ter sido encomendado pelos empresários que ainda não conseguiram receber as dívidas da autarquia e correm o risco de perderem as suas empresas. Pelos munícipes que continuam a sentir-se enganados pelos socialistas que agora votam contra o que eles próprios defenderam no outro mandato. Pelos munícipes anónimos que exigem mudanças efectivas na relação da autarquia com as juntas de freguesia, com as colectividades, com os munícipes anónimos. E a lista podia ser mais extensa se não fosse a falta de espaço.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Os jornalistas são uns tansos

A ideia de que os jornais e os jornalistas são o quarto poder é uma treta. Pelo menos em Portugal. Talvez sejam na Alemanha, na Inglaterra, na América do Norte ou em França. E até na vizinha Espanha. Em Portugal os jornais, na sua esmagadora maioria, ainda são uma trampa. Uma trampa mole que não aquece nem arrefece a vida do país. Repare-se como os jornais lutam contra a falta de investimento publicitário que em grande parte lhes é roubado pelos piratas que enchem de publicidade as nossa ruas, avenidas e rotundas. Este negócio da publicidade selvagem, que em Portugal tem a protecção de todos os poderes, incluindo o dos jornalistas, está ao nível dos países do terceiro mundo como é o caso da Argentina e da Venezuela só para citar dois exemplos em que os casos são verdadeiramente pornográficos.
A independência dos jornais não depende só da cultura e dos interesses dos patrões da comunicação social. Depende sobretudo da facturação da publicidade. Um jornal bem organizado, que não precise do dinheiro das “obras públicas” para pagar os ordenados dos jornalistas é um jornal com futuro. Quantos jornalistas são capazes de discutir este caso na praça pública? Quantos jornalistas a trabalharem nos grandes órgãos da comunicação social portuguesa é que são capaz de dar um aperto de mão a um colega do sector comercial da empresa por este ter fechado um contrato milionário com um cliente que garante meia dúzia de ordenados da Redacção durante um ano? Poucos, respondo eu. E desses poucos alguns trabalham neste jornal.
Na generalidade os jornalistas são uns tansos. São profissionais da actividade jornalística, o tal quarto poder de que tanto se fala, como poderiam ser de uma empresa que vende pentes para carecas ou pó azul para a inspiração poética.

A bica no Senhor Armando


Há um pequeno café no mercado municipal da Chamusca onde regularmente vou beber um café para matar o vício. É o único lugar no mundo onde alguém consegue servir-me uma bica como eu gosto: chávena curta, escaldada e com o café bem forte. Para não deixar a informação incompleta devo dizer que das três pessoas que servem café ao balcão só a bica tirada pelo Beny é que me satisfaz. Quando não é ele a tirar o café a chávena há-de vir cheia demais, ou fria, e lá se vai o meu prazer de beber um café como eu gosto.
Este assunto não tinha importância nenhuma se eu não desse tanta importância à forma como sou atendido ao balcão de um café, seja na Chamusca, em Santarém ou em Vila Franca de Xira, lugares onde regularmente tomo entre cinco a seis bicas por dia. Quando estou bem disposto para reclamar, e depois de pedir uma italiana escaldada e de me servirem um balde de café morno, protesto e, regra geral, servem-me outra bica. Mas, na maioria das vezes, naquele espaço de tempo entre a reclamação e o momento de o novo grão correr liquido para a nova chávena, passam-se mil coisas e o segundo café ainda vem mais mal tirado que o primeiro.
Se um dia passarem pela Chamusca perguntem onde é o café do Senhor Armando e peçam uma bica ao Beny. Se gostam de um café como eu gosto sentirão a diferença. E ficam a perceber melhor como fico indignado com aquelas pessoas a quem pedimos uma italiana escaldada e depois nos servem uma balde de água choca como se nos estivessem a fazer um favor. E como uma bica mal tirada, por um/a sacana qualquer, tem assim tanta importância principalmente quando a pedimos a meio da manhã ainda o nosso dia de trabalho está a começar.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

Cuidado com os chineses

Com a abertura de inúmeras lojas nas principais cidades e vilas de Portugal os chineses estão a tomar conta da economia portuguesa e a ajudar a cavar mais fundo a sepultura do chamado comércio tradicional. Não vem aí nenhuma tempestade; vem aí uma morte anunciada para muitos comerciantes que se mantêm impávidos e serenos à espera que a conta bancária dê o berro para depois chorarem o que já não tem remédio.
Depois de constatar mais uma vez que o Natal em Portugal fala cada vez mais a língua chinesa fui alertado repetidas vezes para a notícia de que no Entroncamento corre o boato que na cave de uma dessas conhecidas lojas alguém foi vítima de um acto criminoso relacionado com o tráfico de órgãos humanos.
A gente sabe que neste mundo nada é impossível e que o crime espreita a cada esquina. Mas eu tenho a prova do boato: das cinco ou seis vezes em que diversas pessoas, bem informadas, me fizeram chegar a notícia a cidade era sempre diferente. Começou no Entroncamento mas depois já era em Torres Novas e, por último o caso tinha data recente e passava-se numa loja no centro da cidade de Santarém.
Cuidado com os chineses que não só vendem pais natal de plástico a um euro como já fabricam Ferraris e alta tecnologia roubada no dia a seguir ao seu anúncio em Nova Iorque. Mas não exageremos: o tráfico de órgãos humanos não é coisa que se faça numa dependência de uma loja do centro de uma cidade como o Entroncamento, Santarém ou Torres Novas. Apesar de tanto uma como as outras serem terras de grandes e estranhos fenómenos.

A lei da selva


Ter um cão tornou-se mais uma das muitas modas da sociedade urbana contemporânea. Não sei como é viver com um animal (ou mais) entre quatro paredes. Gostos são gostos e cada um que alimente os seus. Mas já me incomoda ver no espaço público, que é de todos, um doberman, um boxeur ou um pitbull à solta. Sem trela nem açaime. Deixando qualquer criança ou idoso à mercê do seu livre e irracional arbítrio com a cumplicidade dos seus donos. Histórias como a do menino de Salvaterra infelizmente são recorrentes. E podiam muito bem ser evitadas.Uma criança residente no concelho de Salvaterra de Magos esteve às portas da morte após ser atacada pelo cão de uns vizinhos. Um eventual descuido terá permitido ao pastor alemão fazer o que fez. Pode ter sido um azar. Mas de tragédias destas ninguém está livre nas ruas das nossas vilas e cidades. A impunidade reina nesta selva sem lei nem roque. A legislação obriga à utilização de açaimes e de trela quando se passeiam os animais na via pública. Os dedos de uma mão chegam e sobram para contar os exemplos de cumprimento com que me deparei até hoje.
Das duas uma: ou os donos não conhecem a legislação (nem a querem conhecer) ou simplesmente ignoram-na. E que fazem as distintas entidades com competências de fiscalização nessa área, como as câmaras municipais e as autoridades policiais? Pura e simplesmente ignoram. Assobiam para o lado. Fingem que não vêem. São tão irresponsáveis como os proprietários dos animais. E a conversa da treta do costume, de que não há pessoal, para mim não colhe. Toda a gente sabe onde se podem encontrar infractores e a que horas do dia. Comecem a aplicar a lei e vão ver que as coisas mudam.

quarta-feira, 10 de janeiro de 2007

254 palavras

Esta crónica tem 254 palavras. Se a conseguir manter semanalmente neste espaço durante os próximos tempos não posso nem devo ultrapassar as 254 palavras. Não é fácil dar uma opinião sobre a nossa terra e as suas gentes em tão poucas palavras. Há assuntos que devo tratar aqui para os quais 254 palavras serão muito pouco. Corro o risco de demorar mais tempo a escrever esta crónica do que a trabalhar um texto de uma grande entrevista ou de uma reportagem. Também por que não posso, com o pretexto de que o espaço é limitado, deixar no computador as ideias que completam o meu pensamento. Desde que decidi tomar conta deste espaço que tenho a convicção que me meti numa carga de trabalhos. Mas quem não arrisca não petisca. E 254 palavras para falar semanalmente de um assunto que me interessa, e pode interessar aos leitores de O MIRANTE, não é nada para quem já aceitou tantos desafios e ganhou a maioria deles.
Como não posso contar em 254 palavras a notícia sobre o concurso público que a Resitejo promoveu, para a construção de uma central de valorização orgânica na zona do aterro sanitário da Carregueira, na Chamusca, desafio os leitores a lerem o trabalho publicado nesta edição, assinado pelo jornalista António Palmeiro, e convido a reflectirem sobre o que está em causa nestes concursos públicos em que, às vezes, as menores diferenças nos cadernos de encargos podem justificar a entrega da obra a quem apresenta o orçamento mais caro. Sem mais palavras.