quarta-feira, 28 de novembro de 2007

A visita de Edmundo Pedro


À sala chegaram entretanto mais duas ou três pessoas. Disparei a máquina duas dezenas de vezes enquanto Edmundo Pedro não se sentava para começar a sessão. Quando Moita Flores se preparava para apresentar o livro saí a correr para a sede do jornal que fica ali a dois passos. Desliguei o alarme do edifício e dois minutos depois já estava a ligá-lo outra vez para fazer o caminho até à Golegã. O edifico vazio e o aperto que ia apanhar para chegar a horas fez-me sentir solitário e operário em construção. Quando entrei, senti o vazio da casa e imaginei o que se estaria a passar a essa hora no Picadeiro Lusitanos, para onde também tinham sido convocados todos os trabalhadores do jornal. Meia hora depois estava com a minha gente. Com muitos amigos e com pessoas que são solidários com este jornal. Durante a noite lembrei-me algumas vezes de Edmundo Pedro, da grandiosidade da sua vida e da memória de muitas lutas que ele conseguiu escrever num livro admirável.Na passada sexta-feira O MIRANTE juntou cerca de três centenas de pessoas na Golegã numa festa de aniversário, que fizemos coincidir com mais uma edição do Galardão Empresa do Ano e que organizamos em parceria com a NERSANT pelo oitavo ano consecutivo. Nesse dia tive uma jornada de trabalho danada. Só ao final da tarde comecei a perceber que precisava de despir a pele de operário para vestir a de um dos responsáveis pela obra.
Uma hora antes do início do jantar, sentindo a pressão dos compromissos, ainda estava em Santarém a fotografar Edmundo Pedro, que veio à cidade fazer o lançamento do seu livro de memórias ( Um Combate pela Liberdade). A sessão estava marcada para as 18h mas ele só chegou às 19. Estava uma dezena de pessoas na sala. Moita Flores também lá estava para apresentar o livro. Também ele tinha assembleia municipal nessa noite. O editor do livro ia carregando alguns exemplares para dentro do edifício e respondia a algumas perguntas sobre Edmundo Pedro. “Tem 89 anos mas está com uma saúde de ferro. O livro já foi lançado em Janeiro mas é ele que puxa por mim para continuarmos a divulgá-lo pelo país. Está perdido. Já anda por aí há uma hora mas não consegue encontrar o Fórum Mário Viegas”. Finalmente apareceu embrulhado num sobretudo com a mulher tão sorridente como ele.
Por mais incrível que pareça não estava na sala MárioViegas um único histórico do PS de Santarém. Nem um vereador, um ex-vereador, um simples empregado da política de tantos a que o PS dá emprego. Deviam estar a escrever as suas memórias no conforto das suas casas. A maior parte deles também já tem quase 90 anos e alguns são mesmo muito mais velhos que os dinossauros.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

O negócio sujo da publicidade selvagem


Tem que haver compadrio entre os políticos e as empresas que exploram a publicidade exterior em Portugal para que a ocupação do espaço público com publicidade continue a crescer de forma vergonhosa. Ninguém de bom senso acredita que os políticos estejam a dar o seu melhor para mandarem cumprir os regulamentos municipais de publicidade, ou que estejam a fazer o que deviam para cobrarem o justo valor, principalmente naqueles casos em que a ocupação do espaço público obedece a critérios razoáveis. Ao contrário do que acontece por todo o mundo em Portugal ainda se incentiva o negócio e cobram-se valores completamente irrisórios tendo em conta os valores de mercado que todos sabemos estarem em causa quando se anunciam marcas internacionais que habitualmente gastam milhões na sua imagem.“Se perderes a cabeça resta mais espaço para a poesia”. “Goza a vida enquanto és vivo pois vais estar muito tempo morto”. Recorro a estas duas frases que tenho à minha frente, em cima da secretária, para me inspirar para a crónica desta semana. Estou disponível para escrever sobre um assunto feliz que me deixe bem disposto para dormir um sono sossegado. O problema é que acabo de chegar de uma viagem a Lisboa e não me saem da cabeça as imagens da publicidade selvagem que cada vez mais poluem os espaços públicos da nossa região.
Não sou daqueles que corre risco de vida por causa da publicidade exterior afixada em curvas e rotundas, mesmo em frente dos olhos dos condutores de forma a tirarem-lhe a visibilidade e atenção necessárias para fazerem uma condução segura. Mas sei que uma boa parte dos acidentes que acontecem são fruto da distracção provocada pela publicidade selvagem. O facto de não me deixar distrair pelo apelo da publicidade, que suja os espaços públicos, não me desresponsabiliza enquanto cidadão de denunciar este negócio sujo que provoca mortes na estrada e utiliza de forma vergonhosa áreas históricas, praças emblemáticas e a beira da estrada como se vivêssemos numa república das bananas.
Não me esqueço de um exemplo, que ainda há pouco tempo foi notícia no nosso jornal, de um presidente de junta da região que ao chegar ao executivo transformou uma receita de dois mil euros, que entrava de quatro em quatro anos nos cofres da junta, em mais de duzentos mil. E, segundo sei, o negócio para a junta ainda tem muito para dar mesmo disciplinando o uso dos espaços. Este exemplo tem rosto e pode ser confirmado numa busca ao nosso sitio em O MIRANTE .PT
Lá se foi a tentativa de uma noite sem agitação. Mas a alma ficou mais consolada. Faltam aqui os nomes dos políticos que todos percebemos lucrarem com tamanha irresponsabilidade. Esses dormem sossegados. Já não têm alma.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

As Bicicletas em Setembro


Acabei de arrumar alguns livros de Clarisse Lispector que li e reli durante a viagem, livros de biografias, traduções de poetas gregos, franceses e ingleses. E de todos os livros comprados e lidos entretanto é este que tem lá dentro a minha “intimidade” e o meu “corpo” que são “as únicas propriedades privadas do ser humano” (pag 83). No interior do livro, que é como o interior da minha última viagem, “vi várias vezes o diabo mas nunca perdi a alma” (pag 71), e também nunca deixei de sentir que, às vezes, “ficamos em certos sítios, ou com certas pessoas porque achamos que não merecemos melhor” (pag105). “As Bicicletas em Setembro” é um livro de viagem pela infância que mistura sonho e realidade, um livro de mistérios que povoam a infância de todos os homens e mulheres do nosso tempo.Um mês depois de um regresso de 20 dias de viagem começo a arrumar os livros, as revistas, os recortes de jornais e os papéis cheios de memórias. Cada vez que regresso é uma alegria. Trago alimento para algum tempo e deixo para trás um rasto que sei que vou ter que retomar um dia destes. O que me leva a falar do umbigo é esta sensação de estar a remexer nesse passado com pouco mais de um mês quando, entretanto, já mergulhei num presente feito exactamente da mesma massa, com pessoas, com livros comprados quase diariamente, revistas por ler, jornais que se acumulam de um dia para o outro e que são de leitura obrigatória, e muitos apontamentos a propósito de coisas inadiáveis que, muitas vezes, acabam no bolso das calças dentro de uma máquina de lavar.
Uma dessas memórias do último mês é um livro de Baptista Bastos, “As Bicicletas em Setembro”, edição da ASA, que me coloca no centro do mundo, esteja eu na Chamusca ou em Londres. O autor de “O Secreto Adeus” escreveu um novo romance, quase memórias, de um homem que nasceu num bairro de Lisboa, cujos lugares e heróis bem podiam ser, embora com outros nomes, os da minha infância numa vila do Ribatejo.
Um dia fixei um chinelo velho abandonado no meio da rua. Um quilómetro mais à frente apareceu-me uma criança, meio assustada, a perguntar se não tinha visto o seu chinelo perdido. Aquele episódio marcou-me. Como é que se guarda na memória, em tempo de tanto lixo, a lembrança de um velho chinelo perdido junto de uma valeta? E o que é que leva uma criança a percorrer de volta um caminho tão longo para reaver um chinelo perdido? O novo livro de BB é um romance de grandes emoções. Transporta-nos ao tempo em que levávamos com o chinelo no rabo, mas também nos faz recordar quase tudo da vida e dos lugares “para onde vão os pássaros quando morrem”.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O Festival do senhor Abreu


Há muitos anos que a Região de Turismo do Ribatejo é um feudo para empregar políticos profissionais que se desabituaram de trabalhar. Para além do Festival Nacional de Gastronomia, e de uma falhada Rota do Vinho, a Região de Turismo do Ribatejo é uma instituição despesista cujo orçamento deveria ser aproveitado para promover e ajudar instituições de carácter sócio - cultural, que sempre vivem de joelhos para obterem pequenos e inaceitáveis subsídios.Há anos que não ponho os pés no Festival Nacional de Gastronomia. E apesar de lá ter trabalhado algumas vezes durante os festivais só uma vez é que aceitei um convite para aqueles almoços diários em que se distribuem elogios e se apresentam os actores do momento. Na altura precisava de ver para crer. Aquilo é deprimente e cheira a esturro. A comida, por muito boa que seja, sabe sempre a mofo que o mesmo é dizer à Carlos Abreu e a todos aqueles personagens que se deixam fritar em azeite queimado.
Não tenho nada de pessoal contra o senhor Carlos Abreu mas acho que ele é o espelho da classe política e dirigente da nossa região que continua a viver de rosto tapado, de tachinhos e com muita falta de vergonha.
Se se realizasse um inquérito junto dos habitantes da cidade sobre o que pensam do Festival e das pessoas que o dirigem e organizam, tenho a certeza que ficaríamos todos envergonhados. Como é que um Festival que não tem crédito na cidade pode algum dia ter crédito internacional?
Não resisto a dar conta dos olhos esbugalhados do presidente da Região de Turismo quando alguém lhe pergunta onde é que estão os lucros dos festivais tendo em conta que ali é sempre tudo a pagar. Até as entradas. “O dinheiro foi para investimento” costuma ele dizer como se estivesse a responder a uma pergunta a brincar.
A Região de Turismo do Ribatejo vai acabar com a nova lei orgânica que o Governo está a ultimar. Não acredito que o futuro presidente da nova Região de Turismo de Lisboa e Vale do Tejo não seja um novo Carlos Abreu: um desempregado da política que se recusa a voltar à sua antiga profissão. Mas, pelo menos, tenhamos fé.
P.S. Para quem não sabe o presidente da Região de Turismo do Ribatejo ganha mais que um presidente de Câmara. E a grande “trabalheira” dele é andar a comer e a beber à nossa custa enquanto representa a nossa região. Por último: não conheço ninguém, com importância na vida política local e regional, que não ache que Carlos Abreu representa o pior que existe na nossa vida política. Engraçado não é?