terça-feira, 29 de novembro de 2011

A energia da revolta


O mundo muda todos os dias. Está aí a mudança de mentalidades e a crise, a malfadada crise, que não me deixa mentir, embora me apeteça gozar com certa gente que não fala de outra coisa por desconhecer, no fundo, o que é viver em tempos de pobreza, sem recursos nem misericórdia, sem tecto entre ruínas.
Um amigo de quase oitenta anos, com casa aberta na avenida de Roma, em Lisboa, conta-me de cada vez que o visito a História de Portugal dos últimos cem anos. Desta vez tudo começou por causa da azeitona que fica nas oliveiras até cair para o chão porque as jornas estão caras e hoje já ninguém aceita apanhar de terço quanto mais de meias. Nem dada.
Para comer uma galinha de capoeira tem que vir uma senhora de Tomar aqui vender-ma, conta-me o meu amigo, a quem de seguida arranco o resto da história, que é exemplar, para percebermos os segredos dos antigos que, parecendo resignados, muitas vezes são um exemplo de vida que nos passa ao lado enquanto choramingamos por tudo e por nada.
A dona Maria vai uma vez por mês de Tomar a Lisboa visitar uma dúzia de clientes, a quem telefona antecipadamente para receber encomendas de galinhas, galos e patos, criados nas suas galinheiras que vende já amanhados e temperados.
Vai de comboio e leva a mercadoria dentro de uma mala de viagem que depois carrega por Lisboa em cima de um carrinho de duas rodas que se transporta no comboio como uma mala mais pequena.
Vive sozinha numa pequena freguesia de Tomar. O marido deixou-a há muitos anos para ir viver com uma rapariga mais nova. Foi assim que ela descobriu que tinha que fazer pela vida. Tem uma horta mas não arrisca levar as couves e as batatas para Lisboa. Com os galos e os patos ganha a vida. Trá-los já em condições de irem para o frigorífico. Custam muito mais que ir comprá-los ao supermercado. Mas é tão bom saber que estamos a comer carne do galinheiro, confessa, comovido e sempre com os olhos húmidos, o meu velho amigo da avenida de Roma.
A conversa não ficou por aqui. A certa altura disse-me que em setenta anos de trabalho sempre encontrou uma solução para os seus problemas. Desta vez acha que não vai conseguir. A mercadoria não sai da loja porque não há dinheiro fresco no mercado.
Qualquer dia em vez de comer os galos do galinheiro de Tomar começo a comer a mercadoria da loja, disse, sem se rir, chamando mil vezes gatunos aos políticos, corruptos aos advogados e criminosos a todos aqueles que têm governado o país nos últimos anos.
Aproveitei o desabafo para me safar de mais uma visita ao velho Senhor e, pensando na dona Maria de Tomar, disse para com os meus botões: de uma pessoa com quase oitenta anos, viúvo e sem filhos, que toda a vida viveu do negócio e para o negócio, o que seria dele se não fosse a energia que vai buscar a tanta revolta!

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Os políticos pobres e os pobres da política


A grande maioria do povo português é anti-salazarista mas pensa como Salazar. Dou um exemplo: quando os jornais e as televisões resolvem com uma certa engenharia trazer a público o património da nossa classe política é uma algazarra que não há paciência que aguente. Tudo exprimido, a começar no ministro Miguel Relvas (PSD)  e a acabar no ex-deputado António Gameiro (PS), esta gente é a mais remediada da classe média. Os homens que eu gostava de ver no Governo e no Parlamento eram aqueles que já têm património que chega para dez gerações; quem eu gostava de ver no Governo era os homens que já ganharam fortuna (ou o que tinham a ganhar na sua vida profissional) e ficaram livres e disponíveis para servirem a causa pública. Com este povo e com esta opinião pública, que morre de inveja de quem estreia um fato novo, quem é o homem sério, que gosta de ver o seu nome respeitado, que arrisca servir o país ou a sua terra correndo o risco de ser enxovalhado por causa do valor que amealhou do seu trabalho de muitas décadas ou, eventualmente, das boas heranças que lhe calharam em sorte?
Desde o dia 25 de Abril de 1974 que o país é uma causa perdida ao nível do que é mais essencial a uma democracia; não há justiça cega; não há certeza de que vamos gozar o direito à reforma mesmo depois de tantos anos de contribuições; e quem se deitar a adivinhar que temos o nosso dinheiro seguro no banco pode estar bem enganado.
Foram os políticos pobres e os pobres da política que nos meteram nesta alhada. Foi sempre assim desde o 25 de Abril de 1974. Ninguém com fortuna pessoal foi para o Governo para dar de volta ao país, em serviço público, aquilo que o país lhe deu a ganhar. Todos, salvo raríssimas excepções, foram pobres para o Governo e saíram de lá ricos, quando não foi o caso de enriquecerem depois à custa dos lobbys. Há milhares de exemplos de políticos que entraram nos governos com uma mão à frente e outra atrás, e muitos ainda por lá andam, a desempenhar cargos relevantes ao mesmo tempo que têm escritórios abertos nas avenidas principais de Lisboa, com tabuletas à entrada da porta anunciando o negócio com o seu nome próprio, e apelido, exactamente como na República das Bananas.
Os homens ricos, os homens que tiveram sucesso na vida pessoal e profissional, que poderiam pôr ao serviço do país a sua experiência, dão lugar desde o 25 de Abril de 1974 aos políticos pobres, socialistas e comunistas, inaptos mas espertos, que de emblema partidário na lapela conseguem esta proeza inolvidável de transformarem o país numa casa de velharias do tempo dos nossos avós.
Com a crise vão aumentar os negócios manhosos que puseram o país de pantanas e acabaram com os recursos mínimos nas instituições públicas. Não há políticos do contra que não sejam os velhos comunistas, gente do mesmo circo, sempre os mesmos e com o mesmo discurso de sempre, todos cúmplices do publicitário que inventou aquela verdade sem espinhas de que “o Omo lava mais branco”.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

O sexo na política


A vida dos homens públicos está cheia de sexo e erotismo. Dos políticos aos artistas, dos empresários aos dirigentes de topo, o sexo mistura-se com o dia a dia de trabalho como o fermento com a farinha de trigo nas mãos madrugadoras do padeiro.
Na maior parte dos casos (que sei eu meu Deus!!) os casos de assédio vão muito para além da fornicação e resultam ainda, na sua grande maioria, em escravidão sexual mais do que em casos amorosos.
Quando não está em causa a manutenção do emprego está a suposta importância pública da pessoa; o interesse material na relação; a comunhão da vida privada; o acesso a informação preciosa e, talvez na maioria dos casos, o conhecimento do que cheira bem por cima da pele mas também do que é abominável nas entranhas.
Desde que me lancei nesta profissão que, à boca pequena, ouço histórias de sexo sobre os homens e mulheres públicos que, com mais ou menos verdade, se mantêm ao longo dos anos.
Somos um povo que adora cornear um amigo com uma insinuação, fazer passar por puta a nossa melhor amiga só porque ela estreou uma saia curta e ficou aparentemente mais bonita; e não é preciso ir lavar as mãos ao Tejo para de um dia para o outro lançarmos sobre a mais cândida das pessoas a notícia de que foi vista algures com as cuecas na mão.
Há, no entanto, casos que fazem a diferença e onde as pessoas são mais ousadas. Conheço, de ouvir contar, inúmeros casos em que a troca de afectos deverá ser mais importante que a relação sexual. O Poder e o desgaste da visibilidade pública criam fraquezas em algumas pessoas que precisam de trocar confidências; chorar no ombro; sentir a adrenalina do engate; a comunhão dos afectos; a cumplicidade em tudo o que é mais importante; enfim, gente sábia e com um sentido prático da vida que gosta de praticar com arte a máxima de que a felicidade é o único meio decente de procurarmos sobreviver.
Descobri recentemente que uma das pessoas que mais admirei na vida pública é um predador sexual; é o que dizem as más línguas, e eu, pobre criatura, ainda não tenho informação suficiente para confirmar ou desmentir. Sensual como um rinoceronte; belo como um crocodilo; espadaúdo como um sapo, não faltam atributos a este meu velho amigo para deitar em cima da sua secretária, ou no sofá, as mulheres (ou os homens, que sei eu!!) mais bem casadas da Península Ibérica, assim como as mais belas solteiras do universo. Falta contar que quando nos conhecemos, e até sermos amigos do peito, foi a primeira pessoa que me deu a conhecer o cheiro a farinheira e a couve lombarda.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Chatos ao quadrado


Conheço imensas formas de viajar: uma delas é sentar-me à secretária a ler ou a escrever e fumar o meu cachimbo. Tenho meia dúzia deles comprados nas minhas viagens pelo mundo. E sempre que me apetece deixo-me ir pelo prazer da cachimbadela e pela recordação dos momentos que passei em cada cidade que conheci.
Depois de passar duas horas sentado numa cadeira a olhar para uma mesa, onde pontificava um conferencista chato e cinco outras figuras públicas que, em cinco minutos, despacharam palavras de circunstância, tomei boa nota da minha falta de paciência para continuar a contribuir para este peditório.
Uma conferência deve ser uma viagem em primeira classe e de preferência em boa companhia (mesmo que seja proibido fumar ou mascar pastilha). Ao contrário, e pelo que vou assistindo, a maior parte das iniciativas que pretendem discutir a nossa vida socioeconómica e cultural são dinamizadas por indivíduos que adoram ouvir o eco da sua voz; que têm o umbigo maior que a testa; que por serem autores de um livro, ou titulares de um cargo importante, repetem até à exaustão lugares comuns para auditórios rendidos à suposta importância institucional dos oradores.
Mal comparado, um sujeito que passa uma hora a discursar para depois abrir um debate, e só então dizer alguma coisa de interessante, faz lembrar aqueles jornalistas que depois de ouvirem uma excelente conferência, sem tirarem uma única nota para o papel, esperam pelo final da sessão para fazerem as mesmas perguntas de sempre, deixando escapar, por preguiça e falta de profissionalismo, o que de importante o orador ofereceu durante a sua palestra.
Somos cada vez menos nas conferências e nos debates porque são cada vez mais os chatos que se sentam nas mesas de honra e nas cadeiras do público à espera da vez para nos debitarem mais do mesmo. Regra geral é assim; fala o chato e depois a seguir abre-se o debate que não é debate mas a possibilidade dada aos convidados, que são quase sempre os mesmos, de eles próprios darem também a sua opinião sobre o tema.
Quando se dá o caso de alguém fazer perguntas incómodas aos chatos, arrisca-se a sair da sala enxovalhado. Se houver um moderador, e ele se lembrar de proibir intervenções que não sejam perguntas directas e sucintas aos elementos da mesa, corre o risco de ser considerado fascista ou comunista, conforme o ambiente e as cores das camisolas. Sim, não é normal numa conferência, ou num debate, ter mão firme com os assistentes de forma a não se tornarem, também eles, uns chatos ao quadrado.
É muito chato o texto desta crónica. Percebi isso assim que comecei a escrever sobre o tema. Há alturas em que a palavra não rende. Parece o euro face ao valor do ouro.
Enfim, não é por isso que vamos fechar a loja. A semente está na terra. É preciso deixar que o tempo faça a sua parte.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Um espírito vencedor *


Há poucos dias sentei-me a um sábado de manhã à mesa de um café com um pequeno empresário a falar da realidade laboral do país de há uma dúzia de anos atrás. Dizia ele que a esquerda política eram os milhares de operários a calcorrearem as estradas dentro de carrinhas dormindo pelo caminho entre o ponto de partida e o ponto de chegada, muitas vezes do norte para o sul e vice-versa. Todos a dormirem pelo caminho até ao trabalho menos o condutor que, regra geral, era quase sempre o patrão.
O mundo mudou. Sentimo-nos felizes por sermos testemunhas privilegiadas. Sabemos que em cada reunião de amigos, o tema principal é a crise. Não sei se vos desiludimos mas gostava de transmitir que não sentimos angústia pelo trabalho acrescido que a crise está a provocar. Estávamos mais preocupados se as condições do país se mantivessem da forma que permitiu que os berardos da vida, por serem amigos dos políticos e dos banqueiros, se mantivessem na mó de cima.
Os pequenos e médios empresários são o grande motor da nossa economia, os grandes obreiros de qualquer sociedade. São eles, acima de tudo, que aqui representamos. É com eles que fazemos o nosso percurso. É com orgulho que partilhamos esta responsabilidade de premiar pessoas e empresas que geram riqueza e emprego, pessoas que são importantes, cada um à sua maneira, no crescimento económico da sua terra, da sua região e do seu país.
Nesta altura os problemas na imprensa são tão discutidos como a generalidade dos problemas do país. Há muita turbulência por causa das televisões e da fraca economia que não chega para sustentar os grandes jornais. O MIRANTE está entre os dez maiores jornais do país com mais tiragem e maior sustentabilidade. Temos uma vantagem em relação aos outros. Estamos muito mais próximos dos nossos leitores e dos nossos anunciantes.
Como todos sabem em cada jornal importante há várias agendas. Em O MIRANTE só há uma agenda. É a agenda da redacção. E é com essa que todos trabalhamos. Editamos um jornal para o nosso público e não um jornal para os leitores de uma determinada classe política ou empresarial. A primeira coisa que aprendemos neste ofício é que se o produto não for bom para consumo dos leitores acaba endividado e descredibilizado e nunca passará da cepa torta.
Com as várias edições, com a nossa tiragem, com o aumento da equipa de profissionais, com as parcerias que temos vindo a fazer, temos provado que mais do que um caso de estudo somos um projecto jovem e com futuro.
O Galardão Empresa do Ano é, em parceria com a NERSANT, a nossa iniciativa mais feliz porque nos aproxima da comunidade em que vivemos e trabalhamos. Enquanto jornalistas a nossa obrigação é passar despercebidos antes da publicação de qualquer trabalho. Hoje aqui estamos naquela posição em que nos mostramos como o mensageiro credível para que, no futuro, todos possam acreditar ainda mais na nossa mensagem.

*Excerto do texto lido na cerimónia da entrega do Galardão Empresa do Ano que é notícia nesta edição.