quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

Mestres da sabedoria

Não conheço melhor altura para mudar de vida que esta época festiva de Natal e Ano Novo quando todos andamos contentinhos da silva e entretidos com o umbigo. Passa por mim uma vontade de mudar, de rasgar, de morder, de levantar bem alto os braços e o espírito, de começar tudo de novo. A vida vai andando depressa demais para o meu gosto. Precisava de parar o tempo e saborear as palavras de ontem, o vinho da última colheita, as nozes e os figos do último cabaz, os marmelos que ainda estão nos valados do campo onde passeio a minha infância, demoradamente, todas as vezes que me meto pela estrada do campo direito ao mouchão de S. Braz, ali onde as águas do Tejo se ouvem correr beijando os salgueiros.
Ainda não tenho resposta, e devia ter, para algumas perguntas que fiz a mim mesmo há dias atrás quando me perguntei dentro de um livro se era possível sair pela mesma página que entrei. Continuo à procura do valor de certas palavras que aprendi quando já era crescido e não encontro ainda o que procuro em certas palavras que guardo na boca desde criança.
Tenho no correio uma carta de um amigo a dizer-me que tem a família destroçada por causa da doença, que já deixou de acreditar em Deus porque não pode facilitar a vida ao seu próprio espírito, e só revoltado consegue sobreviver. Curioso este meu amigo que gosta ainda tanto do seu cão morto como gostaria do filho que nunca teve, e da mulher que o deixou e, pelo que sei, ele nunca foi capaz de substituir por outra. Há gente assim no mundo que nos surpreende tal é a capacidade de amarem e de serem fiéis e felizes ao mesmo tempo. E quando temos a sorte dessas pessoas serem nossas amigas podemos perceber melhor o mundo em que vivemos e o quanto somos animais de afectos e crueldades.
Tenho uma vontade enorme de partir para outra, virar a vida do avesso, deixar para trás os cacos e ir à procura dos caminhos de silvas e amoras, ao encontro dos sonhos sempre adiados. Ser fiel a princípios e a compromissos é a minha forma de estar na vida. Mas às vezes paga-se caro demais essa fidelidade canina às promessas que vamos acumulando nos alicerces das nossas casas e causas. Uma forma de tentar fugir ao castigo é escrever sobre o que sentimos. Sabendo que de tanto pensar e escrever sobre o assunto o espírito vai-se educando até fazer de nós mestres da sabedoria, ou seja, aqueles que nunca falam de si mesmos.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

A educação do povo ainda vai dar que falar

SUGESTÃO-Quantos de nós é que já ouvimos ou utilizamos a expressão “o rei vai nu”, sem sabermos a verdadeira origem do dito ( e muitas vezes sem percebermos o significado real) ? Eu acho que sou um deles. Reli há pouco tempo os contos de Hans Christian Andersen e não tenho a certeza se a minha memória deles foi de os ler se de os ouvir contar. Devo ao meu avô paterno a lembrança de algumas histórias que ainda hoje procuro, sem sucesso, nas livrarias como é o caso do Toiro Azul e de O Menino da Mata e o seu Cão Piloto. Sei pelos meus filhos e pelos amigos dos meus filhos que os contos de Andersen são muito mais conhecidos nos dias de hoje. Mas também sei por eles que o conhecimento do escritor e da sua obra não é sinal de que o leram. Porque estamos em época de lembranças deixo aqui uma sugestão para todas as pessoas que acham que a quadra deve ser marcada com prendas de valor. A Relógio de Água tem nas livrarias uma nova edição em capa dura dos Contos de H. Andersen que é um mimo e custa cerca de 20 euros.
SOLIDARIEDADE- Este último fim-de-semana acompanhei duas iniciativas do Núcleo Sportinguista de Santarém que resolveu promover a solidariedade com três instituições da cidade que apoiam crianças desprotegidas. Sei que pela região há muita gente a dar o seu melhor pela felicidade dos outros procurando ao mesmo tempo a sua realização pessoal. Felizes os que recebem a ajuda e os que têm prazer em ajudar.
VAIDADES - Por razões que pode ler numa outra crónica na página de desporto desta edição, tenho acompanhado os jogos de um campeonato distrital de juniores. Há falta de equipas profissionais que disputem futebol de qualidade não conheço melhor forma de rentabilizar os clubes desportivos que apostar nas camadas jovens. Infelizmente os dirigentes, com raras excepções, gastam o dinheiro que têm e não têm a sustentar equipas seniores compostas na maior parte por habilidosos.
EDUCAÇAO - Fui recentemente a Inglaterra ver um jogo de futebol. Puxei do cachimbo nas bancadas do estádio e não podia. Tentei fumar no bar e era proibido. No intervalo do jogo fui à casa de banho e encontrei uma sala de fumadores. E a acumulação de fumo era tanta que nem me passou pela cabeça puxar do cachimbo tão ridículo achei aquela situação. Lá como cá a educação do povo ainda vai dar que falar.
DOSTOIEWSKY - O olhar não vê numa gota de água senão uma unidade liquida e brilhante, onde o microscópio mostra uma multidão, um caos, miríades de infusórios; assim o grande artista destrinça, no mais alto realismo, verdades que parecem estar em contradição com as que nós tínhamos imaginado. ( Stefan Zweig sobre a obra de Dostoiewsky, um dos maiores escritores de sempre, cujos livros serão uma excelente prenda de Natal para qualquer Homem que ande à procura de aventura espiritual).

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Santarém uma cidade perdida no mundo



Em Lisboa, numa galeria de arte com a porta fechada, passo a minha tarde de sexta-feira a discutir com uma artista plástica a compra de uma peça de arte. Ando por Lisboa a um dia de semana e tento sentir-me em Paris ou Madrid. Gosto tanto de Lisboa como gosto de qualquer grande cidade do mundo. Caminho a pé pelo Rossio e tenho meia dúzia de amigos para visitar na Rua do Ouro e na Rua Augusta. Vou aos Restauradores e cumprimento de passagem o dono de uma casa comercial. Acabo de sair da Loja do Cidadão, nos Restauradores, onde vou muitas vezes só para me servir da casa de banho.
As livrarias da baixa são lugares excelentes para folhear as novidades literárias. As pastelarias são locais muito concorridos mas a pasteleira é de qualidade. Na ourivesaria do meu velho amigo José Ceia Garção passo hora e meia a pôr a conversa em dia. Nesta sexta-feira há uma fila de mais de uma centena de pessoas para subirem o elevador de Santa Justa. Parece uma fila para entrar na ourivesaria, diz o meu amigo a brincar enquanto se queixa do negócio. Em sessenta minutos ouvi histórias que davam para um livro. Todas metem polícias, vendedoras de queijo fresco, gente de sangue azul que estaciona em cima dos passeios, putas finas, gatunos de fato e gravata.
Hoje não subi ao Chiado nem passei pelo Martin Moniz, não folheei revistas, não fui matar saudades à livraria Portugal nem tão pouco visitei a minha amiga Teresa e o seu marido Jaime que conheço há trinta anos e que resistem à frente de um negócio na Praça da Alegria.
Acabei de pagar 6 euros pelo estacionamento no parque da Praça da Figueira. Estou a caminho de Vila Franca de Xira. Percebo agora que a minha luta contra o tempo é inglória. De semana não dou pelo passar do tempo. Quando fujo uma tarde para Lisboa provo tudo apenas pela metade. Marquei o ponto em Vila Franca e saí a correr. Começo a escrever esta crónica no jornal, em Santarém, já a noite vai alta. Passei pelo centro da cidade e só vi fantasmas. Santarém fica a meia hora de Lisboa e parece uma cidade perdida no mundo. Sempre que a vejo assim deserta lembro-me de uma noite, há mais de uma dúzia de anos, em que saí de casa para assistir a um colóquio com Sophia de Mello Breyner Andresen que tinha apenas uma dúzia de assistentes.
Já estou no carro a caminho da Chamusca. Na TSF continua a novela do empréstimo que António Costa conseguiu aprovar na Assembleia Municipal de Lisboa. Acabei de falar ao tmv com Moita Flores que reconhece a cada dia que passa a falta de condições para continuar a trabalhar em Santarém tal é o buraco financeiro que os socialistas lhe deixaram.
Cheguei à Chamusca. Foi aqui que há quase meio século caminhei descalço para a escola e deitei-me muitas vezes com a barriga a dar horas. Mas é aqui que ainda hoje gosto de dormir de estômago vazio por causa do enjoo de conhecer tantos idiotas poderosos.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Jovem Mulher casada


Em homenagem a um grande escritor português pouco conhecido, mas que eu admiro muito (nasceu em 1912 e morreu em 1987), deixo aqui um dos seus textos mais bonitos como prenda de Natal para todos os Homens tristes deste mundo e, especialmente, para os meus amigos tristes com a vida. O texto chama-se A Paixão do Urso e o nome do poeta é Luís Veiga Leitão.Deixo para trás duas crónicas que bem podem esperar. Lanço-me a este texto sugerido pela infelicidade de um amigo. Definitivamente sou infeliz quando os que me rodeiam são, ou parece que são, menos felizes.
Não suporto a desgraça dos que a confessam a plenos pulmões. E fico triste quando alguém me puxa pela aba do casaco para me dizer que o mundo foi criado para o tramar. Há gente especialista na arte de nos desconsolar. São pessoas cheias de mundo velho, que herdaram apenas o sangue pisado dos avós e dos pais, que lambem os beiços como crianças satisfeitas quando as palavras que nos podem causar angústia lhes saem da boca certas e ligeiras.
Jovem Mulher casada, ia a caminho da aldeia vizinha da sua, no coração da floresta, a duas verstas do lago Baikal, o mar Siberiano. Sentido contrário vinha um urso não menos jovem. O pêlo denunciava-lhe a idade. De repente, a duas canchas, ambos se quedaram. Olhos nos olhos, assim ficaram um tempo que ninguém soube, nem os génios da floresta. Quando ela caiu em si, um frio correu-lhe pela espinha e, trémula, ainda ganhou forças para voltar a casa. Gritou pelo marido que logo se apressou a carregar a arma de longo cano. Refeito o ânimo, foram encontrar o urso no mesmo sítio. Morto. O coração matou-o. De paixão.
Foram as bétulas, as noivas dos bosques, que o disseram entre lágrimas.
P.S. Já li este texto dezenas de vezes e sempre lhe encontro o encanto da primeira leitura. Não é assim, infelizmente, a nossa relação com a maioria dos nossos amigos. A literatura está cheia de vida mas não é a vida. Aproveito para lembrar a morte do empresário de Santarém, Joaquim Pinto, com quem partilhei há uns anos atrás uma relação de afectividade que me marcou. Joaquim Pinto era um homem sábio mas parece que teve pouca sorte com os políticos e com os projectos em que se meteu nos últimos anos. Mas a sua vida foi feita de muitas lutas ganhas. E no trato era um Homem como há poucos na vida empresarial da região. Guardo dele, acima de tudo, a ideia de que era um sonhador. Nos tempos que correm não é fácil encontrar um empresário bem relacionado com a poesia. É mais do que justo deixar-lhe aqui um abraço de despedida.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

A visita de Edmundo Pedro


À sala chegaram entretanto mais duas ou três pessoas. Disparei a máquina duas dezenas de vezes enquanto Edmundo Pedro não se sentava para começar a sessão. Quando Moita Flores se preparava para apresentar o livro saí a correr para a sede do jornal que fica ali a dois passos. Desliguei o alarme do edifício e dois minutos depois já estava a ligá-lo outra vez para fazer o caminho até à Golegã. O edifico vazio e o aperto que ia apanhar para chegar a horas fez-me sentir solitário e operário em construção. Quando entrei, senti o vazio da casa e imaginei o que se estaria a passar a essa hora no Picadeiro Lusitanos, para onde também tinham sido convocados todos os trabalhadores do jornal. Meia hora depois estava com a minha gente. Com muitos amigos e com pessoas que são solidários com este jornal. Durante a noite lembrei-me algumas vezes de Edmundo Pedro, da grandiosidade da sua vida e da memória de muitas lutas que ele conseguiu escrever num livro admirável.Na passada sexta-feira O MIRANTE juntou cerca de três centenas de pessoas na Golegã numa festa de aniversário, que fizemos coincidir com mais uma edição do Galardão Empresa do Ano e que organizamos em parceria com a NERSANT pelo oitavo ano consecutivo. Nesse dia tive uma jornada de trabalho danada. Só ao final da tarde comecei a perceber que precisava de despir a pele de operário para vestir a de um dos responsáveis pela obra.
Uma hora antes do início do jantar, sentindo a pressão dos compromissos, ainda estava em Santarém a fotografar Edmundo Pedro, que veio à cidade fazer o lançamento do seu livro de memórias ( Um Combate pela Liberdade). A sessão estava marcada para as 18h mas ele só chegou às 19. Estava uma dezena de pessoas na sala. Moita Flores também lá estava para apresentar o livro. Também ele tinha assembleia municipal nessa noite. O editor do livro ia carregando alguns exemplares para dentro do edifício e respondia a algumas perguntas sobre Edmundo Pedro. “Tem 89 anos mas está com uma saúde de ferro. O livro já foi lançado em Janeiro mas é ele que puxa por mim para continuarmos a divulgá-lo pelo país. Está perdido. Já anda por aí há uma hora mas não consegue encontrar o Fórum Mário Viegas”. Finalmente apareceu embrulhado num sobretudo com a mulher tão sorridente como ele.
Por mais incrível que pareça não estava na sala MárioViegas um único histórico do PS de Santarém. Nem um vereador, um ex-vereador, um simples empregado da política de tantos a que o PS dá emprego. Deviam estar a escrever as suas memórias no conforto das suas casas. A maior parte deles também já tem quase 90 anos e alguns são mesmo muito mais velhos que os dinossauros.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

O negócio sujo da publicidade selvagem


Tem que haver compadrio entre os políticos e as empresas que exploram a publicidade exterior em Portugal para que a ocupação do espaço público com publicidade continue a crescer de forma vergonhosa. Ninguém de bom senso acredita que os políticos estejam a dar o seu melhor para mandarem cumprir os regulamentos municipais de publicidade, ou que estejam a fazer o que deviam para cobrarem o justo valor, principalmente naqueles casos em que a ocupação do espaço público obedece a critérios razoáveis. Ao contrário do que acontece por todo o mundo em Portugal ainda se incentiva o negócio e cobram-se valores completamente irrisórios tendo em conta os valores de mercado que todos sabemos estarem em causa quando se anunciam marcas internacionais que habitualmente gastam milhões na sua imagem.“Se perderes a cabeça resta mais espaço para a poesia”. “Goza a vida enquanto és vivo pois vais estar muito tempo morto”. Recorro a estas duas frases que tenho à minha frente, em cima da secretária, para me inspirar para a crónica desta semana. Estou disponível para escrever sobre um assunto feliz que me deixe bem disposto para dormir um sono sossegado. O problema é que acabo de chegar de uma viagem a Lisboa e não me saem da cabeça as imagens da publicidade selvagem que cada vez mais poluem os espaços públicos da nossa região.
Não sou daqueles que corre risco de vida por causa da publicidade exterior afixada em curvas e rotundas, mesmo em frente dos olhos dos condutores de forma a tirarem-lhe a visibilidade e atenção necessárias para fazerem uma condução segura. Mas sei que uma boa parte dos acidentes que acontecem são fruto da distracção provocada pela publicidade selvagem. O facto de não me deixar distrair pelo apelo da publicidade, que suja os espaços públicos, não me desresponsabiliza enquanto cidadão de denunciar este negócio sujo que provoca mortes na estrada e utiliza de forma vergonhosa áreas históricas, praças emblemáticas e a beira da estrada como se vivêssemos numa república das bananas.
Não me esqueço de um exemplo, que ainda há pouco tempo foi notícia no nosso jornal, de um presidente de junta da região que ao chegar ao executivo transformou uma receita de dois mil euros, que entrava de quatro em quatro anos nos cofres da junta, em mais de duzentos mil. E, segundo sei, o negócio para a junta ainda tem muito para dar mesmo disciplinando o uso dos espaços. Este exemplo tem rosto e pode ser confirmado numa busca ao nosso sitio em O MIRANTE .PT
Lá se foi a tentativa de uma noite sem agitação. Mas a alma ficou mais consolada. Faltam aqui os nomes dos políticos que todos percebemos lucrarem com tamanha irresponsabilidade. Esses dormem sossegados. Já não têm alma.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

As Bicicletas em Setembro


Acabei de arrumar alguns livros de Clarisse Lispector que li e reli durante a viagem, livros de biografias, traduções de poetas gregos, franceses e ingleses. E de todos os livros comprados e lidos entretanto é este que tem lá dentro a minha “intimidade” e o meu “corpo” que são “as únicas propriedades privadas do ser humano” (pag 83). No interior do livro, que é como o interior da minha última viagem, “vi várias vezes o diabo mas nunca perdi a alma” (pag 71), e também nunca deixei de sentir que, às vezes, “ficamos em certos sítios, ou com certas pessoas porque achamos que não merecemos melhor” (pag105). “As Bicicletas em Setembro” é um livro de viagem pela infância que mistura sonho e realidade, um livro de mistérios que povoam a infância de todos os homens e mulheres do nosso tempo.Um mês depois de um regresso de 20 dias de viagem começo a arrumar os livros, as revistas, os recortes de jornais e os papéis cheios de memórias. Cada vez que regresso é uma alegria. Trago alimento para algum tempo e deixo para trás um rasto que sei que vou ter que retomar um dia destes. O que me leva a falar do umbigo é esta sensação de estar a remexer nesse passado com pouco mais de um mês quando, entretanto, já mergulhei num presente feito exactamente da mesma massa, com pessoas, com livros comprados quase diariamente, revistas por ler, jornais que se acumulam de um dia para o outro e que são de leitura obrigatória, e muitos apontamentos a propósito de coisas inadiáveis que, muitas vezes, acabam no bolso das calças dentro de uma máquina de lavar.
Uma dessas memórias do último mês é um livro de Baptista Bastos, “As Bicicletas em Setembro”, edição da ASA, que me coloca no centro do mundo, esteja eu na Chamusca ou em Londres. O autor de “O Secreto Adeus” escreveu um novo romance, quase memórias, de um homem que nasceu num bairro de Lisboa, cujos lugares e heróis bem podiam ser, embora com outros nomes, os da minha infância numa vila do Ribatejo.
Um dia fixei um chinelo velho abandonado no meio da rua. Um quilómetro mais à frente apareceu-me uma criança, meio assustada, a perguntar se não tinha visto o seu chinelo perdido. Aquele episódio marcou-me. Como é que se guarda na memória, em tempo de tanto lixo, a lembrança de um velho chinelo perdido junto de uma valeta? E o que é que leva uma criança a percorrer de volta um caminho tão longo para reaver um chinelo perdido? O novo livro de BB é um romance de grandes emoções. Transporta-nos ao tempo em que levávamos com o chinelo no rabo, mas também nos faz recordar quase tudo da vida e dos lugares “para onde vão os pássaros quando morrem”.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O Festival do senhor Abreu


Há muitos anos que a Região de Turismo do Ribatejo é um feudo para empregar políticos profissionais que se desabituaram de trabalhar. Para além do Festival Nacional de Gastronomia, e de uma falhada Rota do Vinho, a Região de Turismo do Ribatejo é uma instituição despesista cujo orçamento deveria ser aproveitado para promover e ajudar instituições de carácter sócio - cultural, que sempre vivem de joelhos para obterem pequenos e inaceitáveis subsídios.Há anos que não ponho os pés no Festival Nacional de Gastronomia. E apesar de lá ter trabalhado algumas vezes durante os festivais só uma vez é que aceitei um convite para aqueles almoços diários em que se distribuem elogios e se apresentam os actores do momento. Na altura precisava de ver para crer. Aquilo é deprimente e cheira a esturro. A comida, por muito boa que seja, sabe sempre a mofo que o mesmo é dizer à Carlos Abreu e a todos aqueles personagens que se deixam fritar em azeite queimado.
Não tenho nada de pessoal contra o senhor Carlos Abreu mas acho que ele é o espelho da classe política e dirigente da nossa região que continua a viver de rosto tapado, de tachinhos e com muita falta de vergonha.
Se se realizasse um inquérito junto dos habitantes da cidade sobre o que pensam do Festival e das pessoas que o dirigem e organizam, tenho a certeza que ficaríamos todos envergonhados. Como é que um Festival que não tem crédito na cidade pode algum dia ter crédito internacional?
Não resisto a dar conta dos olhos esbugalhados do presidente da Região de Turismo quando alguém lhe pergunta onde é que estão os lucros dos festivais tendo em conta que ali é sempre tudo a pagar. Até as entradas. “O dinheiro foi para investimento” costuma ele dizer como se estivesse a responder a uma pergunta a brincar.
A Região de Turismo do Ribatejo vai acabar com a nova lei orgânica que o Governo está a ultimar. Não acredito que o futuro presidente da nova Região de Turismo de Lisboa e Vale do Tejo não seja um novo Carlos Abreu: um desempregado da política que se recusa a voltar à sua antiga profissão. Mas, pelo menos, tenhamos fé.
P.S. Para quem não sabe o presidente da Região de Turismo do Ribatejo ganha mais que um presidente de Câmara. E a grande “trabalheira” dele é andar a comer e a beber à nossa custa enquanto representa a nossa região. Por último: não conheço ninguém, com importância na vida política local e regional, que não ache que Carlos Abreu representa o pior que existe na nossa vida política. Engraçado não é?

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Ser ou não ser comunista


Confesso que não tenho qualidades humanas para me considerar comunista mas, tal como quando tinha 20 anos, conservo intacta a minha coragem, os meus sonhos e os meus ideais de esquerda, seja lá isso o que for nos tempos que correm.Tenho um amigo, empresário de Almeirim, chamado Joaquim Borrego, que me trata familiarmente por comunista. E sempre que pergunta por mim a quem comigo trabalha usa o mesmo apelido.
No princípio, já lá vão uns bons anos que nos conhecemos, não achava muita graça ao trato. Pouco a pouco fui-me habituando a ouvir-me comunista nas suas saudações pessoais e a perceber o efeito do recado afectuoso, “dá lá cumprimentos ao comunista”, que de vez em quando me é transmitido religiosamente.
É claro para mim que ser de esquerda não é exactamente estar ao lado do PCP, do BE ou do PS. Mas não sou indiferente, porque tenho memória, à queda do partido comunista e à ascensão dos bloquistas, já que reconheço muito mais competência ao contra poder dos comunistas do que dos dirigentes do BE. Sobre o PS sempre achei, e o tempo tem vindo a dar-me razão, que os socialistas são muito mais frágeis ao ataque do poder capitalista que outro qualquer partido à sua direita.
Não tenho, longe disso, uma vida de combate ao lado dos pobres e desprotegidos. Não milito nem nunca militei num partido e jamais participei em manifestações. Mas nunca me deixei corromper pelos oportunistas. Não odeio os meus supostos inimigos. Nunca senti nem sei o que é isso do sentimento de inveja. Nunca sorri da desgraça dos outros. Trabalho desde os dez anos e por mais que a vida me sorria, ou seja grata, nunca esquecerei as humilhações que sofri noutros tempos e que sei que estão sempre guardadas para os pobres que não têm onde cair mortos. Por isso não me ofende o epíteto de comunista do meu amigo Borrego. Se ser comunista é ser fiel a princípios, a ideias e ideais, então eu sou comunista.
As notícias muito actuais sobre a vida política da deputada e vereadora da Câmara de Santarém, Luísa Mesquita, fizeram-me lembrar o meu amigo Borrego e a forma de me saudar familiarmente. Não sendo comunista, e supondo que Luísa Mesquita o é verdadeiramente, acho desonesta a sua atitude de confronto com o partido da qual é militante e no qual se apoiou para desempenhar importantes cargos e adquirir grande visibilidade pública. Os partidos precisam de militantes que não se agarrem ao Poder com unhas e dentes. A militância pode levar à dissidência mas não pode servir para desonrar a família política que se escolheu, principalmente quando o que está em causa é o apego desmedido ao Poder.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Memórias quase neo-realistas


Na inauguração do museu do neo-realismo, ao ouvir os discursos da praxe, não senti uma ponta de comoção. Bastou-me testemunhar, antes dos discursos, o entusiasmo sincero da presidente da câmara para me passar despercebido o cheiro do perfume da ministra da Cultura ou o sorriso de plástico do Presidente da República.Na inauguração do museu do neo-realismo revivi momentos da minha vida que me marcaram para sempre. Muitos daqueles autores famosos, que hoje são figuras de museu, ainda vivem na minha memória como se os tivesse conhecido de carne e osso.
Aprendi a escrever com José Gomes Ferreira; ganhei peito para ler um romance à luz da vela quando descobri os livros de Alves Redol; comecei a perceber melhor o mundo em que vivia quando descobri um livrinho de um autor chamado Vítor de Sá. No escritório onde trabalhei sete anos tinha tempo para ler revistas onde Antunes da Silva e Manuel da Fonseca publicavam contos e crónicas. Durante esses anos, como ajudante de guarda-livros, com a cumplicidade do chefe Joaquim Dias de Deus, passava bons momentos a ler e a exercitar a escrita sempre com um olho no burro e outro no cigano, embora soubesse que Dias de Deus era o meu anjo da guarda. Confesso, sem peso na consciência, que foi atrás dessa secretária que passei os melhores anos da minha vida. Foi lá que organizei os pensamentos; que desenhei os primeiros mapas de países imaginários; que escrevi (inspirado pela bondade do chefe e pela ruindade do que exercia a chefia) os meus primeiros textos literários.
O neo-realista com quem convivi verdadeiramente foi Álvaro Cunhal. Recordo-me dele em dois momentos únicos. O primeiro num convívio numa cooperativa de Vale de Cavalos; o outro na livraria Barata, em Lisboa, muitos anos depois, quando já estava quase cego.
Curiosamente, de todos os artistas ali representados é o que menos aprecio como autor. Quando leio os seus livros estou sempre a ver aquela figura de meter medo ao susto, de quem se podia esperar um discurso cheio de amanhãs que cantam e logo a seguir um comportamento que não permitia adivinhar-lhe um coração do lado esquerdo do peito.
Não sou doutorado em coisa nenhuma e prefiro viver o resto da minha vida a partir pedra do que a juntar-me ou a associar-me a pobres-diabos que escondem inapetência e cobardia com títulos e uma erudição verdadeiramente estéril. No meio de tantos retratos e memórias do neo-realismo senti-me outra vez ao lado do Manuel da Fonseca quando passeei com ele pelas ruas da Chamusca e o ouvi contar histórias de vida que nenhum museu do mundo pode guardar.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

A PJ e a luta entre Noras e Barreiro


Foi por causa do ex-presidente Noras e do ex-presidente Barreiro, políticos que se envolveram numa guerra que ainda hoje origina estas visitas da PJ, que fui à presença de uma juíza e saí de uma sala com um enxovalho de se lhe tirar o chapéu. Em determinada altura, por questões de justiça, barriquei-me ( acho que é a primeira vez que uso este termo na minha vida de jornalista) na defesa de valores e princípios de que ainda me orgulho. Os tempos passaram e a memória dos homens é muito curta. Por mim continuo a pagar a melhor das facturas. Por isso vou responder em tribunal por tudo o que escrevi. Com a consciência tranquila e certo de que vou ganhar na justiça por ter escrito a verdade e só a verdade.Saltei para a escrita deste texto depois de ouvir na Antena 2 o advogado e jornalista António Marinho dizer que quanto mais conheço os juízes mais gosto dos políticos (nunca tinha ouvido ninguém dizer mal da Justiça de uma forma tão subtil). Andava à procura de um pretexto para confessar que, recentemente, fui humilhado por uma juíza no Tribunal de Santarém de uma forma tão despropositada e sacana que, em vez de me indignar, fez-me sorrir tal foi a insensatez e o descaramento. Ainda hoje não sei o nome da juíza nem quero saber. Se voltar a encontrá-la, seja em que situa-ção for, tenho a certeza que a enfrentarei tão sereno como sereno fiquei passados cinco minutos de ter recebido o enxovalho bem salivado. Este assunto roubou algum espaço ao que é o tema da crónica desta semana. Como vem a propósito hei-de conseguir poupar nas palavras para facilitar a vida ao gráfico do jornal.
A visita da PJ a casa do ex-presidente da Câmara de Santarém, por ter coincidido com o dia em que a PJ fez investigações sobre pedofilia, originou alguns telefonemas para o meu telemóvel que me deixaram estupefacto. O boato sempre foi a mais terrível das armas de arremesso.
O homem com quem me solidarizei disponibilizando as páginas deste jornal pode estar à perna com a justiça, assim como eu, embora por outras razões. Para o caso não ponho prego nem estopa. Registo, no entanto, o facto de a PJ andar a fazer visitas domiciliárias a casa do ex-presidente Noras cinco anos depois da auditoria solicitada pelo anterior executivo camarário presidido pelo ex-presidente Barreiro.
Para fazer coro com António Marinho tinha que dar a mão à palmatória e reconhecer que os políticos da extirpe de Rui Barreiro e cª. são melhores que os juízes dos tribunais portugueses. Não são com certeza. Se fossem em vez de um enxovalho a tal juíza tinha disparado contra mim um balázio. E lá ia eu, sem o merecer, ficar com nome de rua em Santarém.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

O exemplo de António Paiva

Sempre ouvi dizer mal de António Paiva. Eu próprio, que o conheço desde a altura em que era vereador na oposição, não tinha sobre ele uma opinião muito favorável. Achava-o um sujeito esperto e pouco mais. O seu trabalho em Tomar e o percurso que está a fazer provam que não o conhecia bem. É verdade que ele ganhou a presidência da câmara devido às asneiras de Pedro Marques e ao clima de descrédito que se abatia sobre Tomar. Mas, hoje, António Paiva está para a cidade e para o concelho como o União de Tomar estava para o país quando tinha uma equipa de futebol na primeira divisão nacional. É um homem sábio, ou foi ficando sábio, quando ganhou as eleições e soube governar sem se colar a gente duvidosa; sem se meter em negociatas ou abrir negócios em nome de familiares; sem se aproveitar da política para enriquecer que é o que fazem, em muitos casos, os políticos das novas gerações. Dizem que tem um feitio azedo; que gosta de estar sempre do contra; que se fosse mais ambicioso podia ser o líder político de uma grande região em vez de ser o líder natural do Médio Tejo. Não é segredo, para quem o conhece, as suas divergências com a maior parte dos estrategas de algumas das instituições da região. Toda a gente sabe que ele é o grande responsável por a região estar dividida em duas Comunidades Urbanas. Foi ele que iniciou o descalabro do PS na presidência das principais autarquias da região (depois de conquistar Tomar, o PSD conquistou o Entroncamento e Santarém). Foi António Paiva que, ao conquistar a presidência da câmara de Tomar, retirou a hegemonia aos socialistas que dominavam em todas as frentes. Agora resta-lhes uma parte e ninguém sabe por quanto tempo se, por exemplo, os problemas com Paulo Caldas se agravarem e o PSD conseguir, em mais um assalto, uma outra câmara importante.
Ao fim de seis anos de mandato António Paiva já anunciou que não se recandidata. E não tem um delfim para o seu lugar. Aparentemente António Paiva prepara-se para tomar uma atitude de verdadeiro estadista. A sua decisão mostra um desapego ao poder que é de louvar. E que joga a seu favor noutras lutas futuras que queira travar pela liderança de outras instituições da região. E há muito para fazer para além do exercício de presidente de câmara. Com esta atitude António Paiva abre um novo ciclo na política tomarense. Se os candidatos forem os que se adivinham Paiva vai deixar saudades. Mas ficará na verdadeira História do concelho de Tomar.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

V. F. Xira e a intuição de Moita Flores

* Tenho uma péssima opinião sobre a qualidade do ensino no ISLA de Santarém. Não tenho nada contra quem lá trabalha embora uma vez tenha organizado o lançamento de um livro do poeta António Ramos Rosa que foi um fracasso. E o que nós trabalhamos para encher a sala de alunos. Se não fossem os colaboradores de O MIRANTE e dois alunos da associação de estudantes tínhamos ficado todos a falar com as paredes.
 * O concelho de Benavente vai ganhar o Aeroporto Internacional de Lisboa. Tudo indica que vai sair a sorte grande ao sucessor de Ganhão na presidência da Câmara. O engraçado é que ainda ninguém sabe quem é. Mas, pelos vistos, vai haver gente à altura. E quem escreve é a pessoa que menos sabe das verdadeiras notícias da política.
* O Entroncamento era há tempos atrás um autêntico centro comercial a céu aberto. A febre das construções e da abertura de novas lojas continua. Mas a afluência de pessoas à cidade dos comboios esmoreceu. Jaime Ramos precisa de se rodear de gente jovem com ideias para o ajudar a resolver o problema. Com a actual equipa acho que, um dia destes, vão todos ao fundo.
* Vila Franca de Xira não é nem nunca será a Sevilha portuguesa. Comparar Vila Franca com Sevilha é como comparar o Rossio, em Lisboa, com o largo do Pelourinho em VFX. Mas não tenho dúvidas que é a cidade da região que melhor defende e representa as tradições ribatejanas. E para isso contribuem em grande parte as gentes que se organizam em tertúlias e associações. Há muita má-língua à solta. Mas não acho que seja um problema. Pelo contrário: só não gosta de ouvir dizer mal quem não gosta de ser questionado. E a crítica é o sal do progresso.
* As direcções do União de Santarém destes últimos anos estiveram sempre ao nível dos executivos camarários. Não por acaso um dos ex-presidentes da câmara foi também presidente da assembleia-geral do clube. Nem com a chegada de Moita Flores as coisas mudaram. Quem lá está agora até pode ser gente com muito boas intenções. Mas a realidade não engana. Assim como o PSD só governa em Santarém graças ao fenómeno Moita Flores, a actual direcção da União só vai prolongar a agonia do clube. Resta a ilusão de que enquanto há vida há esperança. 
* Gosto de passear nas Portas do Sol, em Santarém, o mirante por excelência da região do Ribatejo. Esta semana não passei por lá. Estive entre amigos a tentar perceber a vitória de Menezes no PSD e o apoio certeiro de Moita Flores ao seu colega de Gaia. Pelo que conheço de Moita Flores acho que não vai querer exercer no partido o poder que este apoio lhe deve dar. Mas não tenho dúvidas que vai saber aproveitá-lo para pôr na ordem alguns laranjinhas que gostam de usar o emblema do partido para se amanharem.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Aprender a lição e manter o espírito


No regresso de umas férias, às quais aliei o trabalho e o lazer, no caminho entre o aeroporto e a avenida Pascoal de Melo, em Lisboa, com a mala cheia de livros, recebi à janela do táxi, sem precisar de pagar ou agradecer, três jornais diários. E confesso o interesse na sua leitura, que no entanto não me faz dispensar a do Público, do Expresso, do DN, da Visão, entre outros, dependendo da força dos títulos das primeiras páginas.É uma tentação escrever sobre o nosso trabalho. Bem sei que é batota. Não resisto, no entanto, a aproveitar o espaço para confessar o entusiasmo pelo futuro do jornal onde escrevo. Também por que é aqui que está a aposta de duas décadas de vida. De vinte anos de trabalho que passaram num instante com a ajuda dos leitores que nos acompanham desde o início ou nos apanharam pelo caminho e nunca mais nos largaram da mão.
Há dias estive em casa do jornalista e escritor Juan Árias e ouvi-o dizer com todas as palavras que o futuro dos jornais no suporte de papel está condenado. E depois contou como se vive hoje essa preocupação no El País, o jornal que ele viu nascer. E contou ainda como continua a fazer jornalismo, apesar da idade da reforma, numa cidadezinha do Brasil, isolada do mundo, e consegue saber e ler tudo o que lhe interessa sem sair de casa.
Nestas férias viajei muito de autocarro e, na rodoviária, nos transportes para cidades mais distantes, pude ver à entrada dos mesmos resmas de jornais (títulos de referência) para leitura gratuita de quem embarcava. Há muitos anos que vejo o mesmo nos principais aeroportos das mais importantes cidades da Europa.
Foi nessas viagens que aprendemos a lição (que nunca se aprende verdadeiramente) que fez com que um dia, já lá vão mais de uma dúzia de anos, o patrão do Expresso, ao conhecer o nosso projecto, dissesse que O MIRANTE estava dez anos avançado em relação à concorrência. Mantemos o espírito. Damos o coiro para fidelizar leitores através da assinatura. Mas nunca deixamos de dar a ler o jornal aproveitando todos os meios ao nosso alcance para fidelizar leitores que mais tarde se tornem assinantes.
Vamos fazer uma parceria, a muito curto prazo, com um jornal de referência, que nos vai fazer aumentar a tiragem para os números que perseguimos há muito tempo e que fará com que cheguemos a mais 30 mil leitores da região. Com a Internet, onde também investimos, e mesmo com a morte anunciada dos jornais no suporte de papel, ainda é possível fazer muito caminho caminhando. Quando a morte chegar de certo que não nos apanhará na praia.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

A falta de uma política florestal não é um crime?


Quando o nosso território florestal e agrícola for uma manta de retalhos, sem vegetação, sem animais, sem água, com os ribeiros e os rios secos e assoreados, já será tarde para acreditar em milagres. Pior do que perder a riqueza florestal e agrícola é perdermos a nossa identidade. Sem emprego para aqueles que ainda insistem em viver na sua terra, vamos todos de comboio para Lisboa, ou para os dormitórios de Lisboa, que há-de ser bem melhor do que viver na aldeia como os macacos vivem no zoológico (É claro que ficaremos sempre alguns. Quanto mais não seja para demonstração da espécie nas visitas guiadas para turistas nacionais e estrangeiros).Há trinta anos a charneca ribatejana era um oásis. Hoje é terra queimada. E, nos casos em que já não há memória do fogo, a charneca é um imenso eucaliptal. Mais uns anos e será o caos. Se os governos do país continuarem a olhar para os recursos dos nossos territórios da charneca como continuam a olhar para as reservas de ouro do Banco de Portugal, vamos ficar muito mais depressa sem a riqueza florestal que ainda nos resta do que sem o ouro português amealhado durante tantos anos.
Um dia destes só teremos olivais (no Alentejo) e eucaliptais. Tudo por conta dos espanhóis no primeiro caso e das celuloses no segundo. A falta de uma política florestal para o nosso território é um crime. Não sei quem é que vai responder por ele. Quem enriquece à custa do crime não é o país. São os donos das terras e os capitalistas das celuloses. Mas são os políticos os últimos responsáveis. E não vejo nenhuma razão para fazer dos proprietários dos terrenos os maus da fita. Num mercado de livre concorrência cada um procura defender os seus interesses o melhor que sabe e pode. Esperar que sejam os proprietários das terras a substituírem-se ao Governo do país é acreditar na Nossa Senhora de Fátima e, pior do que isso, é esperar que seja Ela a trazer-nos a salvação para a nossa floresta.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

A mania da calotice e tudo o que veio a propósito


A Câmara de Santarém é apenas um caso. Mas é emblemático. E não pode ser esquecido. Principalmente quando temos na nossa região uma das autarquias do país que mais respeita os prazos de pagamento a fornecedores, como é o caso da Câmara de Vila Franca de Xira presidida pela socialista Maria da Luz Rosinha*.Conheço muitos empresários que acham que a melhor forma de financiarem as suas empresas é com o dinheiro dos seus fornecedores. Quanto mais tempo demorarem a pagar uma factura mais barata vai ficando a mercadoria. E menos têm que recorrer ao crédito bancário. Conheço políticos que afinam pela mesma bitola. Há câmaras que acumulam dívidas a pequenos fornecedores durante anos a fio. Nalguns casos, numa e noutra situação, conheço ainda mais pequenos e médios empresários que viveram, ou ainda vivem, histórias dramáticas por causa da mania da calotice que afecta a mentalidade de tanta gente.
É verdade que estas práticas não são de hoje. Mas os tempos mudaram caramba. Para as novas gerações, que tomaram conta da nossa economia e da nossa política, já não serve a desculpa da educação salazarista. Salazar tem as costas largas. Mas não exageremos. Conheço algumas empresas que nos últimos seis anos ganharam vários processos em tribunal contra a Câmara de Santarém por esta se recusar a pagar o que devia. Pouca gente guarda memória do anterior executivo. Excepto os que ainda estão a arder com o seu dinheirinho e todos aqueles que tiveram coragem de afrontar o Poder e ganharam, com juros, na justiça.
Portugal era um país falido se fosse governado por alguns artolas do mundo empresarial e político da nossa região que não têm que trabalhar todos os dias com as apertadas regras de mercado. JAE

* Ora aqui está uma boa base de trabalho para o Secretário Geral do PS, José Sócrates, que nas últimas eleições autárquicas também apostou no homem errado para Santarém e acabou a perder uma das mais emblemáticas câmaras do país para o PSD, um partido que estava tão longe do Poder autárquico escalabitano como Portugal está, em termos de qualidade de vida, dos principais países da Europa.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Uma questão de desamor ao povo


O filme deve ser visto para percebermos a evolução da nossa sociedade. Para percebermos, apesar das injustiças que ainda vivemos, o que nos separa, passados trinta e três anos, desse estado miserável de obscurantismo e pobreza em que vivíamos.Anda por aí um filme, Torre Bela (ver texto sobre o filme nesta edição), que os portugueses deviam ver obrigatoriamente. Os mais novos para perceberem o que foi a Revolução do 25 de Abril e os mais velhos para lavarem a memória. A primeira vez que vi estas imagens ia caindo para o lado de espanto.
Fico magoado sempre que oiço alguém clamar por Salazar e pedir o “ó tempo volta para trás”. Não é que não tenha respeito pela memória de alguns homens desse tempo. É porque tenho memória que não compreendo como é possível eleger Salazar como um dos nossos melhores.
Fui testemunha privilegiada da revolução do 25 de Abril. Antes já ouvia conspirar e, depois, pude assistir a algumas acções que marcaram aqueles tempos. Passados todos estes anos recordo de memória alguns homens e mulheres desse tempo e rio-me do ridículo de algumas situações que vivi e de muitas outras que apenas presenciei. O filme Torre Bela é um documento que fala por todos nós. É um filme que ressuscita a nossa história recente. É um documento filmado no Ribatejo que todos os ribatejanos deviam ter em casa para mostrarem aos filhos.
Se há coisas a que sou fiel é à memória que guardo dos meus avós que me ajudaram a criar e a educar. Enquanto a minha avó ganhava para a sopa ripando camisas, eu fazia recados, nos intervalos em que não brincava na rua, descalço, com a roda de uma bicicleta. Sempre por perto. Não que alguém tivesse medo que eu desaparecesse mas porque “o trabalho do menino é pouco mas quem não o sabe aproveitar é louco”.
Não sei quem é que me ensinou, aos dez anos, a perceber que o mundo era injusto para com os meus. Por isso já nessa altura eu entregava à minha avó o que ganhava dos recados que fazia. E perguntava-me como era possível a minha avó ser uma pessoa tão boa, honesta e trabalhadora e ser assim tão pobre apesar de trabalhar como uma escrava.
Salazar foi o político português mais injusto da nossa História. Tudo o que fizeram à herdade e ao Palácio do Duque de Lafões, que este filme retrata de uma forma comovente de tão real e dramática, é culpa de Salazar, da sua avareza e do seu desamor ao povo português.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Elogio a um homem de carácter


Como a desgraça não está sempre atrás da porta finalmente a sorte protegeu-o e as receitas antecipadas da EDP vão permitir que ele mostre aos escalabitanos obra feita para, se quiser, ganhar um segundo mandato desta vez com maioria absoluta.Diz o povo que a maioria dos nossos melhores amigos são, ou foram, aqueles de quem mais desdenhamos. Eu não acredito nesta máxima embora não tenha por hábito desvalorizar os ditados populares. Pelo que me conheço nunca foi assim comigo. Sou capaz de tentar encostar um amigo à parede se tiver razões muito fortes para isso. Mas se ele se encosta está tramado: ter amigos fracos não é o meu forte.
Toda esta conversa porque, ultimamente, tenho reparado com mais atenção que o meu amigo Francisco Moita Flores tem passado dias difíceis à frente do executivo da Câmara de Santarém.
É público que apoiei pessoalmente a sua candidatura e que sou seu amigo.Ter inimigos fortes e empenhados em nos destruir, como foi o caso do anterior presidente da Câmara de Santarém, pode ser uma boa oportunidade para fazermos novos e melhores amigos. Este é o meu melhor exemplo.
Graças ao uso abusivo do poder, à ignorância do político que o PS escolheu para governar os destinos da autarquia escalabitana, tive oportunidade de conhecer melhor Francisco Moita Flores, um homem que faz da política um exercício de cidadania, para além de um ser humano de excepcionais qualidades.
Não sei o suficiente, porque julgo que nem ele saberá, se Moita Flores se recandidata a um novo mandato. Nesta altura, como sou seu amigo, isso é o que menos me interessa. Nem estou preocupado por não saber quem vai ser o próximo timoneiro da Câmara de Santarém, já com as vantagens adquiridas com a aprovação, para breve, da nova lei eleitoral que vai dar grandes vantagens a quem ganhar as eleições nem que seja por um voto a mais.
Se o PS ou o PSD, ou outro qualquer partido, conseguirem mobilizar alguém com a elevação de carácter, inteligência e sabedoria que quase todos reconhecemos em Francisco Moita Flores, Santarém nunca mais voltará ao tempo da apagada e vil tristeza dos anteriores executivos socialistas.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Os livros, a festa brava e o futebol

A ligação entre a literatura e a festa brava está bem documentada nos romances de Ernest Hemingway, nas telas e textos poéticos de Picasso, entre muitos outros. Mas não é só ao nível dos grandes artistas que estas duas artes se fundem. No seio de uma família dita normal, como é a minha, também se pode sentir a forte ligação entre o mundo das touradas e a literatura. Eu explico. Um dia destes participei numa tertúlia literária com escritores e jornalistas da moda. Durante duas horas entretive a minha fraca vaidade no meio de uma trintena de assistentes, entre os quais se encontravam meia dúzia de manequins que foram dar um brilho diferente à apresentação dos livros para este Verão.
O mundo à volta dos livros é verdadeiramente cinematográfico. Os escritores na sua grande maioria são tipos esquisitos. Os críticos têm um buraquinho ao fundo das costas por onde regra geral não cabe uma agulha. E os jornalistas de serviço à cultura são verdadeiros peralvilhos. Os grandes editores não têm rosto e quando têm é de cera. Os distribuidores de livros são, regra geral, uns falidos. Só para as livrarias e os leitores é que me faltam adjectivos. Ou por outra: deixem-me poupar palavras.
Tinha a memória ainda fresca deste fim de tarde passado no centro do mundo quando, à noite, em casa, depois de ter partilhado esta experiência, um dos meus filhos começou a fazer o relato entusiasmado de uma viagem a Badajoz para ver uma corrida de toiros. Desta vez foi ela que foi parca em palavras. Mas deu para perceber o encanto que lhe tinha despertado aquele mundo dos toiros e dos homens que, não sendo toureiros, nem cavaleiros nem forcados, são tudo isso e mais um par de chocas, tal é orgulho que sentem por pertencerem a um mundo verdadeiramente fantástico que tudo deve à arte e à fantasia. Tudo como na boa literatura.
Em tempos que já lá vão também viajei nestas nuvens. E nem imaginam como eu me entregava ao sonho. Ainda hoje sou capaz de me perder de amores pela festa brava, principalmente se vejo um jovem toureiro a usar o capote como as mulheres usam os olhos para conquistarem os homens. Mas, deixem que vos diga: o mundo da festa brava ao nível das relações humanas é igual, ou pior, ao ambiente dentro de campo nos jogos do campeonato do INATEL do meu tempo de jogador de futebol.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Em Setembro teremos novidades


Em pleno Agosto, quando o país fecha para férias, tenho a agenda cheia de apontamentos e de assuntos para agarrar com as duas mãos. Mas não é isso que me impede de comparecer a uma segunda-feira a meio da tarde numa consulta médica de rotina. O médico atrasou-se duas horas. Nesse tempo consultei mais de uma dúzia de revistas e recolhi apontamentos para não perder de vista assuntos que também podem ser abordados no nosso jornal de uma forma a interessarem os leitores da nossa região. Pelo telefone ajudei a acabar um texto e a finalizar dois ou três contactos. Atendi algumas chamadas de rotina e acompanhei os últimos desenvolvimentos da nossa conturbada relação com a gráfica.Às nove horas da noite, quando estou a sair do edifício do jornal, vou à sala dos comerciais e vejo um colega de trabalho a receber uma chamada. Do outro lado do telefone contam-se histórias de vida que parecem retiradas de um filme. Não sei se vamos contar a história tal é o dramatismo da situação e os problemas que estão por detrás da jovem que resolveu ligar-nos. O Marco Rodrigues não é jornalista nem nunca quis ser. Mas enquanto mantém um diálogo com a jovem faz um trabalho que me surpreende e faz pensar: ser jornalista não é só uma profissão: é um privilégio.
Escrevo estas linhas na véspera da saída da última edição de O MIRANTE em pleno labor para que o fecho do jornal decorra sem falhas e com o interesse que cada edição de O MIRANTE merece ter. Como sempre as questões da política preenchem uma boa parte do nosso quotidiano. Mas os jornalistas da Redacção sabem que não podem sustentar o seu trabalho apenas no que vão ouvir às reuniões de câmara e muito menos no interesse que os políticos julgam ter quando nos convocam para conferências de imprensa onde repetem o óbvio e o habitual.
Já não sei o que fiz ao papel onde tomei alguma notas para dar à Joana que anda a escrever a sua tese de licenciatura. Mas não perdi as duas folhas que rasguei de uma revista, praticando uma maldade que tanto condeno aos outros. Eram duas histórias que eu tinha que trazer no bolso para mostrar o quanto andamos distraídos no nosso próprio quintal e deixamos por conta dos outros o trabalho que nos pertence.
Se tivesse mais espaço contava com mais pimenta o que me aconteceu neste dia e me fez voltar a escrever para o umbigo. Em Setembro vamos dar uma vida nova ao nosso projecto mostrando que não andamos cá só para ver andar os outros.

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

O jogo das damas e a água no vinho


Foi graças ao jogo das damas que conheci pessoas importantes na minha aprendizagem da vida como foi o caso do poeta almeirinense Francisco Henriques (um dos maiores estudiosos portugueses do jogo das damas), e um Senhor de apelido Santos, um retornado das ex-colónias cuja memória já desapareceu da terra para onde veio viver os últimos anos da sua vida.Um tipo chamado Jonathan Schaeffer, natural do Canadá, desenvolveu um software que pratica o jogo das damas na perfeição. Quer isto dizer que uma partida de damas entre dois jogadores, que tenham acesso àquela inteligência artificial, acabará sempre empatada.
Fiquei a saber, por causa desta notícia, que há 500 triliões de posições possíveis das 24 peças do tabuleiro, entre outras curiosidades que não interessa falar agora.
Foi com este último adversário do jogo que, ainda bem jovem, aprendi a perder. É verdade. Nem eu, nessa altura, sabia o que era isso de aprender a perder. Foi com a experiência que ficava de cada partida que jogava com ele que aprendi a perder. Depois de me ter ensinado a jogar tudo o que tinha para ensinar comecei a ganhar-lhe. Como as nossas disputas eram sempre observadas como uma luta de galos, ele ficava tão envergonhado com as derrotas que queria sempre jogar mais um jogo. Como era um prático a cabeça dele aguentava jogar toda a tarde. Eu, mais jogador de estudo e táctica, a partir do décimo jogo já só fazia asneiras. Nem por isso, quando aprendi a perder, eu me negava a jogar mais um jogo, e depois mais outro, logo a seguir ao pequeno campeonato do qual saia vencedor. Como é evidente o crédito que angariava na assistência por lhe ganhar a partida, depois já não chegava quando começava a cometer asneira da grossa e ele ganhava quase todos os jogos que disputávamos a seguir.
Foi quando venci essa vergonha de ser gozado pela assistência, numa situação que eu próprio deixava criar, para que o meu mestre não saísse sempre humilhado da contenda, que percebi o quanto é valioso este sentimento de entregar a vitória ao nosso adversário se com isso não perdemos nada de relevante.
Esta lição é dos meus 18 anos quando a maioria dos meus colegas de escola já estudava na universidade ou trabalhava numa qualquer profissão. Nessa altura eu ainda trabalhava para a família e pouco mais sabia de um ofício que misturar água no vinho.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

A imprensa vive dias complicados


Também não gosto deste poder socialista que impõe regras sem olhar a meios. Por isso deixo aqui o meu protesto. Sem esquecer de lembrar que muitos do que estão agora a bramar não tiveram coragem para contrariar as medidas estalinistas do ex-governante do PS Arons de Carvalho. E, é bom lembrar, alguns até se puseram a jeito convencidos que estavam a contribuir para matarem a concorrência. É vê-los, agora, a gritar que o rei vai nu.Está escrito na testa dos socialistas, quando chegam ao Poder, que a imprensa deve ser livre mas a liberdade pode ser um bocadinho mais reduzida enquanto eles forem membros do Governo e tiverem o poder de legislar. Não é preciso recuar muitos anos para confirmar a falta de jeitinho dos socialistas para lidarem com a imprensa e com os jornalistas. No tempo de Arons de Carvalho o Governo resolveu moralizar os subsídios para a comunicação social regional. Vai daí impôs um preço mínimo de assinatura e o pagamento à cabeça. Ora aí está. Dentro de dois anos os apoios acabam. E o que fez Arons de Carvalho num tempo em que as empresas precisavam de liberdade para se adaptarem às novas regras de mercado que vêm aí? Em vez de acabar com os subsídios para aqueles que nunca criaram emprego, ou exigir a devolução do dinheiro entregue a empresas que não cumpriram, prejudicou os melhores empresários do sector que, de um dia para o outro, tiveram que adaptar o seu negócio a regras apertadíssimas.
Augusto Santos Silva chegou há dois anos ao Poder e já conseguiu uma verdadeira revolução no sector. Desta vez os mais atacados são os jornalistas e os grandes patrões da Imprensa. Questões como a Regulação e a Concentração dividem tudo e todos. De um lado o Governo e uma denominada ERC a clamarem por mais responsabilização das empresas e dos jornalistas. Do outro os empresários e os jornalistas a dizerem que a liberdade de imprensa não se coaduna com legislação para impor regras próprias de Governos antidemocráticos. “É flagrante a constante insistência governamental em proibir, travar, limitar, burocratizar. A competitividade de um sector tão crucial como o dos media não é minimamente importante para este Governo. O que interessa é espartilhar, controlar, cortando cerce as aspirações de convergência multimédia, de crescimento, de internacionalização que qualquer empresa de media deve ter, num mundo em acelerada mutação, em especial as privadas que não vivem do dinheiro dos contribuintes”, diz Francisco Pinto Balsemão o mais conhecido e combativo patrão dos media nacionais.

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Os valores da amizade e da afectividade


Como tive uma semana mais dorida dei por mim a valorizar o gesto mais simples e humano de alguém que desempenha uma profissão e nunca se esquece dos valores que o levaram a escolher determinado trabalho.Por razões que nem o diabo saberá explicar ainda passo muitas horas da minha vida a trabalhar com gente que está a chegar ao mercado de trabalho. Sempre que encontro alguém mais difícil de moldar desisto a meio. Já não tenho paciência para tentar acabar a obra de arte. Se recuar no tempo, agora que penso no assunto, acho mesmo que nunca consegui uma obra de jeito. Quem aprendeu comigo alguma coisa foi mais devido aos seus méritos a aprender que aos meus a ensinar.
Esta semana foi dorida quanto a este aspecto. De repente percebi o quanto valem os nossos recursos investidos a formar gente mais ou menos jovem. A maioria acha que já sabe tudo. E quando chega a hora de uma pessoa se virar do avesso surge então a paz de alma e a sensação de que chegamos ao fim de um capítulo da nossa vida. O que é estranho é que continuemos pela vida fora a cumprir esta missão com pessoas que mal conhecemos, que não nos estimam e, muitas vezes, se apoderam de uma parte da nossa afectividade que depois jogam no lixo e usam como sabão para o corpo.
Com alguma frequência recorro à ajuda de um farmacêutico como recorro, quando me falta a alegria suficiente, ao estímulo de um bom livro ou de uma boa sessão num SPA. Um dia destes a minha mulher foi à farmácia do costume aviar uma caixa de ampolas bebíveis. Duas semanas depois, numa ida à farmácia para a compra de um medicamento para as dores, o farmacêutico perguntou-lhe por mim e quis saber se não estava na altura de levar a segunda caixa de ampolas.
Vejo o meu farmacêutico meia dúzia de vezes por ano. Mesmo com a farmácia cheia de gente, e com tanto para fazer e gente para cuidar, é dele que recebo a maior prova de que no exercício de uma profissão se podem dar e receber verdadeiros testemunhos de amizade.
No meu trabalho é raro o dia em que não ando com alguém ás costas. E ainda tenho que usar albarda não vá alguém queixar-se que eu tenho o esqueleto duro demais. Fico a dever ao meu farmacêutico, que não trato pelo nome por que sei que ele não apreciaria, o favor de me ajudar a compreender melhor o efeito das ampolas bebíveis, e a necessidade de começar a encontrar um pouco mais de tempo para discutir com ele as opções tácticas do actual treinador do Sporting.

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Moita, Saramago, Berardo, Costa e outros


Este país não existe para além de Lisboa e do poder que se reparte entre as docas e a Assembleia da República. E, depois, o que nos resta é esta triste realidade: a votação de duzentos mil eleitores para a presidência de uma câmara completamente desgovernada deixa o país à beira de um ataque de nervos com Marques Mendes e Paulo Portas a darem tristes exemplos. Se isto é um país a caminho da descentralização, da modernidade, de uma nova era, de um novo fôlego, então eu vou ali a Espanha e já venho.No dia em que António Costa ganhou as eleições em Lisboa o DN publicou uma entrevista com José Saramago em que ele admite que o futuro de Portugal e de Espanha é a Ibéria, uma espécie de novo país com várias regiões. “Não é por isso que deixaremos de pensar e falar em português”, defende Saramago numa entrevista em que anuncia também a criação de uma Fundação com o seu nome que terá uma delegação na sua terra natal, a Azinhaga. No dia da vitória de António Costa, em Lisboa, José Saramago, o ribatejano que é motivo de orgulho para quase todos nós, abriu mão da nacionalidade e admite a integração de Portugal na vizinha Espanha.
Depois de ver a forma como as televisões fizeram a cobertura das eleições em Lisboa ( antes e depois da votação) , o nível de abstenção dos lisboetas e a reacção dos partidos derrotados que provocaram rupturas nas direcções nacionais, apetece-me fazer coro com Saramago e desejar que a integração se faça o mais rápido possível.
Pouca gente saberá que Moita Flores, o presidente da câmara municipal de Santarém, tal como Fernando Seara, o autarca de Sintra, foram hipóteses para candidatos a Lisboa pelo PSD antes da escolha recair em Fernando Negrão. Moita Flores não abre o jogo. Verdade ou mentira Moita Flores livrou-se de boa. Embora o PSD, com Moita Flores, não sofresse tamanha humilhação.
Nota. Foi também no domingo que visitei o Museu Colecção Berardo. E durante toda a visita não consegui ver mais nada que dólares e euros nas paredes do CCB. E, por detrás das obras de arte, o país envergonhado que precisa da fortuna de um especulador para apresentar ao Mundo uma colecção de arte. Alguém sabe quanto vale a colecção de arte da Caixa Geral de Depósitos ( que é do Estado) e onde é que ela é guardada? E quanto custa por ano ao erário público? Meus Deus, acho que se soubéssemos, depois deste escândalo Berardo, queríamos todos acordar espanhóis amanhã de manhã.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Uma viagem inesperada


Deixo aqui uma transcrição da Bíblia, do Livro da Sapiência, que Bunuel recorda na sua biografia ( edição Fenda) , numa homenagem a todos os ímpios como eu gostava de ser.Começo a leitura de um novo livro quase todos os dias. Quero um livro por dia como quero um sonho feliz todas as noites. Nem sempre consigo o livro e o sonho. Mas faço tudo para isso.
Um dia destes, enquanto lia entusiasmado uma biografia de Luís Bunuel, abri a internet e marquei para 24 horas depois uma viagem para Barcelona. Fui revisitar o mundo de Dali em Barcelona e Figueres. Aquilo interessa-me para manter a qualidade de vida. É verdade que ali para aqueles lados acabo por perder sempre mais tempo à procura da alma do Picasso do que do Dali ou de Miró. Mas a vida daquela gente interessa-me tanto como a minha própria vida. E, depois de descobrir Bunuel na sua biografia, com uma vida cheia e, tão ou mais interessante do que a dos pintores do seu tempo, não resisti e fui encher os caboucos para mais uma temporada.
(Porque os ímpios disseram para si próprios no descaminho do seu discurso: ) O tempo da nossa vida é curto e cheio de tédio; não há remédio contra a morte do homem e nunca se falou de alguém que tivesse regressado do sepulcro.
Porque nascemos da aventura, e seremos como se não tivéssemos sido, porque o sopro das nossas narinas é mero fumo e a nossa palavra é como uma faísca efémera que parte do nosso coração.
Quando se apagar, o nosso corpo será cinza e o espírito será dissipado como ar subtil.
E o nosso nome será esquecido com o tempo, e ninguém se recordará das nossas acções, e a nossa vida passará como o rasto de uma nuvem negra, dissolver-se-á como neblina afugentada pelos raios do sol e abatida pelo seu calor.
Porque o nosso tempo é como uma sombra que passa, e não é possível retirar o pé do nosso fim porque ele está selado, e ninguém regressa.
Venham e gozemos à grande dos bens que temos. Apressemo-nos a servir-nos das criaturas e da juventude.
Enchamo-nos do melhor vinho e de perfumes e não deixemos passar a flor da estação.
Sejamos coroados de botões de rosa antes que murchem.
Que nenhum de nós seja excluído dos nossos desvarios; deixemos em todo o lado marcas de prazer porque aí reside a nossa porção e o quinhão da nossa herança. JAE

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Notícias do incrível


É incrível a forma como a imprensa, na generalidade, faz tábua rasa de alguns notícias que incomodam o Poder. Toda a gente grita que o Governo telefona para as redacções a dar palpites e a tentar controlar. A verdade é que a generalidade da imprensa põe-se a jeito. Este é um bom exemplo: se a notícia que demos sobre as indemnizações aos rendeiros da CL fosse publicada num jornal de Lisboa toda a gente se repetia no dia a seguir uma vez que estamos a falar da suposta má administração de dinheiros públicos. E também por que não é de pôr de parte a hipótese destas negociatas terem a ver com o projecto do novo Aeroporto Internacional de Lisboa. Como a notícia nasceu fora do casulo em que se movimentam algumas dúzias de jornalistas influentes, amigos e companheiros de políticos influentes, faz de conta que não se passou nada. Esta é a nossa realidade. Somos um país governado por políticos de Lisboa a viverem paredes-meias com grandes jornalistas que conseguem ver o país olhando apenas das janelas dos seus gabinetes de trabalho.Sempre que puder não ocuparei este espaço com conversas sobre politica. Não é que não goste. Acho é que os jornais falam demais de politica. E dão demasiada visibilidade aos políticos. Por isso procurarei não pesar nesta tendência.
Na passada semana o O MIRANTE publicou uma daquelas notícias que muitos jornais de Lisboa e do Porto gostariam de ter publicado sobre as indemnizações a rendeiros da Companhia das Lezírias. Curiosamente, até hoje, terça - feira, só a SIC se interessou pela notícia embora não conheça o desfecho desse interesse.
A forma como o actual administrador da CL se portou neste caso também é exemplar. Primeiro não quis falar porque disse que se já tínhamos falado com o Ministério da Agricultura estava falado. Esta semana “mandou” entregar em mão, por um dos rendeiros, uma carta a explicar o óbvio como se nós fossemos todos uns tansos e não soubéssemos o que é uma negociata.
A Agência LUSA, que tem jornalistas a trabalhar na região, fechou os olhos para não ver a notícia do nosso jornal. Se alguém tivesse dado um traque no planalto de Santarém e isso afectasse o trânsito na A1 era certo que escreviam sobre o assunto. Nem que fosse para dizerem quem era o roto cá do sitio.
Esta gente do Poder, seja ele qual for, sempre teve boa imprensa. É assim com os reis do dinheiro, como está a acontecer com o Comendador Berardo, e sempre assim será com os políticos. Bom proveito.

quarta-feira, 27 de junho de 2007

A minha figura de parvo


Numa outra versão acabava de viver uma velha história dos anos 70 que se contava do senhor Silva, relojoeiro da Chamusca. Depois de pôr um relógio a trabalhar apenas com uma assopradela, fora da vista do cliente, o relojoeiro pediu um dinheirão pelo trabalho, confessando com vaidade a técnica usada na reparação. Chocado com o preço de uma assopradela, o dono do relógio lá acabou por pagar os quinhentos escudos depois de ouvir o mestre Silva explicar que o dinheiro que ia receber não era pela assopradela mas pelo que ao relojoeiro tinha custado aprender onde soprar.A câmara de vídeo avariou nas mãos do Pedro Oliveira. Sem saber como resolver a avaria a máquina cirandou de mão em mão durante duas semanas até chegar ao meu gabinete com a sentença lida: avariou por má utilização e o conserto fica mais caro que comprar uma nova.
Nas minhas voltinhas de trabalho por Lisboa resolvi incluir no roteiro uma visita a uma daquelas lojas onde ainda se atende o cliente como antigamente. Levei a máquina e pedi ajuda. Entre dois dedos de conversa ao balcão o senhor António devolveu-me a câmara de vídeo a trabalhar e como nova. Pelo meio de um atendimento que durou penas cinco minutos ficou um talão de conserto por preencher e o aviso para que não utilizasse determinadas marcas de cassetes e cumprisse, como um ritual, a forma de mexer em certos maquinismos. Como sou ignorante na matéria ouvi tudo o que tinha a ouvir e fingi que estava a dar boa conta do recado: de verdade nunca usei uma máquina de vídeo.
No caso da câmara de vídeo não tive que pagar nada. Mas os meus sentidos foram abalados pelas palavras do senhor António quando me devolvia a máquina e procurava um saco debaixo do balcão. Como não achou disse-me com um sorriso meio a sério meio a brincar: meta lá isso outra fez nesse saco horroroso onde trouxe a câmara e não diga que vai daqui.
O saco era vermelho e tinha escrito a letras gordas a marca Worten.
Há mais de uma semana que ando a magicar na minha figura, em Lisboa, com um saco da Worten na mão a fazer publicidade a uma marca e a um determinado tipo de comércio que também abomino e que vai acabando pouco a pouco com os senhores antónios do comércio alternativo que nos salvam nas horas aflitas.
Moral da história: antes de escrever esta crónica contei este episódio a um amigo: resposta dele: tu és cá uma peça! Quem é que no teu lugar se sujeitava a toda essa trabalheira por causa de uns míseros dois mil euros? Fiquei esclarecido quanto à figura de parvo que ainda faço todos os dias e que começa logo pela manhã quando me levanto da cama com um salto para o soalho.

quarta-feira, 20 de junho de 2007

Vale a pena ter memória


Esta semana, numa rápida leitura pelo Jornal do Fundão, que leio regularmente como leio outros jornais de referência, tive oportunidade de ler excertos de um texto do director e sobrinho de António Paulouro, o fundador do jornal, a propósito da entrega do prémio literário que foi criado com o seu nome. Diz Fernando Paulouro Neves que “a oito anos do centenário do nascimento de António Paulouro está na hora de se começar a pensar nessa data como forma de edificar um acontecimento nacional que faça luz sobre aquilo que foi a sua exemplaridade cívica e cultural (: ) sobre a sua capacidade de se adiantar ao sonho de uma terra, de uma região e de um país onde a felicidade fosse possível”.
O texto está cheio de palavras bonitas e de homenagem a António Paulouro mas o que me interessa trazer aqui, pelas palavras, é a defesa da memória de uma figura da região para que ela sirva de exemplo. E que a defesa surja de uma pessoa que trabalhou com ele dezenas de anos e com ele aprendeu tudo o que tinha para aprender. O que me faz escrever este texto é a admiração de ver alguém no lugar de outra pessoa a puxar pela memória dos homens para que não esqueçam quem ele substituiu e o trabalho que lhe foi legado.
Não conheço pessoalmente o actual director do Jornal do Fundão mas ouvi falar dele muitas vezes, nem sempre bem, na altura em que conversava com António Paulouro sobre os nossos jornais e o futuro da imprensa regional.
Sem querer, talvez porque o apanhei numa altura difícil da vida do seu jornal, uma vida difícil que durou muitos anos, António Paulouro fez-me confidências e partilhou comigo segredos sobre a gestão de um jornal que ainda hoje me servem de guia. Guardo dele ensinamentos que ainda hoje aplico na gestão da minha empresa e na relação com os meus colegas de trabalho. Sei de erros que ele cometeu, e de que se arrependeu, e pagou caro, que por os ter partilhado comigo me livraram de armadilhadas em que toda a gente cai e, às vezes, nunca mais se levanta.
Do actual director do Jornal do Fundão, que na altura já era o braço direito de António Paulouro, ouvi falar como se fala de um jornalista a quem se entrega o futuro de um jornal. Umas vezes com aquela esperança que sempre se tem nos da nossa família, outras com aquela desilusão e raiva por sabermos que quem está mais próximo de nós mais está acomodado. Hoje não tenho dúvidas que António Paulouro teve o sobrinho que merecia. E o jornalista que ele sonhava formar para que o Jornal do Fundão continuasse a ser “a memória de milhões de palavras escritas ao lume da velha inquietação em favor da condição humana”.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

O crime sem sangue pelo meio


Vem tudo isto a propósito de um estudo da Marktest divulgado na passada semana sobre o grau de conhecimento dos portugueses relativamente ao nome dos presidentes de junta de freguesia. Diz o estudo que uma grande maioria dos portugueses ignora o nome do presidente da sua junta de freguesia.Gosto da actividade política. Entendo que é uma disciplina da cultura mas uma disciplina valorosa. Já gosto menos dos políticos. Na minha opinião a política está cheia de caciques. Cheia de gente que não sabe fazer mais nada que conspirar, sacanear, apadrinhar e governar mal, nomeadamente gerindo muitas vezes de forma a defender mais interesses próprios ou privados que o interesse público.
Conheço muitos políticos que são verdadeiramente analfabetos. Não no verdadeiro sentido da palavra mas no que concerne à defesa da coisa pública. Esta semana recebi um telefonema de um político que dois dias antes me tinha espetado uma facadinha nas costas. E falou comigo como se fosse meu companheiro de estrada. Tenho montes de histórias para contar de políticos que não sabem fazer mais nada que conspirar. E praticar o crime embora sem sangue pelo meio. E sem remorsos na consciência.
Como é evidente os números são maiores quanto mais numerosas são as áreas populacionais. A nível nacional a percentagem dos portugueses que disse desconhecer o nome do presidente da sua freguesia é da ordem dos 37%. Mas se falarmos de vilas do interior o número já desce para os cerca de 10 %. Na grande Lisboa a percentagem é de meio por meio.
Talvez porque sempre vi O MIRANTE como um jornal das freguesias, um grande jornal feito a pensar nas pessoas que têm menos voz, nos cidadãos que vivem mais longe do poder, tenho pelos presidentes de junta uma admiração maior e mais sincera. Se um dia voltasse à política como na minha juventude, o que não é provável, gostaria que fosse numa junta de freguesia. Para poder ajudar a fazer um trabalho honesto e limpo como me parece que faz o presidente da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira, o socialista José Fidalgo. Vejo nele o autarca exemplar. O político que para governar não precisa de conhecer construtores civis ou especuladores imobiliários. O presidente de junta que não veste a pele do desgraçadinho mas também não olha de cima para o cidadão que bate à sua porta. Quando falo com ele não sinto que estou a falar com o Poder. Gosto das pessoas que servem a política e não estão na política para se servirem.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Depois de perder os olhos numa bela imagem…


Antes de acabar os cerca de cem metros do meu percurso a pé vi muito gente junta e tentei saber o que se passava. A conversa era sobre o Manuel Emídio. Tinha acabado de morrer no hospital de Santarém. E alguém olhava ao longe um dos filhos que daí a pouco já estava no meio do grupo de mulheres a confirmar a morte do pai. Tinha 82 anos e sempre que olhava para ele lembrava-me de uma mulher baixa e gordinha (Rosa Chora) que foi casada com ele uma vida inteira e que me tratava por primo e me beijava e tentava abraçar como nem os irmãos se abraçam uns aos outros.Na última sexta-feira, logo pela manhã, ao sair de casa, a porta do meu carro não obedeceu às ordens da chave electrónica. Andei cem metros a pé na minha vila e encontrei a Virgínia com quem conversei no meio da rua durante 15 minutos sobre o facto do José Galinha continuar algaliado depois de tantos anos e ninguém a ajudar a encontrar uma solução para aquele sofrimento. Médico para lá e médico para cá, uma pessoa fica doente só de ouvir contar como certas vidas, a partir de determinadas idades, duram anos e anos em condições que cegam e destroem a alma. Sabendo-se, muitas vezes, que a falta de soluções para tanto sofrimento está na falta de dinheiro e influência para recorrer a bons médicos e a boas clínicas.
A meio do caminho parei outra vez para uma conversa de cinco minutos e ouvi a história do António José Lopes (Guerra) que tinha morrido no dia anterior, depois de quase duas dezenas de anos de sofrimento por causa de uma doença congénita. Soube que as autoridades exigiram uma autópsia antes do corpo descer à terra e fiquei embasbacado. E dei corda a uma conversa que sei que corre na vila como o vento (ver notícia nesta edição) e que espelha a desconfiança que mina cada vez mais a relação entre as pessoas. Como se o nosso mundo fosse todo igual aquele que todos os dias nos entra em casa nos noticiários das televisões.
Quando cheguei ao meu destino, depois de perder os olhos numa bela imagem que sempre se atravessa no meu caminho, encontrei a Maria Domicilia e o Francisco Nalha, que também já vão na casa dos 80 e sempre que me vêm, principalmente ela, dá-me um abraço e um beijo como a um neto. E fala-me do tempo em que toda a gente ia para a Azambuja fazer searas de tomate, e eu também ia com os meus pais descalço e com as calças rotas no cu.
Quando voltei ao carro tinha passado uma hora. E já não tenho a certeza se não foi nesse dia que, antes de abrir a porta, estive à conversa com o António Lima que me disse que não há nada que não lhe aconteça (está quase cego, anda a caminho do IPO etc, etc…). Diz ele que só lhe falta uns cornos porque teve a sorte de casar com uma mulher séria.

quarta-feira, 30 de maio de 2007

Os problemas vão continuar com Moita Flores


Penso o mesmo em relação à CULT e à falta de coragem política de Sousa Gomes para salvar a face nesta guerra que começou por envolver o administrador executivo mas que já está a ferir a relação pessoal entre presidentes de câmara.Quem conhece bem o presidente da Câmara de Santarém sabe que a região ganhou um dos autarcas mais tesos do país e um homem de uma qualidade intelectual e moral excepcional. Não admira por isso que Moita Flores tenha pegado pelos cornos alguns assuntos polémicos que lhe vão dando água pela barba. Mas que demonstram uma coragem política que fazia falta à região.
Este braço de ferro com o CNEMA é um virar de página na política da Câmara de Santarém para com a instituição que sempre viveu em grande parte à custa da câmara embora seja uma entidade público - privada com fins lucrativos. Deixo as considerações para outra altura. Mas se Moita Flores ganhar esta batalha e puser esta administração a fazer o que nenhuma fez até agora o seu mandato está ganho. E a autarquia de Santarém ganha o estatuto que parecia perdido.
Moita Flores chegou à Câmara de Santarém para mudar o estado das coisas. Aparentemente, a primeira coisa que tentaram fazer-lhe na CULT foi pô-lo na ordem. Como era previsível ele pediu respeito e mais consideração pela sua pessoa e pela sua autarquia. As reacções são as que se conhecem.
O que nos interessa deixar claro nesta crónica é que Moita Flores não chegou à região acomodado e disposto a pactuar com a mentalidade reinante. Ganhou as eleições em Santarém e quer provar que a capital do distrito não é um verbo-de-encher na política regional. De certo que as suas lutas vão custar-lhe ainda mais dissabores. Sousa Gomes e António José Ganhão, só para citar dois exemplos, têm na CULT um parceiro à altura para animar o debate e a discussão se não entrarem em guerrinhas pessoais e souberem separar o trigo do joio.
Moita Flores não veio apenas inaugurar uma nova era na Câmara de Santarém. Veio também para afrontar alguns interesses instalados e, por isso mesmo, pouco habituados a serem postos em causa. Está na cara que os problemas vão continuar com Moita Flores. Resta saber como é que todos os Joões Machados que abundam por aí, fingindo que gostam da região e que dão o coração por ela, vão conseguir anular a vontade férrea do presidente da Câmara de Santarém.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

As palavras mais belas e as notícias mais justas


Apesar das críticas, e também dos elogios, tenho sempre dúvidas sobre se o caminho que estamos a trilhar é o melhor. Todas a semanas agarro neste jornal e pergunto a mim próprio se não seria possível fazer melhor. Se não deveríamos ter ido um pouco mais longe na pesquisa da informação, na qualidade da escrita, na busca das palavras mais belas e das notícias mais justas.Um dia destes, no lançamento de um livro de um amigo poeta, ouvi o escritor e jornalista Baptista-Bastos, de quem sou admirador, dizer que tem o mais profundo desprezo pela imprensa portuguesa. Principalmente pela chamada imprensa de referência que escreve um português codificado e que não faz mais do que servir o Poder dando-lhe permanentemente a sua imagem devolvida.
Dizia ele que temos a melhor música popular, os melhores poetas, os melhores criadores mas, regra geral, isso não é notícia nos jornais nem na televisão. Uma hora antes da apresentação do livro ouvi-o dizer que O MIRANTE era, hoje, aquilo que tinha sido o Diário Popular nos velhos tempos: um jornal popular que dá a voz às pessoas já que é assim que um jornal pode e deve cumprir a sua missão.
Antes de jornalista e gestor deste jornal sou um crítico permanente do meu trabalho e do ofício das pessoas que fazem equipa comigo. E cada vez que ouço alguém falar mal do trabalho dos jornalistas, ainda que em abstracto, sinto sempre que sou o alvo principal das críticas e que ainda tenho que comer muito sal para editar o jornal que os nossos leitores e anunciantes merecem.
Hoje (escrevo a uma quarta-feira) recebemos na redacção alguns telefonemas de pessoas que, por várias razões, entenderam fazer ouvir a sua voz enquanto liam o jornal ainda a sujar as mãos de tinta.
Houve pelo menos um caso em que tenho que reconhecer a injustiça do esquecimento. Um caso em que me demiti das minhas responsabilidades e não dei a ajuda que devia ter dado a um dos meus catorze colegas jornalistas que escreveram para esta edição. Por isso, logo que recebi o recado, fiquei triste. E olhei para o jornal e para as 88 páginas das três edições diferenciadas, que concentram uma árdua semana de trabalho, e disse uma asneira. Porra…. e como é que é possível ainda haver tanta gente contentinha da silva nesta profissão que nos leva o couro e o cabelo!

quarta-feira, 16 de maio de 2007

O Rio de Janeiro a Caparica e Tejo


A melhor paisagem do mundo é aquela que vive nos nossos olhos infantis e o bem-estar ideal só pode ser fruto da recordação de todos os nossos melhores momentos de felicidade. Terei pensado mais ou menos isto quando, numa dessas manhãs, reparei que para encontrar a tranquilidade que tanto ansiava foi preciso andar 10 horas de avião e correr na praia de uma cidade que, embora toda a sua beleza, é igualmente uma das mais perigosas do mundo.O arquitecto Saraiva, director do semanário Sol, perdeu-se um dia no Rio de Janeiro, mais precisamente na zona de Copacabana e, pensando alto no meio daquele imenso areal, com uma vista espectacular para o calçadão, imaginou o mesmo cenário para a Costa da Caparica. Só um lisboeta poderia imaginar a transformação da imensa Costa da Caparica numa Copacabana à portuguesa. Construir prédios, mesmo que fossem só hotéis, numa zona protegida como é a zona da Caparica, onde se estendem quilómetros de praias, seria tão criminoso como autorizar a instalação de uma pecuária num terreno baldio entre o Estoril e Cascais.
A primeira vez que visitei o Rio, para participar numa conferência internacional sobre Jorge de Sena, tive o privilégio de dormir num daqueles hotéis à beira do calçadão, que também me permitiu alguns passeios às 6 da manhã naquele imenso areal.
À porta de casa, a cerca de quinhentos metros dos degraus da minha porta, corre o rio Tejo, e o seu leito, de Abrantes a Vila Franca de Xira, tem sempre um areal mais limpo que o de Copacabana, para além de uma vegetação admirável, onde temos liberdade para correr, dormir, fazer piqueniques, pescar, armar tenda, assistir ao pôr do sol mais bonito do mundo, enfim, só tomar banho é que é tão perigoso como nas praias poluídas do Rio de Janeiro quando os sistemas de tratamento dos esgotos avariam, o que não é assim tão raro para aquelas bandas.
Não tenho a pretensão de chamar nomes ao director do Sol nem acho que a ideia dele não seja engraçada. Mas apenas para um projecto de computador. E para lisboeta ver numa exposição sobre a área metropolitana de Lisboa no ano 2997. Mas fico a dever à sua ideia peregrina a oportunidade de confessar que quase todos os fins-de-semana me sinto no areal do Tejo como se andasse na praia de Copacabana, Ipanema ou Leblon.

quarta-feira, 9 de maio de 2007

Beber uns copos e depois fazer um convite


O que eu não consegui compreender no meio do alvoroço criado foi a voz grossa do presidente do sindicato dos jornalistas, essa figura às vezes boba que de vez em quando aparece como o salvador da classe.Se há pessoas na política por quem tenho consideração e estima é pelo presidente da Câmara de Almeirim José Sousa Gomes. Porque é um Homem bom e humilde. E a minha admiração por ele não é de hoje. É desde o dia em que o conheço. Estou por isso à vontade para escrever que ele deve provocar urgentemente uma pequena revolução na CULT, da qual é presidente, correndo o risco, se o não fizer rapidamente, de comprometer o seu prestígio e a sua honorabilidade. Assim como deve remodelar o seu gabinete, na autarquia de Almeirim, de forma a não cometer deslizes como o mais recente que foi convidar jornalistas a escreverem sobre o seu concelho para que os melhores textos tivessem depois um prémio envenenado.
Não tenho dúvidas sobre a sua inocência. Prova-o o pedido de desculpas que fez logo a seguir à saída da notícia e às reacções que não se fizeram esperar. Não é normal ouvir um político a pedir desculpas. Sousa Gomes bem podia ter inventado outra razão qualquer para esconder a face nesta situação caricata.
Nas barbas do presidente do sindicato existem dezenas ( ou serão centenas ?) de jornalistas de renome ligados a órgãos de dimensão nacional de grande prestígio que fazem o que muito bem entendem sem que sua excelência levante a voz e tenha uma palavra de apelo ao bom senso. No mínimo ao bom senso. Dou um exemplo que é gritante: a excelente revista da CCDR-LVT, um organismo do Estado, tem uma redacção composta pelos jornalistas mais prestigiados ligados a outros tantos órgãos de informação prestigiados como é o caso de Ana Sousa Dias da RTP e Fernanda Câncio do DN ( só para citar dois nomes mais mediáticos). Isto não é mais grave para o prestígio da classe que um inocente convite do presidente da Câmara de Almeirim que, nesse dia, devia ter alguém no seu gabinete que bebeu uns copos?
De todas as vozes chocas que se levantaram contra o presidente da Câmara de Almeirim só cito a do presidente do sindicato dos jornalistas. Mas é certo que outras vozes se fizeram ou ainda se vão fazer ouvir. A maioria serão com certeza vozes chocas de galos arrufados.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Ganhar a vida com o cartão do partido


Para ele a maior honra foi ter ajudado a fazer a Revolução. E, por força das circunstâncias, e do seu valor como militar, ter sido um dos homens mais influentes que derrubaram o antigo regime.Fui assistir à entrega da medalha de ouro da cidade de Santarém ao Capitão de Abril Salgueiro Maia. Estive do lado da assistência a bater palmas aos ilustres oradores, entre os quais se encontrava o político e poeta Manuel Alegre. E com o povo anónimo aplaudi e senti a emoção dos aplausos em memória de um homem que ajudou a fazer a revolução e não quis nada em troca.
Quase todos os oradores usaram as palavras habituais que caracterizam a atitude nobre e honrada do Capitão de Abril. Salgueiro Maia foi um herói humilde. Jamais se deixou usar pelos oportunistas e nunca foi na cantiga de aceitar cargos e prebendas.
Sempre que os oradores falavam do seu desapego a honrarias e da atitude nobre de nunca se ter servido do Estado, ficava mais visível para mim, na primeira linha dos ilustres convidados, uma das figuras presentes. Refiro-me ao presidente da Região de Turismo do Ribatejo, o ilustre socialista Carlos Abreu, talvez o homem político da nossa região que exerce há mais tempo um cargo público, e cujo trabalho ninguém conhece mas cuja remuneração é superior ao de um presidente de câmara. Não posso falar em nome de ninguém, muito menos de Salgueiro Maia. Mas tenho a certeza que se ele fosse vivo jamais apertaria a mão a um político que se serve de um cartão de militante para ganhar a vidinha sem fazer nada.
É claro que a culpa é do sistema que permite este descarado e vil aproveitamento de um Estado mal governado. A culpa é desta democracia de farta brutos. De arranjinhos e cestos de ovos à medida dos interesses partidários. A culpa também é da nossa falta de militância cívica para denunciarmos as aberrações que continuam a manchar a nossa frágil democracia.
PS: Como se esperava ninguém falou durante esta homenagem da forma como a antiga Câmara de Santarém tratou a estátua de Salgueiro Maia. Talvez por isso foram notórias algumas ausências. Se não compareceram por vergonha acho que merecem ser perdoados. Deus também lhes perdoaria.

quarta-feira, 25 de abril de 2007

A Caixa Geral de Depósitos


Segundo notícia do “DN” os dirigentes do PS e PSD de Leiria mandaram as estruturas nacionais às ortigas e reuniram-se para concertarem estratégias e discutirem em conjunto “os grandes projectos nacionais com interesse para a região” entre os quais, como é evidente, se inclui o novo aeroporto. Por cá a situação é de bradar aos céus. O PS distrital está entregue ao Rodrigues e o PSD está tão longe de se sentar à mesa com os dirigentes do PS como nós estamos da lua.Sou um adepto da regionalização. Não tenho modelos para apresentar nem acho que existam modelos ideais. Contentava-me com a regionalização do país segundo as actuais divisões administrativas. Creio, no entanto, que o país ainda vai demorar muito anos a encontrar o caminho que nos vai levar à regionalização. Conheço o perigo dos governos regionais de que Alberto João Jardim é um bom exemplo. Há formas de caciquismo mais violentos que o fascismo. Em Espanha já se realizaram manifestações com palavras de ordem do género: “no tempo de Franco era mais fácil lutar.” Mas também conheço bem este nosso velho país governado, muitos vezes, ao sabor de interesses inconfessáveis.
Os episódios à volta do novo aeroporto da Ota vieram reforçar a minha veia regionalista. O PSD, que deu o primeiro passo para a OTA, agora é contra esta solução porque já não está no poder. Sócrates já prometeu que não volta atrás. E eu confio nele. Mas os principais dirigentes do PSD ainda nos tentam fazer crer que este país tem que ser governado de forma irresponsável, com estudos em cima de estudos, como se Portugal fosse uma Caixa Geral de Depósitos. Não é. E todos sabemos isso. Sabemos mais ainda quando vivemos e trabalhamos fora dos grandes centros e sentimos o peso da interioridade como os mortos sentem o peso do caixão.
Não batas mais no ceguinho, dirão alguns dos nossos leitores mais avisados. Mas será que merecemos políticos tão deprimentes? Ora aí está uma boa pergunta para a qual gostava de ter uma resposta.