quarta-feira, 26 de março de 2008

Uma espécie de diário


A dirigente nacional do PSD, Paula Carloto, não gostou das nossas notícias sobre a sindicância à câmara de Lisboa que envolvem o seu companheiro, arquitecto e chefe de divisão na autarquia, e ela própria na qualidade de empresária. Vai daí fez duas queixas à Entidade Reguladora para a Comunicação Social numa clara tentativa de intimidar muito mais do que de se defender, já que era aqui nestas páginas que ela poderia explicar-se se tivesse alguma coisa de importante para esclarecer. Paula Carloto é o espelho do actual partido de Menezes: um partido à deriva sem dirigentes à altura.
Se alguém duvida disso, desculpem-me a franqueza, só ajuda a confirmar a inteligência budista que considera a burrice pecado mortal.


Sem saber ler nem escrever publiquei ao longo destes últimos 20 anos em seis antologias que reúnem poesia ou intervenções em colóquios. Um dia destes encontrei um desses livros que publica todas as intervenções num congresso sobre Jorge de Sena, em que tive o privilégio de  partilhar a mesa com ensaístas como Eduardo Lourenço e Eduardo Prado Coelho. Relido o texto agora percebo melhor porque tenho tanta dificuldade em escrever mesmo que seja uma simples crónica de jornal. Ou muito me engano ou a minha prosa envelhece mais rápido que as barbas do milho.


Os estudos da Marktest continuam a mostrar que O MIRANTE é o maior e o mais lido jornal português na nossa área de influência. O mérito é de quem o edita mas também é muito o de quem o organiza e dirige seja a nível editorial, comercial ou administrativo. De uma certeza estamos todos conscientes: os êxitos de O MIRANTE como jornal são para comemorar sempre a dez anos de distância. Nesta altura ainda estamos a comemorar o dia em que há cerca de dez anos resolvemos apostar nas três edições diferenciadas. De um livro recente de Paulo Francis retirei a seguinte frase sobre a vida numa grande cidade que serve que nem ginjas para o que quero deixar implícito: “dominávamos as ruas em que hoje seguramos as carteiras e as mulheres escondem as correntes de pescoço”.


Vou gozar umas férias nas próximas semanas. Não ficarei longe e provavelmente vou escrever e ler todos os dias muito mais do que o habitual. Não sei é se me vai apetecer escrever para este espaço (escrever sobre o assunto pode ser uma boa razão para não faltar a este compromisso com os leitores).

quarta-feira, 19 de março de 2008

A minha forma de estar do contra


Confesso a minha admiração pelo primeiro ministro José Sócrates e pelo trabalho que está a tentar fazer no actual Governo. Acho que o país nunca teve um primeiro-ministro como ele, com coragem para iniciar reformas que são urgentes e das quais depende o futuro dos país e uma vida melhor para os portugueses.
Gosto mais dele ainda quando faz cara feia, e usa o seu melhor português para responder à comunicação social, e dizer que está zangado, mostrando a sua revolta como qualquer mortal que tem o direito à indignação e não se importa de o mostrar ao país para todos saberem que ele é de carne e osso como qualquer um de nós.
Só pelo facto de continuar a ver nos locais públicos de Lisboa a frase infame de que Sócrates é isto e aquilo tenho pena dos partidos e dos políticos que lhe fazem oposição. Tenho medo só de pensar que alguns dos seus correligionários usam e abusam do poder para intimidar jornalistas e manifestantes. Mas quero crer que ele, Sócrates, não tem tempo para se coçar, quanto mais para arregimentar gente facciosa como são alguns dos seus camaradas e opositores políticos.
Apesar de gostar de ver o jornal “Público” a fazer investigação sobre questões relacionadas com o passado de Sócrates, e muito bem, não deixo de me interrogar sobre um projecto jornalístico que não se sustenta segundo as regras de mercado, mas sim à custa de um grupo económico. Se eu fosse PM e tivesse atrás de mim um jornalista pago por Belmiro de Azevedo, que há vinte anos sustenta uma empresa que todos os anos dá prejuízo, não me calava e, se pudesse, fazia uso disso para me defender.
O segundo homem mais rico do país, que tem todas as suas empresas a dar lucros fabulosos, não aguenta por acaso durante vinte anos uma empresa de comunicação social que dá prejuízos de milhões desde que viu a luz do dia, como é o caso do “Público”. Num país em que as regras de mercado funcionassem regularmente, e normalmente, o jornal “Público” já era. Digo eu que sou leitor do “Público” desde o primeiro número, compro-o na banca todos os santos dias do ano, e acho o “Público” um dos jornais mais bem feitos do mundo onde trabalham, e já trabalharam, na minha opinião, alguns dos melhores jornalistas portugueses.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Duas histórias (quase) exemplares


Recebi um dia destes um recado de um leitor de Alpiarça que me pedia encarecidamente para interceder junto do presidente da câmara local no sentido de acudir a uma situação de grande dificuldade. Prontifiquei-me a ajudar a resolver o problema e aconselhei o meu interlocutor a esquecer essa figura bacoca que me parece ser a cada dia que passa o actual presidente da autarquia.
Em tempos que já lá vão assisti à vitória eleitoral do PS num concelho onde o PCP exercia o poder com arrogância. De tal forma que aconteceu o que todos achavam impossível. Passados todos estes anos o poder local fez obra, como não podia deixar de ser, mas em termos de democracia a Câmara de Alpiarça não está melhor do que nos tempos dos comunistas. Ou muito me engano ou a história local um dia dará conta que o actual presidente, que prometia o céu depois do inferno, herdou todos os defeitos dos seus antigos opositores e acrescentou-lhe outros bem piores: a relação com os jornalistas é de cortar à faca, os episódios caricatos que têm sido notícia espelham bem o carácter do homem público e político que ainda é presidente da câmara. Depois de uma vitória tão desejada, e que demorou tantos anos a conquistar, Rosa do Céu prepara-se para abandonar o barco tão triste e cansado que dir-se-ia ter passado nestes últimos anos os dias mais infelizes da sua vida, que só um lugar como presidente de um qualquer conselho de administração, de uma grande e rica empresa, compensará devidamente.
As notícias que vão sendo publicadas sobre os crimes na noites de Lisboa e do Porto, e sobre corrupção e promiscuidade entre poder político e financeiro, se estivessem a chegar a Portugal de Itália por meio de uma agência de notícias todos nós diríamos, olha que admiração é o país da Máfia!. E com esta exclamação arrumávamos o assunto que é exactamente o que faz o país inteiro, embora as notícias não cheguem de Itália mas do país real.
Esta semana ouvi dizer alto e bom som, numa situação excepcional, é verdade, mas ouvi dizer dentro de um grande edifício público, de uma empresa pública, que em determinados andares não há cão nem gato que não tenha na garagem um carro de alta cilindrada, oferta pelos serviços prestados à canalha dos concursos públicos.
Não sei como é que se moraliza um país habituado a chorar por tudo e por nada, que se vende por meia dúzia de patacos, cheio de políticos actores como Paulo Portas e Luís Filipe Menezes. Não sei nem tenho a pretensão de saber, embora não perceba como é possível um ministro de um Governo do meu país dar um edifício a uma empresa que explora o jogo da batota assinando um papel escrevendo simplesmente: “tomei conhecimento”.

quarta-feira, 5 de março de 2008

Uma experiência pornográfica


Hoje acordei com a memória de uma emoção estética. Eu explico: do trabalho para casa, quando viajo noite dentro pela estrada do campo, as raposas atravessam-se no meu caminho. E quando tenho a sorte de as ver aparecer à luz dos faróis do carro, e consigo acompanhá-las com o olhar, fico encantado com a beleza do que vejo. Fascina-me a imagem das raposas a correrem de uma vinha para um pomar; de uma terra semeada de trigo para uma terra lavrada; E guardo algumas imagens de quando elas surgem na estrada até quando desaparecem por entre a vegetação, na outra berma, que comparo ao prazer que tive a ver uma determinada pintura, uma escultura, ou quando releio um poema, ou revejo certas imagens que ficaram na minha vida e que só esquecerei quando a memória soçobrar.
As minhas memórias estão cheias de raposas que comiam as galinhas e os coelhos dos meus vizinhos de infância. Vi dezenas e dezenas de vezes o meu avô paterno armar o ferro de apanhar raposas no meio da charneca. Lembro-me de ouvir falar das caçadas às raposas como me lembro de alguns contos infantis em que a raposa é a protagonista. Sempre percebi que para a maioria dos homens a raposa é um animal a abater. No meu inconsciente sempre vi as raposas com os olhos de uma criança que gostava de as acompanhar nas visitas nocturnas aos galinheiros e às coelheiras dos meus vizinhos.
Se há imagens que me fascinam, e que eu procuro todos os dias quando viajo na estrada do campo, é a silhueta de uma raposa a atravessar a estrada a caminho da maracha do Tejo, esse lugar onde tudo acontece fora do alcance dos nossos olhos no meio das canas e das silvas, dos salgueiros e dos choupos, e da vegetação que esconde todos os animais de mil patas da nossa infância.
Nota: Há muitos anos que conheço uma velha “raposa” da política que um dia destes também se atravessou no meu caminho (ou fui eu que me atravessei no caminho dela?). Porque só conheço as raposas livres e em movimento, e nunca mataria uma raposa pelo prazer da caça (que gosto mas não pratico), facilmente me deixo apanhar como um coelho no meio do restolho. E se for uma velha “raposa”, como é o caso, nem vos conto, com vergonha, a vergonha que senti ao ser apanhado.
Se uma bela raposa atravessa a estrada à minha frente posso ter uma emoção estética mesmo alguns dias ou anos depois e com uma simples lembrança. Ver uma “raposa” a furar pelo buraco da rede da nossa coelheira, e comer-nos como a um coelho macho, é uma experiência verdadeiramente pornográfica.