quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

A Nersant e os “mártires da pátria”

Domingos Chambel resolveu fazer de O MIRANTE um bode expiatório por ter penado durante tantos anos para chegar a presidente da Nersant; o que não tem coragem para dizer de José Eduardo Carvalho e de Maria Salomé Rafael, de quem dependeu sempre a sua candidatura a líder da Nersant, descarregou em cima da administração de O MIRANTE e depois dos seus jornalistas.

O conselho regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) deliberou recentemente enviar para análise do Ministério Público a decisão do presidente da Nersant de proibir dois jornalistas de O MIRANTE de assistirem a uma conferência de imprensa, convocada a propósito de uma notícia do nosso jornal. Veremos se a atitude quixotesca e sensória de Domingos Chambel, e de alguns dos seus fiéis seguidores, merece o interesse do Ministério Público para que seja deduzida acusação contra os dirigentes e a associação. O tribunal depois dirá se Domingos Chambel tem condições para continuar como dirigente associativo (ler notícia na página cinco). Em democracia ninguém se pode comportar como Domingos Chambel, que falou e actuou em nome de uma associação como se fosse seu dono e tivesse poderes para calar quem acha que pode escrutinar o seu trabalho e o dos seus colegas. 

Toda a gente que conhece a associação empresarial sabe o que se passa na Nersant e certamente que nada de bom ficará para o futuro. Esta decisão da ERC, de participar o ocorrido ao Ministério Público, é uma boa decisão que entendi não deixar de referir para lembrar o seguinte: em 35 anos de vida os jornalistas da redacção de O MIRANTE já levaram nas fuças, já foram insultados de filhos da puta para cima, já nos furaram pneus dos carros, fizeram bullying até nos enjoarem e enojarem, boicotaram centenas de vezes o nosso trabalho ameaçando com o corte de publicidade, enfim, vou parar por aqui para não parecer que somos “os mártires da pátria”. 

De verdade, tudo o que se passa e passou com O MIRANTE e os seus jornalistas também acontece com outros órgãos de comunicação social que, como nós, fazem o escrutínio do Poder sem receio de represálias e muito menos medo de ameaças. Por isso não nos queixamos nem nos fazemos de vítimas; mas na altura certa também não calamos o que temos para dizer sobre gente pobre de espírito, como parece ser o caso de Domingos Chambel, que resolveu fazer de O MIRANTE um bode expiatório por ter penado durante tantos anos para chegar a presidente da Nersant; o que ele não tem coragem para dizer de José Eduardo Carvalho e de Maria Salomé Rafael, de quem dependeu sempre a sua candidatura a líder da Nersant, descarregou em cima da administração de O MIRANTE e, por tabela, na cara dos jornalistas que foram proibidos de exercer a sua missão numa atitude digna de um filme americano. JAE

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

O Cavaleiro Andante, o Chico Matias, o capataz da Chamusca e a Tove Ditlevson

A Chamusca tem um presidente de câmara que vai ficar na história por ser um político desinteressado da política, um gestor que é capaz de fazer a folha a um calceteiro, mas tem trabalhadores há anos sem tarefas atribuídas. Paulo Queimado e a sua companheira Cláudia Moreira estão para o futuro do concelho da Chamusca como os eucaliptos para a sobrevivência da biodiversidade.

No último sábado li a correr 390 páginas de um livro de uma autora dinamarquesa com o sentimento de que tenho as leituras em atraso. Todo o dia imaginei a escritora a comer pão com manteiga de tanto o referir na sua autobiografia romanceada. À noite, antes de dormir, tive que comer duas vezes pão com manteiga, não a lembrar-me da escritora mas dos tempos da infância quando barrava o pão com manteiga como se fosse queijo creme. Peguei na memória deste dia, passado com os olhos pendurados num livro, para recuperar um texto sobre Francisco Matias, que morreu recentemente e teve uma vida curta para mal dele e infelicidade dos seus quatro filhos e esposa. Tal como já escrevemos na notícia do seu falecimento, Francisco Matias está ligado aos primeiros anos de vida deste jornal; é dele o boneco que ilustra ainda hoje as páginas do Cavaleiro Andante. Nos primeiros anos de vida do jornal alguns como ele ajudaram a dar dimensão ao projecto colaborando de muitas formas, inclusive dobrando e etiquetando jornais. De verdade ninguém faz nada sozinho por isso é que muitos de nós se agarram com unhas e dentes a algumas conquistas sabendo que nada cai do céu e que o que é importante nunca nos é dado e arregaçado.


Tenho um caderno de apontamentos que é uma memória de assuntos que me podem servir para estas crónicas ou para contar noutros textos biográficos. Já que falo da Chamusca e da política, recupero um desses assuntos que tem mais de uma dezena de anos. O actual presidente da Câmara da Chamusca, quando andava em campanha eleitoral, desabafou com uma pessoa deste jornal, de quem era amigo, que se não ganhasse as eleições tinha que emigrar porque a vida profissional estava um caos. Não disse, mas é fácil concluir, que a vida financeira/empresarial não deveria estar melhor. Ganhou as eleições e não precisou de emigrar. Já lá vão 10 anos e Paulo Queimado ainda não devolveu ao povo da Chamusca o que a maioria fez por ele. O capataz da Chamusca livrou-se de boa, mas nesta década de exercício do Poder não aprendeu nada com o que lhe aconteceu na vida profissional. Um dia que saia da gestão da câmara só deixa memória da organização de festas. A grande maioria do seu trabalho à secretaria é para assinar ajustes directos e satisfazer a clientela do partido e os amigos que lhe guardam as costas.

A Chamusca tem um presidente de câmara que se preocupa diariamente mais com o vinco das calças do que com a falta de médicos, a falta de emprego, a desertificação do concelho e todos os males que resultam dessa miséria que afecta o interior do país. A Chamusca tem um presidente de câmara que vai ficar na história por ser um político desinteressado da política, um político que é capaz de fazer a folha a um calceteiro, mas tem trabalhadores há anos sem tarefas atribuídas, que passam os dias com as mãos nos bolsos. Só não vê quem não quer. Só não denuncia quem não tem jeitinho para fazer política. Paulo Queimado e a sua companheira Cláudia Moreira estão para o futuro do concelho da Chamusca como os eucaliptos para a sobrevivência da biodiversidade.


Já apaguei da memória “Biblioteca da Alma”, tal como escreveu Tove Ditlevsen no livro que acabei de ler, este pequeno apontamento que um dia tinha que desaguar numa crónica. Acho que daqui a três anos, quando houver eleições na Chamusca, o PS vai voltar a ganhar e Cláudia Moreira vai para o lugar do seu querido companheiro com quem divide o Poder na Chamusca. Que sejam muito felizes e, já agora, que aproveitem para apanhar grandes bebedeiras, com ou sem álcool. JAE.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

A vila de Coruche é de quem lá vive

Esta crónica nasceu de uma conversa à porta de casa com uma vizinha que me anunciou que tinha comprado casa em Coruche para viver mas também para criar um espaço de artes. O que me admira é que não haja mais gente a sair da capital para gozar este prazer de viver no meio do campo ou da charneca.


Tenho um amor especial pela vila de Coruche; e não é só por ser uma terra banhada pelo rio Sorraia que lhe dá um encanto que não encontramos em mais nenhuma vila da região. O amor é antigo mas nunca foi correspondido como devia; e a culpa é minha que me desdobro em mil amores para não me dedicar com especial atenção àqueles que eventualmente merecem mais. Não exagero se escrever que a vila de Coruche é um poema escrito com casas sobre a planície; o concelho é um dos mais extensos do país e tem características que fazem dele um dos mais ricos. Limitado a norte pelos municípios de Almeirim e Chamusca, a nordeste por Ponte-de-Sor, a leste por Mora, a sudeste por Arraiolos, a sul por Montemor-o-Novo e Montijo, a oeste por Benavente e a noroeste por Salvaterra de Magos; até parece que o território dá a volta a Portugal para se constituir de várias culturas que ultrapassam a beleza da paisagem alentejana e a riqueza da lezíria ribatejana que podemos encontrar conforme os nossos interesses ou a nossa sede de conhecimento ou de evasão. Ficaria pela última hipótese se tivesse que escolher uma boa razão para viver de forma permanente em Coruche: o desejo de evasão. Coruche faz lembrar a frase de Millôr Fernandes: "o pôr-do-sol é de quem o vê"; Coruche é de quem lá vive e eu sou uma dessas pessoas, embora seja um habitante quase sempre ausente e em dívida para com a hospitalidade das suas gentes e das suas belezas naturais.


Há três dezenas de anos viajava para Lisboa e saía de lá de regresso à terrinha sempre com a sensação que os dias eram curtos, as horas passavam como minutos, os dias a correr, de tal modo que mais de metade dos assuntos ficavam adiados para a próxima visita.

Hoje vivo a situação inversa; vou à terrinha passar o dia e parece que o nascer do sol se encontra com o crepúsculo. Entre a casa de família e a maracha do Tejo, depois do almoço no restaurante, das limpezas e das varreduras, das duas ou três visitas ao correio electrónico para não perder o fio à meada, entre o tempo que procuro um livro na biblioteca que desapareceu da vista, e outro que reapareceu e me cativa para alguns momentos de releitura, passa o dia, e lá vou eu depois a correr para o caminho de regresso a casa de forma a chegar a horas à piscina onde, diariamente, dou umas braçadas para me manter em forma e não achar que me levantei da cama para trabalhar e que vou voltar para a cama para descansar do trabalho.

Desta experiência gostava de partilhar com os leitores que não há vidas perfeitas, principalmente quando vivemos a correr atrás das emoções, mas é possível ir aperfeiçoando a forma como vivemos a vida. Eu explico: depois de uma certa idade esqueçam os compromissos inadiáveis e os objectivos a concretizar; o caldo da vida engrossa de tal forma que ou comemos a sopa devagar ou passamos a vida engasgados.


Esta crónica nasceu de uma conversa à porta de casa com uma vizinha que me anunciou que tinha comprado casa em Coruche para viver mas também para criar um espaço de artes. O que me admira é que não haja mais gente a sair da capital para gozar este prazer de viver no meio do campo ou da charneca. E não esqueço colegas e amigos de escola que em tempos passados migraram com as famílias para Lisboa e nunca mais voltaram à terrinha como se tivessem emigrado para o fim do mundo. E quantos de nós nos tempos de hoje trabalhamos em Lisboa e viajamos todos os dias para Santarém, Entroncamento ou Tomar, ou vice-versa, e nos consideramos uns sortudos por conseguirmos ter o melhor de dois mundos. JAE.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

Um grupo de forcados para pegar o novo aeroporto

Está na hora de constituirmos um grupo de forcados para pegarmos de caras bisontes e minotauros se este projecto de construir um aeroporto internacional em Santarém for só uma questão de coragem e valentia.


Por razões de força maior não assisti ao debate sobre o novo aeroporto que se organizou em Santarém na sexta-feira, 27 de Janeiro. Assim que pude fui atrás das novidades. Não fiquei convencido. É verdade que a procissão ainda vai no adro, mas já é tempo suficiente para começarmos a jogar forte nos planos para invertermos o infortúnio que abala todos os grandes projectos que não ficam no colo das cidades de Lisboa e Porto. Por isso queremos ouvir a voz de barítono dos autarcas, a voz de leão dos empresários, o grito de guerra dos agentes associativos, a sábia voz popular a perguntar se não está na hora de anunciarmos ao mundo a constituição de um grupo de forcados disposto a pegar bisontes, ou minotauros, se for esse o custo de vestir cinta e jaqueta e ter que enfiar o barrete. Um aeroporto no Montijo é o que se espera e estava nos planos do ex-ministro Pedro Nuno Santos. Quem julgar que o camaradinha socialista baixou o machado de guerra que se desengane. O aeroporto no Montijo é uma aberração, mas o que é que este Governo nos tem oferecido nos últimos tempos que não nos faça desconfiar que vêm aí mais aleijões e delírios? Aliás, o episódio da anulação do despacho do ex-ministro está ao nível daquilo que Ricardo Araújo Pereira faz no programa de televisão “Isto é gozar com quem trabalha”. O mafarrico, depois de cavalgar um aeroporto no Montijo e outro em Alcochete para 2035, desmontou-se do cavalo com a mesma facilidade e engenho com que se desculpa entre os amigos de ainda não ter acertado um 13 no totobola. E lá ficou como ministro até a loiça se partir por causa dos milhões da TAP embora o futuro aeroporto possa ser a obra maior do regime depois de Salazar.


Em três horas de viagem li um livrinho de Marguerite Yourcenar sobre viagens, editado e traduzido no Brasil. A tradução é uma desilusão. A autora de “A Obra ao Negro” e “Memórias de Adriano” fica irreconhecível num português do Brasil de uma tradutora pouco preparada. O Brasil é o orgulho, e o país preferido, de muitos portugueses, entre os quais me incluo, mas nunca confiar demasiado. Tal como a luta política no país de Millôr Fernandes, também as traduções têm os seus dias muito maus.


Um dia destes liguei para o telemóvel do carpinteiro que há dois meses recuperou os tacos do quarto da casa onde cresci e que ando a recuperar meio vaidoso e orgulhoso. Fui à procura dele mas só encontrei do outro lado a informação de que está há mais de dois meses num hospital com um cancro  em estado terminal. Não é o último carpinteiro ao cimo da terra mas como ele já haverá poucos. É um homem da minha idade, se não me engano mais novo do que eu. Fiquei a pensar: quando é que chega a minha vez; vamos todos acabar assim mais dia menos dia; ou morremos de cancro ou de uma dessas doenças da moda. Infelizmente para alguns de nós ainda não há vacinas contra a estupidez de uma morte na estrada, uma cabeçada mal dada ou um daqueles ataques de coração que fulminam o peito que até ficamos a cheirar a pólvora.

O facto de escrever esta crónica no quentinho de um quarto de hotel, numa cidade que mete Lisboa a um canto, e que parece perfeita para viver por lá o resto dos meus dias, não faz de mim um privilegiado nem me livra de ter que voltar ao trabalho e ao território ribatejano onde ainda tenho um projecto para concretizar, que é um jardim zoológico à beira do Tejo depois das aldeias do meu concelho ficarem desertas. Só queria falar do José “carpinteiro” mas acabei a falar mais de mim do que dele; Este medo de ficar de borco a dar as últimas, com os médicos a dizerem que não há mais nada a fazer, deve ser a página mais mal traduzida que já se publicou ao cimo da terra. JAE.