quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Santarém vai estar na moda


Gosto muito da minha terra, da minha região e do meu país mas gosto ainda mais de me sentir cidadão do mundo. Um dia destes iniciei uma viagem de férias e comecei por Madrid onde, logo no primeiro dia, tive uma reunião de trabalho no Instituto Cervantes numa visita ao Cervantes TV.
O canal mostra algum trabalho de uma das maiores instituições do país vizinho cuja missão é divulgar por todo o mundo a língua e a cultura espanhola. Em Portugal existe uma instituição parecida chamada Instituto Camões.
Já vi dezenas de vezes representações das duas entidades em iniciativas ligadas à cultura em vários países e cidades do mundo.
Comparar o investimento espanhol e o português na divulgação da língua e da cultura dos dois países é comparar o céu cheio de estrelas a um ovo estrelado.
Dizem que a maior editora de língua portuguesa é espanhola. Não posso confirmar mas não é difícil concluir que sim. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, onde se realizam duas das maiores feiras do livro do mundo, os espanhóis estão presentes na sua máxima força. A grande representação portuguesa é a barraquinha dos doces com as queijadas de Sintra, os ovos moles de Aveiro e os pampilhos de Santarém.
Nos lugares mais imprevisíveis das grandes cidades encontramos o El País numa edição para toda a América Latina, para além de outros títulos nomeadamente de revistas em língua espanhola. Encontrar um jornal português no Brasil só nos aeroportos e nas mãos dos viajantes que acabam de desembarcar.
Tenho vontade de rir da cara que fazem os editores portugueses quando discutem o novo acordo ortográfico. E pelo que eu me rio imagino o quanto os espanhóis se divertem à nossa custa. Neste capítulo sou tão pessimista como José Saramago. E agora compreendo melhor por que é que os nossos vizinhos se empenharam tanto para que o português da Azinhaga do Ribatejo ganhasse o prémio Nobel.


Passei os últimos dois dias a passear por uma rua de S. Sebastian a namorar uma edição ilustrada de Afrodite de Pierre Louys, datada de 1917, um dos meus autores de culto. Já estou noutra cidade. O livro ficou na estante do alfarrabista. Tenho cinco ou seis edições diferentes deste livro e perdi a oportunidade de comprar a mais antiga, a mais completa e a mais bonita de todas as que já vi até hoje. Definitivamente sou muito mais leitor que coleccionador.


“Um dia destes Santarém vai estar na moda”. Tomei nota da frase a meio de um telefonema com alguém influente no Governo de Sócrates que reconhece o trabalho importante do actual Presidente da Câmara, Francisco Moita Flores.
Não sei se a moda vai pegar. O que eu sei é o que vejo quando salto de Burgos para Bilbao, depois para S. Sebastian, Vitória, Pamplona e Saragoza, que são apenas cidades médias de Espanha que estão organizadas e oferecem condições de vida de fazer inveja a qualquer portuga.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Um político sinistro


Meu caro Amigo. Agradeço a sua carta e as críticas ao nosso jornal. Não lhe agradeço os elogios pelas razões que compreenderá. Aproveito esta coluna para responder a algumas das suas críticas com questões que, segundo me parece, você nunca percebeu no nosso projecto.
O MIRANTE é um jornal condenado ao sucesso porque aqui trabalha-se e só depois é que se reivindica. Na redacção de O MIRANTE não existe a paz dos altares. Se o tempo é de paz gozamos a paz. Se o tempo é de guerra vamos todos à guerra já que entre mortos e feridos alguém há-de escapar.
Diz o meu Amigo na sua missiva que não percebe porque somos distribuídos por toda a região dentro do saco do jornal EXPRESSO e mantemos o jornal na banca e a política de assinaturas. Claro que não percebe! Como poderia perceber se o seu “ofício “ é ler e criticar os jornais e não escrevê-los e distribuí-los ?!.
Não tem sentido o que me escreve relativamente ao socialista Joaquim Rosa do Céu.
Se houve pessoas ao longo destes últimos anos que foram beneficiadas politicamente pela linha editorial de O MIRANTE foi o actual presidente da Câmara de Alpiarça. Enquanto o PCP foi poder em Alpiarça O MIRANTE sempre fez jornalismo de contra-poder. Verdade seja dita: Raul Figueiredo e seus companheiros adoravam dar pau e costas. E daí até fazerem dos jornalistas de O MIRANTE os maus da fita foi um passo. Enquanto nós fazíamos o nosso trabalho os comunistas adiavam o deles. E o povo da terra, quando chegou a altura, votou na alternativa. Não tenho nada contra o socialista Rosa do Céu , mas que ele secou tudo à sua volta, isso é indesmentível; e que o homem tem a mania de perseguição, disso também não tenho dúvidas.
Se há coisas de que tenho a certeza é de que ele “odeia” o povo da sua terra. Aliás , ele odeia tudo o que é relacionado com o povo. Mas finge bem. E isso é que é importante em política.
NOTA : Quem ler esta crónica vai pensar que eu não gosto nem um bocadinho do socialista Rosa do Céu. Engana-se! Acho graça ao senhor. Aquele ar sério e pacóvio faz-me pena. Nomeadamente porque já convivi de muito perto com ele e convenci-me (ou ele convenceu-me) que não era lunático pelo poder. E não é. É só um político sinistro. Até prova em contrário.
NOTA 2: Esta crónica é parte de uma resposta a uma carta de um amigo de Alpiarça que vive em Lisboa. O socialista Rosa do Céu não tem culpa no cartório. Eu é que entendi “dedicar-lhe” o Prémio Imprensa Regional que vamos receber esta semana, atribuído pelo Clube de Jornalistas. Há por aí muita avestruz na política mas como o Joaquim Rosa do Céu não conheço outra. Daí a dedicatória que leva apenas o meu nome.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

O meu nome é Joaquim


Foi uma semana de muito trabalho cá para o rapaz. Ficaram por editar, para sempre, duas belas crónicas escritas na areia para que sobrasse espaço para este rascunho. Suei as estopinhas para endireitar alguns textos que estão algures paginados nesta edição. Perdi a paciência com um daqueles jovens kamaradas de trabalho que tinha a voz sempre mais alta que a minha e achava que não havia limites para a falta de respeito. Outro kamarada mais cá da idade do rapaz escreveu-me cheio de boas intenções e eu senti-me a aprender a somar dois e dois como quando entrei para a escola do Manuel Barroso. Estou a ficar velho e azedo para perceber a linguagem dos mais novos e para esperar pelos da minha idade que ficaram pelo caminho. Mais uns anitos e serei o perfeito relógio de repetição. Vou ter que cuidar da máquina. Ou eu não me chame Joaquim.
Esta semana recebi resposta a uma crónica publicada há uns meses. Alguém do outro lado do Atlântico andava a pesquisar na net e deu conta da minha vontade de ler o Toiro Azul e O Menino da Mata e o seu Cão Piloto. Os textos já chegaram em PDF. Já os li e reli. É tudo um pouco diferente daquilo que o meu avô me contou. Mas está lá em letra de forma toda a fantasia dos contos para crianças.
E até a criança que eu fui renasceu por breves instantes.
Daqui por umas semanas há-de sair nestas páginas uma entrevista com um dos homens que eu sempre quis entrevistar e nunca tinha conseguido. Fui para o nosso encontro com a sensação que ia ser a entrevista mais difícil da minha vida de jornalista. Afinal foi muito mais fácil que um dia de trabalho normal numa redacção com uma dúzia de gatos. A vida é uma caixinha de surpresas. O problema é resolver as questões da vidinha. A maldita vidinha que nos obriga, a seguir a uma agressão a murro, a dar-mos ainda a outra face à bofetada.
Agora vou de férias. Hei-de regressar pois vou viajar na TAP e o destino é já ali do outro lado da fronteira. Nunca viajei para tão perto com um programa para tanto tempo. Deixei um recado no telemóvel e na caixa de email para os meus amigos. Se precisarem de mim e quiserem ir à minha procura ainda é mais fácil encontrarem-me numa cave a ouvir jazz do que num bordel ou num convento a tratar do juízo com os olhos pregados no tecto (ou na cruz).

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Um crime no Tejo


No passado domingo, ao final da manhã, percorri de moto durante cerca de duas horas, o campo e a charneca da minha terra. Como viajo numa moto de todo-o-terreno, apesar dos 6oocc, ligo mais ao perigo que encontro na areia, nas curvas apertadas, nas pedras soltas dos caminhos, do que aos números do conta-quilómetros. O prazer é ultrapassar os obstáculos e não o limite de velocidade.
Na hora em que morria um pescador num areeiro do Porto do Carvão, na Chamusca, andava ali por perto a gozar o prazer de poder usufruir de um rio que corre quase à porta da minha casa. Perto do local onde morreu o pescador também eu ando muito a pé procurando pedras do rio matando o tempo e puxando pelo físico.
Não sei verdadeiramente o que esteve na origem da morte do infeliz pescador que veio de Ourém morrer à porta da minha casa. Mas sei que aquela exploração de areia devia estar vedada de forma a não causar acidentes. Aquele lago artificial criado pela exploração de areia é um atentado, uma armadilha para o cidadão, um crime no meio do leito de um rio que corre lento e encostado à outra margem quase a meio quilómetro de distância.
O grande lago do Porto do Carvão, onde morreu o pescador, devia estar protegido com uma vedação e com sinalização adequada a proibir a pesca e a aproximação de pessoas. As empresas de extracção de areia não podem usar o leito do rio como se fosse propriedade particular. Os cidadãos precisam que as autarquias cumpram o seu dever de fiscalização e obriguem os areeiros a implementarem regras de segurança em todo o perímetro das explorações. Quem procura o rio para os seus momentos de lazer não pode ser vítima de acidentes deste género.
Daqui por alguns dias já ninguém se lembra da morte deste homem. Os areeiros instalados no leito do rio vão continuar o seu negócio milionário fugindo ao investimento a que deveriam estar obrigados para protegerem os cidadãos e a própria natureza do espaço.
Este caso podia ser evitado. Há muito tempo que olho para aquele lago artificial e pergunto como é possível fechar os olhos àquela realidade.
Guardo tristes recordações de amigos de escola que morreram afogados nas águas do Tejo. Hoje, quando dou um mergulho, sei que o leito do Tejo mudou muito nos últimos anos e é muito mais seguro do que no meu tempo de criança. Sei exactamente onde a água corria de forma perigosa e os meus amigos perderam a vida. Como o Tejo ficou menos perigoso vieram os empresários de extracção de areia armadilhar o melhor lugar do mundo para passar uma tarde à pesca ou a apanhar gambozinos. Provavelmente os donos desta empresa passam os dias de verão à beira de piscinas privadas, em iates no meio do mar ou nas suas quintas com muros mais altos que muralhas. É o país que temos e estes são os empresários que merecemos.