quarta-feira, 31 de julho de 2013

Uma seara de girassóis

Em tempo de férias devemos escrever de forma mais ligeira e despreocupada? As palavras também vão a banhos? Claro que sim. Não é por acaso que a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista acaba de avisar que finalmente conseguiu aderir às novas tecnologias. Num tempo em que a classe de jornalistas está a desaparecer eis que a CCPJ se moderniza e começa a contar no número de instituições que não servem para nada.
Estamos a viver uma época de verdadeira mudança de ciclo no jornalismo português. Sim, falo de Portugal, por que na maioria dos países da Europa democrática a profissão e o negócio conhecem outras evoluções por onde ainda iremos passar se até lá as instituições democráticas não entrarem em insolvência.
Nos últimos cinco anos fecharam mais de metade dos jornais locais e regionais. As redacções dos grandes jornais decresceram mais de metade. As vendas dos jornais diários são ridículas comparadas com as vendas de há dez anos.
As televisões facturam publicidade às grandes agências com 90% de desconto sobre a tabela de publicidade oficial. Os diários de circulação nacional baixaram os preços de inserção ao nível dos jornais locais. Alguns jornais locais e regionais oferecem publicidade ao preço da chuva porque entretanto baixaram as tiragens para números miseráveis e estão-se marimbando  para o papel de serviço público que lhe cabe.
A cada aniversário do 25 de Abril fazemos mais um funeral à liberdade. Quem é que sabe que todos os processos contra jornalistas são considerados urgentes em Tribunal? Quem são os jornalistas com poder na imprensa portuguesa que falam disso com indignação?  A verdade é que em Portugal julga-se mais depressa um jornalista que um assaltante à mão armada ou alguém que dê um tiro certeiro na cabeça de outro. Quem tem dois dedos de testa não fica preocupado ao saber disto? Um país que demora dez anos a julgar um assassino, e que em meses dá a volta à vida de um jornalista, não é um país perigoso?
Em Portugal ainda há lugar para o jornalismo que não seja aquela coisa merdosa que se faz em televisão todos os dias e que nos entra pela casa dentro nos intervalos dos anúncios?
E é democrático estes senhores da política continuarem a servir canais de televisão a uma elite empresarial quando na maior parte dos países da Europa o sinal de televisão já é tão democrático como todos os outros negócios de comunicação social?
O que acabo de escrever não conta para o totobola. Isto é um desabafo que devo aos meus leitores.
 Mesmo em férias as nossas palavras devem mergulhar até onde o fundo do mar permite que vejamos uma seara de girassóis JAE

quarta-feira, 24 de julho de 2013

O Rui Barreiro de saias

Santarém é uma aldeia. Falo do concelho no seu todo e não da cidade. Na passada semana fui para os lados de Albergaria receber uma terapia. A gente não sabe nem sonha quantos recantos perdidos tem este concelho e quantos velhos sorridentes, e desdentados, se sentam nos bancos à beira da estrada para nos saudarem e dizerem olhem que estamos aqui venham daí para dois dedos de conversa.
Parei o carro na estrada principal às duas da tarde e fui à minha vida. Terapia de uma hora e mais uma experiência interessante. Mais interessante ainda foi a presença de uma mosca que me deu que fazer todo o tempo. Na hora de acertar contas, sentado de frente para a terapeuta, recebi a explicação para a presença da mosca durante toda a sessão. “Foi um incidente, desculpe, mas eu não gosto de matar animais”. Já lhe tinha perdoado quando oiço tocar a campainha da casa. A terapeuta vai à porta e regressa com a informação que tenho a caixa do carro aberta. Pede-me a chave e vem à rua. Venho atrás dela descalço e confirmo que o carro estava lá. Mais tarde confirmo que também lá estava a mala de mão mais a máquina fotográfica que me acompanha para todo o lado. Nem quero acreditar: um carro parado cerca de uma hora à beira da estrada, de mala aberta, cheio de outras malas mais pequenas, e ninguém deitou a mão nem para levar um livro.
Regresso à cidade e vou vendo a publicidade que os políticos já espalharam nas rotundas. Olho pela primeira vez para o cartaz da candidata Idália Serrão e lembro-me do tempo em que ela se chamava Idália Moniz e era a alma gémea de Rui Barreiro na gestão da autarquia. Parece que entretanto se zangaram; fizeram tantas asneiras que viraram-se de costas; Como não se ouve falar de Rui Barreiro, e em política não há inocentes, pergunto-me: politicamente a Idália Serrão não é o Rui Barreiro de saias? Eu acho que é. Aliás… não tenho dúvidas. Conheço-os há muitos anos e sei como eles são gente politicamente fraquinha. Por isso se aliam e se zangam com a mesma facilidade que uma mosca anula uma hora de descanso. JAE

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Os mários soares da liberdade

Sou o homem mais feliz ao cimo da terra. Todos os dias vivo para criar a eternidade. Nestes últimos dias esta neblina foi ouro sobre azul para umas merecidas férias do sol deste Verão que ainda vai a menos de meio. Mesmo a trabalhar, quando a maioria goza férias ou vive dos rendimentos, sinto-me o mais sortudo dos homens. Tenho um jardim à porta de casa; um rio do outro lado da minha rua; e ao fundo do meu quintal começa a zona de charneca ribatejana que é tão grande e diversificada que se confunde, uns quilómetros mais a nascente, com a charneca alentejana.
Apesar de tudo, ou por isso tudo, todos os dias me levanto com o espírito dos meus 22 anos quando estive de malas feitas para emigrar. Em nome dos meus avós e dos meus pais desejo todos os dias que a terra seja pesada a Salazar e aos seus comparsas. Mas em nome do meu trabalho de meio século estou cada vez mais descontente com este país de medíocres e corruptos. Revejo-me em alguns homens políticos de proximidade mas a grande maioria mandou às urtigas os valores conquistados com o 25 de Abril. A maioria dos nossos dirigentes trabalha para o Estado e são donos de empresas: ou são dirigentes públicos e têm interesses privados na mesma área em que trabalham para o Estado. A justiça é um perigo para um cidadão indefeso. A auto-gestão em que se encontra a magistratura portuguesa é mais perigosa para um cidadão do que o excesso de ozono no ar. Morrer de boca aberta a caminhar por aí é muito mais digno do que morrer nas mãos de um juiz ignorante e de uma justiça dos tempos de antanho. Estamos todos a andar para trás. O sistema democrático em que vivemos está desacreditado e este sistema político começa a ser tão duvidoso e perigoso como o de Salazar. Nunca pensei escrever isto e muito menos pensei que podia ter medo de viver no meu país depois do que vi e ouvi aos mários soares da liberdade. JAE

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Os homens bons

São quase duas horas da tarde de um sábado e estou em Santarém a destilar. Acabei de fazer uma jornada de trabalho em Vila Franca de Xira acompanhando a homenagem ao campino, a inauguração de um monumento ao trabalhador, a prova de perícia de campinos na praça de toiros e, logo de seguida, a bênção das motos do Motoclube de Alverca junto à Igreja dos Pastorinhos.
Pelo meio falei com o senhor António, um “Zé Ninguém”, a quem comprei um barrete por dois euros, vive no Barreiro e diz que não tem nada de seu. Dei uma volta pelo comércio de Vila Franca de Xira que tem as montras enfeitadas, bebi dois cafés e duas garrafas de água e, Heureca!!, fiz quase 250 km de moto, sensação que já não experimentava há muito tempo.
Vou agora editar os vídeos e escrever textos, curtos, o mais possível, que o papel está caro e terça-feira os editores no fecho do jornal têm que tomar opções entre as fotos da festa, do desporto e da cultura, da política e de sociedade. Como é evidente, em tempo de vacas magras, o que fica no computador, à falta de espaço, são as fotos da festa.
Tenho o dia ganho porque a trabalhar acabo sempre por me divertir. Vi a moto dos meus sonhos na concentração; ouvi o padre da Igreja dos Pastorinhos perguntar por uma Ducati e assisti a uma bênção que me comoveu o que condiz com o meu agnosticismo cada vez mais firme e inabalável. De todas as formas as palavras da Bíblia, na boca dos homens bons, tomam sempre um sentido divino; muito mais do que se forem lidas no silêncio das nossas casas. JAE