quarta-feira, 25 de julho de 2007

Os valores da amizade e da afectividade


Como tive uma semana mais dorida dei por mim a valorizar o gesto mais simples e humano de alguém que desempenha uma profissão e nunca se esquece dos valores que o levaram a escolher determinado trabalho.Por razões que nem o diabo saberá explicar ainda passo muitas horas da minha vida a trabalhar com gente que está a chegar ao mercado de trabalho. Sempre que encontro alguém mais difícil de moldar desisto a meio. Já não tenho paciência para tentar acabar a obra de arte. Se recuar no tempo, agora que penso no assunto, acho mesmo que nunca consegui uma obra de jeito. Quem aprendeu comigo alguma coisa foi mais devido aos seus méritos a aprender que aos meus a ensinar.
Esta semana foi dorida quanto a este aspecto. De repente percebi o quanto valem os nossos recursos investidos a formar gente mais ou menos jovem. A maioria acha que já sabe tudo. E quando chega a hora de uma pessoa se virar do avesso surge então a paz de alma e a sensação de que chegamos ao fim de um capítulo da nossa vida. O que é estranho é que continuemos pela vida fora a cumprir esta missão com pessoas que mal conhecemos, que não nos estimam e, muitas vezes, se apoderam de uma parte da nossa afectividade que depois jogam no lixo e usam como sabão para o corpo.
Com alguma frequência recorro à ajuda de um farmacêutico como recorro, quando me falta a alegria suficiente, ao estímulo de um bom livro ou de uma boa sessão num SPA. Um dia destes a minha mulher foi à farmácia do costume aviar uma caixa de ampolas bebíveis. Duas semanas depois, numa ida à farmácia para a compra de um medicamento para as dores, o farmacêutico perguntou-lhe por mim e quis saber se não estava na altura de levar a segunda caixa de ampolas.
Vejo o meu farmacêutico meia dúzia de vezes por ano. Mesmo com a farmácia cheia de gente, e com tanto para fazer e gente para cuidar, é dele que recebo a maior prova de que no exercício de uma profissão se podem dar e receber verdadeiros testemunhos de amizade.
No meu trabalho é raro o dia em que não ando com alguém ás costas. E ainda tenho que usar albarda não vá alguém queixar-se que eu tenho o esqueleto duro demais. Fico a dever ao meu farmacêutico, que não trato pelo nome por que sei que ele não apreciaria, o favor de me ajudar a compreender melhor o efeito das ampolas bebíveis, e a necessidade de começar a encontrar um pouco mais de tempo para discutir com ele as opções tácticas do actual treinador do Sporting.

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Moita, Saramago, Berardo, Costa e outros


Este país não existe para além de Lisboa e do poder que se reparte entre as docas e a Assembleia da República. E, depois, o que nos resta é esta triste realidade: a votação de duzentos mil eleitores para a presidência de uma câmara completamente desgovernada deixa o país à beira de um ataque de nervos com Marques Mendes e Paulo Portas a darem tristes exemplos. Se isto é um país a caminho da descentralização, da modernidade, de uma nova era, de um novo fôlego, então eu vou ali a Espanha e já venho.No dia em que António Costa ganhou as eleições em Lisboa o DN publicou uma entrevista com José Saramago em que ele admite que o futuro de Portugal e de Espanha é a Ibéria, uma espécie de novo país com várias regiões. “Não é por isso que deixaremos de pensar e falar em português”, defende Saramago numa entrevista em que anuncia também a criação de uma Fundação com o seu nome que terá uma delegação na sua terra natal, a Azinhaga. No dia da vitória de António Costa, em Lisboa, José Saramago, o ribatejano que é motivo de orgulho para quase todos nós, abriu mão da nacionalidade e admite a integração de Portugal na vizinha Espanha.
Depois de ver a forma como as televisões fizeram a cobertura das eleições em Lisboa ( antes e depois da votação) , o nível de abstenção dos lisboetas e a reacção dos partidos derrotados que provocaram rupturas nas direcções nacionais, apetece-me fazer coro com Saramago e desejar que a integração se faça o mais rápido possível.
Pouca gente saberá que Moita Flores, o presidente da câmara municipal de Santarém, tal como Fernando Seara, o autarca de Sintra, foram hipóteses para candidatos a Lisboa pelo PSD antes da escolha recair em Fernando Negrão. Moita Flores não abre o jogo. Verdade ou mentira Moita Flores livrou-se de boa. Embora o PSD, com Moita Flores, não sofresse tamanha humilhação.
Nota. Foi também no domingo que visitei o Museu Colecção Berardo. E durante toda a visita não consegui ver mais nada que dólares e euros nas paredes do CCB. E, por detrás das obras de arte, o país envergonhado que precisa da fortuna de um especulador para apresentar ao Mundo uma colecção de arte. Alguém sabe quanto vale a colecção de arte da Caixa Geral de Depósitos ( que é do Estado) e onde é que ela é guardada? E quanto custa por ano ao erário público? Meus Deus, acho que se soubéssemos, depois deste escândalo Berardo, queríamos todos acordar espanhóis amanhã de manhã.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Uma viagem inesperada


Deixo aqui uma transcrição da Bíblia, do Livro da Sapiência, que Bunuel recorda na sua biografia ( edição Fenda) , numa homenagem a todos os ímpios como eu gostava de ser.Começo a leitura de um novo livro quase todos os dias. Quero um livro por dia como quero um sonho feliz todas as noites. Nem sempre consigo o livro e o sonho. Mas faço tudo para isso.
Um dia destes, enquanto lia entusiasmado uma biografia de Luís Bunuel, abri a internet e marquei para 24 horas depois uma viagem para Barcelona. Fui revisitar o mundo de Dali em Barcelona e Figueres. Aquilo interessa-me para manter a qualidade de vida. É verdade que ali para aqueles lados acabo por perder sempre mais tempo à procura da alma do Picasso do que do Dali ou de Miró. Mas a vida daquela gente interessa-me tanto como a minha própria vida. E, depois de descobrir Bunuel na sua biografia, com uma vida cheia e, tão ou mais interessante do que a dos pintores do seu tempo, não resisti e fui encher os caboucos para mais uma temporada.
(Porque os ímpios disseram para si próprios no descaminho do seu discurso: ) O tempo da nossa vida é curto e cheio de tédio; não há remédio contra a morte do homem e nunca se falou de alguém que tivesse regressado do sepulcro.
Porque nascemos da aventura, e seremos como se não tivéssemos sido, porque o sopro das nossas narinas é mero fumo e a nossa palavra é como uma faísca efémera que parte do nosso coração.
Quando se apagar, o nosso corpo será cinza e o espírito será dissipado como ar subtil.
E o nosso nome será esquecido com o tempo, e ninguém se recordará das nossas acções, e a nossa vida passará como o rasto de uma nuvem negra, dissolver-se-á como neblina afugentada pelos raios do sol e abatida pelo seu calor.
Porque o nosso tempo é como uma sombra que passa, e não é possível retirar o pé do nosso fim porque ele está selado, e ninguém regressa.
Venham e gozemos à grande dos bens que temos. Apressemo-nos a servir-nos das criaturas e da juventude.
Enchamo-nos do melhor vinho e de perfumes e não deixemos passar a flor da estação.
Sejamos coroados de botões de rosa antes que murchem.
Que nenhum de nós seja excluído dos nossos desvarios; deixemos em todo o lado marcas de prazer porque aí reside a nossa porção e o quinhão da nossa herança. JAE

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Notícias do incrível


É incrível a forma como a imprensa, na generalidade, faz tábua rasa de alguns notícias que incomodam o Poder. Toda a gente grita que o Governo telefona para as redacções a dar palpites e a tentar controlar. A verdade é que a generalidade da imprensa põe-se a jeito. Este é um bom exemplo: se a notícia que demos sobre as indemnizações aos rendeiros da CL fosse publicada num jornal de Lisboa toda a gente se repetia no dia a seguir uma vez que estamos a falar da suposta má administração de dinheiros públicos. E também por que não é de pôr de parte a hipótese destas negociatas terem a ver com o projecto do novo Aeroporto Internacional de Lisboa. Como a notícia nasceu fora do casulo em que se movimentam algumas dúzias de jornalistas influentes, amigos e companheiros de políticos influentes, faz de conta que não se passou nada. Esta é a nossa realidade. Somos um país governado por políticos de Lisboa a viverem paredes-meias com grandes jornalistas que conseguem ver o país olhando apenas das janelas dos seus gabinetes de trabalho.Sempre que puder não ocuparei este espaço com conversas sobre politica. Não é que não goste. Acho é que os jornais falam demais de politica. E dão demasiada visibilidade aos políticos. Por isso procurarei não pesar nesta tendência.
Na passada semana o O MIRANTE publicou uma daquelas notícias que muitos jornais de Lisboa e do Porto gostariam de ter publicado sobre as indemnizações a rendeiros da Companhia das Lezírias. Curiosamente, até hoje, terça - feira, só a SIC se interessou pela notícia embora não conheça o desfecho desse interesse.
A forma como o actual administrador da CL se portou neste caso também é exemplar. Primeiro não quis falar porque disse que se já tínhamos falado com o Ministério da Agricultura estava falado. Esta semana “mandou” entregar em mão, por um dos rendeiros, uma carta a explicar o óbvio como se nós fossemos todos uns tansos e não soubéssemos o que é uma negociata.
A Agência LUSA, que tem jornalistas a trabalhar na região, fechou os olhos para não ver a notícia do nosso jornal. Se alguém tivesse dado um traque no planalto de Santarém e isso afectasse o trânsito na A1 era certo que escreviam sobre o assunto. Nem que fosse para dizerem quem era o roto cá do sitio.
Esta gente do Poder, seja ele qual for, sempre teve boa imprensa. É assim com os reis do dinheiro, como está a acontecer com o Comendador Berardo, e sempre assim será com os políticos. Bom proveito.