quinta-feira, 21 de maio de 2020

A Justiça e o vinho de bom grau e boa cepa

A democracia em Portugal sofre cada vez mais das fraquezas que tanto afectam a Justiça como o Jornalismo.  


Há um dia em que a Justiça nos cai em cima e percebemos que, afinal, os tribunais também estão cheios de malandrecos e malandrecas que se servem da Justiça como o taberneiro se serve do vinho bom para lhe acrescentar água. Não é com jornais, rádios e televisões que se garante a democracia também é com liberdade de imprensa; mas sem Justiça a sério não há regime democrático que resista. Esse ditado popular que diz “mal por mal antes cadeia que hospital”, é talvez o mais mentiroso de todos os ditados populares que já conhecemos; prefiro ter uma doença a sério que passar dois dias de cadeia por ter metido a mão onde não devia ou por ter cometido outro qualquer crime merecedor de prisão. Como eu deveremos ser quase dez milhões de portugueses. Agora que a Justiça portuguesa mostrou mais uma vez o seu lado mais fraco, e isto é só a ponta do véu, o caminho fica mais estreito para todos aqueles que se servem da Justiça como o taberneiro se serve do vinho de boa cepa.
Portugal tem uma imprensa cada vez mais fraca e concentrada em grupos de grande poder económico. Os jornais e as televisões, defendem o interesse público mas estão colados a grupos de interesses e a pessoas que, na maioria dos casos, fazem parte do sistema corporativo, muitas vezes, corrupto. Não é raro lermos notícias sobre assuntos de corrupção que fazem manchete no jornal do grupo A, que entretanto passa completamente ao lado dos interesses dos jornalistas da redacção do jornal ou da televisão do grupo B. Está a acontecer neste momento, no ano da graça de 2020, para vergonha dos jornais e dos jornalistas portugueses. E o caso Marquês, em que é réu, entre muitos, o impagável José Sócrates, serve às mil maravilhas para camuflar essas fraquezas da nossa democracia que tanto afectam a Justiça como o Jornalismo.

Há uma dúzia de anos fomos roubados por uma pessoa que se apropriou de uma dezena de cheques que depositou na sua conta bancária. Apesar de estarem devidamente endossados, o meliante conseguiu enganar o caixa de uma agência bancária de Tomar e depositar os cheques na sua conta. Depois de ser descoberto, e de uma queixa em tribunal, conseguimos reaver o dinheiro em pouco tempo porque o banco em causa tentou, o mais rápido possível, sair do imbróglio em que um funcionário se deixou enredar. Quando pedimos ao nosso advogado que tentasse em tribunal uma queixa que castigasse o abuso de confiança, a resposta foi clara: pensem bem nisso; a Justiça não condena roubos/desvios de pouca monta e vocês vão gastar muito tempo e dinheiro. E assim acabou a história. A Justiça ainda é boa demais para quem vive dela e boa demais para quem se serve dela como o taberneiro se serve do vinho de boa cepa. JAE.

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