segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

A morte na A1 está sempre à espreita

Crónica sobre a circulação com chuva na A1, no troço entre Santarém e Lisboa, assinada por quem, ontem ao final da tarde, presenciou o acidente que acabou em tragédia.


Fui um dos condutores que no final da tarde de ontem, 5 de Dezembro, poucos quilómetros depois de entrar na A1 em direcção a Lisboa, esperou mais de duas horas para seguir caminho. Cheguei ao local do acidente poucos minutos depois do despiste. Parei ao sinal do funcionário da Brisa atrás de meia dúzia de carros que minutos antes circulavam à minha frente. Saí e fui ver o que se passava. A cerca de 50 metros vi um carro que era um amontoado de destroços e recuei. Comentei com o funcionário da Brisa o aparato do acidente que já deixava adivinhar uma tragédia. “Parece impossível, mas não é, infelizmente”, comentou, de cara fechada, enquanto continuava a espalhar os pinos para controlar melhor os automóveis que iam chegando.

Tinha trabalho no carro. Sentei-me a rever provas de um livro e vi chegar a primeira ambulância, depois a segunda, a terceira e por aí fora. Quando vi chegar os Bombeiros de Santarém voltei a sair do carro e aproximei-me. Um deles perguntou a um colega; “há alguém vivo?” Voltei para dentro do carro depois de ter espreitado mais uma vez os destroços do primeiro carro envolvido no acidente.

A chegada de mais ambulâncias obrigava alguns carros a recuarem quase para junto do meu. Durante mais de duas horas, enquanto via passar carros da polícia e ambulâncias, as luzes vermelhas ali a poucos metros anunciavam os sinais da tragédia.

Quando chegou a ordem para avançarmos, e eu fui dos primeiros, fomos mais de uma centena de metros a ouvir debaixo dos carros o barulho dos destroços dos veículos acidentados. Devagar, diziam os bombeiros para os condutores, que usavam apenas uma faixa de rodagem da A1 durante os cem metros de estrada em que tudo aconteceu.

Cheguei a casa pouco mais de meia hora depois. Comi uma sopa e fui ver a RTP 2 que transmitia um bailado. Perto da meia noite, quando ia começar um dos filmes portugueses mais premiados dos últimos anos, Zeus, ligaram-me a perguntar se podiam actualizar a notícia do acidente já que a morte que eu tinha anunciado pelo telefone, com a ajuda da informação dos bombeiros, era uma figura conhecida.

Mudei de canal e percebi que o assunto já era conhecido em todo o país.

Há poucos anos, num final de tarde de chuva como o do passado sábado, também estive envolvido num acidente do género na A1, a poucos quilómetros do local onde estava, mas fui a única vítima. O que mais recordo foi a conversa do taxista de Aveiras de Cima que me levou para casa enquanto a polícia, que passou por acaso, e sorte minha, ficou a guardar o carro enquanto não chegava o reboque: “Assim que começa a chover parecem tordos a cair”. Depois contou-me os pontos fracos da A1 onde acontecem mais acidentes.


Esta crónica serve para contar que ainda há poucos dias tentei pela enésima vez saber quantos pontos fracos tem a A1 desde Santarém até Lisboa? Quantos acidentes se dão por dia quando chove? Porque razão as autoridades não sinalizam os locais onde a circulação com chuva deve ser mais cuidadosa por causa do aquaplaning ? Por que não há campanhas nacionais de prevenção de acidentes nos dias de chuva, em que a grande maioria das estradas, incluindo a A1, é uma ratoeira para os condutores irresponsáveis, e também para os responsáveis que se deixam levar pela pressa de chegarem ao seu destino, ignorando os avisos de que com chuva a velocidade tem que ser reduzida ?


Todos os dias utilizo a A1, e todos os dias, mesmo sem chuva, lembro-me do taxista de Aveiras de Cima que me disse que há automobilistas que “caiem como tordos”. Como eu caí um dia, sem mal maior que perder o carro, mas com a sorte, que ás vezes nos protege, de não circularem carros atrás do meu, o que fez com que não tivesse causado a desgraçado à vida de outros.

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