quinta-feira, 11 de abril de 2024

Trabalhar até de madrugada e ter sempre tudo por fazer

Uma crónica que podia ter ficado por escrever onde se conta da vidinha do autor que nem sempre é um mar de rosas mas para lá caminha.


Esta semana não há crónica, dizia eu para mim mesmo no último sábado à noite depois de andar meia dúzia de dias a deitar-me de madrugada para conseguir ter dois livros prontos para serem apresentados no Porto e em Santarém, a planear viagens, hospedagens, almoços e encontros culturais com os amigos e conhecidos que envolvi nesta aventura, que nunca foi tão ousada para o autor destas linhas. De repente, depois de despachar um longo texto sobre a minha leitura de “Musa Praguejadora, a vida de Gregório de Matos por Ana Miranda”, usando o programa de voz da Google, disse para comigo: quem faz um cesto faz um cento. E assim comecei a passar a limpo os meus textos literários dos últimos meses, recomecei a procurar reforços para a equipa comercial do jornal, organizei o meu arquivo de textos literários para um novo livro que vive de adiamentos sucessivos, tenho quase no prelo o melhor livro de Lêdo Ivo, que comemora o centenário em 2024, e mais umas miudezas de um trabalho que só dá trabalho e prazer, que é aquilo que nos mantém vivos desde que haja dinheiro para pagar as despesas e, quem sabe, ainda trocar de carro antes de não me renovarem a carta e ter que viajar de comboio ou de autocarro.

A meio destas notas lembrei-me que tenho duas motas que também não vou poder usar porque a carta que serve para o carro não serve para as motas de alta cilindrada. Nesse meio tempo recebi um telefonema da oficina de um amigo a informar-me que a Zundap da minha adolescência estava recuperada e pronta a ir para a estrada; e cresci meio palmo e voltei a pensar que tenho futuro, mesmo que envelheça depressa e deixe de poder continuar a trabalhar até de madrugada, embora não resista a contar que, quando posso, durmo uma sesta a meio da tarde para a cabeça não dar o estouro a meio da noite.

Faço tudo isto, que é trabalhar até dar o berro, porque tenho duas casas vazias na terrinha, onde ainda quero dormir muitas noites de Verão e de Inverno, e ainda tenho por empréstimo cinco hectares de terra à beira Tejo que são o meu orgulho enquanto não alugo um cabana à beira-mar. É exactamente por ainda me sentir dividido entre a aldeia e a cidade, entre a beira do rio e a beira do mar, que me meto em trabalhos arriscados com a energia que tinha aos trinta anos, embora agora com mais calma e produzindo o dobro do que produzia dantes. A diferença, a grande diferença, é que dantes queria ganhar dinheiro, e agora o dinheiro já me serve para pouca coisa, que não para comprar a comida para a mesa, o que não é nada por aí além, porque, entretanto, sagrei-me vegetariano. Ou quase. Mas não posso deixar de negociar preços de livros, jornais, gasóleo, carros de trabalho, comunicações, avenças com dezenas de empresas de serviços e tantas coisas mais que só um verdadeiro capitalista sabe avaliar, por que só os capitalistas sabem dar valor aos cêntimos e à diferença que fazem em certos orçamentos.


Como gosto de ser verdadeiro com os leitores devo confessar, já em jeito de nota de rodapé, que tinha uma crónica pensada e anotada que não foi em frente. Tinha pouca matéria para preencher o espaço. Rezava assim: o deputado João Moura foi premiado com uma secretaria de Estado no novo Governo do país porque nos partidos políticos o costume é premiar-se a incompetência, ou seja, agarram-se pelo rabo os animais políticos que não têm cabeça; e secretariar os ministros do Governo do país em determinadas pastas é tão importante que qualquer negociante de gado dá conta do recado e ainda ganha uns trocos.


Agora, mesmo para acabar: ainda tenho que viver muitos anos para me habituar a trabalhar menos e a viver mais à Agostinho da Silva. JAE.

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