quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

A política e os negócios de Francisco Moita Flores

Movimentos financeiros entre a empresa “ABB Construções” e empresa da mulher e dos filhos de Moita Flores põem em causa credibilidade do ex-autarca


A Câmara de Santarém deu uma compensação de um milhão e oitocentos mil euros a uma empresa (ABB Construções) que construiu um parque de estacionamento em Santarém e, pouco tempo depois, essa empresa fez chegar à conta de uma empresa dos filhos de Francisco Moita Flores uma verba de 300 mil euros que serviu depois para transferir para uma outra conta da empresa da mulher de Moita Flores, Filomena Gonçalves.
Não é normal um político ter negócios pessoais e familiares com uma empresa que trabalha para a autarquia onde ele é presidente e sujeitar-se a estes movimentos financeiros, sabendo que, hoje, o escrutínio sobre os políticos aumentou substancialmente. Ainda por cima Moita Flores saiu do concelho de Santarém aos pontapés nos seus antigos camaradas e deitando fumo pelos olhos nas relações com todos aqueles com quem partilhou o Poder. Nada do que acabo de escrever, baseado no que é do conhecimento público (ver notícia nesta edição na página 9) prova que Francisco Moita Flores é corrupto ou se deixou corromper; mas os indícios que o Ministério Público (MP) encontrou e persegue são muito perigosos para a credibilidade do ex-autarca de Santarém a quem sempre ouvi dizer que estava na política para devolver ao país aquilo que as suas instituições lhe tinham dado ao longo da sua vida. Não conheço melhor forma de justificar o dever de cidadania que pagar a quem devemos na mesma moeda, ainda para mais quando se chega a uma idade em que o dinheiro deixa de ter tanto valor e nem para comer já precisamos do prato cheio.
A maior parte dos camaradas e companheiros que ele levou de Santarém em excursão à sua casa de campo no Alentejo ainda hoje falam disso, não para valorizarem o gesto de hospitalidade mas dando conta de uma certa vaidade, própria dos novos ricos, que gostam de fazer alarde das condições de vida que lhes permitem a compra de bens e a contratação de pessoas para os servirem.
Francisco Moita Flores é um Franciscano praticante que acredita em Deus e, sempre que pode, vai confessar-se aos padres. Acredito por isso que, nesta altura, ele já esteja a contas com a sua fé e creia piamente que tudo se resolverá para seu bem e da sua família. Mas eu, que sou ateu e não me confesso às mulheres da minha vida, quanto mais aos padres, não acabo esta crónica sem lembrar que quem semeia ventos colhe tempestades. Quinze dias antes das eleições autárquicas, em que Moita era candidato em Oeiras, o ex-presidente deu uma entrevista a um jornal, entretanto defunto, em que só faltou chamar atrasados mentais aos políticos camaradas e ex-amigos que deixou no seu lugar a governarem o concelho de Santarém. Não é normal este tipo de comportamento, por maiores que fossem as zangas na direcção política da autarquia. A ira revelada nestas relações é um sinal pouco abonatório da personalidade do político e escritor, autor de alguns livros como “O Carteirista que fugiu a tempo”, “Mataram o Rei” e “Polícias sem História”.
Moita Flores justifica em declarações ao jornal Expresso que tudo o que está a acontecer é uma perseguição do MP e do actual presidente da Câmara de Santarém, Ricardo Gonçalves. Quanto ao movimento do dinheiro diz que está tudo justificado e que ninguém tem que ver com as contas das empresas da mulher e dos filhos. Parecem-me fracos argumentos para uma pessoa que conhece bem as investigações a estes casos e o valor que têm para o MP as acusações de perseguição política. JAE.

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