Jorge Lacão retirou-se da política activa mas apareceu recentemente com um artigo de opinião a desancar o Ministério Público e o Presidente da República. Tudo leva a crer que o ataque tenha a ver com a nomeação de Almeida Guerra para Procurador Geral da República e a quase certeza que José Sócrates vai mesmo a julgamento.
Jorge Lacão assinou recentemente no jornal Público (edição de 26 de Dezembro) um artigo em que acusa o Ministério Público de sempre perseguir “a ambição de se constituir um estado dentro do Estado”. Depois das críticas generalizadas à classe política, descarrega ainda em cima do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, escrevendo esta pérola sobre o “Estado de direito à deriva”, título que deu ao artigo que estamos a citar: “Perante este cenário pessimista, mas não menos realista, seria de esperar que um Presidente da República, principal garante do funcionamento das instituições democráticas, se mostrasse particularmente vigilante face às crescentes ameaças à integridade dos princípios mais estruturantes do Estado de direito”. E acaba o artigo a classificar o mandato de Marcelo Rebelo de Sousa como se ele fosse o culpado do desastre em que vivemos, lamentando por fim que a nossa República não tenha “servidores corajosos”.
Uma pessoa lê e não acredita: Jorge Lacão só fez política nestes últimos 50 anos. Foi quase tudo na vida pública com a camisola do PS, incluindo ministro, Secretário de Estado, vice da Assembleia da República, deputado até se cansar da política. Quando se iniciou, foi durante anos uma espécie de secretário particular de Mário Soares, o que diz bem da escola em que se formou. Resumindo, se há políticos que fizeram e dormiram na cama da República portuguesa, Jorge Lacão foi um deles. Não estou a criticar; estou a dar conta de um facto. O que leva Jorge Lacão, retirado da política por vontade própria, depois de fazer o seu caminho, a reaparecer nas páginas de um jornal a desancar o Ministério Público, prevendo uma “catástrofe” em resultado do descrédito das nossas instituições, e acusando o actual Presidente da República de estar “do lado errado da história (...) vergado a uma ideologia populista (...) que sopra do lado da extrema direita” ?
É claro que não estou à espera que os leitores me respondam, muito menos Jorge Lacão, que foi sempre eleito deputado pelo distrito de Santarém, mais tarde pelo de Lisboa, algumas vezes com o meu voto. Tenho, no entanto, uma “desconfiança certa”, como dizia o meu avô materno, que depois de um “grão na asa” tinha algumas frases consideradas interessantes e que ficaram na memória popular do povo da minha terra: a nomeação de Almeida Guerra para Procurador Geral da República está a deixar os cabelos em pé a muita gente. Teme-se que José Sócrates vá mesmo a julgamento e que caia o Carmo e a Trindade porque vai lavar-se muita roupa suja que já devia estar no lixo ou arrumada no armário. O artigo de opinião de Jorge Lacão não mereceu qualquer referência dos habituais comentadores políticos da nossa praça. Mas não é de estranhar. Lacão ataca o Presidente da República e o Ministério Público, mas não diz ao que vem nem ao que vai. É como se Lacão estivesse agora a iniciar-se na vida política, a posicionar-se ao lado dos cães de guarda da República, contra todos os malfeitores que se aproveitaram do Estado e da Justiça desorganizada para esconder dinheiro em envelopes nos gabinetes de trabalho, ou viverem do dinheiro recebido em envelopes dos seus motoristas, entre tantas malfeitorias que se contam e nos enchem de vergonha.
Jorge Lacão foi considerado um parlamentar brilhante, vai certamente ficar na História do Partido Socialista e do país por ter ocupado cargos de relevo. É uma tristeza lê-lo num jornal de referência a mandar bitaites contra o Presidente da República que, como todos sabemos, está em final de mandato e é tão responsável pela má governação do país e da Justiça como Jorge Lacão é pela proveniência dos 80 mil euros que o chefe de gabinete de António Costa tinha escondido em envelopes e que obrigou o ex-primeiro ministro a pedir a demissão num caso que nos envergonha, como país, até ao tutano. JAE.
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