quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Há velhos que nos fazem falta

A morte do Senhor Francisco Leonor, o antiquário de Almeirim, é uma perda para mim embora não seja da família nem tenha sido seu grande amigo. Era, no entanto, há mais de 30 anos, uma pessoa próxima com quem treinava regularmente a conquista da confiança. A minha postura humilde e bom ouvinte fizeram com que ao longo dos anos soubesse pequenos segredos que ainda hoje me servem de alimento e me dão prazer gerir.
O feitio e a forma de estar de Vasco Graça Moura é um deles. O escritor e político, que comprou casa em Benfica do Ribatejo, era desde há muitos anos amigo e cliente do senhor Leonor. Como a minha curiosidade sempre foi mais intelectual que material ouvi muitas conversas que me deliciaram e me fizeram perceber o mundo em que certa gente se movimenta.Vasco Graça Moura era um perfeccionista e um Homem que não se deixava apanhar nem por um cabelo.
Não posso falar aqui dos casos de figuras públicas manhosas, tão ou mais negociantes que o próprio Francisco Leonor. Mas registei muitos casos de figuras públicas que parecem o contrário daquilo que realmente são. Alguns episódios dariam grandes histórias e alimentariam a curiosidade popular. Mas falar deles tão cruelmente, e agora pela boca de um morto, não seria a melhor maneira de lhes chegar a roupa ao pêlo. Nem o Senhor Leonor me perdoaria. 
É verdade que não há pessoas insubstituíveis. É verdade que o Senhor Leonor deveria parecer a muita gente um tipo forreta, espertalhão, oportunista, etc, etc, nomes que não faltarão no dicionário para quem gosta de apelidar pessoas de trabalho que fazem o mundo girar ainda que seja o nosso pequeno mundo. Eu próprio fui vítima, algumas vezes, da sua arte de negociar; da sua paixão pela conversa que nem sempre era a que mais me interessava. Só o filho da onça é que já nasce pintado. Com a morte de Francisco Leonor voltei a lembrar-me de algum velhos sábios que me ensinaram a sobreviver, ou seja, a viver à custa do meu trabalho sem nunca contar com o ovo no cu da galinha; Muito do que sei devo-o aos homens dos ofícios. O que ainda tenho para aprender nem eu sei.
JAE

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